A Responsabilidade Socio-ambiental da Produção Agropecuária Brasileira



Conservador é o que conserva; favorável a manutenção de uma determinada situação, quem se opoe a mudanças radicais.
Conservadorismo é a defesa da manutenção da ordem social ou ordem política existente,
em contraposição às forças que buscam a inovação.
A atitude conservadora também pode ser entendida como uma reação defensiva,
visando à preservação do status quo,
em oposição às tentativas de mudança ou ruptura.


Na parábola dos talentos, Jesus Cristo ensinou a humanidade a necessidade de aproveitar os benefícios concedidos por Deus, para fazer produzir e multiplicar seus efeitos. Na oportunidade, ele demonstrou com maestria que daquele que não fizer uso dos talentos, para realizar tudo o que estiver ao seu alcance de forma a contribuir para vicejar os dons divinos: “tirar-se-lhe-á mesmo o que pareça ter; e seja esse servidor inútil lançado nas trevas exteriores, onde haverá prantos e ranger de dentes" ( Mateus, 25 :14 a 30 ).
A discussão atual na política rural brasileira, principalmente referente ao Código Florestal, remete de forma incisiva para essa realidade. O Brasil tem uma enorme responsabilidade socioambiental com o restante da humanidade, e está deixando ela de lado em nome de um conservadorismo exacerbado. Vejamos o quadro em que se insere a produção agropecuária brasileira.
Do ponto de vista global, temos hoje 1 bilhão de pessoas que passam fome, em uma população de 6,7 bilhões. O crescimento populacional acelerou depois da revolução agrícola e industrial, considerando o modelo de fertilidade média, a população mundial vai atingir 9,4 bi em 2050. A população mundial deve continuar crescendo até 2200, chegando a estabilização com 10,7 bilhões de habitantes.
Em consequencia disso, dos quase 8 ha que haviam disponíveis para cada habitante do mundo, hoje restam 1,7 ha / hab, e serão 1,6 ha /hab em 2050. Para a agricultura, eram 1,1 ha / hab em 1960, e em 2030 serão menos de 0,3 ha / hab. O mundo encolheu, o que exige muito mais critério e responsabilidade na sua utilização, um compromisso com a humanidade.
Em diversos locais do mundo a restrição causada por esse encolhimento já são evidentes, falta terra para cultivar alimentos e falta água, pilares fundamentais para a sobrevivência das pessoas. O mundo hoje tem 3,4 bilhões ha de pastagens naturais e cultivadas e, pouco mais de 1,4 bilhões ha que são formados de terras aráveis, plenamente utilizáveis para agricultura. Outros 30% (3,9 bilhões ha), são ocupados por florestas, dos quais algo como 140 milhões ha de plantações, o restante são áreas naturais. Ou seja, a área disponível para a agricultura é uma pequena fração (cerca de 30%), do que há de florestas naturais. A capacidade de produzir alimentos é fundamental para a seguridade da sociedade e manutenção ambiental. Se não puder utilizar as áreas agriculturáveis, a população tende a buscar as áreas com restrições, normalmente frágeis do ponto de vista ambiental e com baixa produtividade, comprometendo a sustentabilidade financeira e social da atividade.
Países como Índia já utilizaram toda a sua área disponível para agricultura, enquanto a Argentina, China e Europa possuem reservas de menos de 10% em seus territórios (Europa 60 milhões ha, Argentina 44 milhões ha e China 38 milhões ha), enquanto a Rússia e EUA menos de 15% (Rússia 88 milhões ha e EUA 81 milhões ha). O Brasil é o único país do mundo que ocupou até hoje apenas de 16% dos seus quase 400 milhões de terras aráveis, mantendo um estoque de 332 milhões ha – 52% de toda a área passível de utilização para esse fim no planeta. Vale lembrar que o Brasil tem uma cobertura de florestas naturais de quase 60% do seu território, são 500 milhões ha para essa finalidade, com apenas algo como 6-7 milhões ha de plantações florestais.
Além disso, o nosso país é ainda privilegiado com a maior abundância de água no planeta (12-18%), sendo um dos 9 países que detem 60 % de toda a água doce do mundo. A água das chuvas é responsável por 80% de toda produção agropecuária do mundo, e no Brasil por mais de 90%.
Portanto, temos Terra e Água de sobra para nosso país, e para contribuir para o balanço da produção de alimentos do mundo. Além de contarmos com a maior cobertura florestal e biodiversidade do planeta. São “talentos” naturais, fornecidos por Deus para os homens do Brasil. Do ponto de vista dos impactos ambientais, é muito melhor causar impactos em áreas de abundância de recursos naturais (com estoques grandes de biodiversidade, água e Terra, por exemplo), do que em áreas já consolidadas e convertidas. O impacto nas segundas é muito maior, enquanto o impacto nas primeiras é perfeitamente absorvido pela natureza.
O Brasil possui grande parcela da população incapaz de atender às suas necessidades básicas e a distribuição de renda é uma das mais desiguais do mundo. O Coeficiente de Gini do Brasil – que mede a distribuição de renda, é melhor apenas que a Guatemala, Suazilândia, República Centro-Africa, Serra Leoa, Botsuana, Lesoto e Namíbia. A concentração de renda permaneceu praticamente inalterada durante as últimas quatro décadas, com seus índices oscilando dentre as 10 últimas posições do mundo.
Sobre a conversão de áreas de florestas naturais para outros usos, mais de 74% ocorrem por substituição para usos mais rentáveis (agropecuária e plantações florestais, por exemplo), 14% pelo excesso de exploração de madeira e 11% pelo uso energético da biomassa. Ou seja, converter florestas para outros usos é uma forma de contribuir e aumentar a renda da população, em 100% dos casos.
O Agricultor foi o primeiro ecologista que apareceu no mundo. Foi ele que aprendeu a observar os ciclos naturais das chuvas, as estações do ano e o comportamento das plantas e animais, para então passar a cultivá-los. Foi assim que a agricultura e pecuária contribuiram para tirar a humanidade da sina de coletores e caçadores, sem residência fixa, que migravam para onde houvesse alimento e água, e permitiu que hoje 50% da população viva nas cidades. Não há cidades sem agricultura.
Deixar que um grupo de conservadores, que ainda estão na infância do entendimento da natureza, inadivertidamente atente contra a produção agropecuária brasileira, é o equivalmente a permitir que sejam enterrados os talentos nacionais. Sem usar os talentos da maneira adequada, estamos comentendo um pecado contra a humanidade e, de acordo com os ensinamentos bíblicos, nos colocando à mercê da dominação por aqueles que sabem utilizar desses talentos com maior propriedade.
Dessa forma, artifícios como Reserva Legal, que destitui da produção agropecuária parcelas significativas das propriedades rurais, combinando com ações contra o desmatamento, são formas de evitar que seja praticada a justiça social, ambiental e economica. A produção não pode mais ser encarada com uma forma de destruir a natureza, ao contrário, ela precisa ser reconhecida e estimulada como a melhor forma de construir uma natureza que seja ambiental, social e economicamente justa para todos.
O conservadorismo que o país emprega como motivo para deixar de produzir, gera pressões nos preços mundiais de alimentos e um baixíssimo coeficiente de uso da água disponível, além de diminuir oportunidades para que a nossa própria população possa alcançar uma melhor distribuição de renda.





Dr. Robson é Advogado. Doctorat Droit Privé pela Université de Paris 1 Panthéon-Sorbonne. Corso Singolo em Diritto Processuale Civile e Diritto Fallimentare pela Università degli Studi di Milano. Autor de mais de 200 artigos , das obras Manual da Sociedade Limitada: Prefácio da Ministra do Superior Tribunal de Justiça Fátima Nancy Andrighi ; A prevenção de Dificuldades e Recuperação de Empresas e Assédio Moral no Trabalho (E-book). É também juiz arbitral e palestrante. www.robsonzanetti.com.br e [email protected]
Autor: robson zanetti


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