OBRIGAÇÃO ALIMENTAR: CONCEITO, NATUREZA JURÍDICA, REQUISITOS E CARACTERISTICAS
OBRIGAÇÃO ALIMENTAR: CONCEITO, NATUREZA JURÍDICA, REQUISITOS E CARACTERISTICAS
Jehnyphen Samira G. De Santana
Pedro Henrique Andrade Vieira Garcia
RESUMO
O instituto dos alimentos tem por pressuposto garantir a sobrevivência do alimentando, proporcionando-o, sobretudo, uma vida digna. Quando o enfoque é alimentos sempre deverá ser observado, para a concessão de tal benefício, o binômio necessidade/possibilidade, pois deve-se levar em consideração a necessidade do alimentando e a possibilidade do alimentante de arcar com a pensão alimentícia. É um tema bastante profundo e lastreado de conflitos, que provêem, sobretudo, da complexidade das relações sociais e de algumas omissões legais. Neste contexto, o presente trabalho visa demonstrar de forma clara e precisa a natureza jurídica e as princípais caracteristicas do instituto alimentos.
Palavras-chave: Alimentos. Dignidade. Necessidade. Possibilidade. Mútua assistência.
INTRODUÇÃO
Os temas relacionados a alimentos, instituto do direito de família, são de grande valor para o mundo jurídico, tendo em vista que tratam de garantir a sobrevivência digna do necessitado, primando, por conseguinte, pelo direito à vida, art. 5°, caput e pela dignidade da pessoa humana art. 1º, III, ambos da Constituição Federal.
Dentre os diversos direitos oriundos das relações provenientes do casamento e da união estável, este trabalho tem por propósito abordar apenas o direito a alimentos, em virtude de sua notável importância no âmbito social, levando em consideração, sobretudo, os aspectos civis, foco do presente trabalho.
O Direito Civil dá as diretrizes quando o mérito é obrigação alimentar, o juiz, por sua vez, analisará cada caso para determinar se estão presentes os requisitos para que haja a concessão da pensão alimentícia e para delimitar o quantum, tomando por base o binômio supracitado.
As bases deste estudo serão moldadas a partir da mais conceituada doutrina, das legislações pertinentes ao tema, da jurisprudência e de artigos publicados na internet.
Desta forma, serão expostos o conceito de alimentos, segundo diversos autores, os requisitos e as características atinentes ao instituto em tela, haverá análise dos pressupostos e dos fundamentos para o deferimento do pleito alimentar nos casos de alimentos devidos em razão do casamento ou da união estável e também será mostrado as circunstâncias que extinguem a obrigação alimentar. Ademais, para melhor entendimento do instituto dos alimentos analisar-se-á sua evolução legislativa no direito brasileiro, e isto se dará através de considerações acerca do Código Civil de 1916, de legislações infraconstitucionais e da Constituição Federal, que trouxe mudanças importantes, como, por exemplo, a igualdade entre homem e mulher, prevendo direitos e obrigações iguais para ambos. Neste contexto, far-se-á um paralelo entre os entendimentos do passado e da realidade presente.
Diante deste contexto, e, sobretudo, em razão da complexidade das relações sociais, consagra-se ainda mais a capacidade do direito de se transformar e adaptar-se à realidade, pois os tribunais a cada passo buscam a solução adequada para o caso concreto e a doutrina discute temas controversos em busca de um entendimento consistente sobre as peculiaridades deste tema. Ademais existem obras específicas que esclarecem muitas questões e proporcionam uma visão panorâmica deste instituto, apesar de muitas vezes os doutrinadores apresentarem entendimentos diferentes, e até mesmo opostos em relação aos diversos temas discutidos no contexto da obrigação alimentar decorrente do casamento e da união estável.
De fato esta temática está arraigada no seio da sociedade e apresenta uma série de peculiaridades que serão esmiuçadas no avançar deste estudo; vale enfatizar que o tema em voga é sempre atual e muito interessante, faz com que muitos voltem os olhares atentos a esta questão que é corriqueira e habitual, pois uma série de famílias em todo o Brasil vive ou já viveu esta situação.
1. CONCEITO E ASPECTOS GERAIS
Nos moldes da legislação vigente a pensão alimentícia poderá ser exigida por qualquer dos cônjuges ou companheiros.
O Código Civil não traz um conceito direto de alimentos, ele apresenta os requisitos para sua concessão, no entanto a doutrina tratou de defini-los.
Sílvio de Salvo Venosa , traz bom conceito para alimentos:
Assim, alimentos, na linguagem jurídica, possuem significado bem mais amplo do que o sentido comum, compreendendo, além da alimentação, também o que for necessário para moradia, vestuário, assistência médica e instrução. Os alimentos assim traduzem-se em prestações periódicas fornecidas a alguém para suprir essas necessidades e assegurar sua subsistência.
Nos dizeres de Silvio Rodrigues :
Alimentos, em direito, denomina-se a prestação fornecida a uma pessoa, em dinheiro ou em espécie, para que possa atender às necessidades da vida. A palavra alimentos tem conotação muito mais ampla do que na linguagem vulgar, em que significa o necessário para o sustento. Aqui trata-se não só do sustento, como também de vestuário, habitação, assistência médica, em caso de doença, enfim de todo o necessário para atender às necessidades da vida; e, em se tratando de criança, abrange o que for preciso para sua instrução.
Áurea Pimentel Pereira , traz entendimento de Pontes de Miranda, segundo o qual:
(...) Os alimentos, na linguagem comum, são considerados, em princípio, como representativos do estritamente necessário à sobrevivência dos alimentandos, observando que, no direito antigo, segundo o previsto nas Ordenações Filipinas, abrangia, além dos mantimentos, vestuário e habitação (...).
