Resenha Crítico-informativa



Logo na parte introdutória do livro, o autor afirma que o único sentido da avaliação é cuidar da aprendizagem.Avalia­ção, se mal feita, só atrapalha. Se bem feita, entretanto, pode ser es­tratégia fundamental, por vezes decisiva.O autor comenta ainda que não se pode depositar sobre avaliação esperança excitada, porque é apenas par­te do processo, muito menos imaginar que se possa inventar um tipo perfeito e final de avaliação. Toda avaliação é incompleta, incô­moda e injusta, além de muito facilmente estigmatizante, insidiosa e mesmo fraudulenta. Ainda assim, pode ser apoio substancial, se for concebida e praticada para cuidar da aprendizagem do aluno com dedicação diária. Comete-se um grande erro ao pensar que avaliação "oficial" é a "prova", assim como ensino "oficial" é a "aula". Ambas são caricaturas pálidas ou deturpantes da aprendiza­gem mais autêntica.No lugar da prova é urgente colocar outros procedimentos que, ao avaliar, não se restrinjam aos laivos negativos sempre tam­bém presentes, mas impliquem o contexto necessariamente peda­gógico da avaliação, ou seja, objetivo de cuidar da aprendizagem dos alunos. 

No primeiro capítulo, o autor discute conceitos sobre aprender e conhecer. Ele afirma que aprendizagem é dinâmica reconstrutiva política, como mostra hoje também a biologia. Outros autores como Maturana e Varela (1994) cunharam o termo "autopoiese", para designar esta característica de todo ser vivo de funcionar de dentro para fora.Os seres vivos são auto-referentes, porque compreendem arealidade a partir de si mesmos, não apenas da realidade como tal externa. Não há acesso direto e imediato à realidade externa, mas mediado pelos sentidos e pelo cérebro, de maneira sempre reconstrutiva.

A realidade externa não pode ser reduzida a mero ponto de partida, porque é, como a biologia também mostra, ambiente essen­cial do desenvolvimento do ser vivo. Ao fim, predomina a percepção autopoiética, porque não se pode elidir o sujeito, mas a realidade externa, bem como os outros em sociedade, também nos são constitutivos. A vida não é máquina mecânica, reprodutiva, mas constru­ção e permanente reconstrução biológica e histórica, dotada de sujeito inalienável. Pedro Demo cita um exemplo interessante, ele diz que se reunimos 10 pessoas em torno de mesa redonda e contarmos para a número l uma história, para que conte adiante para a número 2, até à número 10, veremos que esta história pode chegar bastante retocada ou mesmo irreconhecível. A razão é autopoiética ou hermenêutica: não sa­bemos reproduzir a história. Ao contarmos uma história, o faze­mos na condição de sujeitos, não de objetos.

O autor reforça a idéia citada acima dizendo que aprendizagem é, pois, "dinâmica reconstrutiva", de dentro para fora. Quer dizer que o aluno somente aprende se reconstruir conhecimento. Não pode permanecer em escutar, copiar e devolver de modo reproduzido na prova.

No que diz respeito a conhecimento e aprendizagem, os dois termos não são sinônimos, obviamente, até por­que pode existir forte tensão entre ambos (Demo, 2000a), mas são correlates em vasta extensão e intensidade. Conhecimento é dinâ­mica tipicamente reconstrutiva e política, porque conhecer implica aprender em sua energia mais intensa e profunda. Aprendizagem, todavia, é conceito bem mais amplo, porque não se restringe, em hipótese nenhuma, à razão cognitiva (Damásio, !996;Goleman, 1996) ou ao que chamamos de racionalidade. Entre as dinâmicas mais fantásticas do desenvolvimento huma­no está a habilidade infinita de aprender e conhecer. Por isso, institucionalizamos processos educativos recorrentes em socieda­de, em parte obrigatórios, porque internalizamos a convicção de que conhecimento é fundamental para a vida, principalmente para mudar de vida. Becker, inclusive diz que conhecimento só é conhecimento no processo de construção, não apenas no processo de reprodução. 

Nos capítulos 2 e 3, o autor fala sobre o processo de descarrilamento da avaliação e que é realmente avaliar. Por não ser nada fácil avaliar, ele diz que os educadores estão de mal com a avaliação, é como se ela fosse realizada apenas para cumprir um requisito escolar e não com a função de auxiliar o aluno no processo de aprendizagem. O autor comenta quepassamos de um extremo a outro. Antes, avaliava-se para ex­cluir, humilhar, estigmatizar. Agora, já não se faz avaliação nenhuma. Os alunos eram mantidos sob constante estado de vigilância, com provas de supetão a qualquer momento, exposição em plena sala dos que não sabiam responder questões à queima-roupa, repreen­sões duras e agressivas, expressando em grande parte a prepotência escolar. Memorizar era praticamente tudo: de um lado, repassar montanhas de conteúdos; de outro, absorver e devolver na prova. Silva (1987) comenta que este procedimento ainda não morreu, em especial em algumas disci­plinas mais formais, como matemática. Muitas escolas de engenharia, por exemplo, medem sua qualidade pelos alunos re­provados a cada ano. Foi importante superar este estereótipo escolar, mas não cabe ir ao outro extremo, já que a pedagogia da exclu­são não pode ser substituída pela do abandono ou do faz-de-conta.

