O Surgimento Da Família Eudemonista



“...a pessoa como valor, isto é, a personalidade, constitui parte que caracteriza o ordenamento jurídico de modo a garantir-lhe a unicidade”.
( Pietro Perlingieri)

O homem, para ingressar na sociedade como sujeito de direitos e deveres, necessita de uma estrutura que o prepare para uma convivência social que é a família.

A referência de sua existência está na instituição familiar e é está que será seu rumo norteador até o final da mesma.

A instituição familiar exerce importância fundamental na formação do indivíduo. Sendo assim, a família tem o papel de orientá-lo para ocupar determinado papel em sociedade.

Existe, portanto, uma relação de dependência e permanência devido a laços afetivos, sanguíneos, princípios e valores que lhes são postos à disposição através da família.

Ao conceituar “família”, dizia Pontes de Miranda:
palavra família aplicada aos indivíduos, empregava-se no direito romano em acepções diversas. A palavra família também se usava em relação às coisas, para designar o conjunto de patrimônio, ou a totalidade dos escravos pertences a um senhor.

A palavra "família" é mencionada no Código Civil de 2002 para qualificar círculo social, empregando a referida expressão apenas para definir um ramo do direito civil, o direito de família. Surge, então, um novo conceito de família deflagrando uma multiplicidade nas suas mais diversas formas de constituição.

A instituição familiar evoluiu ao longos dos tempos, passando por algumas fases e tomando diversos rumos de transformação até culminar com o modelo da família moderna, baseada fundamentalmente nos laços de afeto. São as seguintes fases:

O primeiro tipo de transformação era a estatização, que se caracterizava pela ingerência do Estado nas relações familiares.

Em seguida, a retração, que consistia na substituição da família patriarcal por uma família segmentar.

Na seqüência, a proletarização, que era identificada pela mudança do caráter das relações patrimoniais da família para relações de tipo alimentar.

Existia ainda, a democratização, que denunciava uma grande tendência de transformação do casamento para uma sociedade mais igualitária, no que concerne ao processo de emancipação da mulher e dos filhos na estrutura familiar.

Um outro rumo de transformação da família era a desencarnação, que revelava uma maior importância ao elemento psicológico ou afetivo em detrimento do elemento carnal ou biológico.

Finalmente, a dessacralização do casamento, que dava enfoque à facilidade do rompimento do vínculo conjugal, nos direitos resguardados do concubinato, bem como no tratamento igualitário entre filhos legítimos e ilegítimos.

Diante de tantas fases pelas quais se baseou a estrutura familiar ao longo da história, percebe-se que a evolução da estrutura familiar caminha para relações baseadas, cada vez mais, no sentimento e na afeição mútua.

A sociedade percebe, com o passar dos tempo, que a família deve servir de instrumento para o bem estar de seus membros e não servir apenas como modelo formal a ser imposto aos indivíduos que em torno dela convivem, muitas vezes, infelizes rodeados de tanto conservadorismo e de tantas pressões.

Como instituição responsável pela formação da personalidade única do indivíduo deve ser vista sob o aspecto de satisfação pessoal de seus membros e não meramente como forma de imposição de interesses que refletem uma visão ultrapassada e patrimonialista.

A família moderna é pluralizada, permitindo tantas quantas forem suas formas de constituição. É multifacetária, de caráter democrático, e desprovida de preconceitos, tendo como fim principal a satisfação de seus membros.

O novo modelo de família permite a sua formação de acordo com os laços de afeto entre as pessoas e, portanto, podendo ser composta por qualquer um, ou seja, não existe mais aquele paradigma do qual a família era composta do pai, da mãe e dos filhos. Hoje, a família não tem uma estrutura predeterminada. Uma tia e uma sobrinha, pidem, perfeitamente, compor uma família, desde que, entre elas existam laços de afeto, amor e carinho. Diante de tanta afinidade e cumplicidade,quem há de dizer que as duas não formam uma família? Não é uma questão de quantidade!

Insta salientar que uma das grandes conquistas da evolução da família foi o reconhecimento das uniões homoafetivas, bem como de outras, tais como a união estável e a família monoparental.

Sendo assim, a família possui um papel de suma importância na formação do indivíduo como cidadão, não apenas na sua convivência social e na sua condição de existência no mundo, mas também na satisfação de seus mais peculiares anseios, na busca pela felicidade.

Não é difícil concluir, portanto, que a pessoa que o Código Civil descreve não corresponde àquela que vive, sente e transita pelos nossos dias. É que os valores pessoais, os desejos, a intenção de ter reconhecida a sua dignidade não encontram correspondência na abstração de uma figura que o sistema pretende como pessoa, como sujeito de direito.

A sociedade brasileira deflagra traços marcantes de um fenômeno que surge nas relações familiares, designado funcionalização, que se caracteriza pela conservação da estrutura original dos institutos jurídicos, modificando suas funções contidas no ordenamento jurídico brasileiro, qual seja a de valorização do indivíduo pelo que ele é e não pela posição que ele ocupa na sociedade.

Esse novo fenômeno está intimamente ligado a valores fundamentais do ordenamento pátrio, elegendo, como prioridade, a tutela da pessoa humana. Surge assim, no panorâma do direito brasileiro, a família eudemonista que esta voltada para o afeto e o desenvolvimento em prol de seus membros.

Uma família que, antes de tudo, tem como base, o bem-estar, a boa convivência e a realização pessoal de seus membros. Essa é a nova estrutura da família brasileira! A família eudemonista apostou na qualidade de vida do indivíduo para que assim, bem realizado, possa participar na sociedade de forma mais eficaz, enérgia e atuante. Estrutura esta que, acredito eu, estar na direção certa, uma vez que demonstra ideais e valores necessários a um tipo de vida digna e admirável.

Bibliografia

ASSUMPÇÃO, Luiz Roberto. Aspectos da Paternidade no Novo Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 41.

DIAS, Maria Berenice. Manual do Direito das Famílias. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005, p. 328.

GOMES, Orlando. Direito de Família. Rio de Janeiro: Forense, 11º edição,1999, p.12.

MEIRELLES (2000 apud ASSUMPÇÃO, 2004, p.42)

MIRANDA, Pontes de.Tratado de direito de família. Campinas: Bookseller, vol.I, 2001, p.57-60.


Autor: Juliana Smarandescu


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