Ainda segundo o douto jurista, os alimentos podem ser divididos em naturais e civis (...).
A supracitada autora também faz, em sua obra, referencia ao entendimento de Carvalho Santos sobre alimentos:
A palavra alimentos, no sentido geral, significa o que é necessário para a alimentação, mas, na linguagem do Direito tem um significado técnico, devendo se entender por alimentos, tudo o que é necessário para satisfazer as necessidades da vida e habitação, e, se o alimentário é menor, também para as despesas de criação e educação.
Ana Maria Gonçalves Louzada traz o seguinte entendimento sobre alimentos:
(...) destacamos que alimentos, em sua concepção jurídico-legal, podem significar não só o montante indispensável à sobrevivência do alimentando, mas também o valor que importa na mantença de seu padrão de vida, subsidiando, inclusive, seu lazer.
Os pressupostos da obrigação alimentar embasam-se no vínculo de direito de família, subsidiado nas necessidades do alimentado e nas possibilidades financeiras do alimentante, respeitando o princípio da reciprocidade (...).
É imprescindível dizer que quem não está apto a prover sua subsistência, não deve, em razão deste estado, ser abandonado "à própria sorte". Para mostrar a importância dos alimentos é notável mais uma vez fazer menção à obra de Sílvio de Salvo Venosa :
Os parentes podem exigir um dos outros os alimentos e os cônjuges devem-se mútua assistência. A mulher e o esposo, não sendo parentes ou afins, devem-se alimentos com fundamento no vínculo conjugal. Também os companheiros em união estável estão na mesma situação atualmente. Daí decorre, igualmente, o interesse público em matéria de alimentos. Como vemos, a obrigação alimentar interessa ao Estado, à sociedade e à família.
Nas palavras de Maria Helena Diniz :
O fundamento desta obrigação de prestar alimentos é o princípio da preservação da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III) e o da solidariedade social e familiar (CF, art. 3º), pois vem a ser um dever personalíssimo, devido pelo alimentante, em razão de parentesco, vínculo personalíssimo, devido pelo alimentante, em razão de parentesco, vínculo conjugal ou convivencial que o liga ao alimentando [...]
Neste contexto o Código Civil em seu art. 1695 diz o seguinte: "São devidos alimentos quando quem os pretende não tem bens suficientes, nem pode prover, pelo seu trabalho, à própria mantença, e aquele, de quem reclamam, pode fornecê-los, sem desfalque do necessário ao seu sustento".
Diante do que já foi exposto até então, conclui-se que o montante dos alimentos deve levar sempre em consideração a necessidade do alimentando e as condições de fornecimento do alimentante. Portanto o juiz deve analisar categoricamente as condições de cada um, pois os alimentos só devem ser concedidos àqueles que realmente comprovem sua necessidade. Existe uma grande demanda de ações desse gênero, sobretudo em razão das condições sócio-econômicas vividas neste país.
Os alimentos de que este estudo trata são aqueles que derivam do casamento ou companheirismo, deste modo, e de acordo com a redação do art. 1694, os cônjuges e companheiros podem pedir reciprocamente alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social.
O Código Civil em seus arts. 1702, 1703 e 1704, trata dos alimentos no desfazimento da sociedade conjugal.
Antes de entrar em outra esfera do estudo é importante saber que não é necessária a separação judicial para que haja o requerimento dos alimentos, se estiver configurada a separação de fato eles podem ser pleiteados.
O Código Civil faz alusão aos alimentos considerados necessários, aqueles de âmbito estrito, esta referência se dá nos casos em que o cônjuge é considerado culpado.
O art. 1704, em seu caput e parágrafo único diz o seguinte:
Art. 1704. Se um dos cônjuges separados judicialmente vier a necessitar de alimentos, será o outro obrigado a prestá-los mediante pensão a ser fixada pelo juiz, caso não tenha sido declarado culpado na ação de separação judicial.
Parágrafo único. Se o cônjuge declarado culpado vier a necessitar de alimentos, e não tiver parentes em condições de prestá-los, nem aptidão para o trabalho, o outro cônjuge será obrigado a assegurá-los, fixando o juiz o valor indispensável à sobrevivência.
Os alimentos necessários só serão devidos por um cônjuge, ao outro culpado, se este não tiver parentes em condições de fornecê-los.
Continuando nessa linha da culpa dos cônjuges na separação, deve-se mencionar o art. 1702, que traz a regra geral de alimentos na separação litigiosa, ao dizer que neste tipo de separação, sendo um dos cônjuges inocente e sem recursos, o outro deverá prestar a pensão alimentícia que o juiz fixar, com a ressalva de serem obedecidos os critérios estabelecidos no art. 1694 do Código Civil.
Maria Helena Diniz enumera as causas de extinção da obrigação de prestar alimentos, no entanto vale ressaltar o que interessa para este estudo:
Pelo casamento, união estável ou procedimento indigno do credor de alimentos. O devedor de alimentos (ex-cônjuge, ex-companheiro ou parente) deixará de ter tal obrigação com relação ao credor se este vier a convolar núpcias, passar a viver em união estável ou concubinato ou se tiver procedimento indigno (RT, 701:184;/ 525:111...) em relação ao devedor, por ofendê-lo em sua integridade corporal ou mental, por expô-lo a situações humilhantes ou vexatórias, por injuriá-lo, difamá-lo, atingindo-o em sua honra e boa fama, enfim, por ter praticado quaisquer atos arrolados nos arts. 1814 e 557 do Código Civil, aplicável por analogia (nesse mesmo sentido o Enunciado n. 264 do Conselho da Justiça Federal, aprovado na III Jornada de Direito Civil).
