Você tem dúvidas sobre o turnover?



Periodicamente sou questionado por alunos universitários e outros profissionais, que desejam saber mais sobre turnover. Como meu livro sobre o tema só será lançado em 2010 e, pensando em auxiliar outras pessoas que queiram informações sobre o assunto, desenvolvi este breve artigo baseado em algumas perguntas que me foram feitas.


-A quem se pode creditar (se é que pode) maior responsabilidade na alta taxa de rotatividade?
O capitalismo conta para existir, com o que se chama mão de obra de reserva. Isso permite a barganha por salários. Afinal, os trabalhadores por não serem donos do capital ou de outros recursos além de seu trabalho, ficam à mercê do que a oferta e a demanda do mercado por mão de obra exigem e pelo que estão dispostos a pagar.
No Brasil além desse fator, pesam ainda os graves problemas educacionais que o país enfrenta, com índices de analfabetismo funcional da ordem de 68% além dos 7% considerados analfabetos absolutos*. Isso afeta muito a qualidade da força de trabalho disponível, aumentando a oferta de mão de obra não qualificada, que hoje tem demanda menor e paga baixos salários e por outro lado, restringindo a contratação de mão de obra qualificada, percebida na grande quantidade de vagas em aberto por não conseguirem candidatos aptos.
Esse fator aliado à ausência, por parte das empresas, de claras definições de cargos, salários e principalmente responsabilidades, fazem com que a rotatividade seja bem alta, por motivos que vão desde a incompetência do contratado para a função, quanto no outro extremo, pela decepção do funcionário pela falta de desafios e oportunidades de crescimento no cargo. Infelizmente também, é bem recente e não totalmente difundida, a preocupação das empresas brasileiras em relação à qualidade e a suprir as necessidades de seus recursos humanos. Investimentos em treinamento de pessoal, por exemplo, ainda não é prática adotada pela maioria das organizações.
Aliado a isso, a alta carga tributária brasileira que incide nas folhas de pagamento das empresas restringe a contratação de mais funcionários, sobrecarregando e desmotivando os existentes.
Por sua vez, os funcionários também sofrem vários descontos em folha, o que faz com que muitos prefiram recorrer à informalidade.
Há portanto vários responsáveis pela alta taxa de rotatividade nas empresas: governo, empregados, patrões, estruturas de gestão, entre outros não citados, que causam vários prejuízos à sociedade.
Para citar alguns destes prejuízos, só no que tange às empresas, podemos considerar o mais grave que é a perda do conhecimento da organização, uma vez que em geral, as pessoas o levam consigo ao saírem da empresa (isso pode ser minimizado com claras definições de cargos e responsabilidades, além da manutenção de normas e procedimentos escritos e atualizados para as atividades chave), bem como a queda da qualidade nas atividades executadas, o aumento do retrabalho e também, os custos decorrentes de anúncios, entrevistas, processos de seleção e treinamento dos escolhidos para ocuparem o cargo.

-Qual a parcela de responsabilidade que líderes de departamentos ou de equipes têm da rotatividade de pessoal?
Tudo começa com a contratação. O processo foi bem realizado? A descrição do cargo e a responsabilidade pelas suas atividades estão bem detalhadas? Muitas vezes, o líder não soube definir bem o perfil, ou este foi desenhado sobre as atividades do ocupante anterior. Será que o cargo exige mesmo aquelas expertises? Não se estará solicitando a mais ou a menos do que a real necessidade?
Outra coisa importante e muitas vezes negligenciada pelos líderes, é manter a equipe motivada. Isso é feito através de incentivos, atitudes, respeito e treinamento. Afinal, o líder depende da equipe e vice versa. Um líder sem liderados que o apóiem não é nada.


