A Dengue no MS: aqui (não) é assim mesmo?



Bem, hoje poderia estar escrevendo um artigo que tratasse de coisas boas, mas, devido às ocorrências com relação à dengue, prefiro centrar as atenções neste tema de relevância coletiva. Não quero ser rotulado ou estigmatizado apenas como mais um “crítico de plantão”, entretanto, no meu ver, toda crítica deve ser bem-vinda, pois, traz vigor ao debate e ninguém está imune a possíveis críticas! Afinal de contas, antes de qualquer coisa, é essencial aceitar a existência de falhas, defeitos e problemas, e, quando são reconhecidos, podem servir para realinhar as ações de forma eficiente.

O artigo que inicio agora é simples, porém espero que seja pertinente aos dias que estamos vivendo. Sempre ouvimos a frase: “Tudo na vida tem sua primeira vez!”. Em 2007, tive minha primeira vez! Cheguei a Campo Grande e, em poucos dias, comecei a ter vários sintomas, como: dores no corpo, mal-estar e febre. No meu entender, era pouco provável que estaria com dengue, até porque, sempre pensamos que coisas ruins só acontecem com os outros.

Naqueles dias, minha vida estava atribulada e tinha um compromisso inadiável em Dourados, então segui até aquela cidade. Durante a viagem, o mal-estar foi piorando, de tal modo que resolvi, por bem, procurar um médico. Fui até o Hospital Universitário e, após consulta, tudo indicava que era dengue. O resultado do exame confirmou, eu entrava para as estatísticas da dengue, ou seja, era mais uma vítima da epidemia que aterrorizava o Mato Grosso do Sul em 2007.

Vindo para os dias atuais, e com o devido respeito, parece que a memória de nossa população é curta. São cada vez mais comuns as notícias sobre o aumento no número de casos de dengue no Estado do MS. Para exemplificar, segue a manchete do Jornal do Povo (Campo Grande, edição de 27 e 28/02/2010) que foi “Dengue registra aumento de 109%”.

Outro meio de comunicação, agora fora do Estado do Mato Grosso do Sul, também oferece cenas do pesadelo que estamos vivendo no Brasil e especialmente no Mato Grosso do Sul. O artigo de Daniela Lima, intitulado “A dengue entre nós” (Correio Braziliense, edição de 27/02/2010) que apresentou dados sobre a situação de dengue no Brasil, e infelizmente, o Mato Grosso do Sul era o 2º no ranking nacional em número de casos, perdíamos somente para o Estado de Goiás. Somos um estado pouco populoso e já contabilizávamos 21.050 casos. São Paulo, que é bem mais populoso, estava com 2.930 casos. Os números já falam muito. É inegável que nossa situação é uma das piores no Brasil.

Mais recente é a matéria assinada por Paulo de Tarso Lyra (Valor Econômico, edição de 22/03/2010) que tem no próprio título a gravidade do problema: “Cinco Estados concentram 70% dos casos de dengue neste ano”. O texto aponta que: “[...] mais de 70% dos casos de dengue registrados no país ficaram concentrados em cinco Estados. De acordo com dados do Ministério da Saúde, Rondônia, Acre, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Goiás registraram 77.117 notificações das 108.640 confirmadas em todo o país. Em 2009, no mesmo período, foram registrados 51.873 casos de dengue em todo o Brasil. Apenas cinco municípios - Campo Grande (MS), Goiânia (GO), Aparecida de Goiânia (GO), Rio Branco (AC) e Porto Velho (RO) apresentaram mais de 30% dos casos de dengue, mostrando que o agravamento da doença está se dando no Centro-Oeste [...]”.

Quem procura entender o que é a dengue; como ela pode se proliferar; o que ela causa, e principalmente, como preveni-la, tem a convicção de que a culpa dessa infestação da doença é do povo.

Exterminar a dengue pode até parecer uma tarefa fácil, mas, não é! Os obstáculos aos esforços para exterminar a dengue são imensos. Grande parte da população não cumpre com sua responsabilidade, esquecendo-se da cidadania. É bom lembrar que esse esquecimento ocorre em todos os níveis da sociedade, entre os ricos, pobres, brancos, pardos, negros, jovens, adolescentes, idosos, enfim, todos têm sua parcela de culpa.

Estou no Mato Grosso do Sul há pouco tempo e, dia desses, conversando com uma pessoa natural daqui, papo vai, papo vem, até chegarmos ao assunto dengue. Falávamos justamente do compromisso individual que devemos ter com a cidadania para a prevenção da dengue. Os comentários se davam em torno dos inúmeros terrenos baldios que estão sujos, cheios de mato e com possíveis criadouros de dengue, mas, de repente, essa pessoa de voz mansa advertiu: “Não se aborreça, aqui é assim mesmo!”.

Em dia inspirado, não quis ser deselegante, mas não concordo com os dizeres conformistas “aqui é assim mesmos”. Creio ser mais grave ainda, aceitar os problemas como algo normal.

Será que é correto, corrermos risco de vida por causa de pessoas que não têm consciência coletiva? Quando andamos pelas ruas e nos deparamos com terrenos, canteiros e calçadas cheias de lixo por negligência e desleixo, temos que achar normal e, em breve, fazer igual? Será que é certo ter que contratar pessoas para fiscalizar e limpar vasos, quintais e até terrenos particulares? É certo todo ano o Brasil gastar “rios de dinheiro” em campanhas contra a dengue justamente porque nunca aprendemos a lição? Será que é assim mesmo?

Felizmente, isso não se aplica a todos os cidadãos. Há muita gente preocupada com a cidadania. Pessoas que respeitam seu espaço, o espaço do outro e principalmente, as áreas públicas. Claro que nunca podemos generalizar, ou seja, não tornando a exceção como fosse uma regra.

Acredito que a solução exista e se chama educação, mas não essa educação “bancária” dos bancos da escola, mas sim, uma educação reflexiva que forme cidadãos críticos. Pena que a maioria de nossos políticos não valoriza a educação, quer que sejamos seres que “não pensam” e “nada críticos”. Não é lei nem regra geral, apenas uma constatação, a grande parcela de nossos políticos quer um aluno leitor de revista em quadrinhos e admirador da porcaria do Big Brother Brasil.

Precisaria existir um rompimento com esse conformismo anacrônico, do contrário, continuaremos sendo vulneráveis a problemas, como não conseguir erradicar o mosquito Aeds aegypti.

Há muito a discutir sobre o combate à dengue, em que a complexidade do problema impõe a busca de alternativas controversas e muitas vezes ineficazes.

Se o seu quintal ou terreno estiver sujo, com possíveis focos da dengue, nem é preciso falar do perigo que você, sua família e seus vizinhos estarão correndo. Pare, reflita e tome as medidas necessárias. Mude sua atitude!

Artigo publicado no jornal Folha do Povo - Campo Grande (MS) - Ano XII, no. 3.625, edição de 15 de abril de 2010, p. A-2.

Artigo publicado no sitio eletrônico Campo Grande News, de 20 de Abril de 2010.
Autor: Marçal Rogério Rizzo


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