O ESFORÇO DO GOVERNO LULA PARA CONTER OS TRABALHADORES RURAIS



A questão agrária brasileira, historicamente, sempre foi tratada como questão de polícia. As possíveis mudanças que ocorreram em toda história, com a pouca ampliação do acesso a terra e as condições favoráveis de manutenção da vida, só foram atingidas com lutas, mortes, torturas etc. Foi assim, com canudos, contestado, a revolta de Padre Cícero, o Cangaço, as Ligas Camponesas, e com os movimentos atuais de luta pela terra, a exemplo do MST( Movimentos dos Trabalhadores Sem Terra e da CPT(Comissão Pastoral da Terra).
Nunca na historia brasileira, os trabalhadores rurais puderam possuir favorecimentos de políticas públicas para o setor. Assim, a Lei de terras de 1850, excluía pela base, a possibilidade de acesso a terra. Suas reedições, como Estatuto da terra, de 1964, possuía como tema principal, a defesa da propriedade privada, inclusive com suas novas redações em 1971, 1979 e 1988. Tentava-se enclausurar o trabalhador, discipliná-lo, para que sequer pensasse em questionar a estrutura agrária do país.
As formas de organização desses trabalhadores, também eram sumariamente, aniquiladas. No campo legal, sequer eram mencionados ou, quando eram, favoreciam o capital agrário-exportador, como foi o caso, das Leis criadas nos primeiros vinte anos do século XX. O governo Vargas, disciplina os sindicatos urbanos, colando-os sob a tutela do Estado. Utiliza meios para apaziguar os ânimos, distribuindo recursos as entidades sindicais sob o poder estatal, ampliar direitos, mas antes os redimensiona sob a lógica capitalista. Mas, aos trabalhadores rurais, deixa um vazio legal e, um distanciamento real de quaisquer direitos. Foi a partir da década de 1950, com Ligas Camponesas, em Pernambuco e depois ampliadas para todo o país, que a luta se corporificou, sob a forma de conquista de direitos. Identificava-se, ao mesmo tempo, o principal inimigo: o capitalismo.
Esta posto as condições favorecedoras e contrárias a possíveis mudanças. Entretanto, nesse meio tempo, as elites se organizavam, reeditavam constantemente, através de suas Constituições, o direito inalienável a propriedade da terra, e com ela, a possibilidade real de exclusão pela base dos trabalhadores rurais. Estes, como seres estranhos aos capitais financeiro, industrial e agrário, tendiam ao não contentamento com migalhas, representadas em Reformas Agrárias inconclusas, ineficientes e ineficazes.
O governo militar, representando o capital no Brasil, mostrou a sua face. Pode, finalmente, atingir os objetivos que o Governo Vargas e seus sucessores não conseguiram. Sorrateiramente, como ratos de porão, a destruir esses movimentos, aniquilando-os, cooptando-os, burocratizando-os. Mas como não conseguia fechar todas as portas e janelas, viu nascer, sob sua força aniquiladora, aqueles que representariam a resistência agrária brasileira: os novos movimentos sociais sem terra.
Se o governo Sarney, não conseguira frear os ânimos com o I Plano Nacional de Reforma Agrária(PNRA), logo no inicio de seu governo, em 1985, com fim da Ditadura Militar, viu as elites agrárias( e não apenas elas), preocupadas com os avanços dos movimentos sociais em luta pela terra. A Constituição cidadã de 1988 reeditou valores já existentes nas constituições anteriores e, mesmo concedendo benefícios aos trabalhadores rurais, não favoreceu mudanças significativas em seu cotidiano. O I PNRA possui a importância de ter entre setores ligados aos movimentos sociais( e não apenas aqueles em luta pela terra), ferrenhos críticos e defensores de mudanças significativas para os trabalhadores rurais. Esta, talvez, tenha sido o seu verdadeiro mérito: aglutinar forças para lutas por sua ampliação e efetivação.
Sucessivos governos, de tudo fizeram para conter qualquer mudança que sequer apontasse para a realização de Reforma Agrária, imaginem, questionamentos sobre a estrutura agrária brasileira. As reedições da propriedade privada, como lócus privilegiado, passaria a ser efetivada, nas constantes ações do poder judiciário na defesa da classe patronal, sob a lógica do Direito Positivo, que possui por princípio a suposta neutralidade de suas decisões.
