SENADOR POMPEU, UM PIONEIRO NA EDUCAÇÃO CEARENSE



Vicente Martins

A primeira vez que soube de Tomaz Pompeu de Sousa Brasil, patrono da cadeira nº 26, agora, ocupada por mim, na Academia Sobralense de Estudos e Letras, foi através do escritor cearense Nertan Macedo.
Em 1982, ainda aluno do ensino médio do Colégio Militar de Fortaleza, na Avenida Santos Dumont, Aldeota, onde fiz toda minha educação básica (ensino fundamental e ensino médio), recebi uma Revista Academia Cearense de Letras, oferta do meu professor de língua portuguesa e literatura acadêmico Pedro Paulo Montengro, hoje, ainda um grande amigo. No apêndice da revista, havia os endereços, para correspondência com os imortais.
Foi assim que entrei em contato com escritores como Eduardo Campos e Nertan Macedo. Do escritor e dramaturgo Eduardo Campos, no encontro pessoal com o mesmo na Secretaria de Cultura, no governo de Gonzaga Mota, solicitei livros e um emprego.
Presenteou-me com livros de sua autoria e, quanto ao emprego, disse-me, assim, resumidamente: rapaz, peça emprego a político não, faça todos os concursos que aparecerem, não é tempo de depor as luvas. Senti-me envergonhado e nunca mais bati a porta de político, grande ou pequeno, para pedir emprego. E até hoje não consegui uma emprego sem que não fosse pelo caminho do concurso público ou da seleção pública, sempre exigindo, de mim, dedicação aos estudos na área de minha atuação profissional, a de Letras.
De Nertan Macedo, recebi, autografado, pelos correios, o livro o Clã de Santa Quitéria , prefaciado por Marcelo Pinto.
O livro trata de uma quinta família, os Pinto de Mesquita, das ribeiras do Acaracu, hoje, por força da eufonia, denominado Acaraú. O Capítulo VI, da referida obra, sob o título “O senador Tomás Pompeu, um pioneiro”, é dedicado ao herdeiro dos Pinto de Mesquita, considerado por Nertan Macedo, um pioneiro no campo de atuação política, clerical, jornalística, cultural e educacional. Durante quase uma década, mantive regular correspondência ou, por algum tempo, apenas postais por ocasião do final de ano (Natal e Boas Festas) com o escritor Nertan Macedo.
Pude apurar em minha hemoroteca particular, que Logo depois de ter servido como assessor de imprensa do primeiro governo de Virgílio Távora, Nertan Macedo foi ser assessor de imprensa da presidência da Confenderação Nacional da Indústria, na administração do engenheiro Thomás Pompeu de Sousa Brasil Neto. Herdaram seu nome completo: o filho, um sobrinho e um neto.
No dia 12 de setembro de 2008, quando tomei posse na cadeira nº 26 da Academia Sobralense de Letras, no meu breve discurso sobre meu patrono Thomás Pompeu de Sousa Brasil, jurisconsulto, sábio, escritor, estadista, levita, industrioso, paciente, inteligente, tenaz,severo, sóbrio, orador fluente e consumado, conselheiro,austero,nobre,simpático,ilustrado,assíduo, abnegado, desinteressado, homem de olhar arguto, enfim, um senador contumaz e convincente, qualificações que pude extrair dos estudos sobre Pompeu, ao longo dos dias de preparação do meu discurso de posse, e, por isso, por favor, permitam-me limitar minha fala à sua atuação como professor, educador, diretor do Liceu do Ceará e inspetor de instrução na província cearense, e, mesmo assim, senhoras e senhores e estudantes, não darei conta, tamanha e extraordinária é a extensão e dimensão da atuação cultural de Tomás Pompeu.
Do padre e do político, isto é, do senador padre imperial , apenas pinçarei, agora, alguns casos ou traços pitorescos, anedóticos e interessantes de Tomas Pompeu, descritos, segundo Hugo Catunda, secundado por Nertan Macedo, provavelmente por seu filho, Tomás Pompeu de Sousa Brasil, membro da Academia Cearense de Letras, que nos permite hoje, passados tantos, avaliar melhor seu esboço biográfico, publicado no jornal “ A República”, em 3 de setembro de 1909, “alguns subsídios sobre a vida e a atuação do Senador Pompeu” (MACEDO: 1980, p.51):
• O senador padre Thomaz Pompeu de Sousa Brasil.Nasceu na cidade de Santa Quitéria, em 6 de junho de 1818. Em junho passado, comemoraram-se, portanto, 190 anos de aniversário de nascimento de Tomás Pompeu.
