Ética e Relativismo Cultural: aspectos da disciplina de história nesse contexto.



Ética e Relativismo Cultural: aspectos da disciplina de história nesse contexto. Por Fernanda Esteves Reis O Relativismo Cultural (RC) conforme Harry Gensler (1998) apregoa que não existe um "bem" totalmente "bem" e nem um "mal" totalmente "mal", ou seja, o "bem" e o "mal" são relativos a cada cultura. "Bem", é aquilo que corresponde ao que é socialmente aprovado em determinada cultura. Os princípios morais não passam de uma convenção social. De acordo com a visão do RC não existem valores objetivos que sustentam as diversas culturas, mas sim, culturas diferentes que sustém códigos morais distintos referentes a cada uma delas. Como afirma Ana Relativista, uma interessante criação do autor citado acima, não há verdades absolutas, tudo é relativo, tudo depende do modo de como se vêem as coisas, não há um "certo" e um "errado". Para a personagem, os valores objetivos são meros mitos. Pode-se dizer que segundo o RC, a moral é fruto de uma construção social "democrática", visto que a maioria dita as regras. Além disso, de acordo com Ana, o RC nos permite respeitar e tolerar o outro, sua cultura, sua maneira de viver, seu comportamento, suas ações (GENSLER, 1998). Em conformidade com o autor a primeira vista a teoria do RC mostra-se atraente e até mesmo plausível, porém quando analisada é possível perceber sua fragilidade, inconsistência e inverdade. Não é nada mais que uma falácia, um falso estereótipo, é uma "abordagem relativamente imatura" como alega Kohlberg (apud GENSLER, 1998). Assim, a partir de objeções a essa perspectiva de pensamento abordarei alguns aspectos da disciplina de história nesse contexto. Primeiramente, o pensamento "democrático" que o RC induz é ilusório, uma vez que não se pode contrariar e questionar as normas de sua própria sociedade, mesmo que esta aflija a integridade, a dignidade e os mais elementares direitos humanos. O que essa perspectiva promove é um espírito acrítico e que tolhe o direito dos cidadãos de exporem suas opiniões. Não que em todas as nações, culturas em suas leis e constituições vigorem um sistema democrático de governo, mas o que é questionável é essa "maioria" que o RC se refere. Mesmo esta sendo retrógrada e ignorante, do ponto de vista do RC, deve-se apoiá-la e concordar que as normas estabelecidas são "boas". Conforme essa perspectiva o sujeito não possui a devida liberdade de pensamento e expressão, bases da democracia. Dessa maneira, há um equívoco, uma contradição nessa forma de pensar. Pode-se comparar o RC a um estadista, que com alto poder de oratória é capaz de manipular sutilmente, afim de que as pessoas/ cidadãos pensem que o sistema vigente é o melhor para elas. É um sistema opressor de governo disfarçado de democracia. Segundo, é óbvio que existem verdades absolutas. Verdades que não deixam de ser verdades simplesmente pelo fato de não se concordar ou saber que elas existem. Como por exemplo, verdades morais, verdades históricas e os mistérios da natureza que foram e que naturalmente vem se revelando ao homem. Considerado um dos maiores cientistas de todos os tempos, Galileu Galilei foi preso pela Inquisição por apoiar a teoria de Copérnico de que o Sol e não a Terra compõe-se o centro de nosso Sistema Solar. Por mais que essa teoria fosse um ultraje ao Teocentrismo Romano, o Sol até nossos dias jamais deixou de ser o centro de nosso sistema planetário. Essa é uma verdade absoluta não há como refutá-la. É tão verdade quanto o sistema gravitacional desvendado por Newton. Povos da antiguidade, como os Cananeus, em seus rituais religiosos ofereciam seus filhos para serem queimados vivos a um de seus deuses. Adolf Hitler, estadista alemão que marcou a história do povo judeu aniquilou 1/3 deles no denominado Holocausto, em nome de uma raça segundo ele "pura" e "superior", a raça ariana, do qual ele nem fazia parte por ser austríaco; como também idosos e portadores de necessidades especiais alemães, "julgando-os" ameaçador a "perfeição" de "sua" nação, da futura Potência Alemã (BARTOLETTI, 2006). Mesmo em contextos históricos, políticos e culturais distintos tanto os cananitas quanto Hitler mostraram-se aversos a verdades morais, aos valores objetivos, que no meu entendimento é