A luta dos trabalhadores, já a partir de 1988 para eleger Lula como presidente do país, foi incansável. Finalmente, a partir de 2002, não apenas Lula seria presidente, mas um projeto para a população estaria sendo aprovado, pelo menos sob a ótica de alguns movimentos sociais e de setores ditos progressistas das elites intelectuais. Em 2003, o governo Lula, reafirma sua defesa pela Reforma Agrária, aprovando o II PNRA.
Nesse meio termo, passou a favorecer o setor agrário-exportador. Recursos eram destinados sem maiores constrangimentos; o governo passaria a representar esses setores na Organização Mundial do Comércio(OMC). Dizia fazer o seu trabalho em defesa da agricultura brasileira. O certo é que, apesar de reconhecer, inclusive no II PNRA que a chamada agricultura familiar representava o local privilegiado para a produção de alimentos; da FAO( Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação, em conjunto com o INCRA(Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), detectarem o papel importante da pequena produção, aos trabalhadores rurais restaram políticas públicas reeditadas do governo FHC, como o PRONAF(Programa Nacional de fortalecimento da Agricultura Familiar) que, dentre outras coisas, destina recursos insuficientes e, geralmente, sem fiscalização de seus objetivos, para o desenvolvimento do setor.
Se a proposta do Governo Lula, para a Reforma Agrária, apresentada no II PNRA, não foi efetivada, sendo totalmente aniquilada em 2007, teve como mérito publicizar os reais interesses do atual governo. Sua prática aniquilou qualquer entendimento de que este governo faria reforma agrária sob o ponto de vista dos trabalhadores rurais.
Os movimentos sociais rurais, agora isolados dos demais movimentos sociais, lutam solitariamente, como podem, para que os direitos conquistados a duras penas, não retroajam aos índices de décadas anteriores. Seu isolamento, em parte deveu-se a forma de condução das políticas sociais de cooptação dos trabalhadores, apaziguamento da relação de exclusão, centrada na cooptação de elites sindicais; do conflito existente nas diversas subdivisões internas, e nestas, o apoio a formas de assistencialismos presentes na política governamental. Além disso, não souberam como aglutinar o conjunto dos trabalhadores, tanto os que não possuíam terras, como os pequenos produtores e assalariados rurais. Perderam, até o momento, a oportunidade, de realizar coalizões que enfrentassem as  novas e velhas formas de arregimentação de trabalhadores para as fileiras empoeiradas do pensamento neoliberal.
Ao trabalhador rural, único grupo que resiste a luta contra o processo de exploração capitalista para além de interesses isolacionistas, de orientações individualistas, restou a tarefa inapropriada e inadequada, de lutar contra os ditames do capital agrário. Não significa dizer que a luta não deva existir, pelo contrário, mas apenas que esses movimentos sozinhos, em lutas isoladas, desconexadas do conjunto de trabalhadores tanto do campo como da cidade, quando muito, podem realizar pequenas reformas que, em última instância, não afetam ao capital. Entretanto, suas lutas, especialmente aquelas apoiadas em assalariados, desempregados e pequenos proprietários do campo, possuem o mérito de denunciar para a sociedade em geral, que os camponeses( e não agricultores familiares) existem, possuem endereço fixo nas favelas brasileiras, nas beirasdas estradas, nas cidades de lonas. São aqueles que a burocracia sindical ainda não cooptou totalmente( e não foi por falta de tentar) suas lideranças. Estas decidem através das vozes cansadas de trabalho, de abando, de exclusão. Por ainda não impor a força os valores, possuem credibilidade entre os que os acompanham e, quem sabe, entre tantos outros que apóiam a necessidade de transformação do modelo vigente da estrutura agrária brasileira. Isso, o capital não sabe como negar. Os trabalhadores sem terras, não são os mesmos trabalhadores e filhos de trabalhadores que estão sendo assassinados nos centros urbanos (apesar que muitos deles vivem em tal condição), alimentando a indústria de armamento, mas aqueles que estão reafirmando que, apesar do governo neoliberal de Lula, eles existem, mesmo que ainda não entendam a amplitude de seus feitos.

Autor: Antonio Barbosa Lúcio


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