Histórico das agressões internacionais à ilha de Cuba, por Pedro Lara de Arruda e Raphael Romão da Silva
No entanto me ocorreu que todas estas questões poderiam ser estruturalmente elucidadas ao relacionarmo-las com um evento recorrente na história cubana, o conflito. Ou, melhor dizendo, algo pior que o conflito, pois esse pressupõe agressão recíproca e, conforme veremos, nem sempre o povo cubano revidou e revida às agressões sofridas[1].
Assim sendo, estudaremos as principais formas de agressão que vêm sofrendo Cuba, bem como os principais casos de agressão que assolaram este país. Pra tanto, partiremos de uma análise histórica destacando esses pontos. II Introdução.
O trabalho que se segue buscará analisar as principais crises pelas quais Cuba passou, destacando sempre as agressões que lhes foram infringidas. Buscaremos, com o intuito de uma compreensão mais completa, contextualizar os motivos de cada uma destas crises, bem como suas conseqüências para o povo cubano.
Para tanto associaremos as mais relevantes crises por meio de uma coerente teia histórica, tal que se perceba o aspecto contínuo das agressões sofridas por Cuba. Feita esta base histórica tomaremos algumas das principais questões que atormentam o povo cubano, buscando, mais uma vez, interpreta-la em seu tempo, ponderando antecedentes a buscando traçar cenários possíveis e prováveis.
III Antecedentes Históricos.
Muito se comenta sobre as atuais agressões estadunidenses a Cuba, entretanto a ilha é vítima do ódio vizinho desde sua existência colonial. Há também que lembrarmo-nos da série de violações e agressões a Cuba, próprias do extenso período colonial sob o qual esta foi subjugada pela tirania Espanhola.
É com vista nestes aspectos, muitas vezes esquecidos e não ponderados quando tratamos das agressões sofridas por Cuba, que dedicaremos esta parte de nosso trabalho a analisar o sangrento período colonial cubano, bem como a sua imediata "independência, que mais remonta a um neo-colonialismo". Essa análise guardará ainda o interessede encontrar neste passado atormentado, causas e possíveis soluções para um presente tão incerto.
III. 1 As agressões Espanholas.
Sob um olhar atento, seria prudente dizer que a primeira agressão sofrida pelo povo Cubano foi antes mesmo de 27 de Outubro de1942, quando Colombo aportou em Cuba, pois, como se sabe, as condições de viajem de tripulantes menos abastados e de menor patente eram desumanas. Conforme nos indicam estudos demográficos e estudos sociológicos, a maioria da população Cubana descende de negros trazidos sob regime compulsório e espanhóis de menor estirpe, certamente chegados à ilha por meio de viagens desumanas como se supõem ter sido a de Colombo. Dessa forma, embora não haja a certeza de que os tripulantes de Colombo tenham se instalado na ilha e gerado descendentes que viessem a efetivamente constituir a população cubana, é justo fazer referência a este fragmento, as baixas classes espanholas, que certamente exerceriam notável contribuição na constituição demográfica Cubana.
A partir de 27 de Outubro de 1942, podemos dizer que houve uma agressão intrínseca à constituição social cubana, tanto por sua constituição essencialmente escravocrata, o que por definição já é uma violação das liberdades do cativo, quanto pelo sistema econômico que se implantou, onde uma elite minoritária lucrava com o espólio da mão de obra popular. Esta última direcionada, inicialmente, para criações bovinas e produção do charque, e, a partir do século XIII, voltada para plantations canavieiros e posteriormente cafeeiros.
Além da opressão antagônica e pronunciado desrespeito às populações de menor renda e escrava, podemos enxergar uma agressão espanhola na medida em que sua opção sócio-econômica representava uma limitação ao desenvolvimento sócio cultural da região e, ao mesmo tempo, tornava a ilha um apetitoso pedaço da terra "Cuba is the richest slice in the earth"[2] para o ambicioso império norte-americano que já se desenhava e que, com a unificação das treze colônias (séc. XVIII), passaria a influir diretamente em favor da descolonização cubana, visando, entretanto, tomar conta daquele rico pedaço de terra.
