CORAÇÃO DE PAPEL - CHICA A PORQUINHA DA CARONA



Foi em uma manhã de primavera que eu resolvi passear com o meu carro novinho, cheirando a loja, com plástico nos bancos, tapetes limpinhos e no porta-luvas um carnê de prestações a serem pagas nos próximos trinta e seis meses. Saí de casa e fui a um sítio de um conhecido chamado Pedro, para passear e estrear o carro novo.

 

Lá chegando, fui andar e vi que uma porca da raça Duroc havia dado cria e possuía vários porquinhos. Uns eram brancos por inteiro, outros com pintas pretas, outros bem mais escuros. Todos fuçando na ração, se esfregando no chão, fazendo o maior barulho. Eu fiquei ali parada olhando para eles e me encantei com um filhote de uns cinco ou seis quilos. Era uma fêmea, bem gordinha, branca com manchas pretas nas costas. Tinha o rabinho enrolado, as orelhas erguidas, o focinho arrebitado, uns poucos pelos curtos e espetados, que deixavam à mostra seu couro avermelhado.

 

Eu não resisti me apaixonei por ela e quando me dei conta ela já estava em um saco de ráfia no porta-malas do carro seguindo comigo em direção ao nosso sítio, que já tinha um chiqueiro pronto, mas ainda não tínhamos uma porquinha, pelo menos até aquele dia. Dei a ela o nome de Chica e prometi que eu nunca deixaria que a matassem e que ela nunca seria um desses assados com uma maça na boca.

 

Eu e a Chica seguíamos juntas para o sítio distante uns vinte quilômetros de onde eu a encontrei. Estava tudo muito bom, quando de repente, no meio do caminho, um cheiro muito desagradável tomou conta do meu carro. Rapidamente eu abri todas as janelas para fazer circular o ar de dentro do carro e foi então que percebi que a Chica havia feito cocô no porta-malas do meu carro novinho.

 

A viagem até o sítio parecia infinita e o cheiro era insuportável. Eu não tinha o que fazer, pois estava sozinha e não tinha água para lavar ou limpar naquele momento. As janelas abertas não traziam ar novo suficiente para espantar o mau cheiro que se apropriou de meu carro e fez com que o cheiro de loja sumisse rapidamente.

 

Ao chegar ao nosso sitio, todos que lá estavam vieram ver o meu carro novo e perguntaram o que era aquele cheiro horrível e entenderam quando eu tirei a Chica do porta-malas. Ela ganhou um banho de mangueira e foi para o seu novo lar, um chiqueiro limpinho, com ração, água e tudo o que ela precisava para viver bem. Já eu, convivi durante meses com o cheiro que ficou em meu carro e que mesmo após várias lavagens não sumiu. A Chica foi a carona que realmente estreou o meu carro novo.


Autor: Valdessara Constancio


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