O DANO MORAL



O DANO MORAL
Arthur Leite da Silveira Filho

A ocorrência de dano causado ao patrimônio de outrem resultante de ato ou fato, pessoal ou de terceiro por quem legalmente se responde, doloso ou culposo, cria direito à indenização. Podendo, ainda, significar a responsabilidade pelo reembolso de despesas e pelo pagamento por conta do que o agente passivo do dano deixou de auferir como conseqüência.

Do gênero indenização interessa-nos, para fins deste trabalho, a espécie decorrente de danos causados à moral, sob o prisma específico da sua enquadratura como fato gerador de imposto sobre a renda.

Da natureza da indenização, para a inequívoca efetividade da reparação de forma ideal, seria que sempre ocorresse com a reposição exata, por bem idêntico in natura. Neste sentido a tangibilidade e a possibilidade de existência de objeto idêntico ao bem danificado teria o condão para a reparação perfeita, teríamos a substituição da coisa, rés, danificada por sua idêntica substituta, sem mácula do ponto de vista indenizatório.

No dano moral de natureza imaterial, intangível, em função dos próprios bens protegidos, como por exemplo, a honra, não há como se tratar de reparação in natura. Por determinação legal, a indenização, compensação, deverá ser materializada sob a forma de pagamento, preferencialmente em dinheiro, por equivalência.


DANO NO ORDENAMENTO JURÍDICO

A Constituição Federal e a legislação nacional, a exemplo das existentes no mundo civilizado e democrático, garantem expressamente indenização em decorrência de dano.

Estabelecendo os princípios gerais da nação, a Constituição Federal começa com a declaração dos representantes do povo brasileiro, eleitos democraticamente para a função especialíssima de Constituintes que, já no preâmbulo da Carta Magna, nos apresentam as bases da instituição do Estado Democrático.
Determinando como “valores supremos” a destinação de assegurar, garantir, o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, à segurança, o bem estar, assim como o desenvolvimento, a igualdade e a justiça.

À seguir, tratando dos Direitos Fundamentais Individuais e Coletivos, prevê os danos e assegura o direito a indenizações:

TÍTULO II

Dos Direitos e Garantias Fundamentais

CAPÍTULO I

DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

........

V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;

........

X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

Cabe ressalvar que não ocorre distinção no tratamento dos danos morais e materiais no texto legal transcrito acima.

Algumas situações concretas estão previstas na Constituição Federal em face de indenizações, vejamos:


Ainda no artigo 5º.:

XXV - no caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá usar de propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior, se houver dano;


Tratando de direitos dos trabalhadores urbanos e rurais no artigo 7º, XXVIII, determina a indenização por acidente de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa;

No Título VII, Da Ordem Econômica e Financeira, tratando a Política Urbana da Nação, no Capítulo II, do desenvolvimento urbano, executada pelo poder público municipal, em consonância com a legislação para este mister, prevê no parágrafo 3º que as desapropriações urbanas serão “prévias e com justa indenização em dinheiro”, em atendimento às funções sociais. Vê-se claramente o interesse coletivo sobrepujando-se, via governo, ao individual, com a observação dos preceitos constitucionais de garantia, da segurança e da justiça.

Ressalta, ainda, no inciso III : “assegurados o valor real da indenização e os juros legais ”

Nosso ordenamento jurídico tem evoluído ao longo dos anos na busca do enquadramento normativo das instituições do dano e das suas respectivas indenizações.

A evolução normativa é patente, inquestionável, conforme veremos na seqüência cronológica das normas produzidas, a seguir comentadas, as quais voltaremos a examinar no capítulo seguinte, tratando do dano moral.

Já no início do século passado a regulamentação civil das estradas de ferro inova trazendo para o ordenamento jurídico pátrio a responsabilidade objetiva do fornecedor do serviço, as companhias ferroviárias. Estabelecendo competência para apuração de lucros cessantes e do dano moral, quando trata de “deformidade”, inclusive com a característica de tipo aberto.

