Cirene Ferreira Alves, literatura com criticidade e engajamento social



A escritora mineira Cirene Ferreira Alves, membro da Academia de Letras de Viçosa (ALV), adota o pseudônimo Norah para compor narrativas ricas em descrições do comportamento humano e social. São pessoas do povo que apresentam alguma singularidade, tanto em aspectos psicológicos, comportamentais como na própria condição social. Com espírito engajado, aborda questões de contexto que determinam o destino de seus personagens. Desse modo, desperta no leitor a criticidade necessária para ver o mundo em suas nuances ideológicas e culturais.
Nas obras "Marciela", "Crepe da China" e "Tereza", por exemplo, por meio da ótica feminina, mostra o interior de mulheres e crianças em suas expectativas afetivo - emocionais, submetidas às estruturas marginalizantes do pensamento vigente. Tanto na submissão do gênero, da raça, como na condição do contexto social e familiar, a escritora apresenta ao leitor os resultados do preconceito e da cultura excludente na vida dos personagens, oportunizando, assim, grande reflexão.
Produções como "Marciela" não disfarçam no lirismo comedido a grande sentença do preconceito e a mutilação social a que são acometidas mulheres em todo o Brasil, exploradas como objeto de consumo e do prazer sexual. Nelas, grandes narrativas que compõem um acervo de verdades da maior criticidade, embora reveladas com a sutileza de um discurso harmônico e suave.
Suas obras não omitem valores importantes nem abstêm da denúncia contra a marginalização do ser pelo puro conformismo e banalização morais.
A autora cede à nossa leitura por meio de seus livros "Saudades em dois tempos", "Páginas para serem lembradas" e, agora, na coletânea "Livre Pensar Literário" narrativas extraordinárias que melhor apresentam sua ótica engajada e conscientizadora. "Crepe da China" permite ao leitor saborear a tecitura cuidadosa e bem acabada de um discurso em que exalta a sensibilidade e a ilusão da infância das meninas brasileiras, realçando-lhes, no entanto, as privações da condição socioeconômica e afetiva. Nela, a realidade excludente a que são submetidas muitas crianças do nosso país. Lançando mão, de forma intencional, da omissão do nome, a autora (a protagonista é simplesmente "uma menina", assim denominada), mostra como se generaliza tal condição pelos rincões desse país, transcendendo do universo de identidade individual e assumindo um caráter universal.
Na obra "Tereza", podemos vislumbrar a busca da essência na figura que se insere à margem das políticas públicas, despida de direitos e da mínima atenção da sociedade. O indivíduo se vê subjugado por questões de gênero, raça, afetiva e socioeconômica, num quadro que descreve minuciosamente tal condição. A autora veste-se de uma narradora onisciente para trazer do interior dos personagens verdades valiosas, riquezas escondidas aos trapos pelas mazelas que os acometem. Sutilmente, despe-os dessa carcaça rotuladora e evidencia a beleza que é parte comum a todos os gêneros, raças, credos e condições sociais.
Autor: Bruno Resende Ramos


Artigos Relacionados


Iasmine Zaidan é Uma Das Grandes Revelações Do Projeto Nova Coletânea

A Epifania Em Clarice Lispector

O Confortável Sofá Amarelo Bem Clarinho..., De Lygia Bojunga Nunes

Convergências E Divergências Entre "a Cartomante'' E O Filme " Central Do Brasil": Machado De Assis E Walter Sales

Inclusão Social: Um País De Valores

Resenha Do Livro: O Quinto Mandamento - Caso De Polícia De Ilana Casoy

O Ritmo Das Narrativas