Um conto de adeus



UM CONTO DE ADEUS

(História e Anatomia)

Não deve haver situação tão difícil, quanto aquela em que se tem de fazer algo totalmente contrário à própria vontade. O esmagamento definitivo de um sonho. Algo tão próximo de uma abdicação da própria vida, ou de uma vida desejada desde sempre e que, embora ali, ao alcance da mão, deva ser abandonada sem hesitação.

Por isso ele sorriu tristemente, num contraste estranho, enquanto tentava assimilar as palavras ouvidas. Foram tantas, mas uma delas, talvez a menor, destacara-se das outras: não.

Todas as justificativas, embora corretas, desapareceram, só ficou aquele não ecoando interminavelmente em seus ouvidos. Era o resumo diminuto da resposta à proposição dele, de assumirem uma vida em comum, num novo começo para ambos.

Diante disso, recordou muitos outros nãos já ouvidos pela vida afora e ponderou que jamais outro doera tanto quanto aquele. E, certamente, outro jamais baterá esse recorde.

Como traduzir, para ela, que um amor de tal magnitude jamais será esquecido e estará sempre preso a uma subliminar esperança de que um dia...

Inútil. Nada no mundo, excepcionalmente neste caso, seria tão inútil como a esperança. Não teriam uma vida em comum como ele desejava, ela não partilhava de tais planos.

Através da vidraça, olhou do restaurante para a rua, onde os carros passavam levando pessoas indiferentes à sua dor. Voltou o olhar para aqueles olhos firmes. Ela pode ver as lágrimas rolando dos olhos para o rosto dele e seguindo a lei da gravidade, a despeito da multidão que almoçava e do trânsito de garçons. Ele estava imune às opiniões alheias. Era um homem que chorava, e daí?

Ela estava certa. Eram diferentes. Ela uma rocha, ele um papel higiênico molhado se decompondo na sua frente. Estava claro quem era, na verdade, o representante do sexo frágil ali.

Ela escolhera a família. Não poderia deixá-los, a despeito do amor que sentia por ele, pois se entendia responsável por eles e mais alguém a quem disse dever muito. Era a escolha dela e nada poderia ser feito.

Mas era uma decisão certa a ser respeitada. Nada mais a fazer. A razão fazia reverências a ela, não a ele. Pelo fato de que ela não tinha filhos, ele chegara a acreditar na viabilidade de seu sonho.

Ultimamente, entre eles, cada encontro tinha sido razão para grande sofrimento. Ele entendia que tinha cumprido um papel. Deveria ter sido agente responsável pela quebra da resistência de alguém com relação a ela, em assumir de vez uma relação, oficializar, legalizar, decidir, alguma coisa assim. Mas nada sabia ao certo, só que tudo havia mudado, irreversivelmente.

Ele sentia como que atado indefinidamente num deserto, agonizando de sede, com a água a meio metro de distância, mas sem poder alcançá-la. Como um Prometeu da era moderna, eternamente condenado a ser devorado pela inútil saudade.

Num encontro anterior inócuo como aquele, ela não permitiu sua aproximação, não podendo tocá-la. Depois que ele viajara de volta, ela confessou que mal conseguira se segurar. Desejara ardentemente sair com ele para outro lugar e, como antigamente, fazer amor à exaustão. Ela traía a si mesma. E talvez tenha sido lá, na leitura daquela confissão feita à distância, que a idéia de um definitivo rompimento começara a tomar forma dentro dele. Tudo se concretizava em seu íntimo agora.  

Aceitar a escolha dela era a coisa mais difícil que tinha que fazer na vida, mas faria ou morreria tentando. Era próprio dele, pois se sentir algo incômodo era coisa que não conseguia aceitar.

Pedir, implorar, era coisa que jamais faria, apesar de sua fragilidade no momento. Aceitaria, simplesmente aceitaria.

Colocaria qualquer coisa em jogo, enquanto o ar entrava e saia, penosamente, de seus pulmões. Porém, tentar trocar amor por piedade, era algo que abominava. E como sempre fizera na vida, aceitava naquele instante mais aquele não que a vida lhe trazia. Poderia parecer o contrário para ela, mas não era assim.

Ele só a desejava feliz, nem mais, nem menos. Mesmo que à custa de seu suicídio emocional.

