O ENADE E SUA ATUAL SUPERVALORIZAÇÃO*
Maria Auxiliadora Cavalcante de Souza**
RESUMO
O presente artigo foi elaborado a fim de demonstrar a importância do ENADE no acompanhamento da qualidade da Educação Superior e as suas implicações para as Instituições de Ensino Superior-IES e alunos. Será destacado como seus resultados vêm influenciando na elaboração de outros conceitos, mesmo diante de um processo ainda falho e merecedor de ajustes e alterações para posterior aperfeiçoamento.
PALAVRAS-CHAVE: 1. SINAES; 2. ENADE; 3. CPC; 4. Avaliação.
INTRODUÇÃO
Elaborado com foco no ENADE e sua importância no momento atual, o presente artigo tenta destacar como o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes vem influenciando nas avaliações da Educação superior e em sua regulação. Com base em estudos e pesquisa bibliográfica, destaca-se uma avaliação falha e merecedora de ajustes, aonde as instituições e alunos são prejudicados, diretamente, por conceitos e rankings estabelecidos, majoritariamente, com base nos falhos e discutíveis resultados extraídos do ENADE. Destacando a necessidade de melhoria da metodologia utilizada, para que tenhamos um processo claro, compreensível e justo, respeitando e valorizando as diversidades institucionais, tornando-a merecedora de divulgação e referencia para tomada de decisões.
1. O ENADE
No dia 14 de abril de 2004 o Ministério da Educação, divulgou a criação do SINAES ? Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior ? que tem, dentre suas finalidades, a melhoria da qualidade da Educação Superior, sua expansão e monitoramento da oferta. O SINAES, por sua vez, instituiu o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENADE), em substituição ao provão, passando a integrar o Sistema de avaliação de cursos e instituições, com o objetivo de acompanhar o processo de aprendizagem dos estudantes de acordo com as Diretrizes Curriculares de cada curso .
Perante essas normatizações, não podemos negar, nem fechar os olhos para a necessidade de acompanhar e avaliar a Educação Superior, principalmente diante do crescimento e oferta do setor. O ENADE, então, se pretende apresentar como uma avaliação independente e fidedigna, figurando como instrumento de fundamental importância para que a sociedade possa escolher os cursos e IES com base em avaliações objetivas e justas. Dessa forma, a avaliação serve de referencial para a busca por melhoria e aperfeiçoamento da qualidade nas instituições, além de proporcionar o acesso às informações necessárias às tomadas de decisões, planejamentos e investimentos na Educação, tornando-se a avaliação externa indispensável nesse momento.
Por essa razão, atualmente, o exame de cursos vem sendo aplicado periodicamente, de forma amostral ou censitária, junto aos alunos ingressantes que tenham cumprido de 7 a 22% da carga horária mínima, dos cursos de Graduação Tradicionais ou entre 7 e 25% da carga horária dos cursos superiores de tecnologia e os concluintes que tenham cumprido pelo menos 80% da carga mínima dos cursos Tradicionais ou que tenham concluído pelo menos 75% da carga horária dos cursos tecnológicos e prováveis concluintes no ano do exame. A avaliação é aplicada trienalmente pelo Inep, a partir de instrumentos específicos para os alunos habilitados/selecionados e coordenador do curso, tendo seu resultado expressado por meio de conceitos ordenados de 1 a 5, tomando-se por base padrões estabelecidos por especialistas das diversas áreas do conhecimento.
A regularidade quanto ao exame de cursos vem expressa no histórico escolar do aluno, embora seja mantido o sigilo sobre o seu resultado individual (este dado lhe será encaminhado pelos correios em documento específico), sendo sua irregularidade motivo de impedimento para colação de grau e emissão de diploma.
No entanto, os resultados do Enade e índices obtidos através deste, vem sendo utilizado como base no cálculos de diversos índices, conceitos e avaliações realizados pelo Ministério de Educação. A avaliação vem sendo aplicada através de um modelo único para cada área de conhecimento e instituições, sem que se respeitem e sejam valorizadas as diversidades, assim como valorizado e apoiado pela Legislação maior da Educação Superior,pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional- LDB e pelo próprio Sistema de Avaliação da Educação.
A composição do conceito do Conceito Preliminar de Curso, por exemplo, é atribuído na avaliação feita com base nas variáveis extraídas do ENADE,questionário socioeconômico e cadastro docente ,definindo conceitos que vão de 1 a 5, com base em cálculos complexos e difíceis de ser entendidos ao ponto de se precisar divulgar notas técnicas a respeito, com o objetivo de fazer com que a comunidade acadêmica consiga entender esse cálculo e procedimento.