Em todos estes casos citados, aquele que tem o dever de prestar alimentos deverá pedir judicialmente, sua exoneração do encargo sendo que segundo o enunciado n. 265 do Conselho da Justiça Federal, aprovado na III Jornada de Direito Civil, quando for configurado o concubinato, será necessária a comprovação da assistência material prestada pelo concubino a quem o credor de alimentos se uniu.
Ressalte-se a paridade existente entre o casamento e a união estável neste contexto, por isso, não deve ser outorgado à união estável benefício algum, maior ou melhor que os concedidos a uma relação sacramentada pelo casamento.
Segue um dos diversos julgados, que trazem em seu bojo o tema em questão:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL. ALIMENTOS PROVISÓRIOS. A própria agravada reconheceu que o atual namorado paga o aluguel da casa em que ela reside e mais uma série de outras despesas dela e da filha. Reconheceu, ainda, que ela e o namorado pretendem adotar uma criança. Tais elementos dão enorme verossimilhança à versão de que a agravada vive em união estável com outro homem, o que, se confirmado, lhe retira o direito à percepção de alimentos. De outra banda, os alimentos foram fixados em 09 salários mínimos em 2002. Naquela época, isso representava R$ 1.800,00. Passado tanto tempo, o aumento substancial do salário mínimo provocou um aumento demasiado na verba alimentar. Nesse contexto, considerando-se a exoneração da agravada e o aumento desproporcional do salário mínimo é cabível a readequação da verba alimentar, conforme pretendido pelo agravante. DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO AGRAVO. (SEGREDO DE JUSTIÇA)
A pensão alimentícia não deve ser um instrumento para a ostentação e luxo, deve proporcionar uma vida digna àquele que dela necessita, devendo abranger o seu sustento, transporte, higiene, saúde, além das necessidades intelectuais e morais. Neste contexto não há que se falar em favor, ou benevolência, trata-se de obrigação exigível por vias judiciais.
A obrigação alimentar traz consigo diversas características, sendo: personalíssima, imprescritível, inalienável, irrepetível, irrenunciável e não sujeita a compensação, dentre outras; mais a frente detalhar-se-á cada uma delas. Por fim deve-se lembrar que se a obrigação alimentar não for cumprida, haverá execução "por vias rápidas" , podendo até ser aplicada a prisão como medida coercitiva, de acordo com o art. 5º, inciso LXVII da Carta Magna, art. 733, § 1º, do CPC e art. 19 da Lei n.5748/68.
A obrigação alimentar decorrente do casamento ou da união estável fomentar diversas questões polêmicas, isto se dá porque o direito de família, como um todo, é "aquele que mais reflete a dinâmica das relações sociais" .
2. CONSIDERAÇÕES: Código Civil de 1916, Código Civil de 2002, Legislação Infraconstitucional e Constituição Federal
Antes de adentrar no mérito deste estudo torna-se necessário expor as peculiaridades do Instituto dos Alimentos, para tanto se faz mister analisar sua evolução histórica, pois com o advento da Constituição de 1988 e do Código Civil de 2002 algumas mudanças importantes aconteceram.
O Código Civil de 1916 disciplinava a matéria em seus art. 396 a 405, quando dispunha sobre obrigação alimentar entre ascendentes, descendentes e os colaterais de segundo grau, no entanto era em seu art. 231, III, que tratava da obrigação alimentar em relação aos casados, tendo em vista o dever de mútua assistência. Uma vez configurada a separação judicial, o cônjuge responsável deveria seguir as diretrizes do art. 19 da Lei 6.51577, in verbis: "O cônjuge responsável pela separação judicial prestará ao outro, se dela necessitar, a pensão que o juiz fixar", todavia ambos deveriam contribuir para mantença da prole, de acordo com suas possibilidades (art. 20 da mesma Lei) .
Seguindo o mesmo dever assistencialista os companheiros estavam sujeitos à obrigação alimentar, de acordo com a disciplina do art.; 2º, inciso II, que estabeleceu direitos e deveres iguais aos conviventes, e art. 7º da Lei nº. 9.278/96:
Estou aqui
Art. 2º São direitos e deveres iguais dos conviventes:
I- respeito e consideração mútuos;
II- assistência moral e material recíproca;
III- guarda, sustento e educação dos filhos comuns (grifo nosso).
Art. 7º Dissolvida a união estável por rescisão, assistência material prevista nesta Lei será prestada por um dos conviventes ao que dela necessitar a título de alimentos.
Note-se, contudo, que a primeira lei que tratou expressamente, da obrigação alimentar decorrente da união estável foi a 8.971/94, que em seu parágrafo 1° dispôs que, para fins de pensão alimentícia, a união deveria haver sido constituída a mais de cinco anos, ou que da referida união houvesse resultado prole .
Isto posto, é necessário ressaltar que, quanto aos ex-cônjuges, o Código Civil de 1916, só impunha o dever de prestar alimentos ao marido em favor da mulher inocente e pobre, "assim reconhecida na ação de desquite" . No entanto com o advento da Lei do Divórcio (Lei nº. 6515/77), a prestação alimentar passou a ser recíproca, existindo, portanto a possibilidade da mulher figurar no "pólo devedor" desta obrigação. Ademais em contraponto à separação, que não dissolvia a sociedade conjugal, o divórcio acaba definitivamente com o casamento, subsistindo, porém o dever de prestar alimentos, cessando, no entanto, se houver posterior casamento .