O Código Civil de 1916 (Lei no. 3071/16), revogado pelo atual, regulamentava diversas situações de indenizações por danos, em especial no artigo 1550, quando trata do dano moral, prevendo a possibilidade de ocorrência deste para os casos de “ofensa a liberdade pessoal”:

Art. 1.550. A indenização por ofensa à liberdade pessoal consistirá no pagamento das perdas e danos que sobrevierem ao ofendido, e no de uma soma calculada nos termos do Parágrafo único do art. 1.547.

Determina a duplicação da indenização no caso de ferimento que resultasse em “aleijão ou deformidade”, sendo que quando a vítima fosse mulher solteira ou viúva, estabelecia a indenização sobre forma de “dote”, segundo as posses do ofensor, as circunstâncias do ofendido e a gravidade do defeito.

Com relação aos prejuízos ao exercício de ofício ou profissão pela vítima, decorrente do dano, enquanto perdurassem estes efeitos haveria, além da indenização e das despesas com o tratamento, pagamento de pensão por conta da perda de renda (lucros cessantes) e ou da depreciação sofrida.

No artigo 1543 trata da fixação por critério de “equivalência”, quando não existir a própria coisa, podendo, por via de estimativa chegar-se ao “valor ordinário e pelo de afeição”.

Especificamente na área do dano moral, trata no artigo 1547 da indenização por injúria ou calúnia, estabelecendo a reparação que delas resulte ao ofendido. Traz um critério de fixação de valor vinculado à multa, pelo dobro, da previsão do Código Penal para o respectivo crime.

Vai além, neste campo da dignidade humana e da liberdade pessoal, estabelecendo o pagamento de indenização por ofensa, pagamento de perdas e danos, que sobrevierem ao ofendido, expressamente determinando o pagamento de “uma soma” com a mesma base de cálculo do artigo 1547.


Em 1962 o Código Brasileiro de Telecomunicações (Lei no. 4117/62), tratando sobre o dano moral, traz novidades, tais como a tarifação do dano moral no § 1º do artigo 84, a forma de estimação em decorrência da “posição social ou política do ofendido, a situação econômica do ofensor, a intensidade do ânimo de ofender, a gravidade e repercussão da ofensa”, e ainda, a possibilidade de “retratação” como forma de atenuar a pena de reparação, independente da ação penal.
No parágrafo primeiro inova em termos de “decadência” estabelecendo e exíguo prazo de 30 (trinta) dias contados da “transmissão caluniosa, difamatória ou injuriosa”.

Com a precariedade de outrora nos meios de guardar as “gravações” pelas emissoras de rádio e televisão, visando a manutenção da prova material, estabelecia prazo para notificação pelo ofendido às emissoras, chamadas de “concessionárias ou permissionárias”, para não destruírem seus arquivos, que variava de 5 a 10 dias, de acordo com a capacidade em Kilowatts.


LEI Nº 4.737, DE 15 DE JULHO DE 1965 - Durante o regime militar com a Lei no. 4737/65 nasce o Código Eleitoral, assegurando além da indenização por dano moral o direito de resposta do ofendido, determinando a não tolerância a propaganda que apresentasse calúnia, difamação ou injúria e criando o direito de resposta, sem prejuízo da ação penal.

A Lei de Imprensa de 1967 (Lei no. 5250), regulando a liberdade de manifestação do pensamento e de informação, segue a mesma linha do Código Eleitoral, estendendo a responsabilidade civil às empresas jornalísticas com a previsão de ação de regresso destas contra os jornalistas, ofensores e, ainda, a retração da ofensa.
Em 1973, com a Lei 5988, de 14 de Dezembro, os Direitos Autorais são regulamentados garantindo os direitos morais do autor, tratando de direito à criação artística. No artigo 28, estabelece que os “direitos morais” são inalienáveis e irrenunciáveis”.


O Código Brasileiro de Aeronáutica, Lei no. 7.565/86, vem tratar do passageiro do transporte aéreo e de seus direitos indenizatórios. Estabelece as situações passíveis de indenização e cria um sistema de tarifação para determinar o valor à indenizar.