Isso significa que, mesmo tendo sido criado com a intenção de avaliar e melhorar a qualidade da educação superior e de substituir o antigo provão, seu método de "arranjo" apenas reflete uma visão controversa das realidades de ensino observadas. A fim de corrigir tais falhas, algumas alterações foram feitas para esse novo modelo de avaliação, incluindo-se mudanças que definem alguns pontos fracos, como o fato de o ENADE inicialmente ser aplicado por amostragem e trienalmente, enquanto, no provão, eram avaliados todos os alunos anualmente, onde a partir de 2009 o mesmo passou a ser censitário e não mais por amostragem, permitindo-se um acompanhamento do desenvolvimento e desempenho do aluno, de forma mais justa e real.
E, além das fraquezas e dificuldades apresentadas, o ENADE sofre com a falta de comprometimento dos alunos e conscientização da comunidade acadêmica e seus alunos que boicotam provas, ao responderem de qualquer maneira ou até mesmo deixando-a em branco, utilizando esse momento para reivindicações e protestos contra a instituição ou até mesmo contra o método de avaliação dos cursos, já que, para assegurar a sua regularidade e não se prejudicar diretamente, o aluno se só precisa garantir a sua presença na aplicação do exame. Vale ressaltar também, que no exame de 2009 algumas instituições tiveram suas provas trocadas e os alunos não puderam passar por todo o processo avaliativo, já que suas provas foram entregues em outra localidade.
No intuito de se resguardar quanto a tais movimentos, o governo tem deflagrado campanhas de conscientização dos alunos e melhorias, na tentativa de demonstrar o que ENADE representa para estudantes, para IES e para a educação nacional. Um dos pilares de sustentação do governo é a influência que os resultados do exame têm para a obtenção do Conceito Preliminar de Curso (CPC), criado e divulgado através da Portaria nº 4, de 5 de agosto de 2008, pelo Instituto Anísio Teixeira (Inep), com o intuito de avaliar a qualidade dos cursos de Educação Superior e sua excelência, funcionando como indicador de qualidade dos cursos nacionalmente.Para fortalecer tais esforços e conscientizá-los de tal importância ,as instituições vem criando setores e aperfeiçoando equipes, especificamente voltadas ao ENADE, responsáveis pela sensibilização e conscientização junto a comunidade acadêmica.
O conceito Preliminar de Curso e IDD não foram criados por leis, mas por portarias e funcionam, pois, na marginalidade, já que apenas o ENADE existe legalmente instituído pela Lei do SINAES. O Ministério da Educação tem, entre seus objetivos, o interesse de diminuir a sobrecarga em relação à quantidade de visitas às Instituições de Ensino, o que, por ano chegava a 3.000. Com esse novo indicador, o MEC desejava que o número de visitas caísse para aproximadamente 1.800 por ano, pois caso o CPC de uma IES seja satisfatório, mais ou igual a três, fica-se dispensada a visita in loco .
Dessa forma, os cursos com CPC igual ou maior que 3 tem sua renovação de reconhecimento automaticamente, enquanto os cursos com conceitos inferiores a 3 devem receber obrigatoriamente a visita in loco e elaborar relatório de melhorias a ser encaminhado ao Ministério de Educação.
Demonstrando a importância do ENADE e do quanto seus resultados vêm influenciando nos resultados e imagem institucional, temos a recente Portaria Normativa nº10 de 2 de Julho de 2009, onde fixam-se os critérios para dispensa de avaliação in-loco nas instituições de ensino superior, onde os pedidos de autorização de curso poderão ter a avaliação in loco supridas, dispensado-se da visita dos avaliadores, se o seu Índice Geral de Curso- IGC tiver o seu conceito igual ou superior a 3. Tal índice tem a finalidade de indicar a qualidade das instituições de Educação Superior, considerando em sua composição a qualidade dos cursos de graduação e pós-graduação(mestrado e doutorado) e tem como base o CPC ( ENADE, IDD e INSUMOS).
Embora seja Preliminar, o CPC vem sendo amplamente divulgado pela imprensa, prejudicando a imagem das IES, a partir de conceitos gerados com base em fontes inseguras e falhas. A intenção do conceito preliminar, do ENADE e até mesmo do Ranking das Instituições podem ser das melhores, mas para que esse conceito seja justo e possa ser devidamente divulgado muitos ajustes devem ser feitos e são indispensáveis. Afinal, como podemos nos basear no ENADE se ele depende de tantos ajustes e redefinições, se ele não avalia rigorosamente os alunos, já que os mesmos precisam garantir apenas a presença , sem maiores preocupações já que sua nota não será divulgada? A mudança ocorrida em 2009 foi de extrema importância, a partir da qual todos os alunos , habilitados ,passaram a ser avaliados , acabando com a a amostragem. O aluno deve ser devidamente avaliado como ingressantes e concluintes todos os anos e todas às vezes, sem que dependa de um sorteio para que o aluno realmente seja avaliado na entrada e na saída, levando em consideração que o seu desempenho precisa ser devidamente calculado, sendo o resultado desse cômputo equivalente ao desenvolvimento alcançado pelo estudante.
