A Participação Da Amazônia Na Exposição Universal De Paris Em 1889



As exposições internacionais e os congressos científicos estavam ligados intimamente à defesa dos interesses nacionais, pois a participação nesses eventos aumentava o prestígio dos países e indicava o grau de desenvolvimento científico destes; eram momentos também de confraternização, discursos e mundanidades. O aproveitamento do espaço de representação para esses objetivos políticos, pela comissão dos estados, ficou mais destacado a partir da Exposição Universal de Paris em 1889[1].

A política de propaganda brasileira no exterior, durante o período imperial, foi bastante intensa; o país participou de praticamente todas as reuniões internacionais desde a Exposição Internacional do Palácio de Cristal, em 1851, em Londres e até o Primeiro Congresso internacional de Ciência, Geografia, Cosmografia e Comércio que foi realizado na Antuérpia em 1871.

Na Exposição Universal de Paris, entre os propagandistas mais destacados na representação do país, estavam os senhores Amedíe Prince, Santa-Anna Nery e Eduardo Prado que atuaram na França para a Exposição Brasileira, recebendo apoio da comissão Central do Rio de Janeiro e patrocínio do ex-imperador D. Pedro II. A respeito da importância em participar dessa exposição, o presidente da comissão paraense, Barão de Marajó afirmava: "Trabalhamos no intuito de conseguir que o Pará fosse dignamente apresentado na grande festa do progresso e civilização do mundo, a Exposição Universal de Paris" [2].

A exposição era vista como a festa do progresso e civilização no mundo, portanto, os estados deveriam procurar se sobressair. Os estados amazônicos enfrentaram problemas logo de início, porque não receberam um pavilhão próprio e teriam que dividir o espaço com o destinado aos objetos incas, o pavilhão amazônico foi montado um pouco antes do inicio da exposição; outro problema foi que os "vinhos" amazônicos foram considerados de baixa qualidade diante dos outros estados do país, além disso, um quadro feito com folhas levado pela comissão do Pará não teria sido bem recebido, é bom frisar que os comentários teriam sido feitos pelos delegados de outros estados brasileiros. As exposições mostravam-se um palco perfeito para intrigas e competições entre os estados e entre países, nesse sentido, a elite intelectual amazônica nesses momentos se unia, compartilhando dos mesmos valores e querendo fazer uma boa apresentação em Paris.

Dessa forma, o Barão de Marajó[1] relatava que diante dessas pequenas dificuldades a presença de Santa-Anna Nery teria sido fundamental, por apoiar incondicionalmente os estados amazônicos e em especial ao Pará nas questões do quadro e do vinho, sendo o único da comissão brasileira em Paris a assumir esse papel. O apoio recebido pelo propagandista, fez com que o barão de Marajó exagerasse nos elogios, possivelmente, ele deve ter se impressionado com o gasto de Nery com a "Revue du Monde Latin" e com sua atuação realmente incansável de defender os "interesses da Amazônia":

Pede a justiça que entre os membros do commissariado distinga um pelos seus serviços prestados ao Brazil, e especialmente ao Pará e Amazonas; refiro-me ao sr. Sant'Anna Nery, que pelo seu trabalho incessante já na imprensa, publicando o seu jornal América, para o que não poucos sacrifícios se impõe, já por diversas publicações como o "Guia do Emigrante", escrito em totalidade por ele, e o bello livro " O Brasil em 1889" no qual além de diversos artigos escriptos, tomou a si a coordenação e a revisão, finalmente por repetidos artigos, notícias e retificações em diferentes jornaes, pelo papel que desempenhou em numerosos congressos, se torna mais útil para o Brasil na Europa do que a maior parte dos nossos diplomatas. É um acto de justiça o exprimir-me assim em relação a esse nosso compatriota, e esses serviços que ainda não foram galardoados pelo Brasil já o foram pelo governo francês que lhe conferio a distinção de official da Legião de Honra.[2]

É certo que Santa-Anna Nery ajudou a montar o Pavilhão Amazônico; por meio de seus contatos, ajudou a delegação a conseguir um espaço exclusivo. A exposição intitulada: "Monumentos históricos da habitação humana" (que estava sob a responsabilidade do expositor Ladisllau Netto) continha objetos da coleção etnográfica particular de Nery, e do barão de Marajó, sendo que o último destaca várias vezes no texto que era o proprietário da peça mais chamativa da coleção: uma cabeça de índio mumificada. Esta exposição foi o principal destaque da delegação paraense com seus ídolos, vestuários, utensílios e cerâmicas de origem indígena.

Percebo no objeto mais apreciado da exposição, uma crítica ao imaginário indígena relacionado à Amazônia; os paraenses mostravam aos participantes da "grande festa do progresso e da civilização do mundo" que não eram índios e que estes estavam em um passado distante que se pretendia "morto e mumificado", para estudo e contemplação do passado comum da humanidade, a cabeça era o grande símbolo da morte do atraso e da cultura primitiva. Havia uma "euro-amazônia" sonhada e vivida pelas elites regionais que deveria ser um espaço de civilidade em meio á selva, a exposição do estande amazônico era uma ação voltada para o processo de modernização do espaço amazônico.