A árdua tarefa de ser soldado da BM



Confesso que votei a favor da proposta enviada pelo Comando da Brigada Militar na semana passada a fim de ser apreciada pela corporação. Votei a favor porque, de forma superficial, verifiquei que havia um aumento importante para o soldado, diferentemente da proposta anterior. E votei, mesmo sabendo que iria ser prejudicado enquanto primeiro sargento, porém respeito e admiro aqueles que rejeitaram a proposta por vislumbrarem a possibilidade de galgarem a um aumento verdadeiramente substancial.
Também acho justa a reivindicação dos Oficiais Superiores da Brigada Militar, que com um argumento coerente esperam que se cumpra por parte do governo o que fora prometido, por ocasião do aumento dado aos Delegados de Polícia, ambos ocupantes de cargos de similar importância em suas respectivas instituições.
Portanto, a luta de ambas as categorias é justa. Porém destaco, em especial, a luta dos briosos soldados da Brigada Militar do Estado do Rio Grande do Sul, que com os seus poucos ganhos mantêm suas famílias.
Nessa linha cabe, então, uma reflexão sobre a atividade do soldado. A fim de compartilharmos com nosso leitor um pouco da sua labuta diária. Ao entrarem na força policial, aos alunos soldados da BM são ministradas matérias de cunho humanístico, técnicas policiais, saúde física, defesa pessoas e muitas de legislação aplicada à função, dentre outras.
Quando formados a população os aguarda, são agora os recrutas – é assim que são chamados os novos policiais recém formados – saem para as ruas de mãos para trás, farda passada, barba bem feita e uma cadeia hierárquica para fiscalizá-lo.
E digo isso por que já fui um soldado. Como referi, hoje sou sargento, mas não deixo de respeitar um bom e honesto soldado. Alias, ser honesto nesse país é coisa de quem tem princípios bem enraizados.
Coronéis, Majores, Capitães, Tenentes e Sargentos, têm também sua importante função na corporação, mas em sua maioria trabalham em nível de fiscalização e administração, mas ser soldado reconheço, não é fácil.
Lidar na linha de frente, atendendo centenas de chamados durante a semana, com os mais variados problemas alheios, consequentemente, leva um soldado às raias da loucura. Sim, e digo isso sem exageros.
Um bom soldado não subestima nenhuma ocorrência policial, ele sabe que o ser humano é sempre imprevisível, na semana passada dois policiais atenderam a um chamado de uma briga familiar. No local um cenário de violência e pobreza, o marido agressor tentou atingir um dos policiais com um facão. Outro dia um marido ensandecido mordeu um soldado na mão e, um terceiro caso, o agressor entrou em luta corporal com o policial. Depois de contido foi verificado que o detido era portador do vírus HIV.
Um soldado da BM sabe que nenhuma ocorrência é igual à outra. Podemos relacionar algumas das inúmeras intervenções policiais, tais com contenção de loucos, viciados e demais doentes violentos, trocas de tiros, prisões de traficantes, de ladrões de carga, carros e bancos, dentre outras tantas.
Fora isso, ainda deve enfrentar as históricas delegacias lotadas. Nas madrugadas é normal verificarmos policiais da BM aguardando a lavratura de flagrantes, muitos já fora de seu horário de trabalho, isso quando não tem seu trabalho desmerecido pelo entendimento da autoridade policial – o Delegado – de que o fato não merece a detenção do criminoso, nesse caso o policial fica preenchendo fichas e o então detido em flagrante (preso pelo soldado da Brigada Militar que “in locu” presenciou o crime) sai à passo.
As viaturas policiais não param nunca, as intervenções em geral se relacionam com o sofrimento, à violência, à criminalidade e à miséria, isso tudo traz, inevitavelmente, uma pesada carga emocional.
Mas a sociedade e a cadeia de comando exigem que o soldado BM atue de forma incorrigível, que verifique fatos e não pessoas. Os erros são fatais a um soldado BM.
Em geral o comando espera que o soldado BM não traga problemas para o trabalho, mas como isso é possível se as adversidades são tamanhas? Muitas vezes, ao tentar resolver os problemas dos outros, o soldado BM acaba encontrando um problema para si. Então chegam os Inquéritos Militares as Sindicâncias e os Procedimentos Disciplinares.
Não é fácil ser soldado BM com uma arma da cintura e uma farda no corpo e o mundo esperando uma ação justa, eficiente e legal.
E nem sempre o soldado da BM está preparado para dar a resposta que a sociedade espera. Em realidade, o soldado da BM vive um dilema, por vezes a sociedade exige que o policial seja violento e atue com truculência, gritos como: “bate nesse vagabundo” ou “bandido bom é bandido morto”. Mas se o criminoso é filho ou parente destes que gritam, o soldado da BM passa a ser o arbitrário, o inimigo, o criminoso e o violento.
Mas as dificuldades do soldado da BM começam em sua vida pregressa, sim, pois os jovens que entram na polícia militar geralmente vêm das camadas mais pobres da sociedade, já nasceram e conviveram com a diferença social. Sempre lutaram muito para receberem o pão de cada dia, agora defendem o Estado e o cidadão.
O verdadeiro soldado da BM é honesto, respeita a sociedade, ama sua profissão e busca agir de forma íntegra e correta, sem arbitrariedade ou violência. E, a única coisa que ele espera é poder trabalhar em paz, ter o reconhecimento da sociedade, de seu comandante mediato e imediato. Do governo, espera apenas, condições adequadas de trabalho e um salário que seja condizente com a árdua tarefa de ser soldado da Brigada Militar.
Autor: Geverson Aparicio Ferrari


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