Liberdade Para Amar Pelo Espírito - Parte 2



5:14 Porque toda a lei se cumpre em um só preceito, a saber:

"Amarás o teu próximo como a ti mesmo."

Enquanto os judaizantes estavam advogando que os cristãos gálatas deveriam cumprir a Lei por estar "sob a Lei" (3:23; 4:4,5,21; 5:18) e "guardar toda a Lei" (5:3) cumprindo as exigências da Lei, como no caso da circuncisão e observâncias religiosas, Paulo está indicando que o objetivo inteiro da Lei está cumprido pela Graça de Deus expressando seu Caráter de amor no comportamento cristão.

Jesus tinha explicado em Seu Sermão do Monte, que Ele não viera revogar a Lei, mas cumpri-la (cf. Mt5:17) na dinâmica de Seu próprio Ser. Em outra ocasião, Jesus explicara aos Fariseus que o maior mandamento é "Amar o Senhor, teu Deus" e o segundo é "amar teu próximo como a ti mesmo" e "destes dois mandamentos dependem toda a Lei e os Profetas." (cf.Mt 22:36-40). Jesus não estava repudiando ou rejeitando a Lei Mosaica. Ela serviu a seu propósito na Velha Aliança, parte do qual era proclamar o caráter de Deus.

Entretanto, a Lei de Moisés escrita não tinha nenhuma provisão dinâmica para operar o caráter de Deus. A operação dinâmica de Deus tornou-se disponível apenas pela presença do Espírito do Senhor Jesus ressurreto nos cristãos, nos quais a "lei de Cristo" (6:2) completa e consuma a Lei da Velha Aliança ao cumpri-la e ao trazê-la à fruição em amor.

De fato, Jesus é a única Palavra (logos –cf. Jo1:14) em e por Quem a lei plena, a "lei régia"(Tg 2:8), a "lei perfeita, a lei da liberdade" (Tg.1:25) é cumprida, quando Ele expressa Seu divino amor aos pecadores.

Com efeito, Paulo escreveu aos Romanos que "tudo nesta palavra se resume: Amarás o teu próximo como a ti mesmo." (Rm13:9), e "quem ama o próximo tem cumprido a lei".(Rm 13:8). E ainda: "o cumprimento da lei é o amor" (Rm 8:10).

Ora, isto não significa meramente que é mais fácil estar receptivo ao caráter de Deus pela fé do que tentar cumprir os mandamentos. De modo algum! Esta é uma explanação da dinâmica consumação da Lei na Pessoa e Obra de Jesus Cristo.

Neste sentido, torna-se de fundamental importância ressaltar que a citação de Paulo de Levítico 19:18, "amarás o teu próximo como a ti mesmo" é "simplesmente" o mais citado verso do Pentateuco na literatura neo-testamentária! 1

Para compreendermos a importância do amor cristão, faz-se necessário também compreender a sua razão de ser e sua finalidade. Um intérprete da Lei, perguntou a Jesus: Quem é o meu próximo? A resposta correta a esta pergunta nos permite descobrir o que significa amar alguém como a nós mesmos. Amar alguém que, como nós, possui um certo instinto de auto-preservação, uma preocupação consigo mesmo, uma tendência para buscar os seus próprios interesses.

Amar alguém como amamos a nós mesmos, significa, pois, amar de modo tão espontâneo, tão livre, que chegamos a dar, desejar ou a fazer ao outro aquilo que naturalmente gostaríamos de ter, ou de que fizessem conosco. Mas, amar assim, não significa amar com o amor de Deus.

Significa apenas que é nosso interesse amar o outro com o amor que temos, geralmente, endereçado àquele que nos "agrada", com cuja imagem e conduta nos identificamos. Este é um amor-moral, a nossa dádiva ao "outro-igual", mas jamais ao outro-diferente que se nega a ser conforme nós. Bem diferente é o amor de Deus!

Ora, como iremos amar com o amor de Deus, isto é, cumprir o maior mandamento, sem que esse amor possa se manifestar em e entre nós? E como poderíamos "sentir" esse amor se "nos mordemos e nos devoramos uns aos outros", estando, portanto, fora do contexto da liberdade cristã? Ele cairá do céu sobre nós?

Não! Para Paulo, o amor de Deus é derramado pelo Espírito (Rm 5:5) no coração dos filhos de Deus, mas se manifesta como obediência filial apenas na vida daqueles que podem livremente criar um contexto digno desse amor, a saber: relacionamentos interpessoais nos quais as relações de poder desapareceram, uma vez que cada um serve um ao outro, de modo que ninguém é senhor de ninguém e todos, servos de Cristo.

Depois que construirmos no nosso cotidiano esse "lugar" de liberdade através do esforço de não fazer esforço, saberemos que nada fizemos, pois Deus operou em nós, tanto o querer quanto o efetuar. Por isso esse amor só pode ser manifesto pelo Espírito Santo em nós: "...porque o amor de Deus é derramado em nosso coração pelo Espírito Santo, que nos foi outorgado." (Rm 5:5).

Portanto, para os cristãos, nada pode ser mais importante do que expressar esse amor no cotidiano de suas existências, de modo espontâneo e livre. Quaisquer atitudes, comportamentos ou condutas que não expressem esse Amor implica viver fora do contexto da liberdade cristã, fora do campo de ação do Espírito, não passa de um "andar conforme a carne"!

Esse amor é mais que um"modo de vida", pois é "Vida e seus modos", isto é, é a própriaVida de Cristo na nossacarne mortal. (2 Co4:11). Por isso ele não é um código, um conjunto de artigos, incisos, alíneas etc., porque é à medida que vamos vivendo, caminhando e exercitando a liberdade de viver para amar segundo o Espírito que vamos cumprindo a lei de Cristo (Gal. 6:2), a lei da liberdade e a liberdade dessa lei: amar!

