Fechar emissoras odiadas, uma idéia nada razoável



Vê-se muito desejo, por parte de gente irritada com as manipulações jornalísticas e culturais na TV, de que certas emissoras tenham o mesmo destino da RCTV da Venezuela: a não-renovação da concessão pública de TV aberta e o subseqüente fechamento delas. Entendo sim, muito bem, as razões que levam a esse desejo utópico. Mas convém jogar uma água gelada nessas pretensões com uma pergunta: será que vale mesmo a pena combater essa manipulação e alienação com o fechamento sumário das programações de qualidade questionável?

Pela democracia e liberdades de expressão, imprensa, consciência e crença, podemos notar que isso está longe de ser uma boa idéia. Para começo de conversa, isso é perfeitamente comparável à atitude de o Governo Federal querer fechar uma igreja por considerá-la um instrumento de manipulação intelectual, coação psicológica e extorsão sutil. Imagine se uma hipotética Igreja Evangélica da Majestade Celestial, com 1,5 milhão de seguidores no Brasil, fosse proibida pelo governo de cultuar, sob acusações de conduta criminosa como as três citadas mas não tão aparentes para a opinião pública. Em primeiro lugar, seria uma violação dupla à Constituição Federal, que permite a livre fundação de religiões por mais corruptas, interesseiras, perniciosas e fantasiosas que sejam e impede que o Estado intervenha em locais de culto. Em segundo - considerando que houvesse uma emenda constitucional aprovada que permitisse o fechamento de uma igreja - causaria uma comoção nacional como infelizmente nunca se vê em situações de crise social, uma vez que se estaria mexendo com a “alma” das pessoas, e subseqüentes insurreições populares contra um governo que não respeita a liberdade de crença e os princípios democráticos que permitem à pessoa acreditar no que quiser. E não há nada pior do que uma insurreição religiosa, que sempre vem carregada de ódio “divinamente exaltado” apesar da pregação de “amor ao próximo”, ainda mais envolvendo uma porcentagem significativa dos 20% protestantes e evangélicos do Brasil lá ativos “defendendo o reino de Cristo contra esse governo comandado por Satã”. A própria opinião internacional rechaçaria o Brasil como tendo um regime com quê totalitário. E o mais tenebroso de tudo: alto risco de golpe teocrático.

Pode ser que eu tenha exagerado, mas haveria algo ao menos parecido numa tentativa de fechar uma igreja grande. Se mexer com uma igreja é tão complicado, imagine tentar fechar uma emissora quase onipresente no Brasil como uma das atuais. Suponhamos a Globo, presente em 98% do Brasil. Sendo a emissora tão rechaçada por intelectuais em sua conduta sócio-cultural, a cassação de sua concessão não causaria princípio de guerra civil como o que eu supus no caso da igreja, mas despertaria uma comoção nacional e internacional ainda mais gigantesca. Por mais que se lamente, a Globo é parte da cultura brasileira, extremamente maior que rodeios e vaquejadas que podem ser extintos sem prejuízo cultural válido. Sem falar no desemprego de dezenas de milhares de profissionais que, ao contrário do que supostamente pretende a alta cúpula, não têm compromisso de manipular e alienar as pessoas. Qualquer governo que fizesse isso passaria a ter o apoio de parcos milhares de pessoas que desejavam esse fim da concessão e, em contrapartida, a fúria de mais de 100 milhões(!!!!!!) de brasileiros, e assim seu poder não sobreviveria muito. Acusações de agressão à liberdade de expressão e de imprensa e, de certa forma, à própria democracia pipocariam em todo o planeta.

Aliás, a Constituição, no Artigo 223, parágrafo 2º, afirma que 2/5 do Congresso teriam que apoiar o fim da Globo. De onde os esquerdistas radicais (que compõem a imensa maioria dos anti-Globo) tirariam 206 deputados e 33 senadores contrários à existência da emissora? Só no mundo da imaginação e utopia dessa turma. No máximo dos máximos, haveria uma moção recomendando que emissoras como a Vênus Platinada ajustassem sua conduta cultural e jornalística caso esta fosse repudiada.

De jeito nenhum é uma idéia aceitável a de que a TV pare à força de manipular e comandar o povo como Hugo Chávez fez com a RCTV. Caso nós queiramos que as emissoras nessas condições ajustem sua conduta, o jeito é, com uma devida maturação do intelecto do povo, comandar um boicote de advertência aos piores programas, para que percebam que o povo não é mais burro para aceitar qualquer lixo cultural. Só assim a TV ficaria mais adequada aos interesses do povo e ao bem comum. Se bem que, para essa maturação ser alcançada, temos um longo trabalho educativo para fazer.
Autor: Robson Fernando


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