Incertezas



Ando as voltas com a certeza da minha incerteza a respeito de tudo. Da completa disjunção entre o que penso perceber e as outras possibilidades desprezadas. Confesso que este ponto de partida não é contra o mundo como pode parecer, mas contra as minhas seguranças estabelecidas, meus paradigmas "definitivos".

Ando incerto a respeito da minha capacidade de enxergar o óbvio, da legitimidade do conhecimento que deveria ter a respeito da minha profissão, do lugar em que vivo, dos meus gestos, minhas crenças em certa Verdade, na sinceridade dos amigos e parentes. Incerto sobre o julgamento que faço das pessoas, baseado unicamente nos 2% de lucidez e desprezando os 98% que jazem submersos.

Inseguro se devo ficar ou partir, deixando minha desgastada história aqui, sepultada, e lançar-me, quem sabe, na última fuga em busca de um novo começo. Recomeçar, em um novo lugar, longe do que considero injusto e ingrato. Longe do cansaço do dia-a-dia sem futuro e horizontes. Longe da humilhação do pedir moedas para pagar uma passagem de ônibus porque o dinheiro do mês acabou. Longe da saudade dos que desisti de esperar.

Quero duvidar de minhas culpas, da convicção de meus erros sem perdão, da minha propalada ingratidão, insensibilidade, fraqueza e todos os rótulos que julgo ter e que gostaria de pensar serem imerecidos.

Desejo duvidar da certeza que tenho da minha falta de jeito com as pessoas, com a matemática, com o direito processual civil, com a minha ignorância pasmosa diante de quem deveria mostrar conhecimento e certeza, da minha memória curta, meu sono insopitável, minha preguiça, meu fumar exagerado, minha vontade de beber e ficar alegrinho somente.

Em certos momentos vem-me um desejo de largar tudo e viver sentado em qualquer esquina, dentro de um barril. Outras vezes fico a pensar em quantos segundos ainda tenho de vida, se de repente cairei duro na rua sem poder avisar minha mulher que finalmente toda incerteza acabou.

E procuro e procuro, obstinadamente, mais textos e livros que aprofundem minhas dúvidas e me façam duvidar até do que duvido. Na dúvida, penso que é somente cansaço, falta de férias e de uma vida um pouco mais digna. Talvez seja só falta de diversão, passeios de moto num dia de sol, um almoço gostoso com alguém que me ame, num bucólico restaurantezinho de beira de estrada. Quem sabe a coragem de chegar ao trabalho e dizer que estou indo embora, virar as costas e sair sorrindo, irresponsavelmente. Quem sabe, não tenho certeza, talvez.


Autor: Gilson Goulart


Artigos Relacionados


Minha Dor

Salmos: Salmos 38

Perdidos

VocÊ É Meu Poema

Lute Campeão

Minhas Filhas

Rascunho Da Vida