Reflexão sobre o duplipensar moral onívoro
Qualquer lugar do mundo, século 21. Animais rurais... Sendo de espécie dominada, são tratados como propriedades. Sua existência é. na prática, atrelada a seus senhores ou “donos”. São obrigados a lhes fornecer matéria-prima, recebendo durante a vida apenas alimentação em troca. Como são propriedades, seus senhores se veem livres para lhes causar violências diversas: marcação a ferro quente, fustigações como ordens, espancamentos no caso de demonstração de rebeldia. A liberdade é palavra proibida, um absurdo aos olhos da espécie dominante. Não vivem como fins em si mesmos, por suas necessidades, anseios, prazeres e interesses próprios, mas estritamente para os interesses do senhor que os tem como propriedade. São seres dotados de sentimentos, desejos, anseios e capacidade de sofrer, mas seus “donos” não se importam com isso.
Apesar de tantas semelhanças, enquanto a realidade descrita no primeiro parágrafo desta reflexão é hoje algo visto como abominável, desejando-se que nunca mais se repita, a do segundo parágrafo é largamente consentido, aceito e até defendido hoje em dia sem nenhum pudor ou peso na consciência. É aceitável ainda hoje que os animais sejam tratados da mesma forma que os escravos de antigamente, em nome da nossa alimentação e de outros interesses materiais humanos.
Convido você a refletir: por que isso acontece hoje? Por que, em nome de necessidades já ultrapassadas, ainda nos vemos autorizados a negar qualquer traço de respeito, empatia e compaixão às mais diversas espécies de animais rurais ou aquáticos? Por que, enquanto reprovamos o cárcere e assassinato de humanos, aprovamos o cárcere e assassinato de animais? Por que nossa moral proíbe que usemos, confinemos e matemos seres humanos para nossos interesses mas nos deixa livre para usar, confinar e matar animais de acordo com nossa vontade e conveniência? Por que dois pesos e duas medidas?
Será que vale mesmo que, em nome de nosso paladar, vejamos e tratemos bilhões de animais sem nenhum respeito ou empatia, nos arroguemos no direito de lhes cercear a liberdade e impor um sentido da vida baseado na exploração? Por que resistimos a admitir e aceitar que podemos mudar, nos libertar do duplipensar ético e passar a nos alimentar eticamente, sem sermos cúmplices da crueldade dos pastos, confinamentos e matadouros?
Costumamos ser (ou dizer ser) bons e generosos com o nosso próximo humano. Mas, com os animais rurais que abatemos ou exploramos e os aquáticos que levamos da água para a morte, não estamos sendo nada bons quando optamos por continuar comendo suas carnes e ovos e bebendo seus leites, quando pagamos para que continuem matando-os e roubando-lhes suas secreções alimentares. Enquanto repudiamos os costumes escravocratas dos senhores de escravos do passado, damos apoio aos costumes zooescravocratas dos senhores de animais do presente. Enquanto defendemos e contemplamos os direitos humanos e esperamos para o futuro o fim dos abusos contra mulheres e homens, ignoramos ou negamos os direitos animais e aceitamos para o mesmo futuro a continuidade de todos os abusos e violações éticas do sistema pecuário e pesqueiro. Isso de certa forma nos torna amorais, distantes da nossa autocontemplação como seres morais.
Um argumento comum para aceitarmos a exploração e matança de bichos no meio rural é que nós somos onívoros por natureza e só a pecuária e a pesca em grande escala podem fornecer alimentos para uma parcela mais larga da humanidade. De fato o onivorismo foi a única opção alimentar conveniente para o ser humano por muito tempo, quando ele não tinha conhecimentos avançados de nutrição nem acesso a uma diversidade suficiente de vegetais cultivados em sua região de morada. Mas hoje é diferente: ao contrário dessa época, temos hoje capacidade mais que suficiente para, sem nenhum ônus nutricional, substituir alimentos de origem animal e nos libertar da característica onívora que acompanhou nossa evolução biológica e neurológica por milênios. Assim sendo, a desculpa do determinismo biológico já não serve como antigamente.
Depois de defender acima por que a pecuária e a pesca não são eticamente convenientes e são dispensáveis graças à existência de alternativa alimentar ética válida, apresento a você duas pílulas.
Tomando a pílula vermelha (cor do sangue derramado em abatedouros), você ignorará que seu paladar está, independente de quanto você diz respeitar a ética e gostar de animais, implicando aprisionamento, exploração, sofrimento e morte violenta para um sem-número de animais que poderiam estar sendo poupados de nascer para uma vida miserável e sofrida. Viverá ignorando o sangue e a dor que são o custo de uma alimentação onívora.
Tomando a pílula verde (cor da exuberância vegetal), estará optando por aceitar que uma vida livre de implicações cruéis a outras vidas sencientes é possível. Viverá em comunhão com os direitos de seus irmãos de vida. Passará a ver os animais como seres que possuem tanto direito a viver e ser livres quanto nós. Não estará mais incidindo em evidentes contradições éticas.
A escolha é sua. Saiba melhor sobre o que o vegetarianismo oferece de melhor em ética, saúde e culinária e, em seguida, tome sua decisão.
Autor: Robson Fernando
Artigos Relacionados
Morte Nas Escolas Públicas: Agora Querem Peixes Nas Merendas
Até Tu, Ibama? Até Tu Estimulando A Exploração Animal!
Os Animais
O Novo Ministério Da Morte
Vegetarianismo Também Pelo Ser Humano: Como Melhorar A Conscientização Persuasiva
Animais Devem Ser Sujeitos De Direitos. E O Meio Ambiente Também
Delos é Aqui!