O negro no Brasil



O negro no Brasil

Historicamente o negro sempre foi motivo de discussões no Brasil. Do seu uso como objeto de trabalho, a sua incorporação como trabalhador, de sua invisibilidade social a sua luta por inclusão. Vários são os temas que freqüentam os debates, mas, de uma maneira geral, as diretrizes não são traçadas pelos negros.

Desde o inicio, ainda no século XVI, a incorporação do negro ao Brasil foi balizada pela elite, este mesmo grupo para camuflar a dominação e exploração econômica, criou instrumentos de coerção intelectual que justificavam a idéia da superioridade branca. Com o passar do tempo esta dominação se incorporou aos conceitos sócio-culturais brasileiros e acabou tornando-se parte da superestrutura do Estado.

Abordaremos este assunto, de uma maneira bem sucinta, o dividindo em dois temas: O branco no comando e Da invisibilidade social a luta por inclusão.



O branco no comando

Desde o início da colonização portuguesa no Brasil, os negros encontravam uma estrutura produtiva montada, onde eram dominados e usados como máquinas na fabricação de capital. A dominação nesse período se dava a partir da força, da coerção física na escravidão, na qual os negros eram submetidos a castigos quando não correspondiam aos interesses dos brancos. Assim, neste período, ficava estabelecido o modelo de relacionamento social que marcaria a história de negros e brancos no Brasil. Mas que modelo é esse? É um modelo fundamentado na relação econômica, onde o negro é explorado e o branco está no comando.

A partir do século XIX a prática da escravidão começa a ser contestada com mais intensidade, não por ser um ato desumano, mas sim por ser uma vergonha para qualquer sociedade civilizada da época. Além disso, o trabalho escravo, mesmo sendo escravo, era ainda muito oneroso aos brancos, ou melhor, a elite, pois exigia um gasto muito grande com a manutenção da força produtiva e com a logística de controle das revoltas dos negros. Existia uma outra forma de exploração econômica muito mais rentável e que já estava sendo aplicada na Europa há algum tempo, a relação capitalista de trabalho. Nesta relação, o burguês, possuía um vínculo com o trabalhador que se resumia apenas ao pagamento de uma quantia irrisória pela sua força de trabalho. O burguês deixava o trabalhador livre para buscar seu sustento e organizar sua vida.

Mas como aplicar este modelo ao Brasil? O que ocorreria se a liberdade fosse concedida aos negros? De uma coisa a elite branca tinha certeza, de que deveria se precaver para manter seu poder, e mais, sabiam que a liberdade dos negros geraria uma intensa busca, por parte dos dominados, por um pedaço de terra, e isso poderia suscitar, no futuro, condições de igualdade entre os grupos envolvidos no jogo, pois terra por aqui sempre representou poder. E a liberdade dos negros veio, e junto com ela a necessidade de aplicar no país, as tais relações capitalistas de trabalho, e elas foram empregadas, mas com os brancos, leia-se elite, no comando.

O vácuo deixado pelos negros foi ocupado pelos imigrantes europeus, que eram brancos, mas foram obrigados a se submeterem a nossa elite branca. E os negros que partiram para as relações capitalistas foram empurrados para os piores tipos de trabalhos existentes, criando ali o embrião das relações de trabalho capitalistas entre negros e brancos no Brasil. Mas para maquiar essa dominação, a elite tratou de desenvolver dispositivos de todo tipo, que amenizavam a segregação social e ainda justificavam a sua posição de vencedora no jogo do poder.

Entre estes dispositivos está à ideologia da democracia racial, mecanismo coercivo que gerava a falsa idéia de que no Brasil os segmentos étnicos conviviam em perfeita harmonia. Mas na verdade, este sistema de idéias criava uma espécie de estamento étnico-social, que passou a funcionar de duas maneiras, primeiro tirava dos negros a ânsia de conquistarem visibilidade social, pois para o sistema eles já estavam inclusos, bastava aos excluídos que se incluíssem ao modelo capitalista. E esta idéia criava no inconsciente coletivo dos negros a rejeição por suas origens, já que elas representavam humilhação. Assim quanto mais próximos dos brancos, nas roupas ou mesmo na aparência seria melhor.

