CRIMES POLÍTICOS E O TEMA "EXTRADIÇÃO"



CRIMES POLÍTICOS E O TEMA "EXTRADIÇÃO"

A Lei n.º 7.170, de 14 de dezembro de 1983, prevê os crimes que lesam ou expõem a perigo de lesão "a integridade territorial e a soberania nacional; o regime representativo e democrático, a Federação e o Estado de Direito; a pessoa dos chefes dos poderes da União". Prevê, em outras palavras, os "crimes contra a Segurança Nacional, a Ordem Pública e Social, estabelece seu processo e julgamento e dá outras providências".

Pois bem. A Corte Suprema (STF) e os estudiosos do Direito têm definido que só há ?crime político? quando presentes os requisitos e pressupostos do art. 2º da legislação supracitada.

Tem-se, pois, que para a aplicação da Lei n.º 7.170/1983, dever-se-á levar em conta a "motivação e os objetivos do agente" (art. 2º, I), devendo a conduta deste lesar de forma "real ou potencial" (art. 2º, II), ou expor a perigo de lesão a soberania nacional, o regime representativo e democrático, a Federação e o Estado de Direito.

Segundo preleciona Cretella Júnior, ?crime político? é a "infração que atinge a organização do Estado como um todo, minando os fundamentos dos poderes constituídos". Para Heleno Cláudio Fragoso, ?crime político? é o que atinge "os interesses políticos da nação, ou seja, a segurança externa e a segurança interna, que, por vezes, se mesclam e se confundem, e a ordem econômica e social do Estado" (FRAGOSO, 1981, p. 125).

Registre-se, conforme entendimento da Corte Constitucional brasileira, "os atos delituosos de natureza terrorista não se subsumem à noção de criminalidade política, pois a lei fundamental proclamou o repúdio ao terrorismo como um dos princípios essenciais que devem reger o Estado brasileiro em suas relações internacionais" (STF, Pleno; Extradição n.º 855-2. Rel. Ministro Celso de Mello ? Informativo n.º 394).

Consoante decisão da Extradição n.º 855, da relatoria do Ministro Celso de Mello, os atos terroristas não se encaixam no conceito de ?crime político?. Entretanto, em havendo ações políticas associadas à segurança do Estado, poderá ser caracterizado o delito político.
Urge salientar que segundo a Constituição hodierna, a lei considerará crime inafiançável e insuscetível de graça ou anistia o terrorismo (art. 5º, XLIII), que, conforme explicitado, não tem cunho de ?crime político? por si só.

Importante mencionar que a Constituição Federal de 1988 faz menção aos denominados ?crimes políticos?, porém não os define. Assenta que compete aos Juízes Federais processá-los e julgá-los (CF, art. 109, IV), fixando que "não será concedida extradição de estrangeiro por crime político ou de opinião" (CF, art. 5º, LII).

De se notar que a Carta Magna de 88 não recepcionou a Lei n.º 7.170/1983 no que toca à competência para processar e julgar os denominados ?crimes políticos?. Consoante a precitada lei, compete à Justiça Militar processar e julgar os crimes previstos em seu bojo, o que conflita com o texto magno vigente, que estatui que a matéria ?crimes políticos? deve ser processada e julgada pela Justiça Comum Federal e não pela Justiça Especial Militar (CF, art. 109, IV). Trata-se de competência em razão da matéria, portanto, absoluta!

Como já salientado, a CF/88 não permite a extradição de estrangeiro por ?crime político? (art. 5º, LII), e esse comando traz-me à mente o caso Cesare Battisti (extradição n.º 1.085). Este italiano foi condenado em seu país sob a acusação de ter assassinado 04 (quatro) pessoas, quando lutava contrariamente ao governo italiano na década de 70. Preso no Brasil, Battisti foi reputado pelo Ministro da Justiça, Tarso Genro, refugiado político em 13 de janeiro de 2009. O STF, por maioria de 05 a 04, decidiu pela extradição de Battisti, condenado, na Itália, à pena de prisão perpétua pelo cometimento de quatro homicídios no território italiano. O Ministro Cezar Peluso, relator à época e hodiernamente Presidente da Corte Constitucional brasileira, entendeu que os delitos a ele (Battisti) imputados teriam natureza comum, e não ?política?, considerando atendidos os requisitos contemplados na Lei n.º 6.815/1980 e no tratado de extradição firmado entre o Brasil e a Itália. Os Ministros Joaquim Barbosa, Eros Grau, Marco Aurélio e a Ministra Cármen Lúcia foram contrários à extradição. Note-se, em 16 de dezembro de 2009, o STF estabeleceu que o Presidente da República não está vinculado à sua decisão respeitante à extradição, devendo se ater, no entanto, ao Tratado firmado entre Brasil e Itália, subscrito em 1989.

Por oportuno, é mister ressaltar que Gilmar Mendes, na sessão plenária que julgara a Extradição n.º 1.085, referente a Cesare Battisti, assentou que é "arrematado absurdo dizer-se que agora, uma vez decidida a extradição, o presidente da República está livre para não cumpri-la".
Não obstante, a Corte Suprema (STF) reconheceu, por maioria, que a decisão de deferimento da extradição não vincula o Chefe do Poder Executivo Federal, nos termos dos votos emanados dos Ministros Joaquim Barbosa, Carlos Britto, Marco Aurélio, Eros Grau e da Ministra Cármen Lúcia. Ficaram vencidos quanto a esta questão, os Ministros Cezar Peluso (Relator), Ricardo Lewandowski, Ellen Gracie e Gilmar Mendes (à época, Presidente do STF). Não votou o Ministro Celso de Mello, declarando suspeição.

Frise-se, o Procurador-Geral da República, Antônio Fernando Souza, opinou pelo deferimento do pleito italiano de extradição de Cesare Battisti, ressaltando, porém, que o ordenamento constitucional brasileiro não permite a prisão perpétua, e que, caso fosse deferida pelo STF a extradição, a Itália deveria substituir a sanção de caráter perpétuo pela pena de 30 anos de reclusão, abatendo deste período o tempo que o italiano cumprira prisão preventiva no território brasileiro.

No que tange à veracidade das provas, o Chefe do Ministério Público da União, Antônio Fernando de Souza, assentou que "são incabíveis as discussões a respeito das provas que ensejaram a condenação e do próprio mérito desta".

Convém salientar que o Ministro Cezar Peluso, atualmente Presidente do Supremo Tribunal Federal, no Pedido de Extradição envolvendo Battisti, entendera que a concessão de refúgio por Tarso Genro foi ilegal, haja vista que o precitado italiano não cometera ?crimes políticos?, mas delitos comuns, não prescritos. Ressaltou que o Estatuto dos Refugiados e a Lei n.º 9.474/1997 (art. 3º, inc. III) vedam a concessão de refúgio a quem tenha praticado crime de natureza hedionda.

Enfim, reconhecendo que o italiano Cesare Battisti não é refugiado político, o STF decidiu pela sua extradição para a Itália, destacando, no entanto, que o Presidente da República não está vinculado à decisão da Corte Constitucional brasileira para extraditar ou não estrangeiro, vez que a extradição é ato de sua soberania.

É isso...

Autor: Nourmirio Bittencourt Tesseroli Filho


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