A Educação Religiosa e os Desafios do Mundo Moderno



INTRODUÇÃO
Paulo, em sua segunda carta a Timóteo, descreve os nossos dias como “tempos trabalhosos” (2 Tm 3.1). Nunca o pecado esteve tão forte e tão atraente como em nossos dias. Vemos a humanidade descambando-se aceleradamente para o abismo, a cada minuto e a cada instante. Há crise em todo lugar e em todos os níveis: moral, espiritual, social, etc. Mas, a pergunta que se faz é: De quem é a culpa? A quem devemos responsabilizar pelo caos no mundo? Seria fácil e cômodo atribuirmos a culpa aos líderes políticos e governamentais e ao próprio diabo. Porém, ainda que não gostemos ou não queiramos admitir, a culpa não é só deles, é principalmente da igreja.
Jesus estabeleceu Sua igreja para ser uma força remidora da humanidade e neutralizadora da corrupção e degeneração da raça humana. Ela foi estabelecida para ser “o sal da terra e a luz do mundo” (Mt 5.13,14). À essa igreja, Jesus deu a responsabilidade de fazer discípulos de todos os povos da terra (Mt 28.19). Porém, o que ela está fazendo para cumprir sua missão? Pouco ou nada.
POR QUE A IGREJA NÃO ESTÁ CONSEGUINDO ALCANÇAR O MUNDO COM O EVANGELHO?
A resposta mais simples e direta é: porque não está preparada. Falta-lhe a visão (Rm 10.14,15). Os líderes estão muito preocupados com organizações, projetos arquitetônicos e programas para a obra de Deus, que acabam se esquecendo do elemento principal para quem a obra de Deus é dirigida – o homem. Historicamente somos ativistas. São “tantas” as "responsabilidades" e somos “tão dedicados" a elas, que não "temos tempo" para parar e planejar estrategicamente como alcançar o homem perdido e integrá-lo ao Reino de Deus. Não nos organizamos, nem buscamos a visão certa. Nada de tudo o que fizermos poderá levar a Igreja à maturidade, a ponto de cumprir com sua missão de evangelizar o mundo, se excluirmos ou negligenciarmos a educação religiosa.
Jesus foi um grande evangelizador, porém, os mais influentes líderes de sua época, bem como o próprio povo, que por vezes fora curado e abençoado por Ele, o identificaram como Mestre (Jo 3.2). Ele próprio exaltou acima de todos os seus ministérios, o de mestre (Jo 13.13). Dentre os dons de ministério que o Senhor dá à igreja, destaca-se o de Mestre (professor ou educador). Por certo, se o ensino não fosse vital para o perfeito desenvolvimento da Igreja e propagação do Reino de Deus, o Senhor não teria, Ele próprio, valorizado esse ministério, nem teria dado a nós o dom da maestria.
Somos educadores, e como tal, fomos chamados para equiparmos os santos (Ef 4.11-16). Se a Igreja não está enviando missionários ao mundo, e se não está levando o Reino de Deus a todos os povos, é porque temos falhado em nossa tarefa de educadores religiosos. Estamos fazendo pouco ou talvez nada.
Sabemos que não será um simples artigo como este que irá dirimir o problema, mas algumas reflexões importantes sobre a educação religiosa, o educador e os desafios do mundo moderno, poderão nos ajudar a buscar uma solução para a problematicidade.
EDUCAÇÃO RELIGIOSA
A primeira coisa que imaginamos quando pensamos em educação religiosa é numa reunião onde uma pessoa fala sobre Deus, a salvação, o céu, etc., e muitos (ou poucos, geralmente) ouvem. É aquela imagem de uma reunião monótona, tipo "água com açúcar" onde quem participa não vê a hora de tudo acabar, e quem não participa não deseja jamais começar. É ridículo não é? Mas acontece que é exatamente assim que a maioria de nós "desenvolve" o que chamamos de educação religiosa ou a experimentamos. Uma reunião onde o assunto é bastante teórico e pouco prático. Um assunto que na maioria das vezes não faz muito sentido à realidade da vida do educando, pois tenta atingir sua alma sem, contudo, atingi-lo no todo de sua vida.
Nos tempos do Antigo Testamento, na cultura judaica, não havia diferença entre educação religiosa e educação secular. Cada família tinha a responsabilidade de compartilhar às próximas gerações a natureza de Yahweh e Suas leis (Dt 4.1, 2, 9-11). O shema (ouve) era e é o conteúdo básico da instituição judaica (Dt 6.4-9). A educação era realizada tanto por meios informais quanto formais, sendo que a mais antiga e tradicional era a instrução por meios informais. Dessa forma as crianças eram ensinadas através de exercícios práticos, onde os meninos tinham a oportunidade de trabalhar com os pais na lida do rebanho e/ou no cultivo da terra, enquanto que as meninas trabalhavam com as mães, no lar. A disciplina, que também fazia parte desse tipo de instrução, era vista como fator preponderante na educação. De forma oral (tradição) às crianças eram passadas a história do povo, sua cultura e a Lei (religião).
