A obrigatoriedade desnecessária do hino nacional idem nas escolas



No último 21 de setembro, foi sancionada uma lei federal que obriga escolas de Ensino Fundamental a tocar o hino nacional brasileiro uma vez por semana. Para a visão do senso comum, é algo positivo, mas, numa análise que leva em conta a (in)utilidade de hinos territoriais numa filosofia pacifista e a irrelevância dos mesmos num contexto em que a cidadania civil é muito mais requerida, a medida é bastante questionável e discordável.

Em primeiro lugar, questiona-se a justificativa dada pelo relator da lei, deputado Lincoln Portela, na qual consta uma “carência (...) da noção de patriotismo e civismo, principalmente por parte de nossa juventude”, a ideia de que “o Hino Nacional deve representar para a sociedade a busca constante para o crescimento da pátria” e a suposta necessidade “de um maior senso de patriotismo e civismo”, segundo a qual “nada (seria) melhor que a prática de cantar o Hino para torná-lo cada vez mais familiar em seus sentimentos”.

Como tendo já escrito textos que questionam a utilidade desse tipo de hino em situações civis e a noção de patriotismo e civismo nas mesmas, faço o mesmo em relação à lei de Portela.

Hinos territoriais em sua maioria são ideais para louvores nacionalistas, por normalmente exaltarem a suposta superioridade ambiental e cultural de um país ou unidade federativa, e para animações militaristas, uma vez que banham as emoções das pessoas com a perspectiva de guerrear, matar e morrer em nome de seu país ou região. Tornam-se canções inadequadas e sem utilidade se observadas a partir de uma filosofia de pacifismo e civismo crítico.

Assim sendo, o hino brasileiro é ideal para nutrir o fervor patriota de tropas se (três toques na madeira) o Brasil entrar em conflito militar com outra nação algum dia, mas não para outros motivos ou funções em que a cidadania civil é muito mais útil.

Podemos notar melhor para que realmente serve o símbolo musical brasileiro quando percebemos que as outras duas ocasiões relacionadas a impor por lei o canto solene do hino nacional em escolas eram momentos de governos autoritários adversos à democracia.

A primeira medida relacionada ao hino na escola foi a Lei 259/1936, sancionada em pleno primeiro governo de Getúlio Vargas e, coincidentemente ou não, no auge do Integralismo, que o então presidente ora apoiava. A segunda foi a Lei 5700/1971, levada à vigência por ninguém menos que o general ditador Emílio Garrastazu Médici, dentro das medidas da alienante ideologia da Segurança Nacional.

Assim sendo, fica a dúvida: por que tanta preocupação em exaltar o patriotismo ufânico nas escolas numa época em que tal comportamento é obsoleto e desnecessário e que outras atitudes são mais relevantes?

Obsolescência e desnecessidade também marcam a noção de civismo e patriotismo do deputado que criou essa lei. O civismo de que precisamos, eu já dizia uns anos atrás e ora digo novamente, não é o ufanismo nacionalista que o hino oficial inspira para animar exércitos, mas sim o espírito civil de cidadania.

O patriotismo que faz falta hoje não é o que bajula a nação com versos como “Ó pátria amada, idolatrada, salve, salve” e “Entre outras mil, és tu Brasil”, mas sim o senso de que nós, enquanto pessoas que podem fazer a diferença na construção da sociedade brasileira, devemos trabalhar em prol da melhoria social e política do país.

O amor patriota de que o Brasil precisa não é o ato doutrinado de repetir palavras aduladoras e militarescas semanalmente nas escolas, não é aprender a ser uma pessoa induzida a amar platonicamente a pátria e matar e morrer por uma nação etnocentricamente “superior”. Mas sim a ação construtiva e consertadora que só aulas de cidadania crítica, de que as gerações menores de idade de hoje sentem muita falta, são capazes de ensinar.
Autor: Robson Fernando


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