A CRIANÇA E AS OPERAÇÕES COGNITIVAS E LINGUÍSTICAS



O ato de ler hoje acontece em todos os lugares. Em casa, nos bancos das praças, nas ruas, no ônibus. O indivíduo recebe constantemente várias mensagens escritas: placas, avisos, panfletos, etc...

O mundo da leitura tem muitas facetas. Lê-se para ampliar os conhecimentos, para obter informações, lê-se para chegar ao "prazer do texto". Prazer que resulta um trabalho intelectual, em diferentes níveis, que se instauram entre o leitor e sua experiência de mundo. Ler é experimentar a complexidade, a multiplicidade; é avistar incontáveis paisagens secretas que se ocultam em nossa vida cotidiana.

Todo professor que trabalha com leitura tem que ser, antes de mais nada, um bom leitor e deve gostar de produzir escritas. Ele precisa ler textos diferentes, já que lemos para nos distrair, para ampliar o conhecimento, para sentirmos prazer com os textos literários de ficção e poemas.

É importante também que as crianças contem histórias aos colegas e ao professor. Vamos ensinando aos pequenos, através de contínuas negociações, como se dá a complexa passagem da fala, da língua oral para a escrita. Essa passagem não é automática e exige várias operações cognitivas e lingüísticas, já que a escrita é uma representação simbólica da fala.

No momento em que a criança entra em contato com a escrita, através da interação com as pessoas que lêem e escrevem, começa a elaborar noções básicas da função social da escrita, tais como: organização, comunicação, registro e lazer.

Isto significa que a escola deve intensificar, no interior da sala de aula, a interação com as diversas produções gráficas utilizadas no meio cultural da criança. Produções que possua funções específicas conforme o contexto social em que foram produzidas - função de registro, divulgação de informações e conhecimentos e vivência. A interação com tais produções permite que a criança perceba a importância da escrita na relação com os outros, tornando-a necessária.

Analisando o processo histórico da escrita, podemos dizer que ela inicia na pré-história da escrita na criança.

É interagindo socialmente com a fala, gesto, brinquedos de faz-de-conta, jogos imitativos, desenhos, sons... que a criança avança no processo de apropriação da escrita, tendo a fala como principal instrumento mediador. Segundo Cagliari (1988, p.33),

(...) além da escrita, deve-se investigar as expectativas dos alunos com relação aos diferentes modos de fala, a leitura, à educação e à moral, à filosofia de vida que cada um espera ter para si, o que pretendem fazer quando crescerem e o que pretendem fazer na escola.

Assim, é necessário entender a alfabetização também como um processo de apropriação do conhecimento da língua escrita, em que o aluno, gradativamente, irá ampliar e rever suas formas de ler o mundo e representá-lo. Com o domínio de um sistema de código, a criança ampliará indefinidamente sua possibilidade de cognição.

A alfabetização, anteriormente tomada pela teoria associacionista como mera atividade mecânica, individualista e desvinculada de outros conhecimentos, priorizava apenas a percepção auditiva e visual. Hoje, assumindo um sentido mais amplo, alfabetizar é interagir com o mundo por intermédio da língua escrita.

Ao olharmos a escrita como um processo que da continuidade à aprendizagem / desenvolvimento da linguagem das crianças, não podemos mais aceitar que na prática pedagógica ocorra uma ruptura entre o que as crianças são capazes de fazer ao ingressar na escola e os objetivos que esta se propõe a trabalhar no ensino da língua.

Segundo Cagliari (1988, p.45) a produção e reprodução de textos de diferentes atividades objetivando:

- reforçar nos alunos a sensibilidade para diferentes usos da linguagem, conscientizando-os da existência de variações dialetais e de seu prestígio social e relativo;

- levar as crianças a compreender o fato de que os usos da língua, independente de suas regras são regidas por certas convenções; - caracterizar adequadamente o dialeto padrão como variação socialmente prestigiada, mas valorizando o dialeto da criança;

- caracterizar adequadamente o dialeto padrão como variação socialmente prestigiada, mas valorizando o dialeto da criança;

- levar a criança a observar a oposição entre padrão culto e popular e a produzir frases, orações, expressões em ambos os dialetos em demanda. 

Diante disso, deve-se trabalhar na escola diferentes tipos de textos, pois cada um tem uma função específica e é escrito de forma diferenciada: "A produção de um texto escrito envolve problemas específicos de estruturação do discurso, de coesão, de argumentação, de organização,deidéiaseescolha depalavras, do objetivo e do destinatário do texto, etc..." (CAGLIARI, 1988, p.140).

O trabalho com o texto é realizado visando à compreensão da função da escrita enquanto representação de palavras, para a sistematização necessária ao domínio do código escrito.

É preciso deixar os alunos escreverem textos livres, espontâneos, contarem histórias como quiserem. É neste tipo de material que vamos poder encontrar os elementos que mostram as reais dificuldades e facilidades dos alunos no aprendizado da escrita.

Então não precisamos corrigir demais as crianças, precisamos dar um tempo para que elas aprendam e incentivem a autocorreção e a autocrítica. Quanto mais queremos corrigi-las e orientá-las menos elas refletirão sobre sua ação.

Precisamos motivá-las para que estas se sintam desafiadas a fazer suas tarefas. E claro que isto é um processo muito trabalhoso, mas é necessário. Este tempo será compensado adquirindo de uma maneira conhecimentos mais consistentes pela criança, que organizará sua atuação nos demais anos escolares.

Uma outra atividade possível com a leitura de textos é a discussão do assunto com os alunos, não só do conteúdo, mas até mesmo da forma. Pedindo aos alunos que contem a mesma história com as próprias palavras. Isto é fazer uma interpretação criativa, não repetitiva, do texto.

Às vezes uma simples leitura basta. Nem tudo o que se lê precisa ser discutido, comentado, interpretado. Esse é outro erro que se vê eventualmente em livros didáticos. A leitura às vezes é como uma música que se quer ouvir e não dançar.

Portanto de tudo o que a escola pode oferecer de bom aos alunos é a leitura, sem dúvida, o melhor a grande herança da educação. Deveria se dar ênfase absoluta à leitura no ensino de português, desde a alfabetização.

Pois quanto mais oportunidades o educando tiver de ler e discutir, maior será o seu referencial para realizar uma produção escrita e oral própria; assim ele não será um mero reprodutor das idéias dos outros.

É sempre um trabalho de conscientização que o professor deve fazer no sentido de que a criança melhore sempre sua produção, tanto no aspecto gráfico, como no de estruturação de textos, seqüência lógica das narrativas orais e escritas.

Acreditamos que o trabalho com o texto é sempre norteador de todo trabalho com a alfabetização e a língua. Desde os textos orais que a criança produz e que o professor transcreve para mostrar até a direção da escrita e as correspondências da oralidade, até os textos autônomos nos quais a criança deve fazer presente sua própria voz, seus pontos de vista, suas opiniões, enfim, a linguagem na sua dimensão discursiva.


Autor: Márcio De Melo


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