Diante do art. 19 da mesma Lei, já citado, chegava-se à seguinte conclusão: se o culpado não fosse identificado ou houvesse culpa recíproca, simplesmente não seria possível pedir alimentos. Desta forma só o cônjuge inocente poderia pleitear tal direito, sendo o culpado responsável por arcar com a pensão; a mera iniciativa judicial em pedir a separação, ensejaria na perda do direito de receber a prestação alimentar, segundo o disposto no art. 26 da Lei do Divórcio, in verbis: "No caso de divórcio resultante da separação prevista nos §§ 1º e 2º do art. 5º, o cônjuge que teve a iniciativa da separação continuará com o dever de assistência ao outro (...)".
Com o advento do Código Civil de 2002, os Alimentos ? arts. 1694 a 1710 - passaram a ser disciplinados com maior abrangência, pois o atual Código Civil passou a tratar dos parentes, cônjuges e companheiros, com regras que alcançam a todos. Desta forma ficam revogadas não só as disposições do Código Civil de 1916, como da mesma forma a Lei 6.515/77, no que tange os alimentos na separação judicial e no divórcio, e a Lei 9.278/96, em relação aos alimentos entre companheiros.
Segundo Caio Mário da Silva Pereira: "... o legislador de 2002 não se preocupou em distinguir os alimentos se originários das relações de parentesco, como aqueles destinados aos descendentes ou ascendentes ou do rompimento da sociedade conjugal ou da extinção da União estável" .
Segue o art. 1694, caput: "podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação".
Desta forma, a obrigação alimentar, em linhas gerais, visa manter o padrão socioeconômico do alimentando, no entanto mais especificamente, no caso dos ex-cônjuges ou ex-companheiros, com a dissolução da sociedade conjugal/união estável, o alimentante terá seu o seu padrão de vida fatalmente reduzido, e é neste ponto que o juiz deve analisar o caso e fixar a pensão alimentícia de acordo com a necessidade do alimentando e a possibilidade do alimentante.
Como se observa, o Código Civil de 2002 assegurou o binômio necessidade/possibilidade: "Art. 1964, § 1º: os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada".
O Código de 2002 inova em relação à culpa, prevista no art. 1694, § 2º: "Os alimentos serão apenas os indispensáveis à subsistência, quando a situação de necessidade resultar da culpa de quem os pleiteia", pois esta diretriz se dirige a todos, sejam parentes, em decorrência da união estável ou casamento, e isto é inegável, no entanto, é aplicada de maneira mais contundente na última hipótese.
É manifesto que a culpa pelo fim do casamento sofreu significativa alteração, pois era caso absoluto de perda de direito à obrigação alimentar, hoje é a atenuada pela redação do parágrafo único do art. 1704, que garante os alimentos necessários ao ex-cônjuge se este for culpado e não tiver outro meio de sobreviver; outros aspectos relevantes são as alterações atinentes à regra de transmissibilidade da obrigação alimentar aos herdeiros do devedor e à vedação de renúncia ao direito a alimentos, no decorrer do estudo, nos ateremos a detalhar estas questões.
Com o advento da Constituição de 1988, houve uma maior valorização da dignidade da pessoa humana e do princípio basilar do direito à vida, levando em consideração esta conjectura, conclui-se que a Constituição Federal trouxe uma família arraigada na solidariedade, que traz consigo, por conseguinte, o dever de mútua assistência, galgado na reciprocidade, não deixando que aquele que não tenha condições de prover seu sustento sozinho tenha uma vida sem dignidade, ao menos, do ponto de vista material.
Desta forma, resta demonstrado que a família teve uma nova abordagem, ou melhor, foi encarada sob uma nova ótica, já que a concepção patriarcalista vivenciada em tempos passados, não foi recepcionada pela Carta Magna vigente, vigorando o princípio da igualdade, da dignidade da pessoa humana da solidariedade, dentre outros.
Como assinala Cristiano Chaves de Farias : "a proteção do núcleo familiar deverá estar atrelada, necessariamente, à tutela da pessoa humana através dos (democráticos) princípios gerais da Magna Carta".
A dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF) é, portanto, um dos princípios norteadores dos alimentos, pois, passou a garantir, no âmbito familiar, "proteção de forma igualitária a todos os seus membros" , sendo sua infringência afronta às prerrogativas constitucionais.
Com base neste fundamento, conclui-se que na fixação do quantum, deve-se levar em consideração, tanto a dignidade de quem recebe alimentos, quanto de quem os presta, pois, vislumbrar-se-ão as necessidades do alimentando e a capacidade econômico-financeira do devedor .
Os alimentos também seguem as diretrizes do art. 3º da CF, que traz em seu bojo, o princípio da solidariedade, nesta perspectiva, a família deve se ajudar quando surgirem adversidades, tendo em vista a manutenção da sobrevivência, ou seja, para a conservação da vida (art. 5º, caput, da CF).
É a partir de uma interpretação lastreada, sobretudo, nos princípios da solidariedade e da dignidade da pessoa humana, que se deve analisar o Instituto dos Alimentos pós Carta de 1988.
3. NATUREZA JURÍDICA DOS ALIMENTOS
Quanto à natureza jurídica, este estudo se filia ao ensinamento de que a obrigação alimentar trata-se de um direito pessoal extrapatrimonial, e tem um fundamento ético-social, pois o alimentando não tem interesse econômico, uma vez que a verba recebida não aumenta seu patrimônio, não servindo também de garantia aos seus credores, sendo por sua vez, uma manifestação do direito à vida, que tem caráter personalíssimo .
