Tributação sobre Templos de Qualquer Culto – Imunidades conferidas pela Constituição Federal de 1998.



1. A Carta Magna, em seu artigo 150, estabeleceu as limitações ao poder de tributar, conferindo garantias aos contribuintes, bem como, estabelecendo as chamadas “IMUNIDADES” que estão descritas em seu inciso VI. A palavra Imunidade tem origem no latim immunitas, que quer dizer “qualidade de não ser sujeito a algum encargo ou ônus”.

2. No que tange a imunidade tributária, necessário se faz entender a sua abrangência, visto haver grande dissenso na doutrina e, para tanto, iremos nos apegar ao conceito mais utilizado.

3. Podemos assim, definir imunidade como a característica conferida pelo legislador constituinte, no qual impede, por determinação constitucional, a formação da obrigação tributária, ou seja, a realização do fato gerador. Assim, as pessoas elencadas pela Constituição Federal como imunes, estão desobrigadas ao pagamento de impostos, não podendo, portanto, serem sujeito passivo de obrigação tributária.

4. Assim visto, cabe entender o qual seria o conceito de imposto, sendo que a definição é fornecida pelo CTN, em seu artigo 16, “in verbis”: -
“Art. 16. Imposto é o tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte” (g.n.).
5. A doutrina nos diz que o imposto não é dotado de referibilidade, ou seja, não está vinculado a uma finalidade (contribuições) ou a prestação de um serviço ou poder de polícia (taxas). A sua finalidade é meramente arrecadatória, ou seja, visa prover os cofres estatais de fundos para a movimentação de todo o aparato do Estado.

6. No caso sub examine, dos templos religiosos, acreditamos que a imunidade séria cabível somente nos impostos incidentes sobre o patrimônio (IPTU, ITR, ITBI e ITCMD), a renda (IR, IOF e ICMS) e serviços (ISS).

7. A norma constitucional que embase a imunidade vem descrita no artigo 150, inciso VI, alínea b, e por via reflexa, quando a atividade religiosa estiver ligada a realização de atividade educacional ou de assistência social, sem fins lucrativos, a alínea c, in verbis :¬-
“Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
VI - instituir impostos sobre:
b) templos de qualquer culto;
c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei;
§ 4º - As vedações expressas no inciso VI, alíneas "b" e "c", compreendem somente o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas.”(g.n.)
8. Tal situação já vinha descrita no Código Tributário Nacional (CTN), em seu artigo 9º, IV, alínea b, in verbis:-
“Art. 9º - É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
IV - cobrar imposto sobre:
b) templos de qualquer culto;
c) o patrimônio, a renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, observados os requisitos fixados na Seção II deste Capítulo (com redação dada pela LC 104/2001)”(g.n.)
9. É interessante notar que a vedação é dada somente sobre os impostos, não incluindo assim cobrança de taxas e contribuições. Desta maneira os templos de qualquer culto, bem como as instituições estão obrigados a pagar as taxas (iluminação, água, bombeiros) bem como as contribuições, sejam elas de qualquer natureza (sociais, melhorias).
10. Salientamos ainda, que tais instituições responsáveis pelos templos estão obrigadas a prestar obrigações acessórias, como por exemplo a escrituração de livros contábeis, retenção de imposto de renda, na fonte quando realizar pagamentos, emitir notas dentre outros.

11. Delimitada assim a definição e a abrangência do termo “impostos”, passaremos agora a analisar a amplitude conferida pela Constituição Federal, do que abrangeria o termo “templos de qualquer culto”.

12. A Constituição Federal ao conceder a imunidade aos templos de qualquer culto, o bem fez limitando tal concessão, inclusive para estabelecer a igualdade fiscal pretendida.

13. Assim, a imunidade conferida não se aplica a todos ou quaisquer bens ou atividades exercidas pelo ente imune, mas tão somente sobre aquele que atende a finalidade do templo e do culto religioso.

14. Desta maneira, podemos afirmar que a imunidade é aplicável sobre o imóvel onde se realiza o culto, mas não sobre outros imóveis recebidos em doação (como casas, terrenos) que não estão dirigidos a finalidade religiosa.

15. Contudo, acreditamos que imunidade conferida ao imóvel onde se realiza o culto, aplica-se também as suas dependências, como por exemplo os salões utilizados para realizar palavras, escolas dominicais, salões paroquiais.

16. Sobre o tema, já lecionou o saudoso mestre Aliomar Baleeiro :-
“O templo não deve ser apenas a igreja, sinagoga ou edifício principal, onde se celebra a cerimônia pública, mas também a dependência acaso contígua, o convento, os anexos por força de compreensão, inclusive a casa ou residência especial, do pároco ou pastor, pertencente à comunidade religiosa, desde que não empregados em fins econômicos”
17. Vale colacionar ementa trazida de v. acórdão decidido pelo Extinto 1o. Tribunal de Alçada Cível de São Paulo:
“Imposto – Predial e Territorial Urbano – Templo Religioso – Lançamento sobre casas, salões, paroquiais e centros sociais – Considerações como pertenças do templo, relacionados com a atividade do culto – Artigo 150, par. 4o. da Constituição Federal de 1988 – Imunidade – Recurso parcialmente provido para anularem-se os lançamentos – Voto vencido” (Proc. 473.733-2/00 – Rel. Maurício Vidigal – J. 16/10/1991)
“IMPOSTO - PREDIAL E TERRITORIAL URBANO - MUNICIPIO DE SOROCABA - IMOVEIS QUE ABRIGAM TEMPLOS RELIGIOSOS - IMUNIDADE - CONSTITUICAO FEDERAL, ARTIGO 150, VI, "B" - DESNECESSIDADE DE EXAURIMENTO DA VIA ADMINISTRATIVA PARA A IMPETRACAO DO MANDADO DE SEGURANCA - INTERESSE DE AGIR CONFIGURADO - SEGURANCA CONCEDIDA - RECURSO IMPROVIDO.” (Ap. Cível – 621795)
18. Com relação ao ICMS, este não deve incidir sobre a venda de objetos dentro do recinto da templo, como bíblias, catecismos, emblemas, santos de barros entre outros, por serem atividades diretamente ligadas ao templo ou culto, entendemos incluídas dentro da imunidade conferida.

19. De maneira exemplar, já decidiu o E. Tribunal de Justiça de São Paulo, em voto magnífico, na Apelação Cível 137.511.5/5, tendo como relator o Dês. Emmanoel França, caso envolvendo uma instituição social que realiza a venda de doações recebidas, com a finalidade de sustentar a entidade, sendo contudo autuada pelo fisco para pagamento de ICMS, estando assim ementado:-
“APELAÇÃOCÍVEL -MANDADO DE SEGURANÇA- ICMS -INSTITUIÇÃO DE ASSISTÊNCIASOCIAL- IMUNIDADE TRIBUTARIA- INTELIGÊNCIA DO ART 150, VI, C, DACONSTITUIÇÃO FEDERAL - RECURSO VOLUNTÁRIOPROVIDO SENDO IMPROVIDO O RECURSO ADESIVO”
Nas razões de voto, assim bem ilustrou o Nobre Desembargador, fazendo uma análise do artigo 9º e 14º, § 1º do RICMS de São Paulo:-
“Não configura tal atividade, "data venia", fato gerador de ICMS, pois não contém os requisitos que a lei exige, ou seja, comercialização com intuito de lucro, sucessivos contratos mercantis e não é o Lar Escola São Francisco, comerciante, industrial ou produtor. “
20. Também não incide Imposto de Renda sobre a renda e proventos obtidos pelo templo, tendo em vista que a sua finalidade é justamente a manutenção do templo e do culto, devendo, contudo, como já dito alhures, manter a escrituração fiscal, ou seja, os livros e demais registros exigidos pelo ente tributante, como já decidiu o E.TJ/SP, recentemente:



“IPTU - Instituição religiosa - Pretensão de ver reconhecido seu direito à imunidade, independentemente de requerimento anual ao Município, por ser entidade religiosa conhecida na cidade de São Paulo - sentença de primeiro grau que julgou extinta a demanda por falta de interesse de agir. A dinâmica das situações fáticas da vida impõe a verificação pelo Fisco Municipal, do preenchimento das formalidades legais durante a periodicidade do tributo - Inteligência do art. 150, VI, alínea "c" da Constituição Federal - Norma constitucional de eficácia limitada, complementada pelo artigo 14 do C.T.N. Recurso desprovido. (Rel. Wilson Julio Zanluqui- 14ª Câmara de Direito Público – DJ 14.03.2008 – Apelação sem revisão 702.052.5)
21. Quanto a não incidência de outros impostos, como doações inter vivos ou causa mortis, faz-se necessário uma análise do caso concreto, tendo em vista que a concessão de tal imunidade é objeto de interpretação restrita, devendo sempre ser demonstrada a finalidade pretendida pelo ente imune, para aí então, interpretar-se dentro do disposto naquelas categorias do artigo 146, VI da Constituição Federal, para o qual colocamo-nos a disposição para eventuais dúvidas e esclarecimentos.

22. Podemos assim concluir que a imunidade conferida aos templos de qualquer culto, e por via reflexa, aquela conferida quando a instituição prestar serviços educacionais ou de assistência social, deve ser interpretada de forma restrita, pois visa desonerar os valores destinados a manutenção e subsistência daqueles que prestam serviços de conforto espiritual à sociedade, não desobrigando as instituições de apresentarem as obrigações acessórias exigidas pela lei tributária, sob pena de verem retirado o manto da imunidade outrora outorgada.
Autor: Rafael Franceschini Leite


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