A Evolução Da Criminologia



INTRODUÇÃO:

O objetivo desse trabalho é fazer algumas reflexões sobre a evolução histórica da criminologia, procurando destacar as posições das escolas clássica, positiva e crítica. A preocupação com essa temática surgiu a partir da leitura dos livros de Molina e de Alessandro Baratta, quando trazem uma abordagem político-econômica para a compreensão da criminologia. O que mais chamou a atenção dessa concepção foram os elementos caracterizadores da defesa social em que a proteção do Estado (nação) e dos bens matérias (propriedade) estavam colocados acima da proteção humana. Assim, a criminologia passou a ter um outro eixo.

É nesta concepção que nos apoiamos para compreender o processo evolutivo até chegar às escolas críticas da criminologia. Para tanto, no primeiro momento, aborda-se a posição das escolas clássicas e positivas até chegar à criminologia dos dias atuais.

Em 1764, O Marquês de Becaria teve a ousadia de enfrentar os costumes penais da época, publicando uma obra clássica e de leitura obrigatória para todos que se interessam pelas ciências criminais. "Dos delitos e das penas", que consagrou princípios existentes até hoje, apresentando as primeiras idéias de um direito penal que valorizasse e respeitasse a pessoa humana. Este livro veio num momento de grande revolta estatal ao absolutismo, momento de inconformismo social, enfim, o livro veio na hora certa. O autor traz em sua obra alguns princípios de uma grande importância: a proporcionalidade das penas (segundo o mesmo, as penas deveriam ser proporcionais ao delito); a necessidade de que as leis fossem elaboradas pelo poder legislativo e que houvesse outro poder para aplicação das leis (o judiciário), o juiz deveria aplicar ao caso concreto, sem nenhuma interpretação (nos dias de hoje sabemos que isso não é aplicado); fim da penas de morte, para o autor, elas eram cruéis, corporais, ultrapassavam o acusado (família); era contra a prática de tortura, inquisição; necessidade de que as condenações fossem de forma pública.

Com base na concepção iluminista, Becaria tinha como objetivo alterar as ações criminais medievais para uma maior humanização do direito penal. Essa fase é chamada de pré-científica, na qual predominava um pensamento do direito penal clássico. Para este autor, o crime era visto como abstração normativa; na lei existiam descrições abstratas do crime.

Apoiando-se no pensamento de Silva Filho (1996), quando faz uma análise dos sistemas penais de hoje: o discurso da "inferioridade latino-maricana", em que a tipificação do crime tomando por base os valores religiosos, onde o criminoso era submetido aos ditames eclesiásticos perante o Tribunal do Santo Ofício (Tribunal da Inquisição). O mesmo analisa as noções de subcultura de Alessandro Baratta. Para Silva Filho, essas noções criam ideologias, sendo tal modelo bem sintetizado no que chama de ideologia da "defesa social". Baratta faz uma análise do princípio da culpabilidade, onde "o delito é o resultado de uma postura interior com alto grau de reprovação, pois é contrário aos "bons " valores e normas da sociedade". No Brasil, encontramos a presença desse princípio na reforma de 1814 do código penal. Vale ressaltar, que o primeiro código criminal do Brasil de 1830 tomou como base o pensamento de Becaria. Esse código foi tido como um dos mais avançados do mundo.

1.0– POSIÇÃO DAS ESCOLAS CLÁSSICA E POSITIVA SOBRE CRIMINOLOGIA

Ferri (1999), no século XIX, faz uma associação entre a fase pré-científica e a fase científica, onde o crime era visto como fato individual e também como uma abstração normativa (ele não era visto do ponto de vista social). O que levaria o indivíduo ao cometimento do deliro?. O crime era um comportamento humano que se enquadrava no comportamento penal, sendo apurado através de um método formal, abstrato e dedutivo. No final dessa fase, começaram a surgir alguns pesquisadores nas áreas da psiquiatria, que associaram o crime a uma cautelosa observação. Foi feito um estudo profundo acerca do delinqüente, de forma fracionaria, isolada.

