Proibidões: o Marketing do tráfico



Como toda empresa, uma boa parte do orçamento é destinado ao marketing do seu produto. Para a “empresa tráfico” não poderia ser diferente. Intencionalmente ou não, os traficantes acabaram ligando seus interesses com o Funk- ritmo de música jovem feita nas favelas. No entanto, não se trata de qualquer funk, e sim de uma dissidência desta música que ficou conhecida como “proibidões”. Nesse artigo analisaremos que tipo de música é essa, quem são esses cantores e porquê eles decidiram seguir essa linha de música.
O proibidão foi o nome dado aos funks que contam, de forma realista e entusiástica, estórias em que os traficantes impuseram seu poder contra os oponentes (a polícia ou facções inimigas) e fizeram valer sua lei. Os principais temas encontrados nessas letras são: a morte dos inimigos ou dos delatores (denominados como X-9), à veneração aos comandos (como se fossem times de futebol) e aos seus líderes, bem como a incitação ao consumo de drogas, especialmente à maconha e à cocaína (que são os dois produtos vendidos pelo tráfico).
Ao contrário do que a mídia costuma enfatizar, os cantores não fazem parte da rede do tráfico. Trata-se, geralmente, de MCs que moram nas favelas dominadas pelos comandos e que incorporaram os valores da bandidagem como seus próprios e que decidem “homenagear” os líderes da sua comunidade.
A maioria desses cantores afirma que não fazem parte das facções criminosas, e quando questionados sobre o porquê de entoarem esse tipo de canção, eles relatam basicamente três tipos de resposta. A resposta mais frequente compara essas letras à um retrato da vida na favela, como disse o famoso MC Catra “Eu não sou cúmplice do tráfico, sou cúmplice da favela. Não estou fazendo apologia, estou relatando uma realidade” . Os compositores do famoso “Rap das Armas”, Leonardo e Junior também apelaram para o mesmo argumento: “a idéia era falar do visual da favela, mas eu vi que estava faltando alguma coisa e veio a idéia de listar as armas dos traficantes” .
Outro motivo descrito pelos cantores é a falta de oportunidade de escreverem outras letras. Para eles, o mercado do funk impõe essa condição, como relata o MC Galo “nós fazemos umas letras legais e os caras (as equipes de som) não querem tocar. (...) Isso atrapalha muitos os MCs para conseguir show. Nêgo faz apologia porque em comunidades muitas pessoas gostam desse estilo de música. Para a rapaziada não ficar sem show, eles fazem umas letras dessas” .
A terceira razão apontada pelos MCs é a influência dos traficantes no cotidiano da favela. Através de pedidos dos líderes do tráfico, alguns cantores gravaram músicas que depois viraram hits. O relato do MC Duda do Borel transparece essa situação: “A gente mora dentro de uma comunidade, e qual a comunidade hoje em dia que não rola tráfico? Eu moro na comunidade, e dentro dela tem aquele líder. O cara escreveu uma letra em cima da nossa e perguntou se dava para a gente gravar, e aí gravamos. Não foi uma coisa forçada, foi um pedido. A gente respeitava eles, respeita até hoje.”
Existe uma outra razão para existência do proibidão, mas que não foi comentada pelos MCs, pois eles preferem preservar sua imagem. No entanto, sabe-se atualmente que existe um financiamento desse tipo de música pelo tráfico. De acordo com Cabral , os traficantes possuem mesmo uma marca denominada “Trafic Music”que é responsável pela produção (em gravadoras cladestinas) e pela distribuição dessas canções (para ambulantes no centro de grandes cidades).
A razão pela qual esses jovens decidem cantar o proibidão é, na verdade, uma mistura de todos esse fatores que se convergem em um único ponto: a simpatia pelo poder paralelo. Essa simpatia é uma questão crítica, pois significa a idolatria desses jovens pela bandidagem.
Sem dúvidas, o funk é a trilha sonora dos guetos da cidade, e os proibidões cantam a visão de quem está dentro da favela e que enxerga, muitas vezes, o traficante como um herói. Essa glorificação é cada vez mais exaltada, principalmente quando transforma-se em música, pois passa a influenciar diretamente crianças e jovens através de uma transformação de valores.
Nessas canções, não existe mais a vergonha de ser criminoso, ao contrário, glorifica-se esse lado. Ao atingir esse aspecto piscicológico da formação do caráter de um ser humano, uma barreira enorme é transpassada, eliminando-se o reconhecimento entre o certo e o errado, entre o bem e o mal. Diferentemente de muitos defensores do ritmo, a manutenção de letras que fazem apologia à violência trazem mais do que uma simples realidade do morro, mas também o culto à valores deturpados da sociedade, o que afeta diretamente a formação do caráter dos indivíduos que entoam essas músicas.
Luiza Machado: visite o blog O Guia de Paris

Bibliografia:
- CABRAL, Arthur. Nos bastidores do Funk, contrabando de armas, tráfico de drogas. Registro n. 260242. Fundção Biblioteca Nacional. Ministério da Cultura. 2002.

- ESSINGER, Silvio. Batidão:uma história do funk.São Paulo: Editora Record. 2005
Autor: Luiza Machado


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