Os conceitos continuam sendo amplamente divulgados e supervalorizados pela imprensa, mesmo baseando-se em resultados claramente falhos e proporcionalmente criticados diante destes rankings, o que prejudica direta e indiretamente a avaliação do Ministério da Educação , a qualidade de seus dados para que seja uma fonte fidedigna de informação, as instituições privadas e seus alunos que, embora não se conscientizem tem seu curso julgado como bom ou ruim a partir de sua avaliação do ENADE, além de influenciar diretamente no acesso às políticas públicas de acesso e financiamento a Educação como FIES E PROUNI.
Segundo Schwarzman (no prelo), uma avaliação deve ser feita com clareza definindo previamente o que deve ser medido, mensurando-se conhecimentos e competências para, finalmente, ser comprovada a sua qualidade técnica. Evitando a utilização de uma avaliação única para cada área de conhecimento, uma vez que as Instituições possuem suas diversidades e que estas devem ser respeitadas e valorizadas a despeito de um modelo padrão, único.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Parece impossível chegar a um consenso a respeito da avaliação na educação superior e de como aplicá-la justamente. Existe muito a ser feito, estudado e aperfeiçoado. Contudo, não podemos fechar os olhos para a importância e necessidade de uma avaliação externa eficaz para apoiar nas tomadas de decisões e conquista da qualidade.
Para isso, é fundamental que se encontre uma forma justa, transparente e responsável de avaliar, respeitando as diversidades e especificidades institucionais e regionais. Seja através do ENADE, do CPC ou de qualquer outro conceito ou índice, contando que o processo avaliativo seja fiel para só assim disponibilizarmos conceitos justos e dignos de referência e embasamento para tomada de decisões. Dessa forma, a sociedade poderá acompanhar os conceitos e escolher a IES ou curso que deseja fazer e o MEC renovar ou não reconhecimentos. O SINAES precisa ser aplicado na forma como foi concebido, considerando seus mecanismos, princípios e dimensões, pois, só assim, ele poderá verificar as IES que atendem ou não aos requisitos legais, seja ela publica ou privada, não resumindo ao ENADE e seus resultados.
Não podemos fechar os olhos para a avaliação externa e independente, esta não pode deixar de existir. Pode-se até mesmo continuar demonstrando ao público resultados que permitam julgar as IES e cursos que devem ser escolhidos ou evitados, conquanto que os resultados das pesquisas representem um estímulo na busca pela qualidade, expansão e oferta da educação superior.
Às vezes parece utópico, mas a busca pela excelência na forma de avaliar e divulgar a qualidade educacional deve ser estimuladas e aperfeiçoadas a cada dia, com apoio de especialistas e da academia, observando-se a transparência e a abertura aos ajustes de procedimentos que se fizerem necessários.
REFERÊNCIAS
SCHWARTZMAN,S.O "Conceito Preliminar" e as boas práticas de avaliação do ensino superior. Instituto de estudos do trabalho e sociedade,2008.Disponível em acesso em : 3 jan.2008
LIMANA,A. Desfazendo mitos: o que estão fazendo com o sinais?Avaliação, Campinhas; Sorocaba,v.13,n.3 , p. 869-873,nov2008.
BARREYO, G. B. De exames, rankings e mídia. Avaliação da Educação Superior ,Campinas, vol.13 n.3, Nov. 2008.
FRAUCHES,C.C. Comentários e anotações preliminares para um conceito preliminar:conceito preliminar de curso e renovação de reconhecimento- portaria normativa n.40 ,de 5 de agosto de 2008. Disponível em : Acesso em 10 de jan.2008.
Brasil. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para aspectos Jurídicos. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei 9.394 de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional.
Brasil . Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para aspectos Jurídicos. Lei 10.861 de 14 de abril de 2004.Institui o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior ? SINAES e da outras providências.
Brasil. Ministério da Educação. Gabinete do Ministro.Portaria Normativa 40 de 12 de dezembro de 2007. Institui o e-MEC, sistema eletrônico de fluxo de trabalho e gerenciamento de informações relativas aos processos de regulação da educação superior no sistema federal de educação.
Brasil . Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para aspectos Jurídicos. Decreto 5773 de 9 de maio de 2006. Dispõe sobre o exercício das funções de regulação, supervisão e avaliação de instituições de educação superior e cursos superiores de graduação e seqüenciais no sistema federal de ensino.
Brasil. Ministério da Educação. Gabinete do Ministro. Portaria nº 4 de 5 de agosto de 2008. Regulamenta a aplicação do conceito preliminar de cursos superiores, para fins dos
processos de renovação de reconhecimento respectivos, no âmbito do ciclo avaliativo
do SINAES instaurado pela Portaria Normativa nº 1, de 2007.
Brasil. Ministério da Educação. Portaria Normativa nº10 de 2 de Julho de 2009. Fixa critérios para dispensa de avaliação in loco e dá outras providências.
Autor: Maria Cavalcante
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