O dia dos trabalhadores x sociedade



Às vésperas do dia dos trabalhadores a Câmara dos deputados aprovou um aumento de 26% dos salários dos servidores do Executivo e do Legislativo. Como se não bastasse a crise do “mensalão” e das recentes descobertas dos super salários da magistratura que ultrapassam o teto permitido pela Lei, esta votação representa mais um passo para a constatação que, cargos políticos são vantajosos por vários aspectos, mas, principalmente, pelo aspecto financeiro. Quando refletimos sobre esta questão e a confrontamos com a história do dia dos trabalhadores, percebemos a divergência que existe entre a luta por melhores condições de vida e de trabalho e o poder concedido aos políticos de votar o próprio salário.Além disso, há ainda a elite empresarial, minúscula na pirâmide social do Brasil, que vive da exploração do trabalho dos menos favorecidos.
Uma pesquisa do Dieese revela que, apesar do recente aumento do salário mínimo, a cesta básica representa 48, 78% dele. Esta constatação nos faz perceber o quanto o Brasil tem sido conivente com o aumento das diferenças sociais. No entanto, a chegada do dia do trabalhador traz aquela sensação do quanto o trabalhador é valorizado, o quanto o trabalhador é importante para a sociedade. De fato, não há dúvidas da importância do trabalho para a transformação e formação das sociedades, o problema é: o preconceito e descaso que existe em torno dos trabalhadores braçais, dos trabalhadores do subemprego e dos trabalhadores temporários. O estranho de todo este cenário é que quando voltamos um pouco na história, concluímos que a própria sociedade capitalista é geradora de todas estas diferenças. Ao importar escravos, maltratá-los e simplesmente conceder-lhes a alforria sem pensar em como ampará-los dentro de uma sociedade que apenas concedia privilégios às elites, ela mesma discrimina o próprio feito. Podemos comparar esta sociedade com o inesquecível personagem de Mary Shelley “Dr. Frankenstein” que, ao criar o monstro, sente uma repulsa tão grande por não se identificar com ele que logo o abandona sem nenhum apoio e sem explicar como seria a vida do outro lado. Hoje em dia, o nosso “monstro” são os excluídos do processo histórico tratados pelo Estado brasileiro como alimárias. A sociedade os criou e a sociedade os rejeitou.
Darcy Ribeiro em O povo Brasileiro analisa os primórdios da formação intelectual do Brasil através da perspectiva étnica, isto é, da mistura de raças que sofremos no início do processo de construção da nossa civilização. Para ele, a mistura que resultou no brasileiro, ou seja, a mistura do Europeu com o índio e mais tarde com negro acarretou em uma perda da identidade. O brasileiro, resultado de tanta miscigenação, tornou-se um ser perdido entre o desejo de ser como o pai europeu, mas ser discriminado por ele, e, ao mesmo tempo, discriminar a mãe por ser ela índia ou negra. Este grande caldeirão da miscigenação e da discriminação destes povos construiu o “monstro” de nossa sociedade do qual ainda não conseguimos nos libertar: as desigualdades sociais em que prevalecem os ricos a despeito da massa pobre, sem educação, sem saúde e sem emprego.
O escritor e jornalista Luciano Pires ao escrever para a folha de São Paulo no caderno Dinheiro de 13 de outubro de 2006, vai ainda mais longe nesta reflexão ao mencionar a existência de dois Brasis. Para ele, existe um Brasil que manda e um Brasil que é manipulado: “Existe um Brasil que consome as porcariadas que a mídia dissemina e que os marqueteiros inventam para ganhar dinheiro. É um Brasil pobre de espírito, conformado em ser dirigido. Um Brasil ignorante, que faz dessa ignorância fonte de poder e lucro. Um Brasil onde regras têm pouco significado, onde o que vale é tirar proveito, é a malandragem. O Brasil dos Pocotós”
Ponderar sobre todo este cenário é buscar entender os motivos da origem do dia dos trabalhadores. O dia dos trabalhadores é fruto de reivindicações por dias melhores, pela diminuição da jornada de trabalho, pela justiça dos salários e por melhores condições de trabalho. Esta data é fruto de todo este processo histórico que culminou no dia 1º. de Maio, originalmente, uma data de celebração da luta dos trabalhadores.
Trazer à tona todas estas questões é o primeiro passo no processo de conscientização da importância das diversas categorias de trabalho. É o momento da tomada de consciência de que a valorização da mão-de-obra é a valorização do povo de uma nação. É hora de atentarmos para a fortuna que muitos empresários fazem às custas da exploração de muitos trabalhadores que aceitam condições sub-humanas por valores ínfimos que não asseguram uma sobrevivência digna. É preciso que a sociedade brasileira, em geral, perceba que a verdadeira prosperidade está no conjunto, não apenas nas partes. Só seremos considerados uma nação próspera quando vislumbrarmos a prosperidade do próximo. Esta é a receita dos países “desenvolvidos”, o trabalho é remunerado de forma a garantir qualidade de vida. Pensando mais longe, este também é a melhor caminho para prevenir a violência e muitos problemas que surgem em função da pobreza extrema. Só assim, seremos capazes de mudar o final de nossa história e não deixar que este “monstro” nos destrua assim como o célebre “Dr. Frankestein” foi destruído pela obra das próprias mãos.
Autor: Natália Carolina Alencar de Resende


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