No entanto existe entendimento diverso como se observa nos dizeres de Maria Helena Diniz :
(...) Outros, como Orlando Gomes, ao qual nos filiamos, nele vislumbram um direito, com caráter especial, com conteúdo patrimonial e finalidade pessoal, conexa a um interesse superior familiar, apresentando-se como uma relação patrimonial de crédito-débito... havendo, portanto, um credor que pode exigir de determinado devedor uma prestação econômica.
4. REQUISITOS
A obrigação alimentar obedece a certos requisitos para sua concessão, quais sejam: a necessidade, a possibilidade, a proporcionalidade e a reciprocidade.
4.1 Necessidade
Os alimentos são devidos quando o alimentando não possui bens suficientes, e, além disso, "está impossibilitado de prover, pelo seu trabalho, à própria subsistência, por estar desempregado, doente, inválido, velho (Lei n. 10.741/2003)" . Desta forma, extrai-se que não importa o contexto que levou o indivíduo a necessitar de alimentos, o que não se pode é deixar o sujeito "à própria sorte", sem as mínimas condições de ter uma vida digna.
4.2 Possibilidade
Em complemento a necessidade, existe a possibilidade, que forma o binômio possibilidade/necessidade.
O alimentante "deverá cumprir seu dever fornecendo verba alimentícia, sem que haja desfalque do necessário para ao seu próprio sustento (RT, 665:75, 751:264)" .
Não é justo que uma pessoa que vive com o indispensável para a própria sobrevivência preste alimentos a outrem ao ponto de se sujeitar a grandes sacrifícios, ou seja, o indivíduo não pode ser reduzido a condições precárias e é por isso que o alimentante deve prestar alimentos dentro dos seus limites, já que não pode privar-se de se auto-sustentar, sendo assim, se um parente não puder prover as necessidades do alimentando na íntegra, outro deve ser acionado para que haja a complementação da verba alimentícia.
4.3 Proporcionalidade
Os alimentos, para sua fixação, devem levar em consideração o binômio supracitado, pois este instituto não visa o enriquecimento do alimentando.
Sendo assim não tem porque exigi-los além das necessidades do alimentando, mesmo que o devedor seja dotado de um elevado poder econômico, em contrapartida o devedor não pode "ser compelido a prestá-los com sacrifício próprio ou da sua família, pelo fato de o reclamante os estimar muito alto, ou revelar necessidades maiores (§ 1º do art. 1964)" .
Resumindo devem-se considerar os recursos econômicos do credor e as necessidades do devedor, sendo assim, a proporcionalidade é a conciliação da necessidade do alimentando com a possibilidade do alimentante.
4.4 Reciprocidade
A obrigação alimentar é recíproca, desta forma, se aquele que presta alimentos vier a necessitar poderá pleiteá-los inclusive daquele que anteriormente era seu credor, ou seja, os pólos passivos e ativos podem variar de acordo com as condições econômico-financeiras de cada indivíduo inserido nesta relação jurídico-familiar.
5. CARACTERÍSTICAS
5.1 Direito Personalíssimo
Trata-se de um direito personalíssimo porque sua titularidade não passa a terceiro, deve ser exercido por aquele que não tem condição de prover seu próprio sustendo, uma vez que a obrigação alimentar tem por objetivo assegurar o direito a vida, sendo assim, "não pode ser repassado a outrem, seja através de negócio, seja de outro acontecimento jurídico" .
5.2 Transmissibilidade
A transmissão da obrigação alimentar encontra-se prevista em seu art. 1700 do Código Civil, in verbis: "A obrigação de prestar alimentos transmite-se aos herdeiros do devedor, na forma do art. 1694". Este artigo suscita divergências interpretativas em razão de sua redação.
Nos dizeres de Andréa Aldrovandi e Danielle Galvão de França
O novo Código Civil traz a regra da transmissibilidade da obrigação alimentar, prevista em seu art. 1.700, que remete ao art. 1694, dando a entender que esta regra envolve também a obrigação alimentícia originada do vínculo de parentesco, além das decorrentes do casamento e união estável; e que os herdeiros do alimentante estariam obrigados a prestar alimentos ao credor-alimentado de acordo com as suas possibilidades, e não nas forças da herança. Na verdade o Novo Código Civil não soluciona de uma forma clara as discussões atuais sobre o tema, mas apenas gera uma nova fase de conflitos e incertezas a serem solucionadas pela doutrina e jurisprudência.
A princípio é imperioso mencionar o art. 402 do Código Civil 1916: "a obrigação de prestar alimentos não se transmite aos herdeiros do devedor". Desta forma este artigo previa como regra a intransmissibilidade da obrigação alimentar, no entanto a redação do art. 23 da Lei do Divórcio (Lei nº. 6.515/77) entrou em contradição com esta regra, in verbis: "Art. 23 a obrigação de prestar alimentos transmite-se aos herdeiros do devedor na forma do art. 1796 do CC/1916". O art. 1700 do CC redefiniu a regra da transmissão da obrigação alimentar, ao fazer referência ao art. 1694 do CC.
Como parte introdutória das questões atinentes a este tópico é importante mencionar o que dispõe Euclides de Oliveira , nos seguintes termos:
Correta a observação feita por Luiz Felipe Brasil, quanto ao aparente equívoco na redação do art. 1700 do novo Código Civil, por reportar-se ao art. 1694, argumentando que, para guardar simetria com o que dispunha Lei 6.515/77, em seu art. 23, a remissão deveria ser feita agora ao art. 1997 do novo ordenamento civil, que trata da responsabilidade da herança pelas dívidas do falecido. Do jeito que ficou, e sem qualquer referência aos limites das forças da herança, o art. 1700 "pode conduzir à interpretação de que os herdeiros passam a ser pessoalmente responsáveis pela continuidade do pagamento, independentemente de terem ou não herdado qualquer patrimônio, o que ofenderia, é certo, a característica que diz ser personalíssima a obrigação alimentar.