Um avanço espetacular vem com o Código de Defesa do Consumidor, Lei no. 8078/90 que, dispondo sobre a proteção do consumidor, estabelecida como matéria de ordem pública e de interesse social, nos termos do artigos 5º, inciso XXXII, 170º, inciso V, da Constituição Federal e 48 de suas disposições transitórias, vem já no Capítulo III, tratando “Dos Direitos Básicos dos Consumidores” estabelecer:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
......
VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos.


Nos artigos 12º, 14º e 17º, seção II, trata da “Responsabilidade pelo Fato do Produto e do Serviço”, independente da existência de culpa do fornecedor do produto e/ou serviços, situações de solidariedade do comerciante, e equiparação de todas as vítimas do evento lesivo.


Nesta evolução da proteção legal aos danos e ao direito a indenização, coube, ainda, ao CDC a previsão da “Repetição do Indébito” por cobrança indevida, a proteção da sua intimidade por cobrança que pratique qualquer tipo de constrangimento e o acesso aos Bancos de Dados e Cadastros, além do direito à sua imediata correção e anotações:

O Código Civil, Lei no. 10.406 de 10 de Janeiro de 2002, apresenta-nos sobre dois títulos as determinações legais da tutela cível relativas à indenizações.

Inicialmente tratando do “Inadimplemento por Obrigações”, Título IV, Capítulo III – “Das Perdas de Danos”, artigos 402 a 404 e em seguida, tratando da responsabilidade civil, no Título IX, “Da Responsabilidade Civil”, Capítulo I – “Da Obrigação de Indenizar”, artigos 927 a 954, aonde traz o detalhamento sobre autoria do dano e a indenização com sua determinação, extensão e casos de responsabilidade objetiva.

A Lei de Introdução ao Código Civil, decreto-lei 4.657/42, em especial os artigos 3º e 4º, atuam no sentido de interpretarmos a nossa legislação em geral, assim como nos casos das aqui comentadas e suas omissões, quando estabelecem que: “ Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece” e, respectivamente, “quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito”.


DANO MORAL
No dano moral por sua natureza imaterial, intangível, decorrente da própria essência do bem protegido, a dignidade humana, não comporta reparação in natura. Toma lugar, por determinação legal, a necessária valoração do dano sob forma de compensação, materializando-a na obrigação de indenizar sob a forma de dinheiro, por equivalência.

Esta sistemática, mundialmente utilizada e com suas origens na própria história da humanidade, traz na essência a busca de meio compensatório. Baseia-se no pagamento de indenização em moeda, tendente a compensar o constrangimento moral do agente passivo, seu sofrimento psicológico e suas possíveis repercussões no meio social.
Sobre o dano moral o professor Sérgio Cavalieri Filho (2003), nos ensina, in verbis:
Qualquer agressão à dignidade pessoal lesiona a honra, constitui dano moral e é por isso indenizável. Valores como a liberdade, a inteligência, o trabalho, a honestidade, aceitos pelo homem comum, formam a realidade axiológica a que todos estamos sujeitos. Ofensa a tais postulados exige compensação indenizatória.
JOSÉ DE AGUIAR DIAS (1987) assim define:
Consiste na penosa sensação da ofensa, na humilhação perante terceiros, na dor sofrida, enfim, nos efeitos puramente psíquicos e sensoriais experimentados pela vítima do dano, em conseqüência deste, seja provocada pela recordação do defeito, ou da lesão, quando não tenha deixado resíduo mais concreto, seja pela atitude de repugnância ou de reação a ridículo tomada pelas pessoas que o defrontam.

O dano moral poderá gerar conseqüências em duas áreas distintas do sujeito passivo. Nas situações em que causam danos reflexos ao exercício da atividade econômica do atingido e na sua esfera não econômica, como exemplos, nos âmbitos da sua intimidade e dos seus relacionamentos social e familiar.

Nestas bases, a moral é bem indisponível que compõe o patrimônio lato sensu, objeto unicamente de compensação indenizatória por equivalência. Alvo de indenização em dinheiro para o efetivo implemento do direito à reparação.

Busca-se para o ofendido dar-lhe conforto, bem estar, sob forma de bens materiais, pelo dano não material sofrido, além de penalizar o ofensor.

