BATAM OS SINO PEQUENINOS...



Batam os sinos pequeninos...
Conheça a vida de menores infratores dentro de uma unidade de detenção, a carência, os sonhos, família e volta por cima, saiba também o que pensam os funcionários e como um voluntário tem influenciado a vida deles!

Quando passamos por menores abandonados, e isso ocorre diariamente, temos normalmente duas reações, a de fuga e a de a de agressão. Fuga quando saímos de perto, passamos do outro lado da calçada, avançamos sinais. Agressão quando os expulsamos dos nossos estabelecimentos, fechamos o vidro do carro, olhamos de cara feia.
Acompanho a rotina de menores infratores a aproximadamente dez meses, quando aceitei ser professor auxiliar de percussão na EJLA( Escola João Luiz Alves).
Olhando de dentro para fora, vemos que o problema do lado de dentro é tão grande quanto fora, sendo que quem vigia do lado de dentro são os agentes do DGASE, quem vigia do lado de fora, muitas vezes é apenas o travesseiro!
Ali encontramos diversos casos e nesta época natalina a maioria sente a falta da família, até mais do que de bens materiais, tão buscados por nós nesta época, pois vêem de família desestruturada e depois de trancados lá dentro, são esquecidos. “O mais difícil para mim é o abandono da família, o que os deixa sem referencia”, afirma Eloise faccioli( assistente social na EJLA). Temos o hábito de varrer o lixo para debaixo do tapete, Talvez seja mais fácil obter um cadeado do que ferramentas para adestramento de uma fera. Será que amarramos bem o cadarço do tênis novo, paralizamo-nos diante de aparelhos eletrônicos, trancamo-nos em carrões, em casas novas, para domesticar a fera que talvez também exista em nós?
Talvez de fora o muro seja alto de mais para se enxergar lá dentro, o que nos deixa somente com nossos rótulos e paradigmas. Olhando pelo lado de dentro somos obrigados a refletir sobre crime, pena e recuperação, pois não somos todos criminosos, roubando o patrão, roubando a alegria dos outros, tratando mal os filhos, a mulher, os funcionários, os menos favorecidos, não matamos sonhos dos que estão a nossa volta e não usamos muitas vezes a droga do abandono, do desprezo, do desrespeito, do preconceito, a droga do “jeitinho (ilegal) Brasileiro”? “Quando fiz o concurso não imaginava que me sentiria tão realizado no trabalho, hoje toda manhã quando entro na unidade, agradeço a DEUS por cada menino que já ajudei, sinto-me solidário e satisfeito, não olho para eles pelo que fizeram lá fora, não tenho que puni-los novamente, eles já são punidos em estar aqui dentro, não gosto de covardia” afirma Marcos Poubel (Sub-diretos da EJLA) e completa dizendo: “recupera-los não é difícil, o ECA- estatuto da criança e do adolescente, deveria ser seguido a risca em todas as unidades, pois ele prevê assistência médica, assistência religiosa, lazer, cursos, máximo de 40 por modulo, etc. Valeria Luz(Diretora da EJLA) trabalha com menores á 12 anos e diz nuca ter se sentido ameaçada “tenho uma equipe muito boa, eles me preservam quanto mulher, filtram muita coisa, os meninos me respeitam, sempre olho nos olhos deles, pergunto a eles numa época como essa, o que poderiam ter feito para não estarem aqui e que no ano que vem não quero mais vê-los aqui, alguns já até voltaram para agradecer, acho que se um for recuperado já vale todo o trabalho”! Na unidade hoje há 112 internos, divididos em módulos, a capacidade é de 120 internos, há 70 agentes, divididos em 15 por plantão, com escala de 24Hs X 72Hs. Os menores teêm cinco refeições e são elas: café da manhã, almoço, café da tarde, jantar e ceia , estudam no colégio estadual que funciona dentro da unidade, chamado Candeia, tem atividades esportivas, sala de TV, além dos cursos profissionalizantes oferecidos; informática, mecânica, serigrafia, refrigeração, recarga de cartuchos e lanternagem.
Valéria implantou em 2005, aulas de percussão, trazidas pela assistente social Eloise faccioli, as aulas dadas por Lucas Ciavatta( mestre em educação pela UFF, licenciado em musica pela UNI-RIO e criador do “método do passo”), foram um diferencial na unidade.