No final do século XIX intensificou-se o estudo das ciências, surgindo à fase científica. Os pensadores formaram o movimento do positivismo, começando a propor o estudo da criminologia através de um método causal explicativo. Os principais pensadores dessa época foram: César Lombroso, Henrico Ferri, Rafael Garófolo. Eles buscaram estudar através de um método causal-explicativo. A criminologia vai se preocupar agora com a causa, com o comportamento. Os fundamentos da pena são sobre a personalidade do criminoso, sua periculosidade, sua capacidade de adaptação e não sobre sua natureza. O crime não é só um comportamento individual, mas também é um fato humano e social. A criminologia desloca o centro da norma para a realidade. Nesta fase predominou o pensamento da escola positiva (nova maneira de ver o direito penal).

Com base na concepção de Conceyção Penteado (2000), César Lombroso, médico psiquiatra italiano, dedicou seus estudos às características físicas do criminoso. Para ele, o infrator já nascia com traços físicos que poderiam identificá-lo como tal. Tais estigmas físicos do criminoso nato, segundo Lombroso, constavam de particularidades: a forma da calota craniana e da face, bem como detalhes quanto o maxilar inferior, fartas sobrancelhas, molares proeminentes, orelhas grandes e deformada dessimetria corporal, grande envergadura de braços, mãos e pés. Hoje em dia, sabemos que essa teoria está superada, mas, em alguns casos, ainda há persistência; certas pessoas em razão de elementos biológicos herdados apresentam uma maior predisposição ao cometimento de crimes.

Henrico Ferri (1999) vai dar continuidade aos estudos de César Lombroso, chegando à conclusão de que não bastava a pessoa ser um delinqüente nato, era preciso que houvesse certas condições sociais que determinassem a potencialidade do criminoso.

Em 1824 Rafael Garófolo escreve um livro chamado de "Criminologia", passando, com isso, a batizar a ciência. Neste livro, Garófolo amplia o estudo da criminologia, sugerindo para esta um estudo jurídico; ele estudou o crime, o criminoso e a pena. Ademais, propôs que dentro da criminologia existiria o conceito do crime, que seria: "fenômeno natural de ofensa aos sentimentos de piedade e probidade de um grupo social".

A criminologia ganha, a partir dessa fase, autonomia e status de ciência. A escola positiva generaliza o emprego do método empírico, no qual a análise, a observação, e a indução substituem a especulação e o silogismo, superando o método abstrato formal e dedutivo do mundo clássico.

De fato, como advertiu Ferri (1995), a luta de escolas (positivismo versus classicismo) não foi senão, um enfrentamento entre partidários do método abstrato, formal e dedutivo (os clássicos) e os que propugnavam pelo método empírico e indutivo (os positivistas).

"Falamos de duas linguagens diferentes. Para nós, o método experimental (indutivo) é a chave de todo conhecimento: para eles, tudo deriva de deduções lógicas e da opinião tradicional. Para eles, o fato deve ceder lugar ao silogismo; para nós, a ciência requer um gasto de muito tempo, examinando os fatos um a um, avaliando-os, reduzindo-os a um denominador comum e extraindo deles a idéia nuclear".

2.0– POSIÇÕES CRÍTICAS SOBRE A CRIMINOLOGIA

Alessandro Baratta, (1999) em seu clássico do direito contemporâneo "Criminologia", oferece ao leitor uma breve amostra de sua riqueza científica, filosófica e política, apresentando uma teoria criminológica de maneira sistemática e original. O autor analisa as aquisições das teorias sociológicas sobre crime e controle social com os princípios da ideologia da defesa social, colocando em pauta uma política criminal alternativa.

Essa temática trazida por Baratta, nasceu contemporaneamente à revolução burguesa, e, enquanto a ciência e a codificação penal se impunham como base primordial para o sistema jurídico burguês, a ideologia da defesa social assume o predomínio ideológico dentro do específico setor penal. O autor reconstrói o conceito dessa ideologia, com base nos seguintes princípios. Dentre eles: princípio de legitimidade, princípio do bem e do mal, princípio de culpabilidade, princípio da finalidade ou da prevenção, princípio de igualdade, princípio do interesse social e do delito natural.

"O conceito de defesa social é o ponto de chegada de uma longa evolução do pensamento penal e penitenciário, e como tal representa realmente um progresso no interior deste. E todavia, do ponto de vista da crítica da ideologia e da capacidade de analisar realisticamente, e portanto também de projetar racionalmente as instituições penais e penitenciárias, a ciência do direito penal apresenta um notável atraso com relação à interpretação quedesta mesma matéria se faz hoje no âmbito das ciências sociais (sociologia criminal, sociologia jurídico-penal)."

