A Substituição de Materiais e Créditos de Carbono – Madeira na Construção Civil



De acordo com o relatório do IPCC (Painel Intergovernamental das Mudanças Climáticas) de 2007, vencedor do Prêmio Nobel, as atividades humanas são as responsáveis principais pelo desencadeamento do aquecimento global verificado nas últimas décadas. Dentre as atividades humanas, o próprio IPCC destaca sete setores como os principais responsáveis e, também, os virtuais candidatos a apresentarem soluções para o problema: agricultura, florestas, resíduos, energia, indústria, transporte e construção civil.
O caso da construção civil é particularmente notável: o setor responde por 40% do consumo de energia, 30% do uso de matérias-primas, 20% da água e 10% de toda a superfície do planeta. O setor também responde por 40 % das emissões globais, 30 % dos resíduos sólidos gerados e 20 % dos efluentes líquidos lançados nos corpos d’água. Sem dúvida, o impacto ambiental é enorme. Quando considerada a vida útil das construções, o impacto em cada país é de 25 a 40 % de toda a energia consumida, 30 a 40% de todo resíduo sólido gerado e 30 a 40% das emissões de GEE.
Os impactos sócio-econômicos da atividade não são menos significativo: responde por 111 milhões de empregos em todo o mundo, 75% deles nos países em desenvolvimento e 90% em empresas com menos de 10 empregados, contribui com 10 % do PIB mundial e tem investimentos mundiais da ordem de US$ 3 trilhões anuais.
De acordo com o Acordo de Copenhagen, países em desenvolvimento podem habilitar suas atividades domésticas Mensuráveis, Relatáveis e Verificáveis - MRV, desde que de acordo com os padrões da Convenção Quadro das Nações Unidas para as Mudanças Climáticas - UNFCCC – comunicação a cada 2 anos. O Acordo busca cooperar para estabelecer tetos de emissão para todos os países, e um teto global, com prazo maior para os países em desenvolvimento. Os países desenvolvidos devem implantar metas individuais ou conjuntas, de redução de emissões até 2030 (com base nas emissões de 1990 e 2005), publicados até 31 de janeiro de 2010. Dessa vez, o documento conta com a participação dos EUA.
Grandes partes das atenções mundiais, e brasileiras, se voltaram para o estabelecimento e implantação do mecanismo de Redução das Emissões do Desmatamento e Degradação das Florestas – REDD. Basicamente a proposta envolve manutenção e, quando possível, aumento dos estoques de carbono em florestas com alta biodiversidade – as florestas tropicais são o principal objetivo do sistema.
Entretanto, o setor florestal apresenta outras oportunidades significativas, principalmente para o Brasil. É o caso do uso da madeira para construções sustentáveis. O protocolo de Quioto já previa, e o Painel Intergovernamental das Mudanças Climáticas – IPCC forneceu metodologias, para a estimativa de contribuição dos Produtos Florestais Madeireiros – HWP (do inglês Harvested Wood Products), na redução do carbono atmosférico. A Bolsa de Chicago – CCX, já admite o registro do seqüestro dos produtos madeireiros em seu sistema, e a Organização Internacional de Padronização – ISO, já está em processo de desenvolvimento de norma técnica que permite a contabilização das emissões de Gases do Efeito Estufa – GEE, das cadeias produtivas de vários setores, incluindo o da madeira.
Esses exemplos sinalizam amplas oportunidades no futuro mercado de carbono, para as atividades da construção civil que ensejem, por exemplo, a substituição de cimento, ferro e tijolos, materiais com altas emissões GEE associadas, por madeira que, em alguns casos, não tem emissão nenhuma, podendo ainda ser um material que tem reduções de emissões associadas (é o caso, por exemplo, de um processo industrial que utiliza energia da biomassa como fonte de força para sua indústria).
O Brasil, que tem um déficit habitacional de cerca de 8 milhões de unidades e uma projeção de outras 22 milhões unidades de déficit até 2030, tem uma matriz de construção, principalmente de casas populares, altamente centrada em materiais com altas emissões de carbono associados, é o caso do cimento, do ferro e dos tijolos empregados nas construções. Além disso, como esses materiais não estão disponíveis em todos os locais de implantação das obras, as emissões associadas ao transporte dos materiais aumenta a contribuição para o aquecimento global.
As estimativas iniciais da substituição de materiais com altas emissões por madeira em casas populares (modelo de 52 m2), falam na redução de 12-15 tCO2eq / unidade residencial. Além disso, o uso de madeira supõe a capacidade de implantação de reflorestamentos – viáveis em praticamente todo o território nacional, o que aumenta o seqüestro de carbono atmosférico e reduz as emissões associadas ao transporte de matéria-prima. No conjunto, calculou-se que o impacto total do uso da madeira na construção civil é de algo como 83 tCO2eq / unidade residencial. Isso representa algo como 10% do custo dessas construções.
Prefeituras, governos estaduais e governo federal, podem utilizar dessa redução de carbono do uso de madeira industrial, para o cumprimento das metas de redução de emissões brasileiras, que são de quase 40% até 2030. Ao fazerem isso, elas geram a possibilidade de obter créditos de carbono com a substituição de modelos tradicionais de casas populares de cimento-ferro-tijolo por modelos de madeira. Esses créditos de carbono podem ser comercializados no mercado internacional, e gerar recursos para diminuir os custos das referidas unidades residenciais para seus usuários. Além disso, para as construções de casas de madeira, uma grande variedade de espécies florestais pode ser empregada, de acordo com as características físico-mecânicas e o uso final pretendido (forros, assoalhos, madeira estrutural etc). isso vai contribuir para aumentar o cultivo de biodiversidade florestal.
Portanto, o uso de madeira na construção civil gera benefícios ambientais, sociais e econômicos amplos. A estratégia de mudança da matriz produtiva de casas populares de cimento-ferro-tijolos para modelos de madeira, está de acordo com todos os compromissos estabelecidos pelo Brasil em fóruns internacionais de mudanças climáticas, e pode ser um instrumento importantíssimo para a implantação do desenvolvimento sustentável da atividade industrial de base florestal no país como um todo.


Dr. Robson é Advogado. Doctorat Droit Privé pela Université de Paris 1 Panthéon-Sorbonne. Corso Singolo em Diritto Processuale Civile e Diritto Fallimentare pela Università degli Studi di Milano. Autor de mais de 200 artigos , das obras Manual da Sociedade Limitada: Prefácio da Ministra do Superior Tribunal de Justiça Fátima Nancy Andrighi ; A prevenção de Dificuldades e Recuperação de Empresas e Assédio Moral no Trabalho (E-book). É também juiz arbitral e palestrante. www.robsonzanetti.com.br e [email protected]
Autor: robson zanetti


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