A gente, escritor anônimo
Diz que escrever é terapia,
o que não é mentira,
mas é a muleta padrão
e inveja do Drummond.
Jovem, fala dos amigos,
da cidade, dos umbigos,
do amor, da vida boa,
esguichos de coração rasgado
indícios, traços
do desassossego do Pessoa.
A desilusão dos primeiros
grandes amores possessivos
põe o mundo contra a gente,
veneno com pimenta quente
escorrendo mundo próprio adentro,
a razão abandonada, impotente,
o coração ardendo.
O tempo deixa tudo velho
e mais seco,
coleciona sem entusiasmo
as pedras paradas de João Cabral.
A ética tem muitas morais
e o que é infinito dura pouco.
O sonho, que é chama,
não perde jamais seu viço
enquanto o corpo levanta da cama
e cumpre o serviço imposto.
No poema da gente
não há vagas
para o desconcerto do mundo.
A gente põe pedra em caminho,
barulho em estrela,
obrigação de ser feliz em lei.
A gente é super bacana,
é amigo do rei.
Mas põe também a dor
que tenta esquecer que tem,
a palavra que devora
e o coração não diz,
o urubu que pousa na sorte,
a desilusão de cada nova ferida
na obsessão, todo o vai-e-vem,
e diz que está tudo bem
para ser só uma rima,
não uma solução.
Decide que não vai mais escrever,
que escrever é uma pirraça,
uma boba e frenética ameaça
quase muda e sem poder
para restituir devido valor,
merecer amor preferido,
viver mundo imaginado,
desconstituir dor.
Aparece um reflexo
de facho de luz na cabeça,
vindo de um curto no coração,
a gente descarrega,
invade de novo o mundo de fora
com a nossa tropa trôpega,
a náusea se distrai, a mágoa esfria,
a desilusão vira de novo terapia.
08.05.2010
Autor: Roberto Jr Esteves Siqueira
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