No nosso ordenamento Jurídico, tratado no capítulo anterior, é claro a preocupação com o dano moral e sua reparação indenizatória, vejamos:

No primeiro quarto do século passado a legislação sobre transporte ferroviário, decreto no. 2681, de 7 de Dezembro de 1912, no artigo 21º, já previa situações de dano moral tratando do bem estar do lesionado, da sua integridade física e psicológica.

Logo após, o Código Civil de 1916 (Lei no. 3071/16), revogado pelo atual, nos artigos 1538º a 1553º apresenta diversas disposições, com destaque especial ao artigo 1550, que trata do dano moral, que alcança a intangibilidade deste bem, determinando a possibilidade de ocorrência deste nos casos de “ofensa a liberdade pessoal”.


Com um espaço temporal de quase meio século, em 1962 vem Código Brasileiro de Telecomunicações (Lei no. 4117/62), que trata o dano moral, trazendo novidades como a tarifação do dano moral, no § 1º do artigo 84 e caput, sua quantificação para fins de indenização por estimação em decorrência da “posição social ou política do ofendido, a situação econômica do ofensor, a intensidade do ânimo de ofender, a gravidade e repercussão da ofensa”, e ainda, no artigo 85º o instituto da “retratação” como forma de atenuar a pena de reparação.


LEI Nº 4.737, DE 15 DE JULHO DE 1965 - Do curso do regime militar no ano de 1965, a Lei no. 4737 define o Código Eleitoral, prevê no artigo 243º e seus parágrafos o dano moral por calúnia, difamação e injúria, em decorrência de propaganda, com previsão de demanda judicial para reparação, a solidariedade do partido político e assegurando o direito de resposta do ofendido.
Ainda naquele período ditatorial da nossa história, a Lei de Imprensa de 1967 (Lei no. 5250), regula a liberdade de manifestação do pensamento e de informação, seguindo a linha do Código Eleitoral e estendendo a responsabilidade civil por dano moral às empresas jornalísticas. Traz novidades nos artigos 49º a 52º como da previsão de ação de regresso destas contra os jornalistas, ofensores e, ainda, a retração “espontânea e cabal” do ofensor como elemento para o juízo no arbitramento da indenização.
Em 14 de Dezembro de 1973 a Lei 5988 regulamenta os Direitos Autorais. Trata dos direitos morais do autor e do diretor de obras cinematográficas nos artigos 26º a 28º.


O Código Brasileiro de Aeronáutica seguindo a evolução mundial da matéria, Lei no. 7565/86 determina os direitos do passageiro do transporte aéreo e as respectivas indenizações, que são estabelecidas e tarifadas. No inciso II, artigo 256º, prevê inclusive dano decorrente do atraso no transporte.



A maior evolução ocorre com a Lei 8078/90, o Código de Defesa do Consumidor, matéria de ordem pública e de interesse social, nos termos dos artigos 5º, inciso XXXII, 170º, inciso V, da Constituição Federal e 48º de suas disposições transitórias. Tratando dos “Direitos Básicos dos Consumidores” estabelece no inciso VI, artigo 6º, a responsabilidade objetiva em indenizar do fornecedor, ampliando a proteção do sujeito passivo da ofensa para situações de dano coletivos e difusos.

Avança formidavelmente nos artigos 12º a 14º e 17º, “Responsabilidade pelo Fato do Produto e do Serviço”, tratando do dano causado independente da existência de culpa do fornecedor do produto e/ou serviços, das situações de solidariedade do comerciante, e equiparação de todas as vítimas do evento lesivo.

Inova o CDC no parágrafo único do artigo 42º, com a previsão da “Repetição do Indébito” por cobrança indevida, no caput com a proteção da sua intimidade por cobrança que pratique qualquer tipo de constrangimento e, ainda, no artigo 43º, com o acesso do consumidor aos Bancos de Dados e Cadastros, além do direito à sua imediata correção e anotações:

Em 05 de Outubro de 1988 com a promulgação da nossa Carta Magna, temos a “Dignidade Humana” tratada como “Princípio Fundamental” já no Título I, artigo 1º, inciso III. Colocando na tábua axiológica da Constituição Federal, nossa Lei Mater, a linha mestra do Patrimônio Moral.

