Negociações Internacionais: é preciso compreender para fazer acontecer



Negociações Internacionais: é preciso compreender para fazer acontecer

Este é o ano das meganegociações comerciais. O três processos em que o Brasil está envolvido – OMC, Mercosul/União Européia e Alca – entram agora na fase decisiva de apresentação de ofertas e prazos para desgravação tarifária. A total inter-relação entre elas pode ser constatada na questão agrícola, que representa a maior demanda brasileira para que as negociações avancem.
O setor, que representa 10% do nosso PIB, 40% de nossas exportações, emprega 37% da força de trabalho e em 2002 registrou um superávit de U$ 21 bilhões, tem a obrigação de se levantar diante de movimentos protecionistas dos países desenvolvidos. Sem resultados significativos na agricultura, o Brasil tem o poder e o dever de travar as negociações da rodada de Doha, do acordo Mercosul e da Alca.
Os EUA dizem que só discutirão este tema na OMC, pois alegam que este é um setor muito sensível de sua economia e não querem fazer concessões duas vezes. Se tiverem de derrubar subsídios, isto só será feito em Genebra. A União Européia, por sua vez, alega que não irá mexer nesta questão antes de 2007, quando sua Política Agrícola Comum (PAC) passará por uma revisão. A PAC é a garantia que os produtores agrícolas europeus têm de que seus produtos, de qualidade muito inferior à de seus congêneres brasileiros, terão enormes recursos do governo para poder continuar competindo no mercado internacional. Somando-se a isto a real intenção européia de admitir mais dez países em sua união econômica e monetária, diminuem ainda mais as possibilidades de que as negociações com o Mercosul e com a OMC tenham alguma prioridade em um horizonte de pelo menos quatro anos.
A recente proposta de liberalização agrícola apresentada pelo presidente do Comitê de Agricultura da OMC, embora ainda esteja longe de ser o que o governo brasileiro considera a proposta ideal, é um ponto de partida muito importante para que consigamos vantagens no âmbito multilateral. Ela prevê a redução dos subsídios às exportações pela metade em seis anos e sua eliminação em dez. Sobre as tarifas de importação, diz que devem ser reduzidas entre 40% e 60% em cinco anos, deixando, porém, a questão dos subsídios internos para análise posterior sempre que distorçam o comércio entre os países-membros. Embora a questão das tarifas seja um impeditivo considerável para o maior acesso de nossos produtos, o que mais temos que lutar na OMC é para que sejam eliminadas todas as formas de suporte financeiro aos produtos agrícolas, bem como toda e qualquer forma de barreira não-tarifária, questões essas que estão longe de serem resolvidas.
É oportuno lembrar que, pelo cronograma dos três processos em questão, as negociações devem terminar no mais tardar em 2008. Para que eles se transformem em um jogo de soma positiva, é preciso que o Brasil, mais do que nunca, arregace as mangas e comece a pressionar os países desenvolvidos para que sua política protecionista dê lugar a um ambiente de cooperação em prol de avanços significativos nas economias do mundo.
Para isto, precisamos reforçar a nossa estrutura de defesa comercial o quanto antes. Enquanto o escritório de promoção comercial norte americano (USTR) e a Comissão Internacional de Comércio (ITC) contam com 16.320 funcionários, o Ministério das Relações Exteriores (MRE), a Secretaria de Comércio Exterior (Secex) e o Departamento de Economia (Decon) mantêm em seu quadro funcional uma estrutura de apenas 62 técnicos em negociação. Faz-se portanto necessária a capacitação de recursos humanos capazes de encarar o duro desafio de formular e negociar acordos comerciais que venham de encontro com os interesses nacionais. Para negociar o acordo de livre de comércio com os EUA, que acabou de ser concluído e deve passar pela aprovação dos respectivos Congressos em alguns meses, o Chile formou aproximadamente 200 negociadores comerciais.
Só este ano, estão previstas a realização de 1.420 reuniões do processo negociador da Alca, que serão realizadas na cidade de Puebla, no México. As dificuldades de acesso e a falta de pessoal capacitado para representar o Brasil nesta etapa das negociações farão com que os representantes do governo brasileiro, que não foram agraciados com o dom da ubiqüidade, tenham de se desdobrar em mil para negociar com vigor as posições do nosso país.
Quando o México negociou o Nafta, teve a participação maciça de sua sociedade civil, que se organizou e montou uma coalizão fortíssima com o governo. Os representantes do setor privado, embora não tenham participado diretamente das negociações, ficavam na sala ao lado e municiavam os negociadores oficiais com informações e orientações que atendessem aos seus interesses. A participação da sociedade civil brasileira na questão da Alca tem aumentado consideravelmente ao longo dos dois últimos anos e, na história das negociações comerciais brasileiras, nunca tivemos tanto apoio do governo para fortalecer esta parceria. A crescente participação de representantes do setor privado brasileiro na Coalização Empresarial Brasileira (CEB) e no Coalca (Coordenação Geral da Alca) são prova de que estamos avançando para uma mobilização cada vez maior.
No entanto, o setor privado não pode apenas achar que está bem informado porque participa de todas as reuniões a que é convidado. É preciso pressionar o governo para que aprove todas as reformas estruturais necessárias para promover uma política interna de controle fiscal e uma política agressiva de promoção de exportações. É preciso fazer um movimento de mobilização empresarial que tenha como objetivo principal entender efetivamente qual será o impacto de uma eventual Alca para os setores envolvidos, o que exige investimento em pesquisas e estudos. O governo não tem condições de fazer isso sozinho, ele precisa de ajuda. Embora os negociadores sejam extremamente bem preparados e possuam conhecimento invejável sobre a matéria, a maioria deles, muitas vezes, nunca pisou em um chão de fábrica e nunca assinou um contra-cheque. Quem melhor do que os empresários e donos dos meios de produção para entender o impacto que uma abertura comercial pode ter em seus negócios?

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http://pt.wikipedia.org/wiki/Rodada_de_Doha
Autor: Charleny Francine Lagoa


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