-É um diferencial em liderança identificar possíveis colaboradores que “infectam” a organização com ideias negativas, podendo influenciar na questão do turnover?
Sem dúvida. Para que esses sinais sejam notados a tempo, o líder precisa ser perceptivo e principalmente, não deve deixar se envolver e afetar pelo conflito. Manter a “cabeça fria” é primordial. Decisões tomadas apressadamente, no calor da situação, via de regra são desastrosas para os envolvidos e para a empresa.
Como em uma doença, quanto mais rápido for tomada uma ação para eliminar o conflito, melhor será. Se não houver outra forma de resolver a questão, a demissão do colaborador “infectante” se faz necessária.

-A crise levou e ainda leva à muitos cortes nas empresas. Como administrar essa situação relacionada à inevitável alta no "turnover"?
A humanidade sofre crises periodicamente. Nossa vida pessoal também é marcada por altos e baixos. Será que nunca aprenderemos com isso?
É necessário que as pessoas ou empresas estejam preparadas para essas crises. Por isso, planejar é preciso. O velho e bom planejamento de curto, médio e longo prazo. Guardar na época da fartura para os momentos de penúria.
É inconcebível que gestores financeiros especulem com o dinheiro da empresa e que depois, a sociedade através de seus governos, pague pelos erros de gestão. Muitas das quebradeiras ocorridas nesta crise mundial, são causadas principalmente por falhas grotescas de gestão. Incompetência pura. Se não fosse por isso, todas as empresas estariam mal das pernas, o que claramente, não é verdade.
Despejar esse ônus sobre os trabalhadores também é uma grande tolice. Eles são os clientes! Se ficarem desempregados, não poderão consumir e o ciclo vicioso fica estabelecido.

-Qual a importância de desde a entrevista de contratação ser transparente com o contratado (questão de salários, benefícios etc), para evitar frustrações futuras e evitar uma alta rotatividade?
Isso é primordial. A honestidade que se exige de um funcionário também deve ser respeitada por parte da empresa. Jogos às claras dão melhor resultado, sem falsas promessas ou quebras de contrato. Ninguém gosta de ser passado para trás. É a base da negociação ganha – ganha. Neste tipo de negociação, quando um lado ganha, o outro também.
O dinheiro do salário não é fator motivador. Receber menos que o mercado é: seu funcionário se sentirá motivado a mudar de empresa, levando consigo sua experiência e o conhecimento do negócio que está armazenado nele e que sua empresa não mais poderá utilizar, deixando para você o ônus da contratação e do treinamento de outro para substituí-lo.

-A entrevista de desligamento é considerada uma maneira eficaz de avaliar a situação da empresa e identificar as perturbações dos colaboradores para uma baixa taxa de rotatividade de pessoal?
Não podemos apenas contar com essa entrevista para isso. Ela deve fazer parte de um rol de avaliações pelas quais o colaborador passou durante toda sua estada na empresa. Cruzemos também com as avaliações pelas quais passou seu chefe, por exemplo, ou colegas próximos de trabalho.
Em geral, se o funcionário ficou um bom tempo na empresa e está saindo, é interessante saber o porquê e, isso, nem sempre fica claro apenas com essa entrevista.
Afinal, o que se deseja com esses levantamentos é descobrir os focos de descontentamento e solucioná-los para que mais colaboradores não sigam o caminho.

-O “job rotation” (ascensão horizontal) é uma política bastante usada atualmente nas corporações. É realmente uma forma de manter o colaborador satisfeito?
Em parte. Por um lado é interessante porque o colaborador adquire conhecimento e versatilidade e, neste caso ele ficará satisfeito por estar agregando valor à sua carreira, mas por outro lado, muitas empresas tentam postergar promoções para evitar aumento nos gastos com a folha ou descontentamento de outros colegas de trabalho. Se o colaborador perceber esse “truque”, ele provavelmente escolherá sair da empresa tão logo a oportunidade o permita.