Partindo de interpretações doutrinárias e jurisprudenciais, tem-se que, a transmissão da obrigação alimentar se dá exclusivamente nos limites das forças da herança, sendo que os alimentos persistirão apenas enquanto não se consumar a partilha e a transmissibilidade tem início se quando da morte do devedor, por intermédio de sentença, a obrigação já estiver constituída . Desta forma, o dever de prestar alimentos não se transmite, o que se transmite é a obrigação alimentar, sendo assim, para que a transmissibilidade se configure, faz-se necessário que antes da morte do de cujus, já haja obrigação alimentar fixada judicialmente .
O seguinte julgado corrobora este entendimento:
EMENTA: AÇÃO DE ALIMENTOS CONTRA ESPÓLIO. TRANSMISSIBILIDADE DOS ALIMENTOS. ART. 1.700, CCB. Nos termos do art. 1.700 do CCB, a obrigação alimentar e não somente eventual débito - se transmite aos herdeiros do alimentante, desde que comprovada a necessidade de quem pleiteia os alimentos e que o patrimônio deixado produza frutos suficientes para adimplir a pensão fixada, nos termos dos arts. 1694 e 1695, ambos do CCB. Já existindo pensão arbitrada ainda em vida do alimentante, e possuindo o espólio forças para adimpli-la, persiste a obrigação, devendo o pedido que visa a fixação ser recebida como ação revisional. Tendo o alimentante, em vida, oferecido majoração dos alimentos (o que só não se consumou dado seu falecimento antes do julgamento da revisional), evidencia-se o reconhecimento dele acerca do incremento da necessidade do alimentado. Tal circunstância, aliada ao fato de que o espólio possui bens cuja renda é suficiente para custear o pagamento da verba alimentar, justifica o deferimento do reajuste postulado. PROVERAM PARCIALMENTE, PARA MAJORAR A PENSÃO PARA DOIS SALÁRIOS MÍNIMOS (grifo nosso).
É notório que a obrigação de prestar alimentos é transmitida como um todo, sendo assim deve comportar o pagamento tanto dos alimentos vencidos como vincendos, é claro que de acordo com as forças da herança ("Art. 1792 do CC. O herdeiro não responde por encargos superiores às forças da herança"). Nada obstante, sendo a obrigação transmitida ao espólio do devedor, não havendo bens, não há que se falar em transmissão da obrigação alimentar .
Neste sentido, trago à colação o seguinte julgado:
ALIMENTOS. RESPONSABILIDADE DO ESPÓLIO. TRANSMISSIBILIDADE DA OBRIGAÇÃO. Configurados os pressupostos necessidade-possibilidade, cabível a estipulação dos alimentos. Isso nos remete ao tema da transmissibilidade da obrigação alimentar, agora tornada inquestionável pelo artigo 1.700 do Código Civil. E não se diga que a transmissão se restringe apenas às parcelas eventualmente vencidas, deixando de abranger as vincendas. É que, em primeiro lugar, esse dispositivo legal refere-se a "obrigação" e não a "dívidas" o que, por si só, deve bastar. Há mais, porém. É que interpretá-lo como abrangendo apenas eventuais parcelas inadimplidas até o ensejo da morte do devedor de alimentos é tornar a regra inteiramente vazia, pelo simples fato de que o artigo 1.997 do CC já torna o Espólio responsável pelo pagamento das dívidas do falecido, não havendo, portanto, necessidade de que a mesma disposição constasse em local diverso. Por isso, e não podendo entender-se que a lei contém palavras inúteis, é evidente que o art. 1.700 determina a transmissão da obrigação, abrangendo parcelas que se vençam inclusive após o óbito do devedor, como no caso. LIMITE DA OBRIGAÇÃO. É certo que o apelante, como filho que é do autor da herança, é também seu herdeiro, em igualdade de condições com os demais descendentes. Logo, mais cedo ou mais tarde lhe serão atribuídos bens na partilha que se realizará no inventário recém iniciado. Nesse contexto, os alimentos subsistirão apenas enquanto não se consumar a partilha, pois, a partir desse momento desaparecerá, sem dúvida, a necessidade do alimentado. PROVERAM. UNÂNIME .
Voltando à questão da partilha, vale ressaltar que quando houver a divisão dos bens, não há mais que se falar em sucessores, "os quais não respondem com seu patrimônio particular pelo pagamento de obrigação alimentar do devedor falecido" .
Desta forma, se não houver herança, ou ainda se os bens deixados pelo alimentante forem insuficientes para arcar com o pagamento da obrigação alimentar, não pode-se responsabilizar pessoalmente os herdeiros por este encargo, sobretudo em razão do caráter personalíssimo de tal obrigação , que não pode ser afrontado, pois se assim não fosse poderia se configurar o cúmulo do primitivo credor receber alimentos de um total estranho, em razão do falecimento do devedor da obrigação alimentar.
Portanto só haverá transmissão da obrigação alimentar se houver herança que a suporte. Se não houver herança, também não haverá herdeiro de quem se possa "exigir o pagamento da pensão a que se achava obrigado o falecido" . Repise-se não há sucessão da pensão alimentícia além das forças da herança.
Elucidativa é a redação do art. 1997, caput, do CC, segundo o qual: "A herança responde pelo pagamento das dívidas do falecido; mas, feita a partilha, só respondem os herdeiros, cada qual em proporção da parte que na herança lhe coube".
Pois bem, se for constatado a obrigação alimentar por direito próprio, o credor deve procurar os meio legais e ajuizar a Ação de Alimentos, nos termos do art. 1695 do CC.
