Avaliação Dos Impactos Ambientais Dos Transgênicos



A melhoria de rebanhos e cultivares é um objetivo que desde muito acompanha a humanidade. Desde a antiguidade, o homem vem buscando obter o máximo aproveitamento na agricultura e na pecuária através de diferentes técnicas, a começar pelo cruzamento entre diferentes espécies, até a alteração genética de determinados estruturas [1].

Com o advento da Nova Lei de Biossegurança [2], tornou-se evidente a necessidade e importância da elaboração de estudos prévios de impacto ambiental. A priori o assunto seria passivo, porém a cultura ambiental brasileira não encontra em seu arcabouço social a real compreensão do tema. A nova lei, então, trouxe, dentre outras nuances, uma idéia de massificar o entendimento referente a necessidade de estudos de avaliação de impacto ambiental.

A questão dos trangênicos e do impacto ambiental que podem causar tem alcançado repercussão em enormes proporções, chegando ao cenário televisivo nacional e internacional, estando distante sua total definição.

O tema chega a promover um embate, não corretamente saudável, no qual, de um lado, aparecem os ambientalistas e demais entidades protecionistas, que criticam as experiências em transgenia, entendendo ser este um irremediável “erro científico ambiental”, de outro aparecem as potências industriais (como a Monsanto) auxiliadas por uma grande parte da comunidade científica, que desejam investir e encontram na mesma transgenia a oportunidade de otimizar lucro e qualidade e engrandecer o campo das pesquisas. No meio termo de toda esta situação aparece o Governo, que em meio aos desentendimentos políticos internos, busca ajustar a discussão e orientar os melhores meios de resolução de determinados conflitos.

Visto a necessidade de apresentarem-se novos esclarecimentos ao público que atua (ou possui mero interesse) na área Ambiental é que se presta o presente.

Aspectos da Nova Lei de Biossegurança

Quando se fala em transgenia, logo é necessário fazer-se alusão à nova Lei de Biossegurança, fato este que coloca o tema como de importância de segurança nacional.

Cabe de pronto ressaltar que, mesmo com a Nova Lei de Biossegurança, a legislação no Brasil, em matéria ambiental, em um computo geral, é extremamente insuficiente como bem assevera Ana Maria Moreira Marchesan[3]. Destarte, a entrada em vigor da Lei nº. 11.105 de 24 de Março de 2005[4] trouxe inovações, regulando de forma mais equânime as competências e deveres de cada parte na cadeia transgênica, principalmente por agraciar o ideal de preservação, antes de qualquer pretensão econômica ou política (sendo esta, ao menos em tese, uma de suas pilastras).

Toda a idéia de preservação que se inseriu no sistema jurídico nacional, após sancionada a Nova Lei de Biossegurança, tem suas razões em um princípio do Direito Ambiental: o “princípio da precaução”, princípio este, inclusive, agraciado na Constituição Federal de 1988, que no art. 225, §1º, IV traz a seguinte determinação:

“Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.”

“§ 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:”

“(...) IV – exigir, na forma da lei, para a instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;”

Antes de entrar em vigor a Nova Lei, a anterior[5], que nas palavras de Rubens Onofre Nodari[6], “foi considerada apropriada e elogiada por praticamente todos os setores da sociedade”, deixou enormes lacunas no concernente aos responsáveis pela autorização para liberação comercial do OGM[7]. Este cenário resultou em inúmeras irregularidades, com o CTNbio[8] autorizando e impedindo a comercialização de diversos OGM sem o menor critério de avaliação. Um dos momentos mais complicados, dentro deste cenário já apresentado, ocorreu em 1998, quando o CTNBio aproou a liberação comercial da Soja RR sem quaisquer espécies de análise de risco ambiental[9].

Ora, como já frisado, pode parecer muito simples e notório que a comercialização de produtos geneticamente modificados deva ser previamente analisada em decorrência do risco ambiental que representa, ocorre, contudo, que o tema necessita ser averiguado de um ponto de vista amplo; tanto do produtor, quanto do mercado, da comunidade científica e do poder público, e foi exatamente falta desta mencionada visão que fez com que o governo, através do CTNBio, não atentasse à necessidade de maior cautela com o assunto.

