PERSPECTIVAS DE INCLUSÃO SOCIAL NA AMAZÔNIA
Ana Paula da C. Rebelo[1]
RESUMO
O presente artigo tem por objetivo colaborar para o combate à exclusão social e para a progressiva diminuição das desigualdades, através de ações que envolvam as políticas de governo nas áreas de educação, saúde, assistência social, saneamento e cultura, no sentido de prevenir a exploração de crianças e adolescentes que trabalham na catação de resíduos sólidos no aterro do Aurá e das crianças pedintes da cidade de Belém do Pará. As ações desenvolvidas pelos projetos: "Sementes do Amanhã" e "Reviver", promoveram a reintegração social e familiar de crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social, afim de que, através do exercício da cidadania, alcancem um futuro melhor, compreendendo também a inserção e a valorização da família.
Utilizamos pesquisa bibliográfica e o referencial teórico de mecanismos de Inclusão Social, pois percebeu-se a importância do esclarecimento e a divulgação de dois projetos como: Sementes do Amanhã e Reviver, acerca da aplicabilidade dos mesmos e analise do seu alcance social na Amazônia
Palavras-Chave: Inclusão Social, Projetos, Cidadania e Direitos Humanos
Considerações Iniciais
A história do ser humano na terra realmente tem sido uma grande aventura interativa, contudo a história da humanidade e nossa relação com a terra podem ser concebidas de duas maneiras: como uma interminável aventura ou como uma tragédia envolta em mistério, onde a pobreza se destaca como uma síndrome situacional na qual se associam o infraconsumo, a desnutrição, precárias condições de habitabilidade, baixos níveis de escolaridade, pouca participação nos mecanismos de integração social e talvez a adoção de uma escala particular de valores, diferenciada em alguma medida da sociedade em geral, causadas por um contexto socioeconômico e pelo desequilíbrio com o desemprego nas economias potencialmente ricas.
No Brasil de hoje, grande parcela da população infanto-juvenil enfrenta dificuldades decorrentes das desigualdades sócio-econômicas. Salta aos olhos a quantidade de crianças e adolescentes, filhos e filhas de famílias empobrecidas, que procuram maneiras de sobreviver nas ruas e nos recantos dos centros urbanos. Elas são o retrato da insuficiência e efetividade das políticas sociais traduzidas na falta de moradia digna, alimentação, saneamento, educação, saúde, emprego e renda.
Dentro de um contexto mais amplo, Galbraith e Harrington (1966), ressaltam que, na maior parte do mundo em desenvolvimento, a pobreza tem sido, por séculos, a situação corrente da grande maioria da população. A percepção da pobreza e do subdesenvolvimento se fundiu em um só diagnóstico fatalista ao longo de toda a história colonial.
O processo de descolonização posterior a segunda guerra, trouxe consigo a tomada de consciência nos centros do poder mundial da iniqüidade da pobreza e das possibilidades de desenvolvimento das nações subdesenvolvidas, buscando possibilidades de encontrar as brechas com respeito as nações ricas, confiando que tal crescimento dissolveria progressivamente as estruturas do subdesenvolvimento e, com elas, a pobreza.
No estado atual de nossa compreensão da síndrome da pobreza, não existe um marco teórico no qual se explique satisfatoriamente em sua totalidade, atendendo a presença simultânea dos sintomas que o compõem, além da explicação de cada um deles, como caso extremo de desigualdade em um sistema particular da distribuição dos níveis sociais.
Por outro lado, pesquisas tem apontado que a discussão da pobreza e da desigualdade, via distribuição de renda, freqüentemente se mesclam e se confundem. Não são, sem dúvida equivalentes nem se implicam mutuamente. Constituem problemas diferentes, tanto do ponto de vista conceitual, quanto em suas vertentes políticas. Há situações de ampla desigualdade em que quase toda a população se encontra, sem dúvida, acima dos níveis mínimos de consumo, assim como existem situações de pobreza tão generalizada que mostram comparativamente um considerável grau de uniformidade.
Como um fragmento desse processo, encontrava-se no depósito de todo o lixo da Região Metropolitana de Belém, denominado Aterro Sanitário do Aurá, aproximadamente 240 famílias desenvolvendo atividades de catação de resíduos sólidos para sua sobrevivência. Entre as muitas estratégias utilizadas pelas famílias para aumentar a renda, utilizavam a força de trabalho de crianças e adolescentes.
E foi nesse contexto de completa exclusão social e extrema vulnerabilidade que se encontravam as crianças e adolescentes, que em sua maioria estavam fora da escola, fazendo do aterro sanitário, não somente um espaço de trabalho, mas também de lazer, buscando entre as montanhas de lixo uma boneca ou um caminhão que possibilitasse o embalar de sua imaginação.
O Aterro Sanitário do Aurá representava para cada família, ali presente, a única alternativa de lutar pela vida, pois cada objeto catado representava o resto que a sociedade desigual estava lhe oferecendo, como mecanismo de sobrevivência. Outro modelo de perfeita exclusão é encontrado nas ruas das grandes cidades brasileiras, através dos pedintes e meninos (as) de rua, que fazem um verdadeiro assédio sobre as pessoas "favorecidas" nas ruas, nos semáforos e em todos os segmentos da sociedade que eles têm acesso e que vivem e sobrevivem de pequenos roubos e da caridade humana.
A compaixão pelos pobres, sem dúvida permanece, mas o que se intensifica neste quadro de desigualdade é uma progressiva substituição do sentimento