-Empresas com baixo ”turnover” são muito bem vistas no mercado de trabalho. Quais os principais fatores que podem levar à essa condição?
Uma empresa não é formada somente por prédios, mobiliário, equipamento ou tecnologia. Sua maior riqueza são seus talentos profissionais. As pessoas que desenvolvem atividades na organização é que são verdadeiramente seu "sangue e cérebro".
Essas empresas com baixo turnover sabem disso e utilizam uma série de incentivos para manter seus colaboradores engajados com as metas organizacionais:
Uma das técnicas de gerenciamento e remuneração de funcionários é denominada gestão holística ou integrada, em que seus defensores fornecem benefícios, recompensas e programas educacionais, ajudando a cuidar do bem-estar do funcionário, nos aspectos mental, corporal e espiritual.
Outro mecanismo é o já citado job rotation. Para a empresa, além de manter um bom funcionário em seus quadros, também estará formando um possível futuro ocupante de cargos de chefia.
Em se tratando de reter talentos na empresa, notamos que o treinamento sempre é fundamental.
Essas preocupações em satisfazer as necessidades humanas dos colaboradores são muito bem vistas por eles e fazem com que outros se sintam atraídos para os quadros da organização. Em geral, essas empresas obtém sempre os melhores talentos encontrados no mercado de trabalho.

-Treinamentos capacitam o profissional e lhe dá segurança em suas atividades. Como instrumentos como o “e-learning” ajudam à manter uma baixa taxa de rotatividade?
Uma prática que está se tornando comum nas grandes empresas hoje é o chamado e-learning, ou seja, a possibilidade de aprendizagem à distância, proporcionada pelo uso cada vez mais frequente da Internet e de intranets nas empresas.
Esse investimento em capacitação de pessoal tem demonstrado bom retorno. Quanto mais alto o nível da mão de obra, mais ciente ela é de que a educação é o melhor meio de galgar posições no trabalho e também na sociedade.
É muito simples. O bom colaborador sabe que é vantajoso para ele permanecer em uma organização que investe na melhoria da qualidade de sua mão de obra. Caso ele precise sair da empresa, sabe que os cursos que realizou lhe proporcionarão mais e melhores chances no mercado.

-Um bom clima organizacional também é relevante no “turnover”. O relacionamento interno duradouro entre os colaboradores influencia nesse cenário?
As empresas hoje trabalham em equipes. A palavra de ordem é colaboração ao invés de competição. Um bom clima organizacional é fator primordial para o sucesso desse modelo.
Passamos em geral mais tempo com nossos colegas de trabalho do que com a família. Muitas amizades são formadas para a vida toda nesse ambiente. Muitas pessoas optam por permanecer em uma organização pelo clima interno e pelos amigos. As pessoas gostam de ser respeitadas e queridas. Se os líderes conseguirem suprir isso, administrando rapidamente os conflitos normais que surgem entre as pessoas, não há o que perder.

-Existem empresas que contratam profissionais medianos (que ficam na zona de conforto) para não sofrer com um alta taxa de rotatividade. Até que ponto isso é benéfico?
O importante é que os líderes não sejam medianos como suas equipes. Claro que isso exigirá uma dose extra de esforço do líder para atingir as metas, mas nem sempre isso é ruim. O líder é que não deve em hipótese alguma entrar nessa “zona de conforto”.
Entretanto, uma coisa deve ficar clara. O termo mediano, bem como seu sinônimo pejorativo medíocre, não são necessariamente algo ruim.
As pessoas ditas “normais” são medianas, ou seja, estão na média da população em termos de QI, por exemplo. A grande maioria das pessoas está nessa faixa. Eles são o recurso mais abundante. Além do mais, muitas vezes são mais fáceis de lidar do que os chamados “superiores à média” ou mesmo os “gênios”. Isso faz diferença numa equipe. Muitos “egos superiores “ juntos, em geral, não funcionam devido aos conflitos que geram. O ideal é equilibrar os elementos das equipes, deixando os melhores profissionais liderarem-nas ou aos projetos.


* Prieto, Andréa Cristina Sória. Analfabetismo funcional. http://www.planetaeducacao.com.br/novo/artigo.asp?artigo=700
Autor: Henrique Montserrat Fernandez


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