A idiocracia do RINEI



Para os que não conhecem o filme Idiocracia (“Idiocracy”) – de Mike Judge, mesmo criador de “Beavis & Butt-head” – trata-se de uma comédia sobre um fictício futuro dos Estados Unidos em que os inteligentes serão extintos por déficit de natalidade e a população será composta apenas de cabeças-ocas, gente intelectualmente deficiente e simpatizante da cultura da baixaria, e as grandes corporações dominantes verão seus produtos desbancarem até a água potável. A população americana dessa distopia é (ainda apenas) uma caricatura da cultura degradada e alienada que tem terreno fértil naquele país... e no nosso também.

Tanto lá como cá a cultura respeitável, consciente e construtiva vem perdendo espaço no “mainstream” para fenômenos pseudoartísticos e modas que exaltam exatamente aquilo que o filme descreve: baixaria, pornografia onipresente, hedonismo, alienação, irresponsabilidade, destruição intelectual e outras desqualidades mais. E pertence a essa corrupta categoria o infelizmente maior expoente musical do Nordeste da atualidade: aquele que chamam de “forró estilizado” mas a que prefiro me referir como Ritmo Nordestino Estilizado Imundo – RINEI.

O RINEI está sendo o melhor contribuinte possível para a consolidação da idiocracia no Nordeste. Muito daquilo que alguém pensar de uma cultura moralmente degradada e intelectualmente corrompida pode ser encontrado nas letras e nos palcos das bandas. Se fosse produzida uma versão brasileira do filme de Mike Judge, tenhamos toda a certeza de que, em nossas ruas do século 26, o que mais tocaria seria RINEI, junto ao funk carioca – ritmo cuja representação maior também decaiu do amor e dos problemas sociais às apologias ao erotismo sujo e à cabeça-oca – e à swingueira.

Se nos EUA de 2505 o comportamento social predominante seria vomitar palavrões e chamar de “bicha” ou “fresco” aqueles que falam certo, sem as gírias de um inglês ultracoloquial, o costume que vem ganhando força já hoje entre os rapazes com a atual glória do ritmo imundo é falar de sexo, das “gaias” que plantaram nas namoradas e dos momentos de embriaguez com os amigos. Já duas das frases mais pronunciadas entre as pessoas nos últimos doze meses são “Chupa que é de uva”, uma referência ao ato de fazer boquete com gosto de camisinha de sabor uva, e “Vamos simbora pro bar, beber, cair e levantar”, uma forma de dizer como é bom ir ao bar e alcoolizar-se até começar a cair de bêbado.

Comparando com os anos 80, quando as frases que mais faziam a cabeça dos jovens vinham das bandas do saudoso movimento Rock Brasil – frases com conteúdo robusto, que convidavam o ouvinte a pensar naquele Brasil que tanto sofria –, notamos que prevaleceu aqui, em vez da superação reprodutiva dos cabeças-ocas de Idiocracia, a prevalência comercial da música idiota em detrimento da inteligente, já que aquela vendia muitíssimo mais num país cuja população adora carnavais, feriados e muitas outras oportunidades de se desligar e se alienar dos problemas e cair na farra.

É possível – embora muito incerto – que a idiocracia brasileira nunca chegue ao extremo do filme, mas as bandas de RINEI estão ajudando imprescindivelmente a nos aproximar daquela realidade grotesca, ao menos na região Nordeste. Não vejo, infelizmente, muito o que se fazer para causar sua decadência antes que nos tornemos a primeira zona oficialmente idiocrática brasileira, com governadores reconhecidos pelo passado de cachaceiros e “campeões do cabaré”, mas o que aqueles que odeiam tal estilo por causa da imbecilidade dele podem fazer é ensinar aos seus filhos que o caminho certo a ser seguido não é o de apreciar o RINEI e toda a sua imundície, e sim o de ser seletivo no que se ouve.
Autor: Robson Fernando


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