Alessandro Baratta (1999), ainda fazia referência ao desvio secundário das "carreiras" criminosas, que põem em dúvida o princípio do fim ou da prevenção e, em particular, a concepção reeducativa da pena. Na verdade, esses resultados mostram que a intervenção do sistema penal, especialmente as penas detentivas, antes de terem um efeito reeducativo sobre o delinqüente, determinam na maioria dos casos, uma consolidação da identidade desviante do condenado e o seu ingresso em uma verdadeira e própria carreira criminosa.

Percebemos, infelizmente, que boa parte da população excluída da relação de consumo (imposta por uma sociedade capitalista extremamente injusta e desigual), sem nenhum bem-estar e desprovida de qualquer esperança de sucesso econômico tende a buscar a alcançar as metas socialmente fomentadas através de um "Estado Paralelo" que, de alguma maneira, oferece a esses excluídos meios (trazendo a idéia de inferioridade do texto de José Silva, para este, existente na América Latina), ainda que ilícitos, para obtenção dessas metas e para suas satisfações.

Molina (2000) apresenta fundamentais características da criminologia, dentre elas, o seu método (empirismo e interdisciplinariedade), antecipando o objetivo (análise do delito, delinqüente, da vítima, e do controle social) e suas funções (explicar, prevenir o crime, intervir na pessoa do infrator e avaliar os diferentes modelos de resposta ao crime). O autor faz uma abordagem moderna acerca da matéria, em plena sintonia com os conhecimentos atuais do saber empírico. Mas pretende respeitar, ao mesmo tempo, as origens desta disciplina e a experiência acumulada por ela depois de um século.

"A criminologia pertence ao âmbito das ciências empíricas significando, que seu objetivo (delito, delinqüente, vítima e controle social) se insere no mundo real, do verificável, do mensurável, e não dos valores. Que conta com um sólido substrato ontológico, apresentando-se ao investigador como um fato a mais, como um fenômeno da realidade."

CONCLUSÃO

Dessa forma, podemos concluir que não existe uma causa da criminalidade, o crime não decorre por um determinado segmento. É complexo, pois é o produto de determinados fatores.

O desenvolvimento de uma visão criminológica crítica no Brasil tem sido lento. As razões para este comportamento dos estudiosos brasileiros devem ser analisadas desde a opção ideológica bastante definida da criminologia crítica até as dificuldades políticas internas enfrentadas, que ocasionaram certo isolamento cultural, do único país de língua portuguesa da América latina, passando pela formação eclética dos percussores do estudo criminológico brasileiro.

Para finalizar este estudo, chega-se à conclusão de que, atualmente, o crime e o criminoso têm que ser estudados tanto em relação normativa quanto empírica. O crime tem que ser um disciplinado objeto de estudo de previsão e prevenção do direito penal. Criminologia e direito penal têm que atuar em conjunto para que permita ao Estado uma política criminal que consiga, efetivamente, prevenir e controlar a criminalidade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BECARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. Tradução José Cretella Junior e Agnes Cretella, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,1996.

BARATTA, Alessandro. Criminologia Crítica e Crítica do Direito Penal: Introdução à Sociologia do Direito penal, Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1999.

ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Em Busca das Penas Perdidas: a perda de legitimidade do sistema penal. Tradução de Vânia Romano Pedrosa e Amir Lopez da Conceição, Rio de Janeiro: Revan, 1991.

GOMES, Luiz Flávio; PABLOS DE MOLINA. Criminologia. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.

FERRI, Enrico. Programa de Direito Criminal. Tradução Paolo Capitanio, 1999, 2° ed. Bookseller, Campinas.

SILVA Filho, José Carlos Moreira da. Da "invasão" da América latina aos sistemas penais de hoje: o discurso da "inferioridade" latino-americana. IN: WOLKMER, Antônio Carlos. Fundamentos de História do Direito. Belo Horizonte: Del Rey, 1996.

PENTEADO, Conceyção. Psicopatologia Forense. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2000.


Autor: JULIANA MOTA


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