Sensacionalismo na Sociedade Contemporânea



Certa manhã, enquanto lia o jornal, fixei os olhos em uma das manchetes de capa: “CRIANÇA DE 4 ANOS É CHEFE DE QUADRILHA.” Por alguns instantes, fiquei paralisado, pensando que mundo era aquele. Mas logo me restaurei e vi que era este mundo: o real, e notei também que o fato havia acontecido bem próximo do local onde eu estava. Segundo o texto, publicado no dia 21 de agosto de 2006, no jornal Destak (distribuído gratuitamente nas estações de metrô), a criança comandava mais sete meninos, todos entre 7 e 9 anos. A quadrilha agia em um parque de diversões, com pedaços de pau e estiletes velhos, roubando doces e brinquedos das demais crianças. Os pais de todos os meninos foram indiciados e alguns até foram presos.

No mesmo dia, o Jornal Nacional iniciava sua exibição com a notícia: “PAI MATA OS 3 FILHOS E SE SUICIDA”. Segundo o jornal, o pai havia dopado os dois filhos mais velhos e dado um tiro na testa de cada um. O mais novo tomara dois tiros: um no estômago e outro na cabeça. Após matar os três filhos, o pai suicidou-se e deixou um recado para a esposa. O advogado da família acreditava que o pai pertencia a alguma seita ou religião que o obrigou a fazer isso, já que a família vivia em harmonia e não tinha sequer problemas financeiros.

No dia seguinte, o jornal “Agora” publicou a notícia de capa: “AVIÃO CAI E MATA 45 CRIANÇAS.” Confesso que isso me deixou ainda mais abalado: 45 crianças mortas por falha no motor de um avião.

O choque que tive ao ler estas notícias não acontece exclusivamente comigo. Tenho certeza que ao menos 80% da população teve essa mesma impressão. Mas pensemos: será que, de fato, elas são tão importantes e interessantes a ponto de serem colocadas na 1º página de um jornal? Dependendo do ponto de vista, não. Se levarmos em conta o conceito de que notícia é tudo aquilo que altera a realidade, estes fatos não mudam em nada meu cotidiano, afinal, é preciso que eu deixe de fazer algo ou inicie alguma tarefa nova devido ao pai ter matado os três filhos? Elas são, na verdade, de interesse DO público, mas não de interesse público. Note que os jornais impressos com o qual foram publicadas estas notícias são direcionados para a parte trabalhadora, pois um é distribuído gratuitamente e o outro trabalha muito com recursos de cores, fotografias, e custa apenas R$1,50. Quanto ao JN, é o pico de audiência da Rede Globo. De acordo com dados do IBOPE, é o mais assistido do país pelas mais diferentes personalidades.

Na realidade, o fato de usar tais notícias na 1º página ou na abertura do jornal, deve-se a um meio que a imprensa utiliza para apreender uma quantidade cada vez maior de leitores ou ouvintes: o chamado sensacionalismo. O “sensacional” é algo grotesco, meloso, dramático, e ocorre quando uma determinada notícia, seja ela transmitida pelo rádio, pela TV, ou por meio dos jornais, provoca uma reação física e/ou psíquica no leitor. É simples: aquilo que vemos e chama a atenção de alguma forma. Ao ler a notícia da queda do avião, por exemplo, podemos comentar com um amigo: “Nossa, você viu? Tadinhas daquelas crianças! Talvez teriam um futuro brilhante!” É justamente esse sentimento que a mídia quer causar em nós: de tristeza, de emoção. Além disso, ao comentar com uma outra pessoa, esta ficará interessada também no assunto, e pode assistir ao jornal inteiro aguardando por esta notícia ou comprar o jornal na primeira banca que lhe aparecer. Em resumo, é aquilo que choca, que causa uma reação sentimental no indivíduo.

Para Marcondes Filho, o dito sensacionalista “é o grau mais radical de mercantilização da informação: tudo o que se vende é aparência e, na verdade, vende-se aquilo que a informação interna não desenvolverá melhor que a manchete. Assim, as manchetes, muitas vezes, utilizam esse recurso sensacional, mas a notícia, nem sempre tem essas características, pois é ao ler a manchete que o leitor se interessará ou não por determinado assunto”.

O discurso informativo pode se inspirar em determinadas formas narrativas e, no popular, com características melodramáticas ou grotescas. O conceito de Angrimani Sobrinho é o mais adequado para sintetizar o que acabamos de refletir, pois para ele o sensacionalismo é “tornar sensacional um fato jornalístico que, em outras circunstâncias editoriais, não mereceria esse tratamento. É a produção do noticiário que extrapola o real e superdimensiona o fato”.

O sensacionalismo está presente no nosso cotidiano: no rádio, na TV, nos jornais impressos, e em outros objetos que estabeleçam comunicação entre as pessoas. Por que será, por exemplo, que quando vemos um acidente de carro e o motorista desce apenas mancando, nós olhamos e comentamos: “Ah, não foi nada de grave!” e, quando o cara sai do carro com um pequeno corte na cabeça com uma gota de sangue, dizemos: “Nossa, foi muito sério, ele está até sangrando!”. A ideologia midiática, conhecida aí por Indústria Cultural, nos aliena, acompanhada de uma série de transgressões a diversas regras culturais e simbólicas do nosso país.
Autor: Tiago Cosmo da Silva Dias


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