Isto nos leva a um particular momento de violência na colonização cubana. Em fins do século XVIII, especialmente após 1791, ano do levante de Saint Domingues no Haiti, liderado pelo ex-escravo Toussaint Louverture. Este evento trouxe tanto um clima de medo, por parte das minorias dominantes, que temiam um levante popular similar quanto uma nova fatia do mercado canavieiro. Em vista disso, as autoridades coloniais e senhores de engenho optaram por intensificar seu trato a cativos e populares, impondo sua autoridade por meios cada vez mais despóticos e sangrentos, a fim de coibir qualquer manifestação popular.
Outro especial momento de agressão à ilha foi entre 1868 e 1878, durante a denominada "primeira independência", situação onde colonos, insatisfeitos com as desumanas condições da ilha, bem como com a falta de perspectiva imperante, buscaram emancipar-se para governarem em prol de seus interesses. Entretanto, a reação espanhola extravasou quaisquer expectativas e atingiu um nível de violência tal que a parte oriental cubana fosse completamente destruída, gerando conseqüências que atingiram mesmo os não envolvidos no processo revolucionário. Outra conseqüência catastrófica desta ação foi a desvalorização de territórios ao leste, proporcionando uma compra massiva destes por parte dos estadunidenses, que já ambicionavam um controle sobre a ilha.
III. 2 As Agressões Inglesas.
Antes de debruçarmo-nos sobre as agressões estadunidenses a Cuba, na imediata "independência"da ilha, devemos nos ater a um especial fenômenos vivido por Cuba entre os séculos XVI, XVII e três primeiros quartis do séc. XVIIIDurante este período, especialmente no decorrer do séc. XVII, o alto valor econômico do açúcar, bem como a carência de colônias francesas e, sobretudo, inglesas, nas Américas e Caribe, estimulou corsários ingleses e mesmo piratas a escolherem Cuba como porto seguro nos turbulentos e lucrativos mares do Caribe.
Essa segurança, no entanto, era exclusiva aos que lá aportavam, pois aos colonos restava apenas maior carga de trabalho, intensificação do serviço compulsório e uma escalada de crimes e demais atos que mitigavam o já inexistente "estado de direito na colônia". Houve assim o estabelecimento de bares, prostíbulos e demais estabelecimentos de baixa estirpe, que além de criarem uma visão estereotipada da ilha, agravada durante a período recém independência pela atuação norte-americana, levaram diversos cubanos à criminalidade e prostituição, favorecendo crimes organizados e demais mecanismos que ainda hoje dificultam o estabelecimento da democracia na região.
Afora esta violência velada, houve um especial momento de tensão. Em 1762 a Inglaterra, motivada pelo conflito que travava com a Espanha, invadiu a ilha por 11 mêses, e, tratando-a como espólio de guerra, iniciou uma exploração canavieira extremamente intensiva.
Para tanto houve a necessidade de triplicar-se o número de navios negreiros aportados, o que representou um acréscimo de cerca de quatro mil negros. Além disso a cobrança sobre a população tornou-se mais gananciosa e furiosa. Outrossim, a intervenção inglesa estreitou os laços cubanos com as treze colônia, condenando Cuba aos interesses imperialistas destes.
III. 3 Sob As Duras Penas Do "Neo-colonialismo" Estadunidense.
A partir da unificação das treze colônias os EUA já se figuravam como potencialmente imperialista. Isto em vista tanto de suas capacidades quanto de seus interesses matriciais expressos pelo "destino manifesto".
Assim sendo Cuba era um objetivo natural. Desde seus primórdios a nação do norte já infringia a Cuba tratados espoliativos como o tráfico negreiro e comercio açucareiro. A proximidade (90 milhas) entre os países era também um outro motivo que direcionava os interesses norte-americanos para a ilha. Cuba fica numa região estratégica para controle dos mares caribenhos e seu respectivo comercio açucareiro, além de, obviamente, representar uma base próxima para defesa e segurança nacional dos mares norte americanos. Os mexicanos costumam dizer que estão "tão longe do céu e tão perto dos EUA". Infelizmente, Cuba não pode negar sua proximidade dos EUA.