Os sacerdotes eram responsáveis pela educação religiosa da nação de Israel (Dt 31.9-13). Muitos líderes, levitas e sacerdotes foram enviados por toda a terra para ensinarem ao povo a Lei do Senhor (2 Cr 17.7-9). Assim, a educação religiosa do povo de Israel envolvia não apenas o homem religioso, mas o homem completo, isto é, religioso político, histórico e social.
Nenhum programa de educação religiosa pode ser bom se voltar-se apenas para o espírito do homem, esquecendo-se da sua vida como um todo. Dessa forma definimos a educação religiosa como o processo de aprendizagem que visa levar o educando a atingir a medida da estatura completa de Cristo, aperfeiçoando sua personalidade e propiciando-lhe uma perfeita socialização em seu mundo exterior (Ef 4.11-16; 2 Tm 3.16,17).
FINALIDADE MAIOR DA EDUCAÇÃO RELIGIOSA
A educação religiosa visa, em última análise, a evangelização do mundo (missões). A grande responsabilidade da igreja no mundo é a evangelização. Se não houver maturidade ela não terá condições de cumprir sua missão. Para ter essa maturidade o indivíduo precisará ser preparado, instruído, treinado e educado religiosa¬mente (2 Tm 3.16,17). Uma vez educado religiosamente, conforme o que entendemos ser educação religiosa, o educando terá condições de influenciar o seu meio com o evangelho de Cristo e a cultura do Reino de Deus.
O EDUCADOR RELIGIOSO
Vivemos dias em que nossas Escolas Teológicas estão cheias de quebra-galhos. Aqui, o uso do termo “quebra-galhos” não deve ser entendido em sentido pejorativo, isto está longe de nosso pensamento. Porém, devemos entendê-lo como o recurso usado por nossas escolas no sentido de “improvisar” um professor para esta ou aquela disciplina, por falta de pessoal treinado e/ou disponível. A falta de recursos financeiros para remunerar professores especializados tem levado nossas Escolas à essas improvisações. Tal atitude não é a ideal, mas é a nossa realidade e enquanto ela não muda precisamos adequá-la às condições que melhor correspondam às expectativas de nossas instituições de ensino. Cientes disso, o que podemos fazer na tentativa de dirimir o problema? O mínimo que podemos fazer é conscientizar aqueles que estão no exercício de suas funções pedagógicas sobre qual é o seu papel e o que se espera deles do ponto de vista bíblico e teológico.
Na grande comissão Jesus ordenou três coisas fundamentais: fazer discípulos, batizá-los e ensiná-los (Mt 28.19). Das três, indubitavelmente a mais difícil é ensinar, considerando-se que tornar o homem um discípulo de Cristo é principalmente função do Espírito Santo.
João Locke reconheceu a importância do ensino quando disse: “— Creio que podemos afirmar que em cem homens, mais de novena são o que são — bons ou maus, úteis ou perniciosos à sociedade — pelo ensino que têm recebido”.
OS DESAFIOS DO MUNDO MODERNO
CRISE MORAL
Vivemos num mundo decaído e moralmente destruído, sem escrúlos, despudorado. Algumas estatísticas revelam que só entre os jovens cristãos “praticantes” 8% concorda com o sexo antes do casamento, 21% concorda em casar-se com pessoas de crenças contrárias às suas, 9,5% confessar ler revistas eróticas, 17,5% concorda com o uso de drogas.
De fevereiro de 1997 a janeiro de 2003, o Sistema Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual Infanto-Juvenil registrou 1.565 denúncias de abuso sexual, sendo que 84,48% das vítmias eram menores abaixo dos 8 anos de idade até 18 anos incompletos. No mesmo período, o citado órgão registrou 3.328 denúncias de exploração sexual cujas vítimas eram 61,48% menores com menos de 8 anos de idade até 18 anos incompletos. Convém esclarecer que quando se fala em exploração sexual está-se falando de “prostituição infantil”, pornografia na internet, turismo sexual, tráfico de crianças/adolescentes, confecção, venda ou veiculação de material pornográfico.
De acordo com o Ministério da Saúde, cerca de 27% dos partos feitos no SUS (Sistema Único de Saúde) só no ano de 1999, foram em adolescentes de 10 a 19 anos. Isso quer dizer que a cada 100 (cem) partos, 27 foram em adolescentes. Sendo que naquele anos foram realizados um total de 756.553 partos. Entre 1993 e 1999 houve aumento de cerca de 30% do número de partos feitos no SUS somente em menores entre 10 a 14 anos.
Como educadores, o que estamos fazendo para mudar este quadro? Que solução temos apresentado à sociedade? Em milênios passados o pecado de Judá chegou a extremos tais, que a Palavra de Deus registra: “(...) ao mal chamam bem, e ao bem, mal (...) fazem da escuridade luz, e da luz, escuridade (...)” (Is 5.20). É exatamente o quadro atual de nosso povo, onde o pecado passa a ser justificado por todos e passa a fazer parte da vida normal do cotidiano da sociedade.