Contingências, disse ela. Eram as malditas contingências. E ele, que nunca odiou nada na vida, sentiu que odiava aquela palavra.

Sua dor fora imensa ao ler aquilo, lembrava. Mas tudo era apenas a constatação de um erro. Nada mais que isso.

Ambos sabiam, a essa altura, o tamanho do preço que se paga nestas circunstâncias. Ninguém luta por amor, contra tudo, impunemente.

Haviam acreditado numa ficção temporária sem conseqüências, mas pagavam o preço por tal temeridade. Porque havia acontecido algo com que não atinavam. Fora um encontro marcado por alguma força fora de controle, em algum lugar no tempo, há muitos anos atrás.  

A verdade permaneceria para sempre uma incógnita e o sonho haveria de ser abandonado de vez ali, como de fato foi. Deixou de ser o sonho, da mesma forma tão instantânea como começou. A sensação de que apenas fora útil para alguma coisa, se acentuava, mas não se definia.

 Ela surgiu na vida dele de repente, sem nenhum prévio aviso do etéreo poder que governa o mundo.

Disse desejar conhecê-lo e revelou-se completa, sem medos ou pudores. Entregou-se sem nada exigir. Fora a mulher sempre sonhada, desejada, como nos delírios que ele tinha sobre a felicidade. Talvez ele a tenha construído no tempo, não tinha certeza disso.

Entretanto, era hora de acordar. O sonho havia acabado. E ele sabia que, mesmo que ultrapassasse o universo, voasse a anos luz da Terra, jamais a esqueceria. Era uma marca, como uma imensa cicatriz nas paredes de sua memória, inesquecível.

Ela fora o seu big bang. O start, enfim, de sua vida. Um desejo antigo materializado magicamente e que, sem a menor lógica, se diluía agora. Deveria ter previsto aquilo, mas quando se está tão destemidamente envolvido, o sonho só admite sua realização e uma estranha cegueira absoluta permeia tudo.

Não poderia jamais falar por ela. Apenas observar sua força e seu olhar impassível diante do inevitável. A vida é implacável com aqueles que decidem romper normas, ela também. Ele decidira, ela não. Era direito dela e o exercia acertadamente.

Era lindamente forte e resolvida. Para quem não a conhecesse, pareceria fria. Mas era maravilhosa.

Possuía ao mesmo tempo a delicadeza da queda do orvalho e a violência de uma tempestade de verão. Não uma violência física, mas verbal no manejo das palavras que, como punhais atirados com perícia, acertavam sempre o centro do alvo. Conhecia como ninguém, as fraquezas humanas. E, principalmente, as dele.

Custou um tanto de tempo para que as lágrimas fossem finalmente contidas, com a ajuda do guardanapo que ele segurava na mão. Ela observava.

O que estaria sentindo? Pensando? Melhor não saber, não perguntar. Não mudaria nada.

Nunca a vida lhe havia revelado com tanta clareza a bifurcação de um caminho. À confluência do encontro, seguia-se a ocorrência do desencontro, da irreversível separação.

O perigo dessa proximidade entre ambos poderia causar danos irreparáveis a ela. Isso ele jamais se perdoaria. Por amor continuaria a protegê-la, em seu interminável silêncio interno. No centro do deserto emocional que era a vida dele, novamente. 

Ela falou do carinho e do amor que sentia por ele. Da admiração por sua sensibilidade ímpar (nas palavras dela), mas isso apenas soava como ironia, como se, oculto, um terceiro ser gargalhasse até quase perder o fôlego.

Disse que jamais esqueceria os momentos em que fizeram amor à exaustão, até caírem fulminados pelo cansaço, mas repletos da alegria e da sensação de plenitude.

Ouviu-a dizer que lamentava muito que as contingências não permitissem mais a reprise daqueles momentos. Sua voz, no entanto, soava longínqua, irreal. Tudo lhe parecia de um surrealismo absoluto.

Ele sabia  mais que ela própria  que nenhuma loucura justificaria colocar em risco a integridade dela.

Então sua segurança estava garantida, fosse lá qual fosse, disso ela tinha a mais completa certeza. Pois ele sempre buscou protegê-la em silêncio.