Por esses motivos, dentre outros, é que os EUA ambicionavam dominar Cuba ou pelo menos transformá-la em área de interesse. Para tal os EUA influíram fortemente no processo de independência da ilha, enviando dos mais competentes diplomatas e estadistas às negociações de Madri a esse respeito. Essa ambição ficou deflagrada em 1898 quando os EUA, sob uma falsa premissa de revide ao afundamento de um barco seu Maine no porto de Havana, em janeiro daquele ano, declara guerra à Espanha e consegue, como resultado, a independência de Cuba.
Surge então em 1902 a emancipação cubana que, no entanto, existe apenas em termos, na medida em que a ilha estava, desde 1900, ocupada por tropas norte-americanas. Além disso, a constituição nacional surgiu atrelada a oito emendas que visavam resguardar a capacidade norte-americana de interferir nas questões domésticas da ilha sempre que este julgasse necessário, então denominada "Emenda Platt". Houve ainda o estabelecimento de uma base militar em Guantanamo, que persiste ainda hoje.
Além destas medidas institucionais os vizinhos do norte esforçaram-se por estabelecer, também, um controle político por via da escolha dos governantes. Deve-se destacar que esta opção foi parte integrante de ações norte-americanas para assegurar a pertinência da Emenda Plat, haja visto que entre o estabelecimento da constituição, em 1902, e o governo do civil Ramón Grau, em 1944, foram necessárias cinco intervenções militares norte americanas, altamente desafiadoras e mitigantes da população cubana, bem como da soberania daquela nação.
Cuba viveu então sob a tirania de dois ditadores subservientes ao imperialismo do norte, o primeiro deles foi Gerardo Machado, que governou de 1925 a 1934, quando começou a tomar palanque uma nova figura despótica Fulgencio Batista que viria a "eleger-se" num processo fraudulento em 1940, governando assim até 1944 e retomando o poder em 1952 por meio de um golpe. Este último período de Fulgencio seria um dos mais violentos da história cubana, combinando isso a baixos níveis de desenvolvimento e a uma concentração de renda crescente, muito influenciada pelas constantes práticas de corrupção que tomaram palco.
III. 4 A Recusa Do Norte Em Aceitar O Novo Sistema Cubano.
Quando finalmente a ditadura de Fulgencio foi encerrada pela revolução liderada por Fidel Castro, com a participação decisiva de Che Guevara, Cienfuegos e Raul Castro, Cuba passou a ser alvo do ódio e da ira estadunidense. Washington recusava-se a perder o controle da ilha que por tanto lhe serviu, ainda mais no contexto de Guerra Fria que se vivia, pois os ideais libertários que guiaram a resolução levaram à instauração de um regime socialista.
Vale lembrar que este cenário já era previsto por guerrilheiros e demais atores do processo emancipador cubano como José Martí, que dizia;
"Preocupou-me com afinco na preparação e no significado que teria, para a "nossa América", a Conferencia Internacional Americana, em Washington (1889-1890)"
Como ação mais concreta deste período poderíamos citar o evento conhecido como "ataque à Bahia dos Porcos" (1961), no qual a CIA (agência de inteligência norte-americana) planejou atacar cuba por meio dos traidores cubanos, então exilados nos EUA. Para tanto, o governo do norte armou e treinou cerca de mil exilados cubanos insatisfeitos com o novo governo, para que eles pudessem fazer uma "revolução" e, mais uma vez, alinhar as políticas cubanas aos interesses de Washington.
Entretanto esta ação em nenhum momento foi vista como uma revolução popular de fato, e foi sempre deflagrada como uma intrusão ou, melhor dizendo, ataque norte-americano a Cuba, por meio de uma minoria traidora.
Com a ajuda da população cubana Fidel conseguiu contornar a situação, expulsando os invasores e preservando a soberania cubana, num ato que ele classifica como "vitória sobre o imperialismo".
IV Agressões recentes.
Ao que tudo aponta, o sucesso cubano em resolver a crise na Bahia dos Porcos serviu para a cristalização de um país soberano com autonomia decisória própria. O que houve a partir de então foi um fortalecimento das instituições nacionais e um verdadeiro estabelecimento da democracia e do estado de direito, mesmo que esses pontos sejam questionados com base no governo ditatorial de Fidel.
