O SACO
O SACO
Antonino chega na praça com um saco às costas. Não estava agüentando muito com o peso daquele saco. Na praça, toda florida, muitas pessoas passeiam. É domingo e todos tiram o dia para descansar. Marcelo estava sentado num banco olhando o rotineiro movimento. Antonino, cambaleando de um lado e outro, derruba o saco perto do banco onde está Marcelo. Em seguida senta-se no chão, passa a mão pela testa. Está exausto. Uma moça vai passando neste momento, quando Antonino pede ajuda:
- A senhorita poderia ajudar eu carregar meu saco?
- O que? Esta coisa aí?
- Esta coisa não, dona. Isto é um saco.
- E o senhor não tem vergonha de pedir isto pra mim?
- Por que? É muito feio assim? A senhora nunca pegou num saco?
- É claro que não, seu paspalho. Onde já se viu uma pessoa como eu andar pegando em saco?
- Tem certeza disto, dona?
- Não quero mais conversa fiada.
A moça vai embora e Antonino fica sentado no mesmo lugar. Muitas pessoas vão passando pra lá e pra cá e ele lá sentado. Estava sem coragem para nada.
Um outro homem passa por ele e Antonino faz o mesmo pedido:
- O senhor poderia me ajudar a carregar este saco?
- Eu carregar o saco pro senhor?
- Por que não? É só uma ajuda. Eu pego um lado do saco e o senhor pega o outro lado. Assim o saco não pesa muito pro senhor, nem pra mim.
- Que diria as pessoas se vissem nós dois carregando o saco?
- Ficariam curiosas. Talvez diriam: olha que maravilha, dois homens carregando um saco, ou então:que saco grande, tão grande que precisa de dois homens para carregá-lo. O senhor iria gostar de carregar o meu saco.
- Isto é conversa pra boi dormir.
Marcelo que estava sentado no banco do jardim, resolve interromper:
- O que é que carrega assim, moço?
- Ué, o saco, não está vendo? Até parece que nunca viu um saco.
- É claro que já vi. Por que é que carrega este saco tão pesado?
Antonino vai-se achegando e resolve contar a história do saco.
- Foi minha mãe, moço. Antes da pobrezinha morrer ela disse: Meu filho, você precisa carregar um saco. Um homem precisa ter um saco. No saco a gente pode pôr tudo o que precisa. Um homem sem saco não vale nada. Quanto maior o saco, mais o homem tem valor. Fiquei com aquilo na cabeça e hoje, para todo lugar que vou, levo o meu saco. Não largo o saco pra nada.
- Sua mãe era um pouco exagerada. Também não precisa ser assim. Hoje em dia o homem não precisa de saco.
- O quê? Não acredito que o senhor esteja me dizendo isto. Quer dizer que o senhor não usa mais saco pra nada?
- De vez em quando. A minha mulher usa mais o saco do que eu?
- Sua mulher? Que mulher corajosa. Usar o saco.
- Me diga uma coisa. O que é que tem dentro deste saco?
- O que tem dentro do saco? Ora, ora. O que tem dentro. O que é que pode ter dentro do saco? Uma cobra. Eu carrego uma cobra dentro do saco. Conselho de minha velha mãe. Ela dizia sempre: Um saco sem cobra não tem valor algum. Botei uma cobra dentro deste saco. É por isto que as mulheres tem medo de pegar no meu saco. Por causa da cobra. Toda mulher é assim, quando não tem medo do saco, tem medo da cobra. Agora se os dois estão juntos, aí a coisa pega.
- Como é que é esta cobra?
- Além de grossa é comprida. A cabeça dela é enorme.
- E não ataca ninguém?
- Só quando está com fome.
- E por que o senhor carrega uma cobra?
- Para dar sorte. A cobra é um bicho muito astucioso. Astucioso e mágico. Foi por isto que arrumei uma cobra grande.
- O senhor nem arruma mulher com esta cobra. Não acha que está na hora de matar este bicho?
- E eu andar por aí sem cobra e sem saco? De jeito nenhum.
- Assim as mulheres não chegarão ao senhor. De que é que elas tem mais medo: da cobra, ou do saco?
- Não sei ainda. Vou testar agora.
Uma moça ia passando neste momento e ele fez o convite:
- A senhorita poderia me ajudar a carregar o meu saco?
- O que? Este saco preto e sujo aí?
- Eu, de saco preto, dona. Isto aí é a cor natural dele. O bonito mesmo é o que tem dentro dele. A senhora vai gostar.
- E o que é que tem dentro dele?
- Uma cobra.
- Uma cobra? O senhor anda com um saco e uma cobra por aí? Para que?
- A senhora gosta mais do saco ou da cobra?
- Não gosto de nenhum dos dois.
Enquanto a moça conversava com uma colega, Antonino abriu o saco e retirou de dentro dele uma enorme sucuri. Era uma sucuri mansa de 3 metros de comprimento. A moça não percebera. De repente ele toca no ombro dela:
- Aqui está a minha cobrinha, dona. A senhora quer tocar nela.
- Minha nossa senhora! Que coisa horrorosa!
Saiu correndo dali. Antonino ficou com a cobra na mão. Foi levá-la para mostrar a Marcelo que já havia se mandado dali.
- Estes caras da cidade morrem de medo de uma cobrinha - concluiu.
Autor: Henrique Araújo
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