É interessante perceber que o crescimento de cada aluno, no seu ritmo e contexto, pode ser mais fundamental do que a comparação com outros colegas. É deste pano de fundo que emergem, geralmente, as vozes contrárias à "classificação", embora, excluindo sem mais a referência classificatória, também deixam de avaliar. O fato preocupante, entretanto, é que processos avaliativos vinculam-se com excessiva faci­lidade com procedimentos excludentes, à medida que privilegiam em demasia desempenhos.Ultimamente, com o advento das "inteligências múltiplas" e o realce da "inteligência emocional", a noção de desempenho foi selo menos alargada e flexibilizada.

Comentando sobre o que é avaliar, o autor diz que a atividade de avaliar pode aparecer em inúmeras circunstâncias, tais como: constrastar quantidades, qualidades, qualificar desempenhos, comparar situações, dinâmicas, propor padrões, distribuir expectativas, evitar excessos, prevenir obstáculos e impedimentos, entre outras.

Por conta da complexidade da avalia­ção, é sempre importante diversificar as maneiras de avaliar, no que se pode incluir também "auto-avaliações", desde que não sejam exclusi­vas.

Buscando melhorar cada vez mais o processo avaliativo o autor propõe criticar a avaliação. Ele diz que do ponto de vista educacional, toda avaliação é: sempre injusta, pois não é possível avaliar seres humanos por outros seres humanos de forma justa. É sempre incômoda, sempre incompleta, ideológica, facilmente autóritária, excludente, humilhante, insidiosa. Um procedimento citado pelo autor, em relação a avaliação é a democracia desse processo. Alguns pontos a serem considerados poderiam ser: avaliar o avaliador, o avaliado precisa entender como se dá o processo avaliativo, precisa ter o direito de pedir explicações. O avaliado deve ter o direito de refazer o que fez equivocado. A avaliação deve ser pedágógica, ou seja, garantir o direito de aprender. Por último toda avaliação é discutível. Com essa visão em mente, torna-se mais clara a pequenez da prova. Embora seja prática nacional, é uma forma extremamente frágil de avaliação.O verdadeiro "milagre" do professor é conseguir que seu aluno saiba pensar, torne-se cidadão autónomo, cresça em seu processo emancipatório, aprenda a con­frontar-se com a realidade, desconstrua e reconstrua conhecimento.

No último capítulo do livro,o autor volta a temática principal de toda a obra, fala sobre a intrínseca ligação que deve existir entre aprendizagem e avaliação. Ele afirma que o foco da avaliação precisa ser retirado da prova e de outras querelas que giram em torno da prova, como nota, para centrar-se nodesafio da aprendizagem reconstrutiva política e aí servir de apoio sistemático. Avalia-se para garantir o direito de aprender. Este desafio compensa todas as misérias da avaliação e que, como vimos, são inú­meras e preocupantes. O aluno precisa elaborar toda semana - este é requisito fundamental, ainda que não cabal, nem exclusivo. Em vez de ficar escutando o professor, tomando nota do que diz ou escreve no quadro, copiar a apostila ou o livro didático, o aluno deve ser levado a produzir textos próprios, começando do começo. Nada do que ocor­re em sala de aula pode ser reproduzido, nem a aula do professor. Tudo que existe em sala de aula não passa de "material de pesquisa", que deve ser manejado pelo aluno na condição de sujeito, não de objeto.

O autor comenta que o aluno não vem para a escola escutar aula.Vem para recons­truir conhecimento e arquitetar sua cidadania integral (corporal, emo­cional e espiritual). Sala de aula é, antes de tudo, ambiente de estudo e pesquisa, pela razão simples de que pesquisa é o ambiente de aprendizagem (Demo, 1996a). Pesquisa não é atividade esporádica, eventual, voluntária, intermitente, mas centro da dinâmica autopoiética da aprendizagem. 

Por fim, o autor mostra que a finalidade da avaliação é de cuidar todo dia deste processo. Muda a posição do professor. Não é transmissor de conhecimento, porque sua função não é instruir, mas educar, formar. Seu desafio socrático emerge com toda força: é de provocação, orientação, insti­gação, sobretudo de "cuidado". Cuidar da aprendizagem traduz, ade­mais, a integralidade do processo de aprendizagem, que nunca se reduz ao aspecto racional lógico. Está em jogo a formação da perso­nalidade humana como um todo.

COMENTÁRIO PESSOAL

A obra traz excelentes dicas de como entender melhor o processo avaliativo dos alunos e como fazer dele algo mais eficiente. Avaliar não é uma tarefa fácil e se for realizada de qualquer maneira pode interferir negativamente, na formação e no desenvolvimento do alunado. Os educadores devem estar conscientes de seu papel, que deve ser o de preocupar-se com o aprendizado dos alunos, fazer com que o aluno realmente aprenda. Devem estar empenhados em tranformar seus alunos em seres cada vez mais autônomos e construtores de conhecimento. Somos seres pensantes, e não meros reprodutores de saber. O que está em jogo no processo avaliativo não é uma simples nota, mas a formação de um indivíduo como um todo.


Autor: Adna Couto


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