Classe Sociais, Favela e Samba
Favela, samba e classes sociais; Contradições dentro da Cidade
Juvenal Martins Neto
Na dissertação referenciada e pesquisada podemos observar como se dá o discurso de invenção de uma tradição. Tonani (2006) analisa a origem do samba para buscar captar no discurso dos mais variados pesquisadores como se transmutou o samba de uma modalidade musical até então marginalizada a uma expressão de identidade nacional.
Dessa forma, ele trabalha com a invenção da brasilidade que passa a definir como autêntico algo que foi produto de uma longa e extenuante negociação. Busca enfatizar a eficácia simbólica que uma determinada manifestação popular pode ter nessa construção. Nesse sentido, o samba torna-se um bom caminho para se mitificar essa modalidade musical como pura e cheia de sentimentos, e que deve ser preservada a qualquer custo como algo só nosso, puramente brasileiro.
Observa-se então que uma música que era reprimida pelo poder público até então, e que determinava uma classe social desprestigiada e marginalizada torna-se o símbolo de toda uma nação.
Acredito que Tonani poderia enriquecer ainda mais essa discussão voltando mais um pouco no tempo e analisando outros autores, sendo assim darei minha contribuição ao seu excelente trabalho.
No início, o samba era executado e apreciado principalmente pelos mais humildes, moradores dos bairros que subiam o morro para poder cantar suas tristezas e alegrias sem serem reprimidos pela polícia. E ainda haviam os sambistas de Cidade Nova, ligados à casa de Tia Ciata.
Mas deixando essa discussão de lado, é ponto pacífico que até meados da década de 30 o samba restringia-se apenas aos moradores cariocas e da Bahia, não sendo aceito por toda a sociedade. É a partir das primeiras gravações fonográficas de músicas que já eram há muito tempo cantadas na periferia que o samba é comercializado, passando a integrar o rol dos ritmos nacionais e, futuramente, de grande destaque. Com as medidas de fortalecimento da cultura nacional empreendida por Getúlio Vargas o samba encontra o ambiente propício para seu fortalecimento.
No entanto, a partir do crescimento da indústria fonográfica, este passa a atingir outras camadas da sociedade, isto ocorre também pelo crescimento da indústria carnavalesca que difunde o ritmo não só dentro como fora do país. Nesse momento a música deixa de ser apenas manifestação cultural e torna-se algo comercial.
O samba enquanto estilo musical e expressão da cultura popular brasileira tem sido amplamente estudado e, como é trivial acontecer, e como Tonani (2006) também aponta quando há vários pesquisadores estudando um mesmo tema, inúmeras discordâncias podem surgir a respeito de sua origem e da sua definição. Quanto à origem, alguns pesquisadores dizem que o samba surgiu a partir da fusão de ritmos tribais africanos e indígenas brasileiros; outros afirmam que o samba veio para o Brasil com os escravos e que o próprio nome seria um derivado da palavra semba (umbigo), a qual designava uma dança de Luanda, Angola.
Orestes Barbosa define o samba pelo que (ele) não é: "(...) o samba, que não é batucada, nem choro, nem lundu, nem cateretê, nem rumba (que é antilhana e vive também no Rio Grande do Sul), surge característico no carnaval carioca, ao lado das marchas que são sambas com uma ligeira modificação" (1978. p. 23). O autor afirma que o violão torna-se o principal intérprete da emoção carioca. Cita também outros instrumentos ao longo de seu livro como o piano, o cavaquinho, a flauta, a cuíca, o tamborim, o violino, a bateria, entre outros.
O samba teria sido temperado de uma forma diferente em cada bairro da cidade. Este samba urbano foi designado como a corrente principal da música popular brasileira urbana, estabelecido ao longo dos anos 30, e tido como resultado da transculturação entre as diversas camadas sociais que compunham a cidade do Rio de Janeiro.
Outra definição dada por Orestes Barbosa para o samba é:
"O samba é mais plástico. É filósofo, classista, amoroso, familiar, pedagógico, científico, estatístico, jurídico, vingativo, generoso, aclamador, irônico e sentimental." (1978, p.41).
O samba seria o local ou a forma pela qual o malandro desabafa a sua descrença ou fixa suas ironias. O samba parece carregar certa cultura de protesto, cantando as misérias da população.
Por outro lado, é possível que o consumo de discos e a audiência desviem o artista-intelectual para um simples produtor de mercadorias. Ao atender à preocupação de vender suas produções do que produzir música feita apenas pelo gosto, o samba perde seu caráter despreocupado e ingênuo, passando a ser dirigido, feito de forma a tentar agradar uma clientela.
Bem, como apontado nesse trabalho o samba em sua gênese tratava de retratar adesigualdade social existente dentro do espaço denominado cidade. Percebe-se a possibilidade de pesquisar as diversas formas dessa distinção entre pessoas que habitam e que de alguma forma dividem o mesmo território, uma vez que aparecem no mesmo espaço.
Referências:
ALENCAR, Edigar de. O Carnaval Carioca Através da Música. 2 ed. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1979.
BARBOSA, Orestes. Samba; sua história, seus poetas, seus musicais e seus cantores. 2 ed. Rio de Janeiro: Funart, 1978.
CAVALCANTI, Maria Laura. Viveiros de Castro . Rio de Janeiro: Ed. Funarte, UFRJ, p. 22/23
GUIMARÃES, Francisco (Vagalume). Na roda do samba. 2 ed. Rio de Janeiro, Funart: 1978.
MARTINS NETO, J. O samba na década de 1960. 2005. Disponível em: < http://www.webartigosos.com/articles/1345/1/O-Samba-Na-Decada-De-60-A-Meados-De-70/pagina1.html .> Acessado em: 6 fev. 2010.
NAPOLITANO, Marcos. A música popular brasileira nos anos 60: apontamentos para um balanço historiográfico. Curitiba: UFPR, 1998.
PATROCÍNIO, Paulo Roberto Tonani do. Entre o morro e o asfalto: imagens da favela nos discursos culturais brasileiros. Dissertação de Mestrado. Rio de Janeiro: PUC, Departamento de Letras, 2006. Disponível em: Acessado em 28 fev. 2010.Autor: Juvenal Martins Neto
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