Franz, o egoísta



Franz, o egoísta

(Luis C.)

No outono de 2008, eu exalava inspiração: conseguia escrever sem bloqueios, sem empecilhos e em todas as noites daquele tempo, as teclas da minha máquina podiam ser ouvidas em harmonia com as melhores canções de blues da estação de rádio. Mas, foi então que lembrei que não estava mais naqueles tempos dourados, e, agora, tudo o que eu tinha era cento e dez reais na conta corrente e um amor que morava a 970 quilômetros de mim.

Meu nome é Franz. Sem família. Dois dias de jejum. Sem dinheiro; dinheiro gasto apenas com cigarros, pois eu sei que um dia estes cigarros vão me levar para a paz infinita, vão me guiar para o descanso eterno e, assim sendo, atingirei o meu nirvana.

Oras, quando a máscara da infância cai e você percebe que suas idéias não são aceitas pela sociedade, a máquina criadora de vícios entra em ação. Mas não são vícios aceitos, são vícios que preenchem o vazio causado pelas dúvidas sobre si mesmo. E quando isso se mistura aos horrores do cotidiano, eles tendem a ter um novo significado.

Meu nome é Franz. Sou o operário que ninguém sabe o nome onde eu trabalho; sou a terceira tentativa de felicidade para o amor da minha vida; sou o filho desvirtuado da Dona Vera; sou o não-alienado mantendo relações com os alienados, sou o alcoólatra no meio dos embriagados. Seja lá o que eu fiz na outra vida, minha missão desta vez é apenas pagar o preço.

E não há nada mais maligno do que ouvir a sua amada dizer que um dia quer construir uma família com alguém como você, ouvir as pessoas que você ama dizer que um dia tudo isso vai passar, que um dia as águas do Atlântico renovarão a sua fé; mas, se não consigo sobreviver nem ao presente, como posso viver na esperança de dias celestiais?

Isso tudo não é sobre renascer na pele de uma pessoa destinada à felicidade, não é sobre ser a prioridade nos planos da pessoa que você ama, não é sobre deixar de ser utópico, não é mais uma carta de suicídio e nem um pedido de ajuda; isto é uma carta de amor e seja quem for a pessoa que leia isso, eu a amo com todas as minhas forças e quero que saiba que se não fosse você, eu não estaria escrevendo. A cada dia que passa, o que me mantém vivo são os meus ancestrais, porque os meus problemas perto dos que eles tiveram são como penas no meio do chumbo e eu não posso desonrá-los. Por isso, sigo vivo esperando apenas pela última tragada daquele tabaco que trará o meu descanso merecido...


Autor: Luis Carlos


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