Ganhar valor agregado é o desafio da exportação



GAZETA MERCANTIL
CADERNO A – PÁG. A5

Brasil precisa vender mais óleo de soja do que grãos e evoluir nas etapas de produção de ferro

4 de julho de 2005

O forte desempenho dos produtos manufaturados é um dos principais destaques nos sucessivos recordes das exportações brasileiras. Especialistas ouvidos por este jornal, entretanto, alertam que esses produtos apresentam baixo valor agregado, à exceção dos aviões produzidos pela Embraer. "É muito bom termos ampliado o percentual de exportações de manufaturados, mas precisamos conferir mais tecnologia a eles", diz o diretor do MBA Executivo da Fundação Armando Álvares Penteado (Faap), Tharcísio Santos.
"Além disso", acrescenta, "o complexo agroindustrial ainda é predominante, porque fizemos a lição de casa no momento certo e assim os principais produtos do setor são hoje altamente competitivos e apresentam índice de produtividade bastante elevado."
Em muitos casos, a diferença por tonelagem chega a ser gritante. Um bom exemplo é a China, um dos países emergentes, que ao lado do Brasil, Índia e Rússia compõe o grupo conhecido como Bric. Enquanto os chineses venderam ao Brasil, no período de janeiro a maio deste ano, produtos que, por tonelada, custaram US$ 1.585,25, pagaram ao País só US$ 86,17, por toneladas, pelas mercadorias destinadas a seu mercado. Peças para transmissores e receptores são o principal item importado pelo Brasil da China; já o minério de ferro é o primeiro da lista de produtos comprados pelos chineses do Brasil.
A maior preocupação dos especialistas brasileiros é a escassez de investimentos em ciência e tecnologia, o que pode levar o Brasil a manter em sua pauta de exportação bens que tendem a diminuir seus preços
ao longo do tempo, enquanto mantém a necessidade de importar bens que encarecem a cada dia. Com isso, os esforços para ampliar de forma sustentável o saldo comercial podem vir a ser minados num futuro não muito distante.
Os três principais produtos importados pelo Brasil - petróleo, autopeças e circuitos integrados - custam, por tonelada, USS 336,19, USS 6.409,09 e USS 639.241,43, respectivamente. Já os principais produtos exportados - minério de ferro, soja e automóveis - têm custo por tonelada de US$ 25,36, US$ 223,08 e USS 6.523,88, nessa ordem. Essa diferença também pode ser observada quando comparamos o valor da tonelada vendida e comprada pelo Brasil.
O sócio-diretor da Consultoria RiskOffice, Carlos Antonio Rocca, explica que por trás dessa diferença de valor pago por tonelada também está o coeficiente de incorporação de trabalho qualificado e tecnologia nos produtos. "Quando se aumenta a quantidade de horas de trabalho qualificado incorporado no produto cresce o valor por unidade de peso. O Brasil exporta bens de menor qualificação tecnológica e importa o contrário", diz Rocca lembrando ainda a teoria econômica das vantagens comparativas segundo a qual dada a natureza da disponibilidade interna de recursos naturais e humanos num país determina-se o preço relativo desses fatores.
"Com o desenvolvimento tecnológico, a estrutura intensiva em capital ou trabalho de acordo com a disponibilidade de cada país passou a explicar menos as vantagens comparativas."
Por isso Rocca destaca a urgência da evolução tecnológica brasileira. "A evolução tecnológica mudaria essa estrutura de comércio exterior, mas esse não é um processo de curto prazo", afirma Rocca. Segundo ele, a Lei de Inovação brasileira é um avanço, mas a passos lentos se comparados com as iniciativas tomadas pelos países emergentes da Ásia. "Precisamos ainda de maior investimento privado em pesquisa e desenvolvimento, de maior qualificação dos nossos recursos humanos e um conjunto de variáveis determinantes do tão buscado desenvolvimento econômico. O desenvolvimento tecnológico depende do desenvolvimento econômico."
O especialista em economia internacional da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Evaldo Alves, diz que esses números mostram empiricamente o fundamento teórico da deterioração das relações de troca ou dos termos de intercâmbio. Ou seja, o país que exporta industrializados tende ao longo do tempo a vender seus produtos a preços mais altos ou no mínimo estáveis. Já para os exportadores de produtos primários, os preços tendem a cair ao longo do tempo. "Os países que exportam bens pouco elaborados terão que vender cada vez mais para comprar as mesmas coisas. Isso explica a luta da China e dos asiá¬ticos em geral para ampliar a venda de produtos elaborados, aumentando a sua receita média por produto", explica Alves citando Celso Furtado: um país produtor de café terá que vender cada vez mais sacos de café para comprar o mesmo automóvel.
Segundo Alves, o Brasil não deve deixar de produzir produtos agrícolas, mas agregar valor a eles, passando a vender mais óleo de soja que soja e evoluindo nas etapas de produção de ferro gusa por exemplo. "Isso exige uma estratégia de exportação. As exportações para a América Latina têm algum valor agregado, mas para a Europa e Ásia não", diz Alves sugerindo uma estratégia de exportação mais voltada para a América Latina e que num eventual acordo entre Mercosul e União Européia sejam incluídos industrializados. O economista afirma que o Brasil tem o comércio exterior mais bem estruturado que o de outros países latinos como Argentina e Uruguai, mas está pior que o México e que os asiáticos.