Outra observação de Euclides de Oliveira merece nota:
Sendo o credor dos alimentos herdeiro do devedor, opera-se a confusão entre os sujeitos da relação obrigacional, levando à extinção do encargo, mesmo porque a nova situação patrimonial do alimentado pode conduzir ao reconhecimento de que não mais necessite de assistência.
Conclui-se que o art. 1700 do Código Civil, afim de evitar conflitos interpretativos deve ser analisado à luz dos arts. 1792 e 1997, ambos do Código Civil.
O Deputado Ricardo Fiúza apresentou o Projeto de Lei n. 6960/2002 que em seu bojo, dentre outras intenções, visa alterar a redação do art. 1700 do CC, nos seguintes termos: "Art. 1700. A obrigação alimentar de prestar alimentos decorrente de casamento e da união estável transmite-se aos herdeiros do devedor, nos limites das forças da herança, desde que o credor da pensão alimentícia não seja herdeiro do falecido" .
Esta alteração tem por propósito adequar o art. 1700 do CC às circunstâncias em que o credor não seja herdeiro do falecido. O projeto tem como foco apenas o cônjuge e o companheiro, desde que não tenham direito à herança, e exclui os parentes, sob o fundamento destes já configurarem como herdeiros, e também porque, se sobrevier necessidade, teriam como pleitear alimentos por direito próprio em relação aos demais sucessores.
5.3 Irrenunciabilidade
A irrenunciabilidade está prevista no art. 1707 do Código Civil, in verbis: "Pode o credor não exercer, porém lhe é vedado renunciar o direito a alimentos, sendo o respectivo crédito insuscetível de cessão, compensação e penhora".
A regra prevê que não se pode renunciar a alimentos, nada obstante, o credor pode deixar de exercer, ou seja, é renunciável o exercício e não o direito. O Código Civil estabelece a irrenunciabilidade da obrigação alimentar por considerar que os alimentos estão protegidos por "razões de ordem pública" , tendo em vista que visam garantir a sobrevivência do alimentando, ou seja, preservar um direito elementar, com previsão constitucional, qual seja, o direito à vida.
Pela letra da lei o direito a obrigação alimentar é indisponível. Portanto, mesmo que as partes tenham acordado "a renúncia" aos alimentos, estes podem ser pleiteados desde que surja a necessidade do alimentando e haja possibilidade do alimentante arcar com a pensão alimentícia. Ana Maria Gonçalves Louzada entende como não escrita a cláusula estabelecida entre as partes em que ambos renunciam alimentos entre si.
Esta característica da obrigação alimentar preserva o interesse público, qual seja a vida, em detrimento do patrimônio, que se configura como um interesse particular.
A Súmula n. 336 do STJ ("A mulher que renunciou os alimentos na separação judicial tem direito à pensão previdenciária por morte do ex-marido, comprovada a necessidade econômica superveniente"), ressaltou irrenunciabilidade dos alimentos em qualquer circunstância, não importando sua origem, sendo assim são irrenunciáveis não só os alimentos decorrentes do parentesco, como também os decorrentes do casamento, da união estável, etc. . Foi exatamente esta a intenção do Código Civil de 2002.
O art. 1707 do CC corrobora o entendimento dado pela súmula 379 do STF, que diz o seguinte: "No acordo de desquite não se admite renúncia aos alimentos, que poderão ser pleiteados ulteriormente, verificados os pressupostos legais".
No entanto esta temática é controvertida no que tange a obrigação alimentar decorrente de casamento ou união estável. Esta questão será abordada com mais ênfase no capítulo seguinte.
5.4 Impenhorabilidade, Incedibilidade e Incompensabilidade
Todas estas características estão explícitas na redação do art. 1707 do Código Civil, como visto na lição anterior.
A pensão alimentícia é impenhorável, pois a verba alimentar é destinada à mantença do alimentando, desta forma não pode responder por suas dívidas.
Todavia, como assevera o célebre Yussef Said Cahali :
A doutrina prevê algumas exceções à impenhorabilidade dos alimentos, quais sejam, a penhorabilidade dos bens adquiridos com os alimentos e a penhorabilidade de parte dos alimentos, desde que prestados alimentos civis, ao fundamento de que na totalidade do valor pago há uma parte que não é necessária à sobrevivência.
Sendo assim, apenas o padrão social estaria prejudicado e não a sobrevivência do alimentado.
O crédito alimentar também é incompensável, pois em decorrência da característica sui generis da obrigação alimentar, qual seja: sustento do alimentando, não pode ser objeto de compensação, se fosse possível este procedimento, se houver uma inversão dos pólos, o, anteriormente devedor, e agora credor, não poderia opor o crédito, quando exigida a obrigação .
Como assinala Maria Helena Diniz , a obrigação alimentar é "(...) incessível em relação ao credor, pois o crédito não pode ser cedido a outrem, por ser inseparável da pessoa do credor (...)". Todavia, nada impede a cessão das prestações vencidas a outrem, uma vez que constituem dívida comum (art. 286 do Código Civil).
5.5 Imprescritibilidade
O direito a alimentos é imprescritível, mas as prestações vencidas não o são. O prazo prescricional para pleitear as prestações vencidas é de 02 anos, a partir da data em que venceram (art. 206, § 2º do Código Civil).
Portanto se a pessoa vier necessitar de alimentos, e cumprir os requisitos, poderá cobrar alimentos a qualquer tempo, tendo em vista o caráter imprescritível deste direito.
