A grande corrupção nasce nos menores hábitos



O que mais se ouve de “discussão política” no Brasil são queixas de que o cenário político do país, de municipal até federalmente, está dominada por corruptos, por pessoas que chegam ao poder para angariar ganhos pessoais e sustentar os interesses de setores econômicos que lhe são aliados em vez de lutar pelo bem comum do município, estado ou país. Pensando melhor sobre a cultura brasileira em que prevalecem o Jeitinho e o pensamento do “depois eles repõem”, não é surpreendente concluir que os maus hábitos dos grandes políticos corruptos têm berço nos pequenos delitos que até mesmo aquele mais humilde trabalhador comete de vez em quando.

Esse lado sombrio da cultura brasileira, ao lado do mau caráter que o político carrega previamente à sua eleição, é de fato a fonte maior da tradição da roubalheira. O que esperar de uma sociedade que, além de desprezar a vivência realmente honesta, lança mão da desonestidade desde os procedimentos mais simples do dia-a-dia?

Entre os delitos pequenos que quase invariavelmente evoluem para os grandes crimes da política, está incluído o furto de pequenos itens das escolas, faculdades e hospitais. Um número razoável de estudantes, funcionários e outras pessoas que circulam em instituições desses tipos costuma furtar, por exemplo, papéis higiênicos, lápis-piloto e sabonetes para levá-los para casa. Afinal, para quem faz isso, “o governo repõe depois” e “um rolo ou lápis-piloto sozinho não faz diferença numa escola desse tamanho”. O que se pode esperar de um futuro em que os mandantes da nação serão algumas dessas pessoas?

Outros atos notáveis de “microcorrupção” incluem os pequenos subornos dado por infratores de trânsito aos policiais rodoviários para anulação de multas e o pagamento de “taxa de aprovação” para obter uma carteira de motorista não merecida. Nessa cultura pervertida, inclui-se, como já dito, o ato de menosprezar a honestidade e o comportamento de quem respeita todas as normas não-arbitrárias.

Numa sociedade que adota esses comportamentos, realmente não há perspectiva de que se iniba na política o ato de almejar a obtenção de vantagens pessoais por métodos escusos. Queiram ou não os “microcorruptos” que subornam policiais e furtam papéis higiênicos, ninguém daqueles que incorporam esses hábitos sujos simples tem moral de exigir ou desejar que a corrupção seja varrida das casas legislativas do Brasil.

É muito esperável que um brasileiro qualquer que adote as pequenas desonestidades em seu dia-a-dia, quando vence uma eleição para vereador/deputado com base em suas (hipócritas) promessas de “lutar por um(a) cidade/estado melhor”, não demore em mexer os pauzinhos para obter em seu favor alguns milhares de reais que seriam destinados para determinada obra. Porque, afinal, “50 mil reais não fazem tanta diferença e o governo pode repor depois”.

E o mesmo vereador ou deputado que aprendeu a ser corrupto no dia-a-dia pré-eleitoral traz também o pensamento de que “a honestidade faz a pessoa quebrar a cara” e que “o malandro é quem se dá bem no Brasil”. Usa então o Jeitinho para fazer suas manobras e driblar a lei no parlamento em que está atuando, adotando politicamente a malandragem das ruas, bem ao estilo Zeca Urubu. O resultado não requer muito trabalho para se constatar.

Para se inibir essa cultural “faculdade ao ar livre” de corruptos, só promovendo uma educação familiar e escolar que desencoraje o jogo sujo e a desonestidade cotidiana. Se não for assim, o Brasil continuará alimentando por muito e muito tempo essa cultura de “microcorrupção” que gera a grande corrupção engravatada e nunca terá moral para reclamar.
Autor: Robson Fernando


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