Preconceito racial: um estudo de caso com alunos de uma escola pública no município de Paulo Afonso ? BA.



Preconceito racial: um estudo de caso com alunos de uma escola pública no município de Paulo Afonso  BA.

                                              

 

Cínthia Rafaely Lima Gomes; Jaciele Andrade; Simone vieira Rodrigues.

 

Graduandas em Ciências Biológicas pela UNEB.

 

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 RESUMO

Baseado numa pesquisa realizada com alunos de uma escola pública no município de Paulo Afonso  BA, o trabalho objetivou saber qual a percepção de jovens do 9º ano do ensino fundamental com relação à temática preconceito racial, enfatizando o preconceito de cor, propriamente dito. Os resultados mostram que o percentual de discriminação sofrida por esses jovens é baixo, sendo mais elevado entre os pardos que entre os demais.

Apesar de estar em menor número, percebe  se os que se classificam como pretos estão em sua totalidade inseridos nos índices de quem presenciou e de quem sofreu discriminação racial. A percepção de pardos e pretos sobre racismo é maior que a demonstrada pelos brancos.

     

 Palavras-chave: preconceito racial; percepção; escola; jovens.

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Introdução

 

De modo geral, os jovens estão expostos à situações preconceituosas no ambiente escolar. São comuns as brincadeiras e chacotas com aqueles que estão muito acima ou muito abaixo do peso, com os que têm traços físicos distintos da maioria, enfim, no ambiente escolar a teia de relações construídas nem sempre é harmoniosa.

O presente trabalho aborda a temática do preconceito racial na visão de jovens estudantes em uma escola no município de Paulo Afonso  BA. A pesquisa foi realizada utilizando-se questionários semi-estruturados que foram respondidos por 30 alunos com faixa etária média de 14,6 anos.

Foram adotadas as categorias utilizadas pelo IBGE, sendo que a amostra foi constituída de 53,3% de jovens que se autodeclararam pardos; 3,3% de jovens que se autodeclararam pretos; 3,3% de jovens que se autodeclararam índios; 16,6% de jovens que se autodeclararam amarelos e 23,3% de jovens que se autodeclararam brancos.

Apesar das leis que tratam o racismo como crime inafiançável, aplicando inclusive penas de reclusão, ainda é bastante expressivo o número de pessoas que dizem já ter presenciado ou sofrido constrangimento em conseqüência de sua raça.

É importante salientar que, em se tratando de grupos humanos, o conceito de raça não encontra embasamento do arcabouço das ciências biológicas, uma vez que o termo faz referência à espécies distintas. Temos, porém, o vocábulo raça amplamente difundido para denominar grupos humanos, especialmente no que se refere a manifestações fenotípicas, sendo, portanto, uma forma de percepção e classificação social. Como afirma Araújo (1987 apud CARVALHO, 2005), a raça pode ser concebida como "um fato social, referido aos significados atribuídos pelas pessoas a atributos físicos e que servem para demarcar indivíduos e grupos, como uma percepção social que categoriza" Embora em dissonância com a conceituação biológica, é nesse sentido que o termo raça foi utilizado nesta pesquisa.

 

Preconceito racial no Brasil

 

A sociedade brasileira caracteriza-se por ser produto de um processo histórico que reuniu três grupos distintos: portugueses, índios e negros.

É certo que cada um desses grupos teve sua seu papel na mestiçagem do povo brasileiro. Mas se a história conta a importância dos negros, também nos remete a lembrança do regime de escravidão vivido por esses negros quando aqui chegaram. A escravidão em território brasileiro contituiu-se num estigma que deixou marcas tão amplas quanto permanentes, pois as raízes mais profundas do racismo têm sua origem no regime escravocrata.

Apesar do alto grau de mestiçagem, que, durante muito tempo alicerçou as bases do mito da democracia racial, pode-se afirmar que o preconceito racial no Brasil é, na prática, proporcional à cor da pele: quanto mais negro for o cidadão, mais passível será de discriminação.

 Segundo o Artigo 5º, XLII da Constituição Federal, a prática do racismo constitui crime inafiançável imprescritível, sujeito a pena de reclusão nos termos da lei.

A realidade social brasileira, no entanto, ainda não acompanha o avanço do quadro jurídico uma vez que o racismo continua, ainda nos dias atuais, sendo uma prática comum na sociedade brasileira.