• O sobrenome Brasil dado, no início do século XIX, pelo pai, um liberal “patriota” , segundo Abelardo Montenegro, era o costume de usar nomes nacionais a fim de apor ou substituir os nomes menos nativos. As famílias passaram a usar nome nacionalista que expressava algo pecular à terra brasileira.
• Filho de Tomás d’Aquino Sousa e dona Geracina Isabel de Sousa.Observamos que o senador Pompeu herdou seu nome Tomás do pai(no caso deste, seguido de Aquino e Sousa), que era primo do Padre Mororó, figura central e mártir da Revolução de 1824. O pai do senador Pompeu compactuava com a Revolução de 1824, assinando, inclusive, a ata do Conselho de Revolução de 1824, e, por sua opção ideológica, sofreu perguições que o levaram à penúria de sofrimentos e haveres. A esse respeito,há interessante artigo de Maria do Carmo R. Araújo, professora do Curso de História da UFC .
• O senador Pompeu fez seu curso primário em Santa Quitéria, tendo por mestre seu próprio pai, Capitão Tomás Aquino de Sousa, “homem suficientemente instruído, pois abandonora o Seminário de Olinda quando já cursava o primeiro ano de Teologia”.
• O pai Tomás d’Aquino Sousa o destinou para a carreira do Sacerdódico, tendo matriculado Tomás Pompeu, , na Aula Régia de Latim de Sobral, regida pelo seu materno, advogado Gregório Francisco Torres de Vasconcelos. No capítulo “Os passos da educação”, em seu prestimoso livro Origem da Cultura Sobralense, padre Francisco Sadoc de Araújo (2005) fala da caráter do professor Gregório,nascido em 17 de novembro de 1785, na Fazenda Flores, sertão de Santa Quitéria, filho primogênito do matrimônio de Gregório José Torres e Vasconcelos e de Isabel Pinto de Mesquita . Gregório era titular de aula de Gramática Latina da vila sobralense, oficialmente em 26 de junho de 1825 (p.133). Sadoc refere-se ao professor Gregório Francisco como um “homem íntegro e de muito caráter” corajoso e reagia, como autêntico liberal, os atos de prepotência do presidente da Província José Martiniano de Alencar. Relata-nos o cônego Sadoc que entre os “alunos adiantados” de Gregório Francisco, destacava-se seu sobrinho, o jovem Tomás Pompeu de Sousa Brasil que chegara a Sobral a 23 de fevereiro de 1834, com 16 anos de idade, tendo estudado durante mais de dois anos com seu tio professor” (ARAÚJO: 2005, p.137). E conclui Sadoc: “Tomás Pompeu viajou depois para Olinda onde se fez sacerdote e advogado. Retornando ao Ceará, militou na política tornando-se, nacionalmente, famooso no tempo em que exercia mandato no Senado do Impérito. Senado Pompeu, quando estudava em Sobral, a 20 de julho de 1836, solicitou da Câmara atestado de pobreza e de boa conduta, no que foi atendido. Seu tio, o admirável professor Gregório Francisco, a quem Sobral muito deve, faleceu a 13 de abril de 1868 e foi sepultado na Matriz sobralense deixando viúva sua mulher Antônia Gregorina que, por sua vez, expirou a 12 de janeiro de 1887, com 92 anos de idade”. (ARAÚJO: 2005, p.137-138, grifos nossos)
• Ainda em 1835, matriculou-se o Senador Pompeu no Seminário Diocesano. Em 1836, foi aprovada para Academia Jurídica, em Olinda, Pernambuco.Em 1837, em duas épocas, foi aprovado em Filosofia, Aritmética, Álegebra, Geometria, Francês, inglês. Em 1838, aprovado em em Gografia, História, Retórica e História Sagrada.Em 1839, era submetido, no Seminário Diocesano, a ato de Teologia Dogmática. Em 1840, o futuro sacerdote foi provido, em 21 de novembro, na Cadeira de Teologia do Seminário.Em 1840, o seminarista Pompeu de Sousa Brasil recebia as ordens de diácono, sendo aprovado em exame Sinodal pelo bispo de Olinda, Dom João da Purificação Marques Perdigão, ordenando-se Sacerdote no dia de setembro de 1841, aos 23 anos, no Palácio da Solidade(Sede do Bispado.Em 2 de março de 1843, portanto, aos 25 anos, recebeu o grau de bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais.