No Novo dispositivo legal de Biossegurança, logo em seu art. 1° trata-se do princípio da precaução, como vemos a seguir:

“Art. 1°. Esta Lei estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização sobre a construção, o cultivo, a produção a manipulação, o transporte, a transferência, a importação, a exportação, o armazenamento, a pesquisa, a comercialização, o consumo, a liberação no meio ambiente e o descarte de organismos geneticamente modificados – OGM e seus derivados, tendo como diretrizes o estímulo ao avanço científico na área de biossegurança e biotecnologia, a proteção à vida e à saúde humana, animal e vegetal, e a observância do princípio da precaução para a proteção do meio ambiente.” (grifo nosso).

Tem-se, daí, que a Lei buscou deixar explícita a necessidade de corrigir um lapso deixado na legislação anterior.

Comprovadamente a obediência ao princípio da precaução remonta a tempos bem mais distantes, podendo ser observada já na Convenção sobre Diversidade Biológica – CDB, que surgiu com a Declaração do Rio, em 1992, na ocasião da RIO-92.

Como princípio 15 da Declaração do Rio, o princípio da precaução está assim estabelecido: “Com o fim de proteger o meio ambiente, o princípio da precaução deverá ser amplamente observado pelos Estados, de acordo com suas capacidades. Quando houver ameaça de danos graves ou irreversíveis, a ausência de certeza científica absoluta não será utilizada como razão para o adiamento de medidas economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental[10]”.

 Toda essa discussão sobre a competência para se realizar as devidas concessões, e a forma pela qual se deve proceder às mencionadas concessões, aportam na competência ambiental do Estado, que é o responsável maior pela preservação do habitat, tanto diretamente quanto indiretamente (momento no qual incumbe-se de alertar a população sobre as necessidades de preservação).

A comercialização de OGM esbarra em muitas outras questões, vez tratar-se, como já dito, de questão de cunho ambiental, que requer atenção da Administração Pública, e desta forma, no campo da ordem social guarda relação com os termos da política de habitação[11].

Ora, não é de se abismar que o tema envolva tantos aspectos, muitas vezes distantes aos olhos menos atentos.

Estudos de Impacto Ambiental

Os alimentos transgênicos estão cercados de diversas preocupações, dentre estas os efeitos sobre o meio ambiente é uma das principais. São diversas as incertezas: perda de biodiversidade, eliminação de espécies nativas, resistência de insetos a pesticidas, são conseqüências possíveis da introdução de culturas transgênicas na agricultura. Para evitar complicações desta ordem, não só o Brasil, a maioria dos países vem adotando rígidos protocolos de biossegurança antes de autorizar a liberação no meio ambiente de sementes ou outros organismos geneticamente modificados (OGM). No Brasil, qualquer empresa (pública ou privada) que queira pesquisar, cultivar ou comercializar transgênicos, deve atender às exigências de cinco órgãos: a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama), o Ministério do Meio Ambiente (MMA) e o Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama).

A ligação dos estudos de impacto ambiental na situação dos transgênicos é reconhecidamente nova. Nas doutrinas e na própria legislação, somos conduzidos a enxergar a figura dos estudos de impacto ambiental quando o tema central for a lavra garimpeira e outras atividades de “operação direta em solo”, o fato se dá pela novidade que é a própria transgenia.

Impacto ambiental é, pois, qualquer degradação do meio ambiente, qualquer alteração dos atributos deste[12].

O estudo de impacto ambiental pressupõe o controle preventivo de danos ambientais, que, uma vez constatados ou previstos, devem ser estudados de forma a se buscar evitar ou minimizar o prejuízo.

Segundo a Resolução CONAMA[13] 01/86, é considerável como impacto ambiental “qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas que direta ou indiretamente, afetam: I - a saúde, a segurança e o bem estar da população; II - as atividades sociais e econômicas; III - a biota; IV - as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente; e V - a qualidade dos recursos ambientais". O texto torna evidente que a questão do impacto ambiental possui uma amplitude sem precedentes, afetando diretamente a sociedade.

Como já asseverado, os Estudos de Impacto Ambiental (EIA) presumem-se de grande importância, pois é exatamente desta prévia análise que poderemos saber os reais benefícios oriundos das atividades agrárias com Organismos Geneticamente Modificados.

Conclusão

No Brasil a avaliação do impacto ambiental de transgênicos permanece com muitas questões a resolver. Não há padrões estabelecidos e, por outro lado, as exigências para liberação de OGM no meio ambiente são grandes, mas nem de longe obedecidas por completo ou aplicadas com correção.