O Código Civil, Lei no. 10.406 de 10 de Janeiro de 2002, seguindo a orientação constitucional, traz sobre dois títulos as determinações legais da tutela cível. Trata das “Perdas e Danos”, capítulo III, título IV, artigo 402º e, em seguida, no capítulo I, do título IX, artigos 927º a 954º, “Das Obrigações de Indenizar”. Estabelecendo no artigo 944º que “a indenização mede-se pela extensão do dano” e estabelecendo que nos casos de obrigação indeterminada, como no dano moral, “na ausência de lei ou contrato disposição”, as perdas e danos serão apurados na forma determinada pela lei processual.

Ampliam no parágrafo único do artigo 927º as situações de responsabilidade em indenizar independente de culpa, responsabilidade extracontratual, trazida pelo CDC, para os autores de atividades de risco implícito. Atribui responsabilidade de indenizar ao incapaz, artigo 928º, quando seus responsáveis não tiverem como fazê-lo ou não dispuserem de meios. Tipifica situações de responsabilidade objetiva, tais como: do dono ou detentor de animal, do dono de edifício ou construção, do tutor, do curador, do empregador por seus empregados, dos donos de hotéis, dentre outras.

Trata no parágrafo único do artigo 953º e no caput do dano moral decorrente de injúria, difamação ou calúnia e da fixação do valor das suas reparações por equidade.

A admissão da existência do dano moral é característica da evolução dos povos e seus reflexos são expressos nas suas legislações. É noção básica da existência dos direitos do indivíduo, elemento intrínseco, próprio, inseparável, parte integrante e inata do patrimônio extra-material, componente do patrimônio lato senso, como gênero.

Desde o Código de Hamurabi, descoberto em Suza, cidade da Pérsia, gravado em diorito negro, no capítulo XIII, artigo 241º, vemos a previsão de direitos extra-materiais: “Se um homem livre tomou um boi como garantia de uma dívida, pesará um terço de uma mina de prata como multa”.

As escrituras bíblicas, no livro de DEUTERONÔMIO, “Nas de diversos pecados cometidos para com mulheres”, existem vários casos de indenização por dano moral. Em especial no capítulo 22, versículos 18 e 19 que dispõem sobre a competência e a indenização a ser paga pelo homem que divulgou má fama sobre mulher que tomou para si, nos seguintes termos:


“Então os anciões da mesma cidade tomarão aquele homem, e o castigarão”.
“E condenarão em cem siclos de prata, e os darão ao pai da moça; porquanto divulgou má fama sobre uma virgem de Israel. E lhe será por mulher, em todos os seus dias não a poderá despedir”.

Na Odisséia de HOMERO, Grécia, trata-se de adultério e da sua reparação moral.

O Direito em Roma já previa a Actio Injuriarum Aestimatória que tratava de dano moral com indenização por estimativa, decorrente da conduta de em via pública contra donzela.

Nos países ex-socialistas, por suas recentes aquisições de direitos dos indivíduos, muitos ainda em sérias transições, não se admite o dano moral. Uma especial e histórica declaração retrata a situação evolutiva e o estágio destas nações no início da década de 80, a pouco mais de um quarto de século, vejamos o jurista soviético e adepto da Teoria Negativista, MCGREGOR (1981, p.46), in verbis:

“Nos países burgueses existe a denominada compensação por perdas mentais. Isto está diretamente conectado à preocupação burguesa em criar nas relações humanas uma relação de barganha econômica. Apenas a burguesia pensa que o sofrimento moral pode ser curado com dinheiro e, como mercadoria, pode ser trocado por dinheiro. Nos países socialistas, o homem é a coisa mais valiosa da sociedade. A vida e a saúde do homem não podem ser calculadas em termos monetários. No entanto, no caso da injúria pessoal, o ofensor é responsável pelo pagamento de uma compensação apenas quando esta injúria resulta em dano à propriedade”.