Não havia nenhum toque passional, havia troca de idéias sobre tudo em memoráveis discussões sobre temas elevados. Ela disse não acreditar em Deus. E ele nunca tinha se deparado com um ser tão maravilhoso que negasse seu Princípio.

No começo haviam tentado decifrar a origem daquela coincidência, mas logo desistiram.

Viveram o que foi possível viver juntos e agora era a hora de cada um seguir seu caminho, levando apenas lembranças. Ele ainda via com nitidez na memória, suas mãos percorrendo os contornos do corpo dela. A pele arrepiada. Lembranças. O hálito de ambos misturados na respiração ofegante.

As mãos dela em carícias múltiplas. Ouvia-a dizer: veja como você é lindo, parece um menino, jamais aparenta a idade que tens. E ria. Gargalhava enquanto falava: nossa! Você é puro, como pode? Jamais esteve com uma mulher de verdade antes.

Ela não esperava encontrar o que encontrou e, por isso, se apaixonara. Confessou depois, mesmo sem dizer diretamente. Mas escolheu o estabelecido e não o amor.

O último gesto dele foi um olhar. Nem para o passado, presente ou futuro, mas para o vazio que encontraria sempre, onde deveria estar a presença dela. Sua ausência já se tornava uma antevisão do nunca mais.

Ela havia dito que o nunca mais não existia, pois tudo poderia mudar nesta vida e poderiam até ficar juntos como ele queria. Isso lhe pareceu uma tentativa de manter, sem querer ter. Aquilo doía. Sentia-se como um ás reservado, caso o jogo desse errado.

Estava terrivelmente fora de todo o contexto. Não combinava com a situação como um todo.

Isso o fez lembrar uma antiga figura vista na infância, onde um burrico seguia uma espiga de milho amarrada numa vara presa à sela, de forma que a espiga ficasse sempre a um metro adiante de sua cabeça. E o tal burrico seguia a espiga indefinidamente.

À dor, seguiu-se a raiva de si mesmo. Queria sentir raiva dela, seria mais fácil, mas o amor era maior que tudo nele e não permitia. Seu amor tudo perdoava e perduraria, ele sabia. Mas isso era problema dele, não dela.

Entendia agora, de forma cristalina, que nada promove tanto a imortalidade de um amor, como a concreta certeza do fato dele ser impossível.

Algo se dissolvia dentro dele, sentia-se como se tornando líquido. Como se a terra já o estivesse absorvendo. Uma extrema sensação de desagregação de si, numa perda irreparável. Impotência absoluta.

Imaginou que aquilo devia ser semelhante a morrer. A absorção num estado em que nada mais faz sentido. Tudo era, de repente, sinônimo de nada.

Era um sentimento novo, profundamente dominante, incontrolável, terrível de sentir. Mas reinava a despeito de sua vontade de que fosse diferente.

Chegara a pensar um dia que era perito em dor, mas descobrira ali, naquele atômico instante, o quanto são imbecis as opiniões formadas. Pois só a metamorfose é constante.

Por causa dela, muitas pessoas lhe haviam dito, sem que soubessem a razão, que ele havia perdido aquela sua característica tristeza no olhar. Que havia um brilho diferente, vivo, em seus olhos. Parecia, enfim, feliz. Perguntavam na brincadeira: está apaixonado?  Ele ria sem nada dizer, mas estava.

Naquela última visão dela ele devolveu a alegria inebriante e efêmera que se acendera, por tão pouco tempo, no seu olhar.

O adeus não foi dito. Aconteceu, como se fosse sólido, por si mesmo, dentro do silêncio daquele último olhar. Talvez ela tenha percebido, talvez não. Ele não saberia jamais dizer.

Não foi como a luz do começo de tudo, mas como uma terrível sombra, escolhida a dedo por um diretor de filmes de terror. Ele começou a provar ali, para ela, que o nunca mais existia sim.

Que não há resgate possível para o passado, pois a lembrança não é um resgate e sim apenas uma tentativa frustrada de reviver momentos que o tempo levou.

Haveria a saudade das palavras e das carícias. Das letras colocadas caprichosamente, de forma a construir palavras que o enalteciam, como tentativas de revelar sua admiração.