Os estudos sobre racismo no Brasil apontam para uma relação paradoxal onde os brasileiros reconhecem a existência do preconceito racial, mas concomitantemente afirmam não comungarem no racismo.

Dahia (2008) afirma que, se de um lado os brasileiros não se consideram racistas e ostentam uma imagem de gente sem preconceito afeita à mistura racial, por outro, quando são sondados sutilmente, fornecem indicadores que apontam para um preconceito racial latente.

 

Percepção do racismo pelos estudantes

 

Foram incluídas perguntas no questionário semi-estruturado, com intuito de saber qual a percepção de jovens do 9º ano do ensino fundamental com relação à temática preconceito racial enfatizando o preconceito de cor, propriamente dito.

Para verificar a compreensão desses jovens com relação a sua raça fizemos a seguinte pergunta:

 

P1 - Como você se considera?

 1) Pardo; 2) branco; 3) preto; 4)amarelo; 5) indígena.

 

53,3% escolheram a opção (1)

23,3% escolheram a opção (2)

3,3% escolheram a opção (3)

16,6% escolheram a opção (4)

3,3% escolheram a opção (5)

 

Tomando essa pergunta como base, podemos perceber a diversidade de percepção de raças entre os jovens segundo os sexos.

 

Tabela 1

Autopercepção de raça segundo o sexo (%)

Raça

Sexo feminino

Sexo masculino

Pardo

62,5

42,8

Branco

37,5

  7,1

Amarelo

--------

35,7

Indígena

--------

  7,1

Preto

--------

  7,1

 

 

Analisando a tabela 1 tem-se a percepção de raça entre os jovens de sexos diferentes, observando o gradiente de suas respostas com relação a sua cor, podemos ver que a proporção de pardos em ambos os sexos é maior, seguida por brancos, amarelos e igual proporção para indígenas e pretos.

Sendo notado que a percepção de cor parece está mais bem diversificada entre os homens.

 

A admissão do preconceito racial foi testada através da seguinte pergunta:

 

 

P2 - Você se considera racista?

1) não;  2) sim

 

93,3% escolheram a opção (1)

6,6% escolheram a opção (2)

 

 

Tomando essa pergunta como base, temos um resultado surpreendente ao perceber uma suposta divergência em algumas respostas.

 

                                                            Tabela 2

Percepção do preconceito segundo o sexo (%)

Raça

Sexo masculino

Sexo feminino

 

Racista

Não racista

Racista

Não racista

Pardos

------

 48,2

12,5

37,5

Pretos

------

  7,1

------

-------

Brancos

------

  7,1

------

37,5

Amarelos

------

35,7

------

------

indígena

-------

  7,1

------

------

 

 

Com relação às respostas da tabela 2, percebemos que a grande maioria não se considera racista, embora algumas respostas tenham sido positivas para a pergunta.

 

Quanto a ter presenciado algum tipo de preconceito racial em seu cotidiano, foi feita a seguinte abordagem:

 

P3  Você já presenciou alguma cena de discriminação racial?

1)     sim; 2) não.

 

50% responderam (1).

50% responderam (2).

 

De acordo com as respostas a essa pergunta podemos perceber que entre pelo menos metade desses jovens, cenas de preconceito são corriqueiras.

 

Tabela 3

Percepção de discriminação racial segundo o sexo (%)

Raça

Sexo masculino

Sexo feminino

 

Presenciaram

Não presenciaram

Presenciaram

Não presenciaram

Pardos

21,4

21,4

31, 25

31,25

Brancos

  7,1

------

------

37,5

Pretos

  7,1

------

------

------

Amarelos

28,5

7,1

------

------

Indígenas

  7,1

------

------

------

 

 

Observando as respostas nota-se que em ambos os sexos há uma porcentagem balanceada da percepção de discriminação onde outras pessoas sofreram o ato. Todavia esse percentual é alto, quando se trata de algo que deveria ter sido erradicado do Brasil há muitos anos. Viu  se que essa percepção é maior entre os pardos, amarelos, pretos e indígenas sendo menos percebido entre os brancos. Percebe-se que quanto mais escuro for o individuo mais fácil é para identificar a cor. A cor é uma variável que interfere na intensidade com que o racismo é percebido.