Na Comunidade Européia o dano moral é reconhecido na maioria dos países, demonstrando a paridade entre a evolução das nações e a admissão deste instituto. Vejamos algumas das diversas classificações que se aplicam à matéria no velho mundo.

Em Portugal o Código Civil estabelece nos artigos 483º e 496º que o dano moral deverá ser indenizado de acordo com a gravidade da ofensa. Os valores indenizatórios, via de regra, baseiam-se em decisões judiciais anteriores.

Na Bélgica, o dano moral é reconhecido desde o final do século XIX e esta disposto no artigo 1382º do Código Civil Belga.

A Espanha denomina-se “pecúnia doloris” e prevista no artigo 1902º do Código Civil, que determina a obrigação em indenizar decorrente de ação ou omissão do agente causador, por culpa ou negligência.

“Dommage moral” ou “dommage corporelle” são os termos utilizados na França. O Código Civil, artigos 1382º e 1386º tratam dos danos em geral. Em especial o 1382º que determina “qualquer fato humano, que cause a outro um dano, obriga a seu responsável a repará-lo”.

Os germânicos tratam o dano moral de “immaterial ler schadenersatz” ou “schmerzensgeld”. Regula-os o BGB – Bürgerliches Gesetzbuch no artigo 253º conjugado com o disposto no 847º que prevê indenização eqüitativa a qualquer pessoa que tenha sofrido taxativamente dano físico ou mental, privação de liberdade e mulher que tenha sofrido abuso sexual. Fora estas hipóteses e ressalvado as situações de responsabilidade objetiva prevista em outras disposições normativas, valerá o disposto no artigo 253º, que só prevê indenização em dinheiro aos prejuízos que dizem respeito aos “bens”.

A legislação itálica distingue o dano moral em dois tipos: o “danno non-patrimoniale” e “danno allá salute”. O Código Civil italiano prevê no artigo 2059º o ressarcimento em casos previstos em lei. A constituição Italiana no artigo 32, complementada pelo artigo 2043º do Código Civil, dispõe a obrigação de indenizar a qualquer um que cause dano injusto a outrem, seja decorrente de culpa ou dolo. O artigo 1226º desta mesma codificação determina indenização por equidade.

Há mais de um século o direito inglês, common law, reconhece o dano moral, classificando-os em danos pecuniários e não-pecuniários, sendo no velho continente a mais extensa e especializada legislação sobre o tema.

Na Holanda sob a denominação de “sartegeld” para as lesões corporais e “immateriele schadevergoeding”, previsto na codificação do direito civil de 1992, artigo 1407º.

Os Gregos tratam-no de “apozimozi” ou “psychiki odyni” e está regulamentado em artigos esparsos para situações preestabelecidas, tais como: difamação no artigo 59º, ato ilícito no 932º e até divórcio com requintes difamatórios no 1453º.

No mundo civilizado aonde vigora a democracia os direitos individuais, a liberdade e o bem estar estão assegurados, protegidos. São objetos de reparação quando atingidos, pela via das indenizações, visando-se a manutenção do sistema como um todo, protegendo-se suas unidades formadoras, indispensáveis à convivência e harmonização das suas populações.

Nos Estados Unidos da América do Norte as proposições de ações por danos, buscando indenizações, inclusive à moral, criaram uma verdadeira e notória indústria dentro do sistema judiciário.


REFERENCIAS.

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DIAS, José de Aguiar. Responsabilidade Civil em Debate. Rio de Janeiro: Forense, 1983.

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. Malheiros. São Paulo: 12ª ed., 1997.


MACHADO, Hugo de Brito. Regime Tributário das Indenizações. obra coletiva, Coordenador Hugo de Brito Machado, SP, Dialética, 2000.


MACHADO, Hugo de Brito. O Conceito Jurídico de Renda. 15º. Volume, São Paulo: Repertório IOB de Jurisprudência, 1988.
MACHADO, Hugo de Brito. Temas de Direito Tributário. RT, 1994.
MCGREGOR, Harvey. International Encyclopedia of Comparative Law, Martinus Nijhoff Publishers, Boston, Massachusetts (EUA): Volume 9, 1981.




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Autor: ARTHUR LEITE DA SILVEIRA FILHO


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