atemporal. Ambos afligiram a vida, que é direito de qualquer pessoa. É importante ressaltar que, pode-se eliminar e/ou atenuar certos valores de uma cultura, sem que esta sofra o que os antropólogos chamam de fenômeno da "aculturação". Dessa forma, está claro que a crença e a idealização do RC não levam senão a um conformismo social, político, cultural e até mesmo pessoal, pois no momento em que o sujeito não questiona seus direitos, seus deveres, sua história que está inserida numa história maior, a da humanidade, como irá compreender, ver, pensar e sentir o outro numa mesma cultura ou em outra cultura qualquer? Estamos vivendo a meu ver, tempos em que a sociedade globalizada, e em específico a nossa sociedade, tem sofrido de uma epidemia que ouso chamar de "dormência contemporânea", cujos sintomas principais são a cegueira moral, a ignorância intelectual, a intolerância, a indolência e a apatia. Uma maioria totalmente passiva, que se acomoda com facilidade a situações às vezes caóticas. Pessoas que preferem viver num mundo ilusório a viver a realidade, vivem simplesmente por estarem vivas, o correto seria afirmar que sobrevivem. Essa perigosa moléstia, que tem ultrapassado fronteiras atinge fortemente os órgãos institucionais que compõem o corpo social. Duas dessas instituições sociais podem ser consideradas essenciais para a disseminação dessa epidemia: a instituição familiar e a instituição escolar. Atinarei apenas ao sistema educacional e de forma mais exclusiva no ensino de história brasileiro. De início é bom ter-se em mente que a "disciplina" de história, embora marginalizada, é primordial para o conhecimento da cultura de um povo. Talvez mais importante que o estudo das línguas e das ciências exatas, já que é por meio do conhecimento histórico que se aproxima da origem da língua materna e se compreende o raciocínio lógico-matemático, bem como seu sistema simbólico ao longo dos séculos. A arte de ensinar e aprender história permite o sujeito questionar o passado, interpretar o presente e pensar o futuro (suas possibilidades). Permite em outras palavras, sistematizar, problematizar e através de pesquisas, criar hipóteses sobre a veracidade de fatos e momentos históricos que não se vivenciou; a compreender que o presente é fruto de ações passadas e que o sujeito como importante agente transformador da sociedade pode construir um futuro melhor. É na história que se encontra a constante discussão entre o verdadeiro e o místico, entre o real e o distorcido. É por meio de um ensino de história consciente e "aberto" que é possível situar o educando no contexto conturbado do Governo Militar, localizando-o no tempo, com referência aos seus precedentes e atentando-o para os fatores históricos que permitiram ou influenciaram sua produção. Permite também, compreender e criticar conceitos e teorias como o RC e valores objetivos e suas respectivas relevâncias. Assim, é necessário fazer dessa geração uma geração que pensa. Uma geração fascinada pela arte de aprender. Uma geração que não está alheia aos acontecimentos e as circunstâncias que envolvem sua sociedade e o mundo. É preciso instigar a criatividade e a curiosidade científica da criança desde cedo. Incitá-la a desvendar mistérios que estão além dos conhecimentos prescritos nos livros didáticos. É necessário realmente promover um ensino que possibilite a criticidade e a "autonomia intelectual" do discente, que não corresponde a um "egoísmo intelectual". É desejoso um ensino que esteja presente no cotidiano do educando e imbuído de significação e sentido para todos os agentes envolvidos no processo educacional. Anseia-se de fato nesse pequeno texto, por uma educação que exalte "as palavras dos sábios ouvidas em silêncio do que o clamor de quem governa entre os tolos" (Livro do Eclesiastes 9:17). Referência Bibliográfica: BARTOLETTI, Susan Campbell. Juventude Hitlerista: a história dos meninos e meninas nazistas e a dos que resistiram/ Susan Campbell Bartoletti; tradução de Beatriz Horta.- Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2006. GENSLER, Harry. Ética e Relativismo Cultural; tradução de Paulo Ruas. Site: www.Geocities.com/echagas/relativismocultural.htm, Internet, Routledge,1998.
Autor: Fernanda Esteves Reis


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