Em relação a sentir - se vítima de preconceito racial e onde isso comumente ocorre, fizemos a seguinte pergunta:

 

P4  Você já sofreu algum tipo de discriminação por causa da sua cor? Onde isso aconteceu?

 1) sim; 2) não.

 

83,3% disseram (2)

16,6% disseram (1)

 

Sendo que dos que escolheram a opção (1) 60% disseram ter sofrido a discriminação dentro do ambiente escolar e 40% em outros lugares.

 

                                                               Tabela 4

                                     Percentual de discriminação (%)

Raças

                          Sofreram discriminação

                                          

 

Pardos

                                           40

Brancos

                                         -------

Amarelos

                                           20

Pretos

                                           20

Indígenas

                                           20

 

 

Os resultados mostram que o percentual de discriminação sofrido por esses jovens não é baixo, sendo mais elevado entre os pardos que entre os demais. E o que mais causa alarde é isso ser tão comum nos ambientes em que esses jovens freqüentam rotineiramente.

A percepção de pardos e pretos sobre racismo é maior que aquela demonstrada pelos brancos porque são eles os que no cotidiano, em suas relações pessoais e sociais, se deparam com vários indícios que os remete a essa temática. Os brancos têm menor percepção do racismo porque não é algo que os afeta diretamente, então imaginam que esse é um problema com pouca relevância atualmente.

 

Considerações finais

 

Os brasileiros evitam expressar verbalmente a existência do preconceito em suas ações cotidianas, mas a realidade é que o preconceito é um problema presente no Brasil, estando muitas vezes associado ao racismo e discriminação.

A sociedade contemporânea precisa ressignificar sua própria cultura, tendo em vista a necessidade evidente da superação de preconceitos, especialmente quando se faz referência a cor.

É inadmissível que em pleno século XXI ainda exista espaço para a cultura racista implantada desde o período colonial e que permanece como uma mácula que pesa sobre parte da população brasileira, essencialmente a afro descendente.

Numa sociedade multiétinica como o Brasil, as representações negativas de uma raça equivalem a negar sua própria genealogia, seu contexto epistemológico e social.

O trabalho mostrou que metade dos jovens pesquisados já presenciou alguma cena de discriminação racial, esse é um dado que só vem corroborar o lamentável quadro de preconceito de raça que ainda é arraigado na nossa sociedade.

 

 

Referências bibliográficas

 

 CARVALHO, Marília. Quem é negro, quem é branco: desempenho escolar e classificação racial de alunos. Rev. Bras. Educ.,  Rio de Janeiro,  nº. 28, abr.  2005.  Disponível em . Acesso em  19  dez.  2009. 

 

CECCHETTO, Fátima; MONTEIRO, Simone. Discriminação, cor e intervenção social entre jovens na cidade do Rio de Janeiro (RJ, Brasil): a perspectiva masculina. Rev. Estud. Fem.,  Florianópolis,  v. 14,  n. 1, abr.  2006.   Disponível em . Acesso em  19  dez.  2009. 

 

 DAHIA, Sandra Leal de Melo. A mediação do riso na expressão e consolidação racismo no Brasil. Soc. estado.,  Brasília,  v. 23,  n. 3, dez.  2008. Disponível em . acesso em  20  dez.  2009.

 

GUIMARAES, Antonio Sérgio Alfredo. Preconceito de cor e racismo no Brasil. Rev. Antropol.,  São Paulo,  v. 47,  n. 1,   2004. Disponível em .  Acesso em  20  dez.  2009.

 

MAGGIE, Yvonne. Pela igualdade. Rev. Estud. Fem.,  Florianópolis,  v. 16,  nº. 3, dez.  2008 .   Disponível em . Acesso em  20  dez.  2009. 

 

MAGGIE, Yvonne. Racismo e anti-racismo: preconceito, discriminação e os jovens estudantes nas escolas cariocas. Educ. Soc. vol.27 nº. 96.  Campinas Oct. 2006. Disponível em . Acesso em  20  dez.  2009. 

 

OLIVEIRA, Cloves Luiz Pereira; BARRETO, Paula Cristina da Silva. Percepção do racismo no Rio de Janeiro. Estud. afro-asiát.,  Rio de Janeiro,  v. 25,  nº. 2,   2003 .   Disponível em .

 Acesso em  20  dez.  2009.

 

 


Autor: Simone V. Rodrigues


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