5:15 "Se vós, porém, vos mordeis e devorais uns aos outros, vede que não sejais mutuamente destruídos".

Contrariando tudo que havia sido dito antes acerca do amor de Deus, o apóstolo denuncia aqui um tipo de relacionamento que é bem o oposto daquele que é produzido no âmbito da liberdade cristã. Tudo nos leva a crer que, sob a influência dos legalistas judaizantes, os cristãos gálatas estavam se tornando raivosos, irados, provocando dissensões, discórdias etc.

A tentativa de viver o Evangelho da Graça sem a liberdade para simplesmente viver o amor cristão, estava levando os cristãos gálatas a expressarem um caráter egocêntrico e destrutivo.

As três palavras que Paulo usa para descrever esse comportamento sem amor, eram usadas, na língua grega, para descrever o comportamento selvagem, animalesco, típico de um bando de animais selvagens quando devoram e estraçalham suas presas.

De fato, quando as pessoas tentam viver seguindo apenas uma religião, em vez de se deixarem inspirar pelo caráter amoroso de Cristo, a tendência é se tornarem "canibais sociais" cujo comportamento vai se tornando cada vez mais "natural", embora desumano e destrutivo. Nesse caso, contudo, o senso de comunidade vai sendo gradativamente destruído, até o ponto em que o falar de amor, provocará risadas, na melhor das hipóteses.

Paulo irá em seguida descrever as divisões, dissensões e facções que são as "obras da carne" (5:19-21) e são freqüentemente indicativas de comunidades religiosas que desprezam o exercício livre do amor de Deus pelo Espírito.

5:16 "Digo, porém,: andai no Espírito e jamais satisfareis à concuppiscência da carne"

Em contraste a tal comportamento, Paulo encoraja os cristãos gálatas a reconhecer a própria responsabilidade ("andai", está no modo imperativo!) para conduzir suas vidas sob o controle e influência do Espírito de Cristo, o que gera amor nos relacionamentos interpessoais.

Só assim o cristão pode caminhar na vida. Ser guiado pelo Espírito, portanto, significa, não mais estar "sob a Lei" (v.18).

Posteriormente, escrevendo aos Colossenses, o apóstolo diz que seu desejo era o de que aqueles irmãos pudessem viver "de modo digno do Senhor [Jesus],...frutificando em toda boa obra".(Col.1:10). Mas, devemos ter em mente que essas "boas obras" não é fruto de nenhum potencial humano, de nenhum talento natural, nem do esforço para cumprir certos preceitos de regras religiosas ou mandamentos morais. Pelo contrário, a comunidade cristã funciona segundo a dinâmica do Espírito e seus frutos expressam o exercício da liberdade cristã. Esse é, pois, o único modo cristão de ser, o qual é legitimado pelo próprio Espírito no espírito do cristão.(cf.Rm 8:16)

Assim, conforme Paulo, a conseqüência de se viver assim, desse caminhar pela fé, desse "andar no Espírito" é não satisfazer a concupiscência da carne. Em outras palavras, o andar no Espírito nos leva a expressar o amor de Deus que é sempre orientado para o outro.

A Supremacia do poder do Espírito de Deus é fundamental no argumento de Paulo, pois ele está convencido de que a ação de Deus no homem é suficientemente capaz de consumir todas as negativas e egoístas expressões de carnalidade.

Ora, o apóstolo João poderia concordar com Paulo nesse sentido: "...porque maior é aquele que está em vós do que aquele que está no mundo" (I Jo 4:4).

Desse modo, o apóstolo quer mostrar que é do cristão a responsabilidade de andar no Espírito, e que qualquer outro modo de viver a fé cristã, (cumprir os preceitos da religião, por exemplo) é, inevitavelmente cumprir os desejos da carne!

Na verdade, a tendência da religião é sempre advogar uma certa performance de ação ou abstenção. Não é à toa que a interpretação deste verso (v.16) tem sido freqüentemente equivocada. A mais freqüente interpretação é: não faça isso e não faça aquilo e conseqüentemente estará andando no Espírito. Nada disso!

O argumento de Paulo por toda a epístola é que as performances do homem de "fazer" ou "não fazer" nunca foi a base do Evangelho Cristão, pois o Cristianismo é a dinâmica da Graça de Deus funcionando no cristão pela presença do Espírito de Cristo para expressar Seu divino caráter.

5:17 Porque a carne milita contra o Espírito , e o Espírito contra a carne, porque são opostos entre si; para que não façais o que, porventura, seja do vosso querer. Continuando sua explanação Paulo escreve: "porque a carne milita contra o Espírito e o Espírito, contra a carne". O que Paulo está dizendo é que, os desejos da "carne" se opõem ao desejo de amar o outro com o amor de Deus.

Ora, contrário a muita inculcação religiosa, não é o cristão que está obrigado a lutar contra a carne para "matar seu eu", "mortificar seus desejos" etc., mas o Espírito de Cristo é que coloca Seu desejo contra a carne quando nós estamos receptivos a isso pela fé.

Assim, vemos mais uma vez que a performance da religião é evitada pela graciosa provisão de Deus em Cristo. Prosseguindo Paulo diz: "porque são opostos entre si". Tal afirmação não quer sugerir qualquer tipo de dualismo entre forças iguais e opostas. De modo nenhum! Em versos anteriores podemos notar claramente a supremacia do poder do Espírito no cristão. Mas, apesar dessa supremacia, os padrões da carne não estão erradicados da alma e, portanto, não há que se falar num perfeccionismo que nega o conflito comportamental.




Autor: Adir Freire


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