Sustentabilidade nas alturas



Sustentabilidade até nas alturas
Voltando de uma reunião no Rio de Janeiro, deparei-me com algumas cenas comuns. Mas que incomodam. Dentro da aeronave, ainda em procedimento de embarque, foi solicitado que não se utilizasse aparelhos eletrônicos, incluindo-se claro, o celular, uma vez que estavam abastecendo nosso avião.
Todos que estavam usando o aparelho, assim continuaram. E outros, logo se dispuseram a ligá-los como se nenhuma orientação fosse repassada. Vá lá, vamos tentar entender o outro lado. Alguns precisavam resolver problemas urgentes da empresa, embora o vôo fosse às nove da noite. Uns necessitavam falar em casa, verificar a normalidade do transcorrer do dia. A lição dos filhos, o remédio da mãe, a comida do cachorro. E até mesmo, outros, por costume, ligavam para parentes e amigos apenas para dizer um olá, dizer que estavam chegando, que o avião já estava prestes a se lançar no céu.
Em se tratando de ser humano, até posso imaginar que um sujeito poderia ligar para um amigo apenas para tirar sarro, dizendo que estava voltando do Rio de janeiro. Tem a turma da superstição, ligam na esperança de receber uma benção, um “vai com Deus”. Um verdadeiro alívio, mesmo para uma viagem curta.
Avião abastecido, passageiros embarcados, minha atenção de volta para duas, digamos senhoras sentadas ao meu lado. Estavam empolgadíssimas. Muitas sacolas e bolsas nas mãos, uma diz a outra. Não podemos ficar com nenhuma bagagem aqui, pois é saída de emergência. Comentário feito, continuaram a animada conversa. Esperaram, claro, a aeromoça fazer o pedido de “acomodar as bagagens de mão no compartimento de cima, pois estavam em área destinada a saída de emergência”. Ela, a aeromoça, assim o fez, cordialmente. Tudo natural.
Embarque encerrado, retirei-me deste assento e fui para o outro lado, mais à vontade. Mas mesmo assim, prestando atenção no bate-papo. Logo em seguida, uma delas se levantou e resgatou as bagagens do compartimento superior. Eram objetos que preencheriam o conteúdo do debate: produtos de beleza e outros resultantes de receitas para emagrecimento e rejuvelhescimento. Como pude observar, havia pouca diferença entre eles, a não ser um chá verde para uma, vermelho para outra.
No decorrer da viagem, um pouco de leitura, um cochilo e uma hora depois estávamos em Belo Horizonte. Avião na pista de pouso, taxiando e começa-se a ouvir o desatar dos cintos de segurança. Vem então o aviso, a tradicional orientação para que esperassem o completo estacionamento da aeronave, claro para segurança de todos.
Obviamente ignorado. É a corrida para ver quem levanta mais rápido, quem consegue ultrapassar algumas fileiras, quem pega primeiro a bagagem e finalmente quem será o campeão, que chegará mais ligeiro até a sala de desembarque e ocupará lugar de destaque na fila das malas, sem trocadilho, claro.
E nessa correria, as duas companheiras de viagem também se agitam. Uma delas simplesmente subiu na cadeira para pagar a outra parte dos objetos. Bem prosaico para o final de vôo.
Mas, o mais impressionante é ver as pessoas ligando os celulares, evidentemente, depois do aviso de somente acessá-los após ultrapassarem o salão de desembarque. Imagino qual seria a urgência que impede de esperar dois, cinco minutos. Em alguns casos, parece uma ação automática, como desatar cintos e ligar o telefone.
Vou sugerir às companhias aéreas que mudem diariamente aquele texto padrão. Tem que chamar a atenção. Tipo: (uma voz bem desesperada) Senhores, senhoras, por favor. (Gritando) Por favor, nossa aeronave está em perigo, se algum telefone for ligado, vamos ter pane elétrica e as portas vão se trancar automaticamente. (Mais alto e mais desesperado) Eu disse, vão se trancar!
Ou assim: Passageiros, passageiros, promoção relâmpago – quem sair por último vai ganhar bônus em nosso programa de fidelidade. Eu disse, por último!
Não fiquei para ver mais cenas na sala de desembarque, já que não tinha bagagem. Certamente, a ordem foi a desordem, muitos afoitos e poucos “com licença”, “por gentileza”.
Cada vôo poderia ser um começo de uma nova viagem para alguns passageiros, que poderiam se tornar cidadãos também nas alturas. A frase não é nova, mas se cada um se comprometesse com seus deveres, não seria necessário clamar pelos direitos.
Ter uma vida sustentável não é difícil, mas é preciso começar olhando para si, antes de olhar para o outro. E antes que julguem o inconveniente de ter ouvido a conversa alheia, garanto que era impossível não tê-lo feito. Mas vale o alerta.

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Autor: Lúcio Flávio Machado


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