PEQUENAS E MÉDIAS EMPRESAS
Na mesma direção, Alves diz que o Brasil busca agregar valor a sua pauta de exportação mas faz isso numa velocidade mais lenta que os asiáticos. "Somos mais lentos porque nossa política industrial não é adequada e a indústria não está articulada para exportar. Quem exporta no Brasil são as multinacionais", afirma Alves. Segundo ele é importante inserir as pequenas e médias empresas nesse processo. "Na Alemanha a participação de pequenas e médias empresas nas exportações chega a 40% enquanto no Brasil não passa de 15%. Na Ásia as pequenas se articulam com grandes empresas fornecendo insumos e assim são inseridas no processo."
O conselheiro da Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi), Istvan Kasznar, pondera que os dados revelam "a preferência dos países por um determinado sistema de produção" e por isso é difícil comparar tais números. "O Brasil apresenta o maior índice mundial de produtividade da soja. Isso significa alta tecnologia intrínseca", afirma Kasznar. Segundo ele, interessa a uma nação qualificar-se competitivamente para exportar, ou seja ter preços relativos mais atraentes que os de seus concorrentes.

VALOR AGREGADO NACIONAL
Santos detaca que a alta produtividade da agroindústria é resultado de investimentos em ciência e tecnologia realizados há 30 anos. "Hoje a política de ciência e tecnologia brasileira é deficiente. Os gastos nessa área são restritos, diferente da Coréia, Singapura e Malásia. Precisamos elevar os gastos com desen¬volvimento tecnológico para que daqui a 15 anos possamos colher os frutos como estamos colhendo na agroindústria."
Para Santos, as dificuldades em adicionar valor aos produtos brasileiros decorre da falta de política de desenvolvimento dos anos 80, uma vez que o ciclo de maturação de investimentos em tecnologia é longo. Segundo ele, entre os manufaturados, a exceção da Embraer, as exportações não passam de resultados da importação de know-how sem adi¬ção de valor, como ocorre na indústria automobilística.
Já Kasznar destaca que o Brasil tem buscado ganhar valor. "Os indicadores de produtividade fabril cresceram em média 14% ao ano entre 1994 e 2002", afirma. Ele diz que o problema foi o aumento da carga tributária de 24% do Produto Interno Bruto (PIB) para 34%. "A pesada carga tributária e as altas taxas de juros anularam os ganhos de produtividade."
A solução, diz ele, é reduzir o custo Brasil. "Nós exportamos com um esforço gigantesco porque o crédito à exportação é restrito. Segundo o Banco Central, até maio, só 12,5% do total exportado contava com algum financiamento a curto prazo. Além disso, o desaquecimento da economia interna continua um motivador das vendas."
Em 2004, a participação dos manufaturados na pauta de exportações brasileira foi de 54,9%, alta de 33,5% ante 2003. O crescimento dos manufaturados superou a alta geral das exportações, de 32%, mas ficou aquém da ampliação dos básicos, de 34,7%.

*Um dos diretores da RiskOffice, Marcelo Rabbat é consultor de investimentos e também sócio da PR&A, juntamente com Sérgio Malacrida, especializado em modelagem de sistemas de risco de mercado e de crédito.
Autor: Assessoria de Imprensa Web


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