Isso o encabulava, mas  ao mesmo tempo  começava a despertar seu ego da letargia em que vivera absorvido desde sempre e na qual mergulhava novamente naquele instante.

Lembraria as longas horas ao telefone, que pareciam instantes breves, tentando, ambos, encurtar a distância física. A incessante busca do mútuo agrado.

Tudo isso acabava ali, naquele silencioso adeus, que brotou do nada, feito uma lápide, talvez feita da mesma rocha que formava o caráter decisivo dela, belo de se ver, tanto quanto difícil de aceitar nos seus desígnios.

O silêncio dele foi uma resposta calada, diante da proposta de manutenção de uma amizade impossível para ele. Não teria forças para ser de tal forma hipócrita.

Olhar para ela com amizade era tão possível quanto segurar a lua nas mãos. Ela dizia que não queria perder a convivência com a rara sensibilidade dele.

Impossível, poucas coisas nesta vida poderiam ser tão impossíveis. Essa beleza da amizade só acontece quando só o amor remanesce e o desejo não.

Não era o caso. Ele a desejava tanto quanto amava.

Perto dela, era como se ele tivesse brasa derretida correndo nas veias em lugar do sangue. Ardia. Tal era a intensidade do desejo. O desespero de nunca mais vê-la parecia-lhe mais suportável. Sabia, desde aquele momento, que necessitaria encontrar, de vez em quando, um local isolado para gritar o nome dela e chorar seu desespero pela imensa falta que já sentia.

Havia sido um encontro raro. Daqueles que só acontecem de séculos em séculos, ou milênios. Como algo preparado, meticulosamente, para ser tão perfeito enquanto durasse quanto impossível na sua permanência.

Um sentimento citado por muitos poetas em milhares de obras, mas que poucos chegam a conhecer realmente. O amor tornado imortal pela sua própria impossibilidade.

Devastador, de tal forma que, no primeiro momento rompeu com todas as convenções sociais. Isso permanecera para ele, não para ela. Era um homem que amava como as mulheres e não transitava bem entre amores. Sua forma de amar era singular, não conseguia abstrair sobre a existência de plural nesse caso.

Mesmo assim, ele tivera um hiato de felicidade na sua vida. Conhecera, embora por tão escasso tempo, o amor na sua plenitude. O grau máximo e temerário em que o amor pode chegar. A loucura do esquecimento de tudo o mais, numa espécie de heresia impensável.

E tudo se resumiu, enfim, num minúsculo ponto final. Invisível para todo mundo, mas imenso para ele.

Carregava-o como Atlas carregava o mundo em seus ombros na mitologia.

Tudo que era ruim voltara, de repente, a ter sua antiga carga super dimensionada, a despeito de seu desejo de que não fosse assim.

Era como se as antigas decepções de sua vida  às centenas  rissem dele, como se gritassem: bem feito!. Era contra tudo isso que teria que lutar a partir daquele momento.

E prometeu a si mesmo, em silêncio, que lutaria.

Que praticaria as lições que ela lhe dera durante a curta convivência. Notadamente a do desapego. Isso aliado às suas experiência passadas deveria bastar.

Haveria de extrair daquela dor impensável, a lição que ainda permanecia invisível. Um dia se desligaria um tanto mais daquilo tudo, até que se transformasse apenas na lição jacente.

Afinal, fora assim que sobrevivera no passado, tirando das próprias quedas as razões para levantar-se. Das próprias dores as lições contidas. No momento, porém, restava deixar fluir tudo até chegar o dia propício para consolidar as mudanças necessárias para sua sobrevivência.

As nuvens do lado de fora do avião pareciam diferentes para ele na volta. Sombrias, não mais radiantes como na ida. Os olhos vermelhos denunciavam que havia chorado muito. No entanto, não havia nele nenhuma preocupação com as possíveis opiniões alheias. A vida era dele. Faria dela o que e como quisesse.

Parou de observar a tristeza estampada nas nuvens. Voltou os olhos para o papel que tirara da carteira e segurava na mão chispada. Leu tudo de novo, pela última vez.