Isto deu a elite branca o comando da sociedade brasileira, que era justificado não só pelo poder econômico, mas também por ser o modelo que todos aqueles que desejassem alcançar o topo da pirâmide social, deveriam seguir.



Da invisibilidade social a luta por inclusão

Dispositivos como este citado acima, desenvolveram uma hierarquização social que empurrou os negros para a marginalização histórica. Com o decorrer do século XX esta marginalização se tornou uma verdadeira invisibilidade social, mesmo com os negros se fazendo notar.

O movimento negro no século XX ganhou força com o surgimento de várias células de resistência, como a imprensa negra paulista e a Frente Negra Brasileira, que veio a se tornar um partido político. Com o advento do Estado Novo este partido foi dissolvido, e em seguida, no período da redemocratização foi considerado ilegal. Assim sem opção política para buscarem visibilidade social e cidadania, os negros são obrigados a retornarem as suas formas tradicionais de resistência cultural. A única exceção neste momento é o Teatro Experimental do Negro, fundado no Rio de janeiro e que tinha como objetivo conscientizar os negros sobre suas origens e de seu papel na sociedade brasileira. Mas a invisibilidade política e social continuava, e os negros, só eram lembrados como referência cultural ou mesmo como um problema para o desenvolvimento do país.

Entre as décadas de 1950 e 1970 surgem dois movimentos negros, a Associação Cultural do Negro e o Instituto de Pesquisa e Cultura Negra, que buscavam rearticular e criar bases ideológicas fortes para o movimento negro brasileiro. Mas era um período de ditadura militar e os militares haviam transformado a democracia racial brasileira em uma de suas bandeiras, com isso, qualquer negro que se levantasse contra essa política era tratado como traidor da pátria. Mais uma vez o movimento negro havia perdido seu poder de contestação, foi cerceado do seu direito de reinvidicação por participação política e de sua busca por uma maior visibilidade social. O movimento hiberna e ressurge forte na segunda metade da década de 1980, o fim da ditadura deu mais liberdade política e civil às pessoas, cientes de suas necessidades, os negros iniciam uma nova etapa em sua luta, a militância.

A partir da elaboração e da promulgação da Constituição federal de 1988, o movimento negro brasileiro sai da passividade e começa a militar por seus direitos. A Constituição ajuda, pois possui dispositivos legais que garantem uma série de direitos aos negros, mas ainda era necessário buscar mais. Neste contexto a principal vitória do movimento foi a conscientização dos afrodescentes, que não se entendiam negros, de sua negritude. Mulatos e pardos acabaram tornando-se negros e isto fez com que o movimento ganhasse força. O grupo passou a exercer pressão não só social mais também política, pois o movimento descobriu que possuía, e em grande número, a moeda de barganha política, o voto.

Outras conquistas vieram como o sistema de cotas, que é visto por muitos de forma ambígua, pois ao mesmo tempo em que da aos negros condições de alcançarem posições que nunca imaginavam, sustenta a idéia de que as conquistas deste grupo só acontecem quando os brancos os auxiliam. Mas sabemos que por de trás de todas estas fórmulas excludentes se escondem as principais razões para se manter este modelo, que são os interesses econômicos e políticos da elite brasileira. Um grupo que não aceita de maneira alguma ter que dividir seu espaço no poder e na riqueza com outros segmentos sociais, e por isso faz de tudo para barrar o avanço dos negros em busca de seu espaço.









Referências Bibliográficas

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FUKS, M. Arenas de ação e debates públicos: conflitos ambientais e a emergência do meio ambiente enquanto problema social no Rio de Janeiro (1985-1992). Rio de Janeiro: Irih Contas, 1999.



GUIMARÃES, A. S. A. Racismo e anti-racismo no Brasil. São Paulo: Editora 34, 1999.
Autor: Mario Fernando Calheiros Barbosa de Souza


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