• O padre Tomás Pompeu de Sousa Brasil é o personagem Padre Brasil, do romance Dona Guidinha do Poço, de Manoel de Oliveira Paiva. Há uma passagem no romance em que faz referência ao senador: Quim, o Major Joaquim Damião, ao ler um bilhete, assinado por um “amigo da paz” (na verdade, era Guida), resolveu ir para Capital: “ Aí chegando, porém, em vez de consultar ao facultativo, foi pedir garantias para a sua vida ao Chefe da Polícia, e aconselhar-se com o Padre Brasil a respeito do desquite” (PAIVA: 1999, p.162)
• Leitor de Camões, em seu livro Compêndio de Geografia, adotado no País, traz como epígrafe: “Eu desta glória só fico contente/Que a minha terra amei e a minha gente”. Os versos, na íntegra, são assim: “Aos bons ingenhos. A vós só canto, espritos bem nascidos,/A vós, e às Musas ofereço a lira,/Ao Amor meus ais, e meus gemidos,/Compostos do seu fogo, e da sua ira,/Em vossos pleitos são, limpos ouvidos,/Caiam meus versos, quais me Febo inspira./Eu desta glória só fico contente,/Que a minha terra amei, e a minha gente”.
• O Senador Pompeu tinha especial predileção pelo estudo da Geografia e escreveu um livro “ensaio Estístisco da Província do Ceará” (em 1859). Escreveu muitos trabalhos e livros, dos quais, citaria alguns: “Princípios Elementares de Geografia” (para uso do Liceu do Ceará, em 1850); “Compêndio de Geografia (1856); “Memória estatística da Província do Ceará, em dois volumes (1859) e “Compêndio de Geografia Geral e Especial do Brasil”, a maioria, oficialmente, adotada no Colégio Pedro II, nos Liceus e Seminários do Brasil.
Pioneirismo cultural de Pompeu
• Instituiu, em 1845, aos 27 anos, o ensino secundário no Ceará, com a fundação do velho Liceu do Ceará, atendendo convite do presidente do Ceará, coronel Inácio Correia de Vasconcelos. Segundo Tomás Pompeu, o filho-biógrafo, “as cerimônias do magistério tinham para o seu espírito mais atrativos do que as cerimônias eclesiásticas” (MACEDO: 1980, P.54). O Liceu instituiu um ensino centralizado e de qualidade, permitindo ao seu responsável o controle da formação dos provincianos. Comentando sobre o valor do Liceu no século XIX, para o Ceará, o cônego Sadoc Araújo diz: “ Criado pela Lei 304, de 15 de julho de 1844, o Liceu do Ceará veio trazer novos rumos ao ensino de toda a Província, tornand0-se modelo para as demais escolas cearenses” (ARAÚJO: 2005, p.146). E acrescenta: “ O artigo 8º da Lei 501, de 14 de dezembro de 1849, detertiminava que não mais poderia ser criada qualquer escola na Província sem prévia licença do Presidente, ouvido o Diretor do Liceu. Este dispositivo se por um lado restringir a iniciativa particular, por outro lado, concorria para o aprimoramento do ensino, já que as permissões só eram das a professores devidamente examinados e aprovados nas matérias que pretendiam lecionar” (Ibidem).
• Em 1845, foi inspetor-geral da Instrução, fazendo longa excursão pelo interior, visitando as escolas primárias, disseminadas nas diversas localidades da Província.
• Há mais de 160 anos, Tomás Pompeu defendia a reforma da escolar popular, isto é, do sistema escolar dominante: criticava a escola de instrução, transmitindo apenas noções imperfeitas de cálculo, leitura e escrita, como ocorria (e ocorre) com as escolas primárias daquele tempo, longe, como diz Nertam Macedo (p.63), “ do ideal da verdadeira escola popular”. A grade curricular estabelecida, oficialmente, em 1844, definia as seguintes disciplinas: Filosofia Racional e Moral; Retórica e Poética; Aritmética; Álgebra; Geometria; Trigonometria; Geografia e História; Latim; Francês e Inglês. Apesar da quebra de uma formação exclusivamente literária da aulas clássicas de Latim, quando tomou o encargo de diretor de Instrução Pública, achou tal configuração curricular demasiadamente abstrata para nossa realidade e dizia, em relatório enviado ao Presidente da Província: “Cada povo deve aprender principalmente aquilo de que mais precisa para aumentar os cômodos da vida” . (GIRÃO: 1977, p.12). Na proposição curricular de Pompeu, a nova configuração curricular era mais ou menos esta: Curso Religioso “ Católico”; Artes Liberais (Desenho e Música); Ciências Naturais: Física; Mecânica; Botânica, Agricultura; Geometria e Agrimensura. Na proposta de Pompeu, quebrava-se a formação exclusivamente voltada para as belas letras.