Lucas diz ter aceitado o convite porque se sentiu desafiado e que queria contribuir de alguma forma, Lucas iniciou em abril de 2005 e trabalha como voluntário, tem como auxiliar Gabriel Aguiar e Luciano Pierre, as aulas são dadas as sextas feira, das 15h30min ás 17Hs. “Sabia que as aulas dariam certo, o passo trabalha com muita coisa cultural e muita coisa natural, como o andar e as palmas, o menor infrator anda e bate palma, as aulas aqui são as mesmas que dou tanto para alunos de classe média, quanto para mestrandos em musica nos EUA, no passo o aluno se apropria do saber, isto facilita muito. Afirma Lucas
Todo relacionamento é uma troca, os meninos aprendem percussão e você o que aprende? O respeito aqui é muito claro, tenho aprendido muita coisa aqui dentro, mas o mais importante, é que tenho aprendido a ser melhor professor, nunca levantei a voz com eles, coisa que lá fora, as vezes nos permitimos para encurtar o caminho do silencio!
Lucas faz questão de ressaltar que o apoio da diretoria foi fundamental, além da presença da Eloise nas aulas. ” No meu trabalho aqui tenho que ser criativa, quando sou criativa me sinto bem, por isso trouxe o Lucas, minha filha faz aulas com ele, eu queria ver que impacto traria na vida dos meninos, eles muitas vezes vêem em mim a chance de sair, sabem que sou muito fiel no meu relatório, tenho que analisar o comportamento deles, a trajetória da família, a do menino na família enquanto aqui dentro e quando lá fora, assim busco meios de ajuda-los, inclusive participando das aulas, não abro mão do meu agogô”! Alguns meninos que freqüentavam as aulas tiveram os comportamentos mudados, o que os levou a L.A (liberdade assistida) mais rápido.” sei que não é só musica, é concentração e disciplina” declara Poubel.”Para mim foi um premio dado a eles, pois demonstraram até mais interesse pelos outros cursos, diz Eloise. Gabriel diz que quando o Lucas disse que ele iria com ele para EJLA, só não o achou louco porque talvez seja um pouco também, mas se sentiu motivado e desafiado, “ sei que não é só fazer o bem, mas saber como, tem que saber que ferramentas usar, o passo é uma que tem dado muito certo, tenho visto mais aproximação com a família, expressões mais calmas, ajuda entre si, sorrisos e muita vontade de acertar”! Gabriel você afirma estar lendo a bíblia, mesmo sem ser evangélico ou coisa assim, a base da bíblia é o amor, você acha o fato de estar na EJLA um ato de amor? “o ato de ensinar sempre é um ato de amor ao próximo, quanto mais você se dá, mais você recebe! Por isso você chorava ao final de uma apresentação com os meninos? “sim, vi o trabalho dando certo, o que recebi ali não tem preço”!
Valéria tenta hoje implantar a percussão no pólo profissionalizante, para que os meninos postos em liberdade possam freqüentar as aulas, coisa pedida por eles, J (um menino posto em liberdade) disponibilizou seu contato para que fosse chamado para as aulas, w se tornou um referencial nas aulas e no momento que recebeu a liberdade e soube que sairia na quinta feira, pediu à direção que retivesse o documento oficial, só para poder fazer sua última aula. “Quero me reunir com o Lucas e a Nina coordenadora dos CRIAN (centro) para vermos essa possibilidade”. Diz Valéria.
Quando cheguei ao portão da EJLA no primeiro dia sentia cheiro de morte, pensava como muitos, que já não havia mais jeito para esses meninos, mas do lado de dentro sentimos o cheiro da vida, o pulsar de cada um esperando um presente, não um presente dado pelo papai Noel ou simplesmente a liberdade, mas um presente dado pela vida, um presente dado por mim e por você, um presente que não cabe em uma meia nem debaixo de uma arvore, um presente do tamanho do coração deles, um presente chamado: nova chance.
Quando nosso chefe nos admitiu ele não viu quem éramos e sim quem podíamos ser, quando sua esposa ou seu marido te viu, não pensou apenas na pessoa jovem e imatura que se apresentava pro namoro, pensou em quem você poderia se tornar ao lado dela(e), quando seu filho olha para você, ele não vê o chefe, o defeituoso ou o certinho, ele vê um apoio na hora da nota vermelha, uma força na briga no colégio ou simplesmente um colo, quando você olhar para seu filho lembre-se que ele poderá ser um menino desses, não será se você o amar e aconselhar. Quando você olhar para um menino desse, lembre-se que ele poderia ser seu filho, seu amigo, seu chefe, seu marido, não é porque alguém não o amou, mas poderá ser se começarmos a fazer algo!!!!!!!


Por Luciano Pierre Dos Santos
Autor: LUCIANO PIERRE


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