Sonhara com ele por toda sua vida. E o conhecia desde sempre. Não pela forma estética, mas por outra, metafísica. Buscara por muito tempo a outra parte de seu todo, cuja divisão ocorrera num plano ainda desconhecido aos mortais. Não sabia o que faltava, mas, reconheceria imediatamente, caso encontrasse. Encontrara. Só não esperava ser impossível fundir as duas metades. Os meios pelos quais o destino concretiza seus feitos, às vezes, podem não ser os mais ortodoxos. Madrugada. Insônia. Um texto na tela dum computador. Tremor nas mãos. Reconhecimento. Chorara compulsivamente. Alegria e temor. Fizera contato. De onde? Precisava mais que isso. Ouvira. Vira. Tocara. Despedira. Chorara. Outra vez a solidão.

As palavras de uma confissão escrita por ela na terceira pessoa. Uma mensagem, como um lamento, que já apontava o fim. Enviara numa noite de extrema saudade dele.

Lentamente rasgou o papel, como se rasgasse a si mesmo, como se tivesse mesmo exterminando assim, algo impossível de ser exterminado. Voltou a olhar as nuvens distorcidas pelas lágrimas. Era estranho como tinha tanta intimidade com a dor. Não era masoquismo, mas uma espécie de reencontro com algo conhecido desde há muito tempo.

Colocou o fone de ouvido para tentar fugir daquilo tudo, através de alguma música que o motivasse a esquecer.

Novamente a vida se vingava, rindo dele. Dos fones vinha uma canção de Fagner que, como nunca antes, encontrava eco em cada célula de seu ser: O aço dos meus olhos e o fel das minhas palavras, acalmaram meu silêncio, mas deixaram suas marcas.Se hoje sou deserto, é que eu não sabia que as flores com o tempo perdem a força e a ventania vem mais forte.

Hoje só acredito no pulsar das minhas veias. E aquela luz que havia em cada ponto de partida, há muito me deixou. Ai! Coração alado desfolharei meus olhos neste escuro véu. Não acredito mais no fogo ingênuo da paixão (...) nessa estrada só quem pode me seguir sou eu.

Suprema ironia. Parecia que fora ele próprio quem tivesse escrito aquela música. Já a ouvira antes, milhares de vezes, mas nunca a havia sentido com tal intensidade. Cada palavra era como uma faca a cortá-lo impiedosamente por dentro.

Havia, no entanto, em si, como em gestação, um sentimento de liberdade. Estranha liberdade de ser só emocionalmente outra vez. Sem amarras. Sem satisfações a suprir cobranças. Sem o pavor de ter toda a razão de viver contida em outra pessoa, correndo os inumeráveis riscos a que todos estamos sujeitos.

Suprema covardia que liberta aqueles com o profundo medo de amar, de se entregarem como o amor exige. E era assim que amava, como um kamikaze, intenso e profundamente.

Carregava consigo a certeza de que jamais passaria por aquilo de novo.

Pela primeira e única vez acontecera com tal plenitude. E fora a última vez que abrira as portas de seu coração. Sem mais ilusões agora. Sem mais tentativas e fim.

Os superficiais, que amam apenas a segurança material, tinham razão, afinal.

Já não sentia mais vontade de procurar um sentido para a vida. Ela passaria, sem questionamentos, do jeito que viesse. Estava cansado de suas ironias.

Continuaria, entretanto, sua luta pela extinção das dores alheias, pois só assim conseguia minimizar a sua. E embora fosse impossível esquecê-la, haveria momentos em que os envolvimentos com o mundo exterior o fariam afastar-se um pouco de seu intenso universo interior.

Sempre fora esse, antes, o seu modo de sobreviver. Retornava a ele agora. Só que era outro ser, agora renovado pela certeza da paz na sua solidão.

Quando em terra firme, caminhou sentindo o imenso vazio que carregava, com movimentos ditados pela inércia. Nada mais. A partir dali tudo seria assim, regido pelo Movimento Retilíneo Uniforme, pregado pelas leis da física.

Sentia-se como um alienígena. A cidade não era a mesma. Era como se tivesse adormecido e acordado em uma outra dimensão. Quando criança fez uma longa viagem com os pais. Na volta, lembrava, levou certo tempo para se readaptar ao cotidiano. Era assim que se sentia agora, um total estranho no ninho.

Então ele seguiu lentamente nesse caminho que agora começava indiferente quanto ao próximo destino, ao nunca mais...


Autor: Joaquim Saturnino Da Silva


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