Logicamente devemos conceder atenção aos esforços científicos empreendidos na questão dos trangênicos, em suma essas experiências têm apresentado bons resultados, têm demonstrado um crescimento e preocupação com a melhor qualidade dos produtos, inclusive atentando-se ao fator comercial, na expectativa de uma redução significativa de preços, vez que os custos com antigos problemas (pragas, agrotóxicos agressivos, pestes, etc...) serão drasticamente reduzidos com a evolução e criação de espécies mais resistentes, mais seguras.

De fato, o consumo responsável é a ferramenta mais efetiva para o controle dos prejuízos ambientais que um OGM possa trazer, é meio de conservação da natureza. A opção por consumir ou rejeitar um produto é particular a cada cidadão, e, de uma forma final, acaba por, também, influenciar no desenvolvimento de novas espécies, o que, por conseguinte, atinge no arcabouço jurídico que versa sobre o tema.

O Estado possui um papel preponderante na conservação e fiscalização do meio ambiente, cabendo a si a Biossegurança, o que de forma alguma exclui o particular de ser uma extensão desta fiscalização, afinal de contas somos nós os destinatários finais de tais produtos.

A importância do estudo de impacto ambiental na questão dos OGM está no fato de ser este, muito provavelmente, o “fiel da balança”. A garantia de estudos prévio consistentes e sérios pode, de uma vez por todas, amenizar a tensão entre as partes interessadas no assunto, vez que pode comprovar realmente o que pode ou não ser trabalhado, quais espécies podem ser cultivadas, quais tipos de modificações devem ser implementadas, pode este ser o norte de uma melhor condução às discussões.

Notadamente faz-se necessário um poder público correto e bem amparado, pois a elaboração de estudos de impacto ambiental deve obedecer a normas rígidas que resultem em documentos de teor inquestionável. Desta feita, faz-se necessário, prontamente, órgãos mais capacitados, reformulados e comprometidos com as novas premissas da proteção ambiental.

Trata-se de um questionamento social, político e jurídico, onde todos devemos agir conscientemente, visando a preservação do meio ambiente para as próximas gerações.

[1] NORONHA, Durval de Goyos Junior, BONI, Adriano de Souza, BRATZ, Eduardo. Direito Agrário Brasileiro e Agronegócio Internacional – São Paulo: Observador Legal, 2007.

[2] Lei nº. 11.105 de 24 de Março de 2005.

[3] Biossegurança e novas tecnologias na sociedade de risco: aspectos jurídicos, técnicos e sociais, Florianópolis: Conceito Editorial, 2007.

[4] Nova Lei da Biossegurança

[5] Lei n° 8.974 de 05 de Janeiro de 1995

[6] NODARI, Rubens Onofre e outros - Biossegurança e novas tecnologias na sociedade de risco: aspectos jurídicos, técnicos e sociais, Florianópolis: Conceito Editorial, 2007. p. 18/19

[7] Organismo Geneticamente Modificado. Trata-se da correta definição e nomenclatura de “Transgênicos”.

[8] Comissão Técnica Nacional de Biossegurança, órgão criado em conjunto com a legislação de biossegurança para analisar e atuar com base na lei, regulamentando os OGM’s.

[9] NODARI (op. Cit). p.24

[10] NODARI (op. Cit)

[11] SILVEIRA, Patrícia Azevedo da., Competência Ambiental, Curitiba: Juruá, 2002. p. 115

[12] SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional, São Paulo: Malheiros, 2005. p. 286

[13] O Conselho Nacional do Meio Ambiente - CONAMA é o órgão consultivo e deliberativo do Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA, foi instituído pela Lei 6.938/81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, regulamentada pelo Decreto 99.274/90. Trata-se de um órgão composto por Plenário, CIPAM, Grupos Assessores, Câmaras Técnicas e Grupos de Trabalho. O Conselho é presidido pelo Ministro do Meio Ambiente e sua Secretaria Executiva é exercida pelo Secretário-Executivo do MMA, sendo um colegiado representativo de cinco setores, a saber: órgãos federais, estaduais e municipais, setor empresarial e sociedade civil. O CONAMA reúne-se ordinariamente a cada 3 meses no Distrito Federal, podendo realizar Reuniões Extraordinárias fora do Distrito Federal, sempre que convocada pelo seu Presidente, por iniciativa própria ou a requerimento de pelo menos 2/3 dos seus membros.

Autor: Genival Silva Souza Filho


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