negociação e conflitos



Conflitos internacionais

A obra desses excelentes pesquisadores João José Reis e Eduardo Silva, denominada negociação e conflitos, vêm ratificar uma tendência bastante saudável da historiografia brasileira de fazer releituras do período escravocrata que buscam desmistificar e corrigir uns tantos equívocos produzidos a respeito da atuação dos negros durante a vigência do regime de escravidão no Brasil. Revêem-se, assim, ao menos em parte, inclusive formulações de autores célebres como Nina Rodrigues, Gilberto Freyre, Florestan Fernandes, na medida em que não considerou devidamente o escravo como ator político capaz de resistir, no dia-a-dia, ainda que a seu modo, aos desmandos e à exploração física e psicológica a que os controladores do sistema escravista os submetiam.
As fugas de escravos no período colonial e durante o império eram, sem dúvida, um recurso extremo para livrar-se do cativeiro. Elas, no entanto, não aconteceram em grande número, quando comparadas ao imenso contingente de escravos presentes nos país. De mais a mais, como frisam João José Reis e Eduardo Silva, o Brasil escravocrata vivia o chamado paradigma ideológico colonial: a simples fuga do escravo ou a alforria não o tornava um homem livre, já que o conjunto da sociedade não o considerava como um ser igual a qualquer homem branco.
Entre os escravos havia diferenças de ordem étnica e de nascimento que alimentavam rivalidades que na vida cotidiana eram utilizadas pelos senhores para evitar uma união entre os mesmos que pudesse pôr em xeque o poder senhorial – tal era o caso da rivalidade existente entre a preta mina (africanos) e os crioulos (nascidos no Brasil) –,, porém os escravos também se aproveitavam das diferenças e das inimizades entre os senhores para fugir, obter manumissões e negociar direito.
A invasão do candomblé do Abico, descrita no capitulo três, coloca à mostra uma perseguição bastante comum naquela época, ao mesmo tempo em que revela a capacidade dos negros de conseguir apoio político entre os brancos que divergiam daqueles que queriam acabar com os ritos de origem africana. Este fato é exemplar por comprovar que os escravos tiravam proveito das divisões internas que havia entre senhores para alcançar suas conquistas, isto é, os negros não foram somente agentes passivos dentro da lógica escravista, mas atuaram de forma a minimizar sua situação de dominados dentro da estrutura econômica da sociedade brasileira. Tanto não eram meros sujeitos passivos que freqüentemente os escravos despertavam temores junto a seus dominadores.
O episódio do Dois de Julho, acontecido na Bahia em 1823, é bastante significativo. Como se sabe, ele resultou da oposição e do desentendimento entre brancos nascidos na província baiana e os portugueses que lá moravam. A elite baiana, enquanto lutava para afastar os portugueses dos negócios e do poder político na província, temia que os negros adicionassem à causa em questão o fim da escravidão.
Bahia, foi pioneira no que poucos meses mais tarde iria se tornar a independência brasileira: uma solução de compromisso que não modificou o principal pilar da economia do Brasil na época, o modo de produção escravista.
Já o último capítulo do livro aborda o levante do malês ocorrido na Bahia em 1835. Este acontecimento histórico evidencia a luta empreendida por escravos africanos de religiosidade mulçumana que demonstraram capacidade de organização para impulsionar seu projeto de superação da sua condição escrava.

Portanto, a análise dos autores busca construir uma visão dialética a respeito das relações entre escravos e senhores, procurando simultaneamente fugir dos dogmatismos e das visões parciais e estanques dos fenômenos históricos. Nisso consiste sua contribuição, o que não é pouco, muito pelo contrário.
Autor: ricardo teixera


Artigos Relacionados


A Resistência Negra No Período Colonial Brasileiro.

A Origem Dos Escravos Africanos Em Sergipe

África

Estrategias De ResistÊncia Escrava*

A Escravidão Negra No Brasil Colônia

O Temor Da SeguranÇa PÚblica No Brasil Do SÉculo Xix: O Escravo

Ser Escravo No Brasil Na Perspectiva De KÁtia Mattoso