O fato é que Cuba é ainda hoje objeto de desejo norte-americano, que, tanto busca anexa-la como região estratégica, quanto visa destruir sua harmonia para demonizar a imagem socialista e consolidar a superestrutura capitalista que tanto lhe favorece.
Desta forma Fidel se vê obrigado a restringir o acesso aos meios políticos, caso contrario os EUA mitigariam a capacidade política da ilha e, mais uma vez, exerceriam controle e dominação sobre o povo cubano. Além disso o governo de Fidel inclui-se plenamente na fase de "Ditadura do Proletariado" para obtenção do Comunismo, propostas por Marx & Engels e Lênim, bastiões teóricos do sistema que o povo cubano outrora lutou para implementar, num processo de democracia ativa na medida em que a maioria não apenas escolheu seu sistema como também lutou por ele.
Isto em vista, veremos a seguir algumas das principais formas de agressão que os EUA vem incidindo sobre o povo cubano.
IV. 1 A Diversidade da Agressão.
Antes de qualquer contato com as ameaças estadunidenses é preciso termos em mente que o fortalecimento do estado cubano, sua maior inserção no sistema internacional e conseqüente percepção norte-americana da lealdade do povo cubano ao seu sistema político, são barreiras sensíveis a intervenções convencionais ataques militares, etc..., mesmo que estas ainda aconteçam.
Conscientes disso é que os EUA vêm desenvolvendo novos caminhos para intrometer-se na política cubana. Creio, dessa forma, que uma percepção mais ampla do intervencionismo norte americano em Cuba seria propiciado por meio de uma apresentação das principais agressões à ilha, separados por modalidades de ação (e.g intrusões econômicas, culturais, etc...). Conforme se segue.
IV. 1. 1 As Agressões Econômicas.
Embora uma minoria alegue que o Embargo norte-americano a Cuba seja uma mera questão de mercado, esta ação extravasa as possibilidade de mercado e enquadra-se perfeitamente no conceito de "War Act" (ato de guerra), reconhecido pela Conferência Naval de Londres, segundo a qual, "seu emprego é unicamente possível por parte dos beligerantes". Assim sendo, o Direito Internacional assegura os Direitos cubanos na medida em que definitivamente não há ataque cubano aos EUA, o que deslegitimaria a ação belicosa norte-americana. Outro contraposto legal a esse ato seria a não declaração norte-americana de guerra contra Cuba, mesmo que atos de guerra estejam sendo praticados.
Tampouco podem os EUA alegar legitimidade para sua ação, haja visto as 15 condenações massivas aprovadas na Assembléia Geral das Nações Unidas, contrárias ao embargo norte-americano. A expressividade destas eleições podem ser percebidas ao analisarmos os últimos resultados, de 2005 e 2006, onde os EUA tiveram o apoio, respectivamente, das Ilhas Marshall e de ninguém.
Resta-nos, portanto, compreender em que consiste este embargo comercial, suas perspectivas históricas e, sobretudo, conseqüências para o povo cubano.
Um embargo econômico foi incidido sobre Cuba já em 1958, quando iniciavam-se os embates revolucionários contrários ao governo de Fulgencio Batista. Com o estabelecimento do regime de Fidel, em 1960, os EUA intensificaram este embargo, restringindo as importações de cana a 700.000 toneladas, golpe que poderia ter sido letal não fosse o acordo estabelecido com a URSS, visando escoar a produção açucareira e o abastecimento energético da ilha.
Ainda em 1960 o presidente Einsenhawer aprovou um embargo a demais produtos cubanos, iniciativa que precedeu o rompimento diplomático que ocorreria em 1961. Mais uma vez a aliança com a URSS foi providencial na medida em que Cuba passou a ter preferência nas cotas de exportações soviéticas. A resposta norte-americana a esse subterfúgio foi aumentar ainda mais a lista de produtos inviabilizados de serem comercializados com a ilha, por meio de uma ordem executiva do presidente Kennedy em 1962 .