• Com a ascensão dos conservadores à estrutura de poder, Pompeu foi exonerado da direção do Liceu, porque era do partido liberal. Com a subida dos liberais, voltou à direção do Liceu, e apresentou um relatório ao presidente da Província, no qual insiste em suas idéias reformistas
• As idéias de Pompeu divulgadas há 160 anos, tem agora plena e oportuna atualidade: dizia ela, não há mais lugar para a escola tradicionalista, de métodos puramente memoralistas, e sim, de uma escola que eduque para o trabalho e para a vida
• A escola ideal para Tomás Pompeu deveria, além de instruir, preparar o educando para as “aptidões para o exercício de uma profissão útil no meio em que vivia” (MACEDO: 1980, p.63)
• Defendia a preparação profissional do mestre, o qual, a par de novos conhecimentos, deveria promover uma “escola de trabalho, de atividades pré-vocacionais, que transformasse o educando num homem do futuro – adestrado para viver e vencer no meio”.
• Foi nomeado e diretor e lente da cadeira de Geografia e História no Liceu do Ceará, com que o distinguiu o governo da Província.
• Aperfeiçoou-se nesse período em que foi diretor do Liceu do Ceará e inspetor de instrução aos estudos da língua portuguesa e das línguas estrangeiras (Francês, Inglês) e clássica (Latim).
• Habituado à leitura diária de Horácio, Virgílio, Tácito, Lucrécio, Juvenal, Ovídio, Camões, Milton, Bussuet, Lamartine, Vieira e outros clássicos
• Leitor familiar de Cícero, Demóstenes, Fenelon e Vergniaud, mestres da eloqüência e dos modelos portentosos da dicção oratória.
• Gostava da leitura silenciosa e devotado à paz do seu gabinete de trabalho.
• Era um apaixonado pelos problemas da educação na sua Província.
Pioneirismo político de Pompeu
• Em 1845, foi eleito primeiro suplente de deputado geral, tendo tomado assento na Câmara Temporária, com o falecimento do deputado nato padre Costa Barros.
• No dia 9 de janeiro de 1864, aos 46 anos, foi nomeado por Pedro II senador imperial através de Carta Imperial
• Era Pompeu um admirador do sábio Agassiz
• Fundou em 16 de outubro de 1846, com o apoio do seu amigo sobralense Francisco de Paulo Pessoa, o jornal “ O Cearense”, órgão do Partido liberal. Do sobralense, o Senador Pompeu recebeu 100 contos de réis para comprar as máquinas necessárias à instalação e impressão do jornal .
• Foi amigo íntimo de Francisco Otaviano de Almeida Rosa, senador, jornalista, poeta e dos mais destacados chefes do Partido Liberal na Monarquia.
• Em 1877, quando o Ceará sofreu na carne com a grande seca, contando com retardo e limitações de auxílios e recursos para os flagelados, patrocinados pelo Partido Conservador, presidido pelo Barão de Cotegipe, Pompeu revoltou-se, escrevendo, em O Cearense, “libertem-se de um jugo ditatorial que nos mata...esqueçam-se do centro...proclamen s sua liberdade e autonomia”
• Era o Senador Pompeu legítimo político de José Martiniano de Alencar e do coronel Pessoa Anta, irmão do primeiro senador Paulo Pessoa. Segundo o jornalista Lustosa da Costa, o senador Paula Pessoa foi um dos responsáveis pela eleição de Pompeu à Câmara Alta do Império: “ Com ele – senador Pessoal -, a zona norte passa a exportar senador. Em 1846, ajuda a eleger Thomaz Pompeu, seu primo, nascido em Santa Quitéria, freguesia de Sobral, cuja carreira política financia” (COSTA: 2004, P.89) .
• O senador Nogueira Acioly era seu genro.
• O Senador Tomás Pompeu de Sousa Brasil, que sofria de miopia, morreu no dia de 2 setembro de 1877, aos 59 anos, em Fortaleza, vítima de ataque cardíaco.
Vicente Martins é professor da Universidade Estadual Vale do Acaraú(UVA), em Sobral. Ocupa a cadeira nº 26 da Academia Sobralense de Estudos e Letras cujo patrono é Senador Padre Thomaz Pompeu. E-mail: [email protected]
Autor: Vicente Martins


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