5.6 Irrepetibilidade
A irrepetibilidade é uma característica tradicional do instituto dos alimentos, e consiste na proibição da repetição dos alimentos, ou seja, tem por intuito impedir sua restituição quando houver constatação posterior de que não eram devidos. Sabe-se que é costumeira a busca de restituição nas ações exoneratórias ou revisionais de alimentos .
Segundo lição de Caio Mário Pereira da Silva, "consideram-se irrepetíveis, as prestações de alimentos prestados entre os cônjuges", tendo em vista a obrigação moral .
No entanto existe posicionamento doutrinário que contesta esta característica, em razão da repulsa ao enriquecimento ilícito, ou seja, quando o credor recebe verba alimentar tendo condições de se prover, nos dizeres de Rodrigo da Cunha Pereira :
[...] Por esta razão, e Pelo princípio que veda o enriquecimento ilícito, a doutrina vem repensando esta característica, pois o credor dela se vale para protelar cada vez mais o processo judicial e, por conseguinte, prolongar o tempo em que o alimentando faz jus às prestações alimentícias, postergando uma sentença de mérito... Diante disso inexiste óbice jurídico a rever esta tradicional característica dos alimentos, para os tomar como repetíveis, o que se torna uma arma contra a morosidade da Justiça, pois o devedor tem a garantia de que não haverá locuplemento indevido dos valores que, muitas vezes, vem pagando sem ter condições financeiras.
6. EXTINÇÃO DA OBRIGAÇÃO ALIMENTAR
A obrigação de prestar alimentos pode cessar em virtude da morte do alimentando, por ser um direito personalíssimo; no entanto a morte do devedor de alimentos, seja decorrente de parentesco, casamento ou união estável, ensejará a transmissibilidade da obrigação alimentar aos herdeiros do devedor (art. 1700), nos limites das forças da herança, frise-se. A obrigação alimentar também pode ser declarada extinta, se o binômio necessidade do alimentando e possibilidade econômica do alimentante deixar de existir, ou seja, se os pressupostos do art. 1695 não forem evidenciados. Ou ainda se de acordo com a redação do art. 1708 e seu parágrafo único:
Art. 1708. Com o casamento, a união estável ou o concubinato do credor, cessa o dever de prestar alimentos.
Parágrafo único. Com relação ao credor cessa, também, o direito a alimentos, se tiver procedimento indigno em relação ao devedor.
Desta forma se o credor ao casar, ou se unir a outrem de forma a configurar a união estável ou concubinato, perderá o direito a alimentos. Quanto ao procedimento indigno em relação ao devedor e à atitude a ser tomada pelo mesmo quando as hipóteses do art. 1708 estiverem evidenciadas, Maria Helena Diniz traz as seguintes anotações:
(...) O devedor de alimentos deixará de ter tal obrigação com relação ao credor (...) se tiver procedimento indigno, em relação ao devedor, por ofendê-lo em sua integridade corporal ou mental, por expô-lo a situações humilhantes ou vexatórias, por injuriá-lo, caluniá-lo ou difamá-lo, atingindo-o em sua honra e boa fama, enfim, por ter praticado qualquer atos arrolados nos arts. 1814 e 557 do Código Civil, aplicável por analogia (nesse mesmo sentido o Enunciado n. 264 do Conselho da Justiça Federal, aprovado na III Jornada de Direito Civil)". Em todos estes casos o devedor deverá pedir judicialmente, sua exoneração do encargo, sendo que "na hipótese de concubinato, haverá necessidade de demonstração da assistência material prestada pelo concubino a quem o credor de alimentos se uniu" (Enunciado n. 265 do Conselho da Justiça Federal, aprovado na III Jornada de Direito Civil) (grifo nosso).
É oportuno ressaltar que o novo casamento do cônjuge devedor, não constitui fundamento para a alteração da obrigação alimentar "pelo mesmo anteriormente assumida ou a ele imposta" . (art. 1709 do CC).
7. CONCLUSÃO
O instituto dos alimentos visa garantir a subsistência do necessitado, de modo a lhe permitir uma vida digna, devendo sempre ser levado em consideração o binômio necessidade/possibilidade, que rege a obrigação alimentar, seja decorrente de casamento, união estável ou parentesco, ou seja, a fixação do quantum alimentar deve ser proporcional, devendo observar a necessidade do alimentando e a possibilidade econômica do alimentante em arcar com tal obrigação.
A obrigação alimentar decorrente do casamento e da união estável decorre do dever de mútua assistência recíproca existente entre os cônjuges ou companheiros. A igualdade de direitos e obrigações entre homem e mulher esta calcificada no ordenamento jurídico brasileiro, desta forma não há privilégios em razão do sexo do demandante.
REFERÊNCIAS
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DIAS, Maria Berenice. Conversando sobre alimentos. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006.
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. v. 5, 22 ed. rev. e atual. de acordo com a reforma do CPC. São Paulo: Saraiva, 2007.
FARIAS, Cristiano Chaves de. Alimentos decorrentes do parentesco. In: CAHALI, José Francisco; PEREIRA, Rodrigo da Cunha (Coords.). Alimentos no Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2005.
LOUZADA, Ana Maria Gonçalves. Alimentos: doutrina e jurisprudência. Belo Horizonte: Del Rey, 2008.
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RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito de família. v 6. 28 ed. rev. e atual. por Francisco José Cahali, de acordo com o novo Código Civil (Lei 10.406/10-1-2002). São Paulo: Saraviva, 2004.
SEREJO, Lourival. Direito Constitucional da Família. 2 ed. rev. e atual. Belo Horizonte: Del Rey, 2004.
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VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito: Direito de Família. 7 ed. São Paulo: Atlas, 2007. ? (Coleção direito civil; v. 6).
Autor: Jehnyphen Samira Gomes De Santana
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