No ano seguinte o mesmo presidente mostrar-se-ia ainda mais intransigente quando, influenciado pela "Crise dos Mísseis", proibiu viagens a Cuba e lançou o "Cuban Assets Control Regulations" - Regulamento para o Controle dos Recursos Cubanos -. Em julho do mesmo ano ele baixou a "Acta de Comércio com o Inimigo", congelando os ativos cubanos em bancos norte-americanos, o que foi nada menos que um roubo massivo dos recursos financeiros cubanos.
Em 1964 e Organização dos Estado Americanos, mecanismo altamente influenciado pelos EUA, estabeleceu uma sanção multilateral a Cuba, que só seria destituida em 1975. Esse período em especial foi bastante crítico, pois implicou não apenas a perda do mercado americano, que exercia um histórico oligopólio das exportações cubanas, mas extendeu-se também aos demais compradores americanos da produção cubana. Deixando assim a ilha praticamente sem mercado e extremamente dependente das importações russas.
A situação permaneceu tensa e especialmente desfavoráqvel para Cuba quando esta perdeu privilégios comerciais com a URSS. Uma pequena melhora só ocorreria em 1979 quando o presidente norte-americano Jimmy Carter se negou a renovar a proibição de viagens a Cuba e, complementariamente, tirou limitações de gastos turísticos na ilha.
Entretanto as ações do Presidente Ronald Reagan anunciaram uma nova tendência ao recrudescimento. Já em 1982 houve uma reinstauração do embargo comercial que seria reforçada, em 1992, pela "Ata para Democracia cubana", popularmente conhecida como lei Torricelli. Mais vinculante ainda seria a Ata para a liberdade cubana e pela solidariedade democrática, proposta pelo senador Helms-Burton. É, ainda, importante notarmos que estas Atas proíbem qualquer forma de comércio entre filiais de empresas norte-americanas em outros países e Cuba.
A eleição de Bush trouxe, como esperado, um embrutecimento das relações norte-americanas, que foi diretamente sentido por Cuba. O energúmeno presidente norte-americano por meio de sua "Comissão de Ajuda para uma Cuba Livre" estabeleceu ações contra o turismo e os investimentos em Cuba, restringindo os fluxos financeiros e limitando as remessas familiares.
A recente retomada de ataques econômicos norte-americanos contra Cuba aponta para horizontes mais sombrios que quaisquer outros já vistos, isto pois Cuba não conta mais com a aliança estratégica que outrora mantinha com a URSS. Embora, até então, a situação esteja controlada, graças a uma maior integração regional cubana, bem como uma forte aliança que se trava com a Bolívia e Venezuela, os efeitos de um recrudescimento podem ser cruéis para o povo cubano, que corre o risco de perder elementos básicos como suprimento energético.
Além disso, há um evidente impedimento ao desenvolvimento social cubano, que por vezes impede o estado de assegurar a existência humana digna, de tal maneira que alguns considerem este embargo uma forma de genocídio, conforme previsto na Convenção de Genebra:
"(...) os atos perpetrados com a intenção de destruir total ou parcialmente a um grupo nacional, étnico, racial ou religioso", e nesses casos abrange "o submetimento intencional do grupo a condições de existência que tenham de acarretar a sua destruição física, total ou parcial"[3].
IV. 1. 2 As Agressões Diplomáticas.
Fora esta supressão econômica das capacidades cubanas, os EUA se empenham, também, em denegrir a imagem internacional cubana, bem como de tratar Cuba em desacordo com os padrões e ditames da Diplomacia e do Direito Internacional Público.
Conforme visto acima, o embargo econômico a Cuba está descoberto de qualquer respaldo ou bases legais internacionais, bem como politicamente deslegitimado. Sustentando-se assim apenas pelas capacidades norte-americanas, num movimento oposto à confluência de esforços e energia para constituição de uma "sociedade internacional"[4] solidária e, sobretudo, capaz de resolver pacificamente suas controvérsias.
Observa-se neste sentido um incansável esforço norte americano de desprezar os mecanismos "onusianos" de solução de controvérsia, que bem poderiam auxiliar em suas desavenças com Cuba. O que se vê, ao contrário, é uma busca por excluir Cuba do manto e justiça internacional que busca ser a ONU.