CRISE ESPIRITUAL
A maioria de nossos jovens não sabe o que é firmeza espiritual, por nunca tê-la experimentado, e quase sempre nós educadores, estamos omissos quanto ao problema. A firmeza espiritual não acontece quando a pessoa reconhece que precisa entregar a vida a Jesus. Mas, quando a pessoa de fato entrega a vida a Cristo e deixa que Ele mude e dirija seus pensamentos, vontade, decisões, ações e toda a sua vida.
Há estatísticas que mostram que quando o jovem entra para o ensino médio, aos 12 anos de idade, ele já ouviu e viu cerca de 350.000 comerciais de televisão, o que equivale a cerca de 3.000 horas diante do televisor. No campo da violência, aos quinze anos de idade um jovem já viu 15.000 assassinatos na televisão. De acordo com o professor Jair G. Rangel, em seu artigo “o estudo da violência na televisão”, uma pesquisa realizada pelo Centro para Política Comunicacional da Universidade da Califórnia em 1995, a violência apresentada na TV causa riscos a seus telespectadores. 73% dos personagens maus, que praticam atos violentos, saem impunes. Os canais de TV a cabo premium (pacotes mais completos) apresentam 85% de programas violentos. o requinte da violência exibida aponta para efeitos cada vez mais danosos para os telespectadores, sendo os principais efeitos: o medo, a aprendizagem da agressão e a desensibilização.
Se o nosso ensino, como educadores cristãos, não for fortemente fundamen¬tado nas Escrituras, não conseguiremos vencer o mundo, e suas crises organizadas consumirão os nossos jovens. Como disse Franklin Roosevelt, presidente dos E.U.A., “nem sempre podemos construir o futuro para nossa juventude, mas podemos construir nossa juventude para o futuro”. Portanto, precisamos fazer alguma coisa já!
CRISE SOCIAL, ECONÔMICA E POLÍTICA
O quadro que vemos em nosso país é de fome, miséria, pessoas sem moradia, etc. Pensamos sempre que a razão do problema seja a má administração do dinheiro público ou a falta de planos de governo, claros e definidos. Mesmo que tudo isso também seja verdade, contudo, o verdadeiro problema que se desemboca na fome, miséria e nas calamidades que vemos por aí, no cotidiano, tem como causa a crise moral e a crise espiritual de nosso povo.
No campo da violência corporal, de acordo com dados da Secretaria Nacional de Segurança Pública – SENASP, tendo como base nos anos 2004-2005, 11,2% dos homicídios dolosos praticados no Brasil tiverem como protagonistas menores entre 12 e 17 anos de idade e 38,6% jovens entre 18 e 24 anos.
Embora muitas causas possam ser apresentadas, contudo, tais crises também são decorrentes da enorme falta de formação religiosa (cristã e bíblica) de nossa sociedade. Como educadores religiosos temos o grande desafio de educar religiosamente o povo, principalmente os jovens, a fim de que eles sejam amanhã, líderes sérios, responsáveis pelas mudanças sociais, econômicas e políticas do país. Querer prepará-los para o céu sem lhes dar condições de viver bem no mundo presente é quase utopia.
CRISE FAMILIAR
A família deveria ser o porto seguro da criança, do adolescente e do jovem. Contudo, não é o que se constata nos dados estatísticos. Segundo dados do Sistema Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual Infanto-Juvenil, 81,60% dos casos de abusos sexuais sofridos por menores ocorre dentro de sua própria casa, sendo que 59,03% dos casos é praticado por pessoas da família da vítima. Não bastasse tudo isso, 93,5% da violência física sofrida por crianças e adolescentes em sua própria casa, é praticada por parentes, sendo que destes, 52% da violência é praticada pela mãe da vítima e 27% pelo pai. É alarmante.
Como educadores o que temos feito para resolver ou amenizar o problema? Podemos dizer que de nada adiantará um programa de educação religiosa que vise atingir a criança, o adolescente e o jovem sem, contudo, atingir também a sua família. A família ainda é o grupo social que maior influ¬ência exerce sobre o indivíduo – positiva ou negativamente.
CONCLUSÃO
A educação religiosa precisa ser vista como uma forma de manifestar amor ao próximo, visto que ela almeja o melhor para ele. Não podemos, como educadores, nos limitar à cumprir apenas um programa curricular. É preciso, além disso, levar o educando a um desenvolvimento completo e à uma experiência mais profunda com o Senhor, a ponto de levá-lo à condição ideal de discípulo de Cristo.
O mundo moderno nos desafia com suas crises generalizadas. No entanto, nós podemos vencer as crises (1 Co 15.57). Temos a arma e os equipamentos necessá¬rios. Somos educadores e não crianças brincando de “escolinha”. Portanto, assumamos o nosso papel e cumpramos as nossas responsabilidades, lembrando-nos do que Paulo nos diz na Carta aos Romanos: “O que ensina, esmere-se no fazê-lo” (Rm 12.7b).
Façamos de nossos alunos espelhos de Jesus Cristo.
Autor: Rubem Menezes


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