Minha Empresa é Familiar: O Que Devo Fazer?



O que fazer para melhorar as chances de sucesso de uma empresa familiar? Deveria ser possível melhorar essas chances no mínimo até iguala-las às da empresa profissionalizada. Eu diria até, em teoria, que seria possível melhorar até tomar as chances da empresa familiar melhores do que as da empresa profissionalizada – isso porque se conseguirmos dar à gestão familiar eficiência igual à da profissional teremos, na empresa onde esses eficientes executivos são também donos, um empenho e interesse maior, além da maior agilidade na tomada de decisão.

Enquanto os profissionais algumas vezes estarão pensando na possibilidade de trocar de emprego, ou estarão se empenhando no resultado de curto prazo em detrimento do longo (é típico das empresas americanas que se preocupam mais com o trimestre, e com a cotação das ações na bolsa, do que com o longo prazo), os executivos que também são donos darão sempre prioridade ao longo prazo, que é o que interessa quando o que está em jogo é o seu patrimônio. Esta teoria poderia explicar o sucesso continuado durante muitas e muitas gerações, até durante séculos, de dinastias familiares como Michelin, Dreyfus, Rothschild e outras.

Comunicação e entendimento

Uma premissa básica: se alguém está com vontade de levar vantagem, de passar para trás seus irmãos ou primos, nada vai dar certo. Melhor contratar logo um bom advogado e tentar negociar uma separação amigável. Estamos falando aqui sobre tentar fazer dar certo, com boa fé e boa vontade, uma associação.

Uma regra é fundamental: diálogo. Há que se comunicar. A comunicação tem de ser aberta, franca e transparente. Os acionistas têm de estar bem informados e, além disso, têm de se sentir bem informados.

Especialmente os acionistas que não têm cargo na empresa precisam ter a certeza de que estão de posse de todas as informações relevantes para saber como anda seu patrimônio. Uma das coisas que traz problemas na empresa familiar é o acionista que sente que não estão lhe contando tudo o que acontece. Ele pode tornar se um acionista hostil.

Recomenda se esquematizar muito bem o sistema de comunicação familiar, que provavelmente funcionará em vários níveis. Uma sugestão e a criação do Conselho de Família, que incluirá todos os membros da geração que esteja no poder. Quando um membro dessa geração já tiver morrido será representado por um de seus filhos, escolhido por seus irmãos. Foi muito comum, no passado, não admitir mulher nesse Conselho. Isso ainda existe, mas e ridículo, e quanto antes forem abolidos melhor. Esse Conselho, freqüentemente muito numeroso, não existe para gerir a empresa ou empresas do grupo.

Existe para se informar e para tomar grandes decisões como compra ou venda de empresas, ou a escolha do sucessor. O Conselho de Família também escolherá os representantes da família no Conselho de Administração de cada empresa do grupo e este Conselho é que cuidará da gestão da empresa

Essa separação entre família e gestão é fundamental. O Conselho de Família é família, enquanto o Conselho de Administração é trabalho, é gestão. Deveriam fazer parte dele somente os membros da família que entendam do negócio, além de se possível, membros externos, que como veremos no capítulo sobre o Conselho, têm muito a acrescentar Quando se misturam as relações afetivas de família com a gestão da empresa isso leva a decisões erradas.

É comum um herdeiro de empresa, principalmente se não entende do negócio, tomar uma atitude do tipo “Na empresa que papai criou ninguém mexe”. Essa atitude, se prevalecer, acaba com qualquer empresa. Daí a necessidade da separação. Esse filho ou filha pode discutir no Conselho de Família, mas não deve se meter na tomada de decisões da empresa.

A um tempo atrás, a imprensa noticiou que a grande multinacional Nabisco, do ramo alimentício, comprou uma empresa familiar brasileira. Quem vendeu foram os filhos do fundador, já falecido. Eles exigiram uma cláusula estipulando que a Nabisco não tiraria do mercado a marca original da empresa, “a marca que papai criou”. Este é mais um exemplo do tipo de atitude que pode destruir uma empresa. Não dá para tocar para frente um negócio com decisões tomadas com base em fatores sentimentais.

O próprio fundador se estivesse vivo, provavelmente concordaria com a retirada do mercado de um produto ou marca que tivesse se tomado obsoleto, mas o filho ou filha do fundador, nada conhecendo do negócio, impõe por razões sentimentais uma cisão ilógica que pode causar sérios prejuízos.

Supondo que já exista uma nova geração que ainda não está no poder, mas que já trabalha e se interessa pelos negócios da família, é conveniente a criação de um Conselho Jovem, onde estarão todos os membros do que será a próxima geração do Conselho de Família. O Conselho Jovem, embora não tome decisões, se reunirá trimestralmente recebendo as mesmas informações que o Conselho de Família.

O acordo de acionistas é uma peça formal que uma vez assinado tem força de lei. E se a companhia for de capital aberto o acordo tem de ser registrado na Comissão de Valores Mobiliários, a CVM, e passa a ser de conhecimento público.

Um acordo de acionistas bem feito tenta prever tudo ou quase tudo que possa acontecer para afetar o relacionamento entre os acionistas, e preestabelece regras para resolver cada problema que surja. Os pontos básicos de um acordo devem ser negociados pelos acionistas entre si, possivelmente com a assessoria de um especialista, mas a redação final precisa ser dada a um advogado de primeiríssima linha, caso contrário, o risco de ter falhas ou omissões é grande.

Uma coisa comum nesses acordos é a questão do direito de preferência no caso de um acionista querer vender suas ações. Geralmente o acordo dirá que o interessado em vender, antes de oferecer as ações a estranhos, tem de oferecê las primeiro aos outros acionistas dando lhes um prazo razoável, por exemplo, trinta dias, para decidirem.

Outro item comum é a questão do preenchimento dos cargos de diretoria – o acordo pode rezar que cada grupo acionário tem o direito de indicar este ou aquele diretor ou pode, ao contrário, dizer que a diretoria será preenchida por profissionais recrutados no mercado de trabalho e que não tenham vinculação com nenhum dos acionistas. Ainda podem ser previstas maneiras de dar liquidez a acionistas que queiram sair, regras para determinar preço e condições de compra de ações no caso de divergências entre sócios, e muitas outras coisas.

No caso específico da empresa familiar sugiro a existência de um acordo de família que não é necessariamente igual a um acordo de acionistas como o previsto em lei. O acordo de família, que será mantido em sigilo, explicitará além do tipo de coisas citadas acima o funcionamento dos conselhos de família e de administração das empresas do grupo mais os assuntos que vêm a seguir: regras para a sucessão e para o ingresso de jovens da família na empresa.

Preparação para a sucessão

Após completar sua formação universitária estes jovens não deveriam ser admitidos imediatamente no negócio da família. Deveriam, isto sim, ir à luta, conseguir emprego no mercado de trabalho, e fazer um pouco de carreira por conta própria. O jovem que fizer isso e tiver sucesso, chegando, digamos, a um cargo de gerente numa empresa não da família, por méritos próprios, terá muito mais moral para vir para a empresa familiar. Já terá mostrado que é bom, será mais respeitado pelos profissionais da organização, terá mais confiança em si mesmo e, talvez o mais importante de tudo, terá o respeito de seus parentes. Além disso, essa estada em outra empresa fará com que ele conheça outra cultura empresarial, evitando que absorva os eventuais vícios que qualquer organização tem.

Na tentativa de formar um líder é preciso ter em mente as qualidades necessárias para exercer esse difícil papel. A pesquisadora americana Alicia Turner Foster, em artigo publicado na Family Business Review, identifica quatro características básicas no líder de uma empresa:

• Conhecimento do setor. É preciso ter uma visão clara do mercado, da concorrência, dos aspectos legais ligados ao setor. É bom conhecer a evolução passada a fim de poder prever tendências e mudanças.

• Conhecimento básico do produto e de negócios. O futuro líder deverá conhecer a fundo os produtos, as técnicas de fabricação, o suprimento das matérias primas cruciais, e ao mesmo tempo entender o mercado, os seus acio¬nistas e suas necessidades. Em suma, além da visão global do setor citada no item anterior ele precisa conhecer a fundo a empresa por dentro.

• Capacidade de liderança. O líder precisa saber moti¬var, inspirar, formar alianças à sua volta. Esse talento pode ser desenvolvido a partir das experiências vividas.

• Autoconhecimento. Conhecer se e compreender se é essencial Para um líder. Ele precisa saber quais são suas forças e fraquezas, onde pode agir sozinho, onde deve pro¬curar apoio.

A essas quatro eu acrescentaria mais uma: a vontade de exercer o papel. Infelizmente ainda acontece muito de o filho ir trabalhar com o pai simplesmente porque é isso que se espera dele. Esse jovem possivelmente irá sacrificar sua vida inteira para não correr o risco de desagradar ao pai, ao invés de criar coragem e dizer com clareza que sua vocação é outra.

Em seguida a autora desse interessante artigo cita estratégia para desenvolver a capacidade de liderança:

• Desafios estimulantes. Aprende se muito mais fazen¬do que olhando os outros fazerem. Cada vez que a gente enfrenta um desafio novo, e consegue superá lo, essa ex¬periência enriquece e amadurece.

• Feedback permanente. É fundamental receber feed¬back dos colegas e chefes para que o jovem executivo aprenda a se conhecer, a corrigir suas falhas. Isso freqüen¬temente e difícil, já que boa parte dos funcionários tem medo de fazer críticas ao filho do patrão.

• Aprendendo com os outros. Aprender com os mais velhos é muito importante. Não necessariamente com membros da família – freqüentemente um jovem tende a rejeitar as opiniões do pai ou de um tio e elege um amigo da família, ou um executivo profissional, como mentor.

• Cursos e leituras. Aprendizado é um programa para a vida inteira. Um executivo, em qualquer nível, deve ter co¬mo programa fazer pelo menos um curso ou seminário por ano, e estar sempre procurando leituras que lhe tragam novas idéias e conhecimentos.

A tarefa do fundador é desenvolver uma ideologia estável e coerente para a família navegar entre os escolhos durante a segunda geração. Alguns fracassam porque não conseguem transpor a clausura de sua individualidade e transformar o seu sonho no projeto da segunda geração. Não conseguem reunir o grupo familiar para que ele escolha quem melhor identifica o conjunto dos valores.
Autor: Sandra Regina da Luz Inácio


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