Da mesma forma, os EUA não buscam esconder suas pretenções imperialistas sobre Cuba, o que contraria os princípios Westfalianos de soberania, segundo o qual, estados não poderiam simplesmente deixar de existir e subordinar-se a terceiros, conforme ambiciona os EUA para com Cuba. Segundo este princípio, os estados devêm ter assegurado o princípio básico da existência, que vêm lhe sendo negados pelos EUA.
Além de todo o desprezo expresso nos discursos diplomáticos norte-americanos, no que tange a Cuba, e da incessante tentativa de excluir o país dos mecanismos internacionais, os EUA se propõem mesmo a manipular tais mecanismos para agirem em seu favor, prejudicando o governo cubano.
Um exemplo claro disso seria a histórica sanção comercial multilateral que a nação imperialista conseguiu "enfiar goela abaixo" dos demais membros. Embora hoje as demais democracias americanas sejam suficientemente fortes para protegerem seus artífices multinacionais, impossibilitando assim o uso deste por parte dos EUA para atormentar Cuba, existem ainda outros mecanismos suficientemente sensíveis para que os EUA empenhem-se em manipulá-los de maneira semelhante.
Como exemplo, poderíamos tomar o Conselho de Direitos Humanos, antiga Comissão de Direitos Humanos, que foi reformulada a fim de aumentar sua efetividade. Entretanto, os EUA usaram este momento de vulnerabilidade para impor seus interesses e como tal vêm buscando um afastamento de Cuba nesse macanismo.
Cuba que sempre foi um ator protagônico na Comissão, sendo autora de válidos textos e iniciativas, chegando mesmo a moderar alguns dos mais importantes debates neste foro, é agora alvo da manipulação norte-americana que, por meio de working papers e grupos extra-oficiais, vêm acusando Cuba de violar Direitos Humano, apenas com o intuito de denegrir a imagem internacional desse país.
IV. 1. 3 As Agressões Sócio-Culturais.
Buscando atingir a estabilidade governamental cubana em todos os fronts possíveis, o vizinho do norte presta-se ainda a atacar a cultura popular cubana, buscando reeditar e desvalorizar qualquer iniciativa que não seja contra o governo de Fidel.Pior ainda, os EUA utilizam-se de seu poder econômico para comprar a fidelidade de alguns cubanos empobrecidos graças aos embargos e demais iniciativas nocivas do governo yanekee.
Como exemplo disso poderia citar o fundo para ajuda aos cubanos "exilados", que é um fundo destinado a Cubanos que migrem para os EUA[5]. Esse fundo, por sua vez pretende melhorar o nível de vida destes apenas para que seus familiares em Cuba fiquem com ciúmes e venham assim a questionar o governo de Fidel. Outros dizem que esta ajuda seria na verdade a formação de um novo exército para uma "nova Bahia dos Porcos".
De qualquer modo esta é uma iniciativa descaradamente voltada para a desestabilização política e demográfica de Cuba, uma intrusão tão exacerbada que em qualquer outra situação levaria à guerra. Entretanto estamos falando dos EUA, a maior potência do mundo, o que inibe uma reação cubana e tampouco permite uma ação humanitária no âmbito da ONU ou OEA.
Há, com isso, um uso indireto da força, os EUA manipulam a estrutura sócio-cultural cubana, respaldados por seu poderio milita. É como se alguém lhe pedisse seu dinheiro com uma arma em sua cabeça, isto não seria roubo? E uma nação influir no ordenamento doméstico de outro com o maior exército do mundo a cerca de 90 milhas? Creio que não haveria metáfora melhor para a situação cubana.
Outro exemplo seria a atual crise radiofônica pela qual Cuba vem passando. A proximidade com os EUA possibilita a transmissão de rádio dos EUA para Cuba. Os vizinhos do norte, por sua vez, aproveitam esta peculiaridade e transmitem "interferências" questionando o governo de Fidel e fomentando a insubordinação civil. Isto por meio de inverdades e utopias que são passadas, explorando justamente a situação de pobreza e falta de desenvolvimento em Cuba, cujo principal responsável é justamente os EUA, com seus embargos e políticas segregacionistas.
Os EUA buscam também desafiar Cuba em questões consulares, usando-se de tal artifício para prender, torturar e humilhar cidadãos cubanos em território norte-americano. Isto como uma forma de desmoralizar o governo cubano perante as vítimas e seus familiares, que, obviamente, carecem de iniciativas mais enérgicas por parte de seu governo. Estas iniciativas, por sua vez, são mitigadas pela capacidade militar norte americana, conforme tratado acima.
Ultimamente foram presos cinco heróis cubanos, pais de família com grande comprometimento nacional e dever público, que foram presos sob acusações forjadas e altamente questionáveis. Aos quais não foi rogado o direito a um julgamento justo e, como conseqüência, tampouco lhes foi incidida uma pena condizente com as acusações a que respondem. Até o presente momento as ações diplomáticas para uma possível extradição foram inúteis e o judiciário norte-americano vem mostrando-se irredutível a uma redução de pena ou revisão do processo. Este fato vem ferindo grandemente a honra nacional cubana.
IV. 1. 4 Terrorismo contra Fidel.
Vale, por fim, citar a mais descarada e brutal ameaça norte-americana, que se dirige ao líder revolucionário e atual presidente Fidel Castro. Embora esta não seja uma novidade, pois é recorrente desde a tomada do poder em 1959, é, certamente, uma das ações mais extremadas por parte do império do norte.
Estas iniciativas de assassinato do herói cubano são tanto elaboradas por agências norte-americanas, quanto articuladas por meio de traidores cubanos e civis de outros países, motivados pelos imundos dólares norte-americanos.
Como efeito imediato disso deflagra-se um alto investimento cubano na segurança pessoal de Fidel, o que destoa do ideal igualitário da revolução e, ainda, traz certo medo e incerteza ao povo que tem seu líder ameaçado.
V - Conclusões.
Em vista de todo o exposto acima, cabe concluir com algumas observações gerais sobre padrões e características das agressões proferidas contra Cuba. Inicialmente vale observar que a vulnerabilidade cubana é inerente à sua colonização extensa e agravada pelo pós-colonialismo de subserviência aos EUA, que muito prosperaram fazendo de Cuba sua fazenda e seu bordel.
Percebe-se num primeiro momento, quando da emancipação cubana, que a ofensiva humana era mais declarada e seguia padrões clássicos. Entretanto o caráter solidário e democrático do regime resistiu a essas ameaças que passaram a fazer-se usando como armas estruturas capitalistas como o mercado.
Recentemente as ofensivas estadunidenses são cada vez mais elaboradas e desrespeitosas, voltando-se mesmo a indivíduos cubanos, como forma de desmoralizar-se as capacidades do governo e tornar o espaço nacional vulnerável para uma possível transgressão estadunidense.
Entretanto, o povo vem se mostrando consciente da culpa norte americana nestes processos sócio-culturais que lhes assolam e, como tal, vem se mostrando solidários aos ideais libertários de Fidel que, por mais dificuldades que se aponte, aprimora-se dia-a-dia. Prova disso são os índices sociais cubanos, que nos remetem a um verdadeiro estado de participação social, onde o povo segue unido enfrentando os covardes ataques imperialistas.
[1] O que se dá por motivos diversos, dentre eles e, predominantemente, a incapacidade estrutural de reagir, conforme veremos nos capítulos que se seguem.
[2] Madri. Drummond Wolf, diplomata norte-americano referindo-se a Cuba. Séc XIX.
[3] Artigo II da Convenção de Genebra para a Prevenção e Sanção do Delito de Genocídio, de 9 de Dezembro de 1948.
[4] Bull, Hedley. "A Sociedade Anárquica".
[5] Este fundo é dedicado àqueles cubanos que arriscam suas vidas para fazer a travessia ilegal, pois não há abertura de fronteiras. Não se sai de Cuba e chega-se nos EUA legalmente, entretanto, uma vez lá por meios ilegais o governo não os deporta e, pelo contrário, os fornece abrigo, uma ajuda de custo e ajuda-os a encontrar emprego.
Autor: Pedro Arruda
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