Políticas de segurança do trabalho na construção civil: panorama nacional e o caso da CLIP.



RESUMO

O setor de construção civil apresenta um dos maiores índices de acidentes de trabalho, muitos deles, fatais. Em virtude disso, foi realizado um estudo de caso numa empresa do ramo da construção civil e constataram-se as ocorrências de acidentes de trabalho no período de dois anos consecutivos e a tratativa para os mesmos. Após o término da pesquisa foi constatado que, a Clip Engenharia preocupa-se com as condições de trabalho por meio de ferramentas de controle e prevenção de acidentes.

Palavras-chave: acidente de trabalho, construção civil, estudo de caso.

1 INTRODUÇÃO

Com o objetivo de mostrar como uma empresa lida com os acidentes dentro do respeito às leis de segurança no trabalho, realizou-se esta pesquisa. Foi feito um levantamento dos acidentes de trabalho ocorridos na empresa do ramo da construção civil CLIP EMPREENDIMENTOS E CONSTRUÇÃO LTDA ocorridos num período de dois anos. Com isso, foram identificadas as ocorrências com precisão de tipo, quantidade, causa, atividades atingidas, além de um estudo direcionado aos Equipamentos de Proteção Individual (EPI). Também se avaliou a política de segurança no trabalho e os procedimentos adotados para os casos de acidentes pela empresa.

A escolha deste tema se deve a ele estar diretamente relacionado à parte humana das empresas com o foco na segurança das pessoas, considerando que os recursos humanos representam os principais recursos empresariais.

Além disso, os acidentes de trabalho são freqüentes nas organizações e muitos deles não são formalizados com a CAT – Comunicação de acidente de trabalho.
Outro fator determinante foi o desconhecimento dos integrantes do grupo em relação às normas regulamentadoras que regem as atividades trabalhistas.
Neste contexto, procuramos analisar as causas das ocorrências na empresa, as ações corretivas e preventivas, formas de controle, e demais considerações que oferecem impactos à área da empresa que se responsabiliza pelas condições de trabalho.


2 ACIDENTES DE TRABALHO


O acidente de trabalho é caracterizado por lesão corporal, perturbação funcional ou doença no local e durante o trabalho, ou durante o trajeto do empregado ao trabalho ou em seu retorno ou durante o intervalo para refeição e descanso, bem como em viagens de trabalho. Estas situações garantem à vítima direitos como pagamento de auxílio, indenizações, pensões ou estabilidade no emprego (PINHEIRO, 2009).

Segundo a Lei nº. 8.213, de 24.7.1991, artigo 19, in verbis: "O acidente do trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa ou pelo exercício do trabalho dos segurados referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho" (BRASIL, 1991).

Anualmente, aproximadamente 1,3 milhões de pessoas em todo o mundo morrem em decorrência de acidentes de trabalho e doenças de origem ocupacional, de acordo com a Organização Internacional do Trabalho (MORAES; PILATTI; KOVALESKI, 2005).

Acidentes de trabalho podem ocorrer em qualquer tipo de instituição, setor e profissão. Entretanto, alguns trabalhadores são mais passíveis de sofrerem acidentes do que outros. Entre os ramos de atividade que têm as piores condições de trabalho está a Indústria da Construção Civil, apresentando altos índices de ocorrência em acidentes de trabalho (SILVEIRA et al, 2005; SANTANA, NOBRE, WALDVOGEL, 2005).

As causas dos acidentes de trabalho podem ser classificadas em causas humanas, causas materiais e causas fortuitas. As ações perigosas tomadas pelo próprio homem (causas humanas) têm origem em fatores como incapacidade física ou mental, falta de conhecimento, de experiência ou motivação, stress, não cumprimento das normas e dificuldade em lidar com a figura de autoridade. As causas materiais, por sua vez, estão ligadas a questões técnicas perigosas presentes no ambiente, ou ainda defeitos de equipamentos.

As causas chamadas de fortuitas são aquelas que não estão ligadas nem à fatores humanos ou técnicos, são eventos raros, relacionados ao acaso e a fatalidades (MORAES; PILATTI; KOVALESKI, 2005).

Pesquisa realizada em Hospital de Ribeirão Preto apresentou uma análise criteriosa de prontuários médicos, a fim de levantar informações mais precisas sobre acidentes de trabalho na construção civil. Concluiu-se que os fatores que motivam os acidentes são vários, dentre eles: falta de critério ao recrutar empregados sem preparação e informações sobre seus direitos que, em casos de acidentes acabam por assumir a responsabilidade, más condições no acesso da obra, acúmulo e desorganização de materiais pontiagudos nos canteiros de obra, baixa remuneração, baixa ingestão de alimentos, trabalhos sob pressão em ritmo acelerado (SILVEIRA et al., 2005).

Quando ocorrem acidentes de trabalho o foco principal é a vida humana, no entanto, os investimentos na função exercida pelo colaborador devem ser analisados, pois são vários os fatores que causam prejuízos às empresas, como, falta de investimento em capacitação e maquinário (RIBEIRO, 2009).

Ainda de acordo com Ribeiro (2009, "o cumprimento das normas de segurança é uma responsabilidade das empresas", ou seja, tem que haver uma política que atue na fiscalização quanto ao cumprimento dessas normas uma vez que as empresas tendem a obter resultados positivos desde que haja respeito à vida humana e planejamento preventivo de acidentes. Pinto Filho (2008) define muito bem a importância da prevenção quando diz que "a prevenção aos acidentes é a ferramenta mais importante para evitar a incapacitação de milhares de trabalhadores".

O procedimento correto que deve ser tomado pela empresa quando ocorre um AT é registrar junto ao INSS a Comunicação de Acidente de Trabalho, conhecido pela sigla CAT, independente se houve ou não o afastamento do empregado, porque, caso esse procedimento não seja realizado, implicará o pagamento de multa (BIBLIOMED, 2006).

Estudo realizado na cidade de Salvador identificou que cerca de 31% dos atendidos em pronto-socorro sofreram acidentes de trabalho. Destes, 37% tinham carteira assinada, mas apenas 45% tiveram seu acidente notificado para a Previdência. Isso indica que há um alto nível de sub-registro dos acidentes de trabalho, mesmo entre os trabalhadores do setor formal (CONCEIÇÃO et. al., 2003).

De acordo com os dados do Ministério da Previdência Social (2007), durante o ano de 2008, foram registrados no INSS aproximadamente 747,7 mil acidentes do trabalho. Em comparação com os dados de 2007, houve um aumento de 13,4% no número de acidentes. Os trabalhadores do sexo masculino somam 78,8% das vítimas de acidentes considerados típicos, e as pessoas do sexo feminino 21,2%. Em relação aos acidentes típicos e nos de trajeto, a faixa etária que mais sofre acidentes é a de pessoas jovens, de 20 a 29 anos com, respectivamente, 39,8% e 42,7% do total de acidentes registrados.

As leis existem, porém não se aplicam à boa parte dos acidentes pois "eles matam oito brasileiros por dia e esta conta pode ser muito maior, já que não inclui os 40 milhões de brasileiros da economia informal" PINTO FILHO (2008). O trabalho informal é um problema não só no setor civil como em outros setores, e isso faz com que muitos casos não recebam a tratativa adequada.

Mesmo com o número elevado de acidentes as empresas não comentam, pois além de diminuir a sua boa imagem, acidentes significam responsabilidade, danos materiais e morais. Tão grave quanto à informalidade das relações contratuais é a prática por meio de conflitos judiciais para fazer com que os operários reconheçam a culpa dos próprios acidentes, amparando, assim, alguns casos de negligência e de descaso do empregador, que tem o dever de "se antecipar às possíveis negligências do trabalhador, às suas omissões" (GUEDES, 2008).


3 METODOLOGIA


A pesquisa, de caráter qualitativo, foi realizada na empresa CLIP EMPREENDIMENTOS E CONSTRUÇÃO LTDA, situada em Belo Horizonte, Minas Gerais. A empresa está no mercado há 8 anos e o seu foco é gerir empreendimentos e elaborar projetos inteligentes. A escolha da empresa se deve ao seu bom conceito e crescimento.

Foi realizada uma entrevista, previamente agendada, com a responsável do setor de Recursos Humanos. As informações do roteiro elaborado foram voltadas para a gestão preventiva de acidentes, histórico da empresa, formas de controle, estrutura do setor de Recursos Humanos e sua atuação.

Durante a entrevista foram obtidas informações sobre as ocorrências de acidentes no período de 2 anos, o que motivou cada acidente, as consequências, os cargos atingidos e os procedimentos tomados, a importância do RH, a composição da CIPA, frequência dos treinamentos para atender a NR 18, e os equipamentos de proteção individual utilizados na empresa.


4 RESULTADOS E DISCUSSÕES


A empresa CLIP Engenharia tem sede em Belo Horizonte, onde foi realizado o estudo, foi fundada em 2001 e possui um quadro de 500 funcionários. O foco desta empresa é elaborar projetos inteligentes para atender uma demanda crescente de personalização, buscando o equilíbrio ideal da equação entre custos e soluções de engenharia.

A empresa possui um setor de Recursos Humanos que visa promover a ascensão e qualidade de vida dos profissionais: "Trabalhamos para manter as equipes sempre motivadas, no sentido de proporcionarmos realização pessoal e profissional para todos os colaboradores", afirma Albergaria (2009).

A empresa não possui uma política de segurança do trabalho formalizada, somente política da qualidade, que por sua vez, foi elaborada recentemente devido à auditoria para certificação da ISSO 9001:2008 em janeiro de 2010.

A empresa possui CIPA formada e, todo o processo é realizado na própria empresa. Porém, somente a filial de Barbacena possui CIPA, pois, nesta obra há mais de 70 funcionários.

É feito um treinamento inicial da parte de segurança para atender a NR 18 e depois são realizados treinamentos periódicos (seis em seis meses) para fortalecer a consciência da importância do uso correto dos equipamentos de proteção individual e coletivo. Existe um técnico de segurança do trabalho em cada obra, que monitora e orienta os funcionários, diariamente, quanto à utilização dos EPIs.

Os equipamentos de segurança nessa empresa são: botina, capacete, protetores auriculares, luvas (armação e látex), cinto e óculos.
Quando há acidentes de trabalho, o administrador da obra encaminha o funcionário para atendimento (HOSPITAL JOÃO XXIII), emite a CAT, que é entregue no hospital e devolvida com assinatura médica e atestado do mesmo, para ser encaminhada para o INSS.

Durante o período de dois anos foram registrados apenas três acidentes. Em fevereiro de 2007 um pedreiro perfurou o pé ao pisar em um prego no canteiro de obras. Esse acidente ocorreu mesmo com o uso de equipamento de segurança. O acidente foi causado devido à desorganização da obra, pois todos os materiais devem ser retirados do local assim que terminarem o uso. Esse funcionário foi encaminhado para o atendimento no hospital João XXIII.

A CLIP Engenharia emitiu a CAT, que foi entregue ao hospital no momento da entrada do paciente. Após diagnóstico do médico responsável pelo atendimento, constatou-se a necessidade de afastamento das atividades normais de trabalho por 30 dias, a partir da data do acidente, consequentemente o empregado foi encaminhado ao INSS, com o atestado e o comunicado assinado pelo médico.

O episódio não foi mais grave, pois o funcionário utilizava os equipamentos de proteção individual, no entanto, o uso de materiais não evitou a perfuração do corpo do empregado.

Com isso, fica nítido que os funcionários devem receber treinamentos de capacitação e orientação profissional para otimizar o ambiente de trabalho e conceder aos colaboradores a segurança necessária para as atividades. Estes devem ocorrer periodicamente para prevenir a ocorrência de não conformidades como a de fevereiro de 2007.

Em março de 2008, outra ocorrência marcou a história da empresa, dessa vez, havia na CLIP Engenharia uma obra para reforma de um escritório. A equipe era constituída por 5 pessoas que trabalhavam sem equipamento de proteção individual. Nessas condições, um pedreiro, distraído, durante uma análise da laje do escritório caiu do primeiro andar do prédio. A empresa adotou o mesmo procedimento em relação ao acidente de 2007, encaminhou o funcionário para o hospital João XXIII junto ao comunicado de acidente de trabalho. Após análise do médico não foram constatados lesões graves, somente escoriações nos braços e pernas, consequentemente, o funcionário recebeu uma licença de 15 dias.

Ficou claro que as características do empregado qualificado para função vão além das capacidades técnicas (execução das atividades com eficácia), é necessário o desenvolvimento de habilidades intelectuais, imprescindíveis para a execução das tarefas. Um bom exemplo é o índice de criticidade e atenção dos colaboradores que poderia evitar a ocorrência do acidente na laje do escritório.

As escoriações nos braços e pernas do colaborador poderiam ser evitadas ou minimizadas caso o funcionário no momento do acidente estivesse com os equipamentos de proteção individual.

O terceiro acidente registrado pela CLIP Engenharia despertou a atenção dos gestores da empresa. Dessa vez, um serralheiro, serrou três dedos durante uma tarefa de rotina. O curioso é que não havia negligência ou imprudência no processo. Segundo informações do Departamento Humano, a possível causa do acidente seria a distração ou falha humana, uma vez que esse processo é rotineiro. É importante ressaltar que o funcionário usava equipamentos de proteção individual, que não minimizaram os efeitos do grau do acidente.

A ocorrência foi a mais grave da empresa, e conforme os registros anteriores, o colaborador foi encaminhado ao Hospital João XXIII, para avaliação médica. Após avaliação o colaborador recebeu 15 dias de licença, com prorrogação de mais 30 dias para recuperação do ferimento.



5 CONSIDERAÇÕES FINAIS


Após análise dos dados apresentados, ficou clara a importância da discussão deste assunto e da implantação de métodos preventivos e de controle como a CIPA, treinamentos, monitoria, equipamentos e respeito às leis para proporcionar a segurança dos trabalhadores nas organizações.

Foi visto que as perdas, quando ocorrem acidentes de trabalho, são financeiras, materiais e humanas, sendo esta última a mais grave de todas.
Constatamos que a CLIP Engenharia e Construções Ltda, se preocupa com o bem estar dos seus colaboradores, por meio de ferramentas de melhoria contínua, como por exemplo: a composição da CIPA e a política da qualidade.

O maior diferencial competitivo que uma empresa possui são as pessoas, os seus talentos, a CLIP dá um bom exemplo a ser seguido, pois é de conhecimento que as condições de trabalho são de muita importância em todo o contexto organizacional.


RERERÊNCIAS


ALBERGARIA, Priscila. Acidente de Trabalho. Belo Horizonte: CLIP Empreendimentos e Construção Ltda. 09 set 2009. Entrevista a Jérsica Franciele Miranda.

BIBLIOMED. Acidentes de Trabalho. Boa Saúde, 27 Jul 2007. Disponível em . Acesso em: 12 set 2009.

BRASIL, Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991. Disponível em: . Acesso em: 20 Nov 2009.

CONCEIÇÃO, Paulo Sérgio de Andrade et al. Acidentes de Trabalho Atendidos em Serviços de Emergência. Cadernos de Saúde Pública (FIOCRUZ), Rio de Janeiro, v. 19, n. 1, 2003, p. 111-117.

GUEDES, Márcia Novaes. Acidente de trabalho: protegendo a imprudência. Pastoral do Migrante, 23 Mai 2008. Disponível em: . Acesso em: 03 Out 2009.

MINISTÉRIO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. Anuário Estatístico da Previdência Social - AEPS 2008. Disponível em: . Acesso em: 12 Out 2009.

MINISTÉRIO DO TRABALHO E DO EMPREGO. Anuário Estatístico de Acidentes de Trabalho: AEAT 2007. v. 1., 718p. Disponível em: . Acesso em: 12 Out 2009.

MORAES, Gláucia Therezinha Bardi de; PILATTI, Luiz Alberto; KOVALESKI, João Luiz . Acidentes de trabalho: fatores e influências comportamentais. Tecnologia & Humanismo, v. 20, 2006, p. 155-166.

PINHEIRO, Adriano Martins. Acidentes de Trabalho e Doenças Ocupacionais, 22 Jul 2009. Disponível em:
. Acesso em: 04 Set 2009.

PINTO FILHO, João Carlos. Acidente de trabalho: O Quadro Brasil, 2008. Disponível em: . Acesso em: 04 Set 2009.

RIBEIRO, Valdeci T. O acidente de trabalho e as perdas materiais. Disponível em: < HTTP://www.liveseg.com/artigos_acid_trab_perd_mat.html>. Acesso em: 04 Set 2009.

SANTANA, Vilma; NOBRE, Letícia; WALDVOGEL, Bernadette Cunha. Acidentes de trabalho no Brasil entre 1994 e 2004: uma revisão. Ciênc. saúde coletiva, Rio de Janeiro, v. 10, n. 4, Dec. 2005, p. 841-855.

SILVEIRA, Cristiane Aparecida et al. Acidentes de trabalho na construção civil identificados através de prontuários hospitalares. Rem: Rev. Esc. Minas, Ouro Preto, v. 58, n. 1, Mar 2005, p. 39-44.

Autores: Janaína Rodrigues, Jérsica Franciele Miranda, Laura Coelho Frutuoso,
Naiara Gabriela dos Anjos e Paulo Ricardo Gomes.


Belo Horizonte, 02 de março, 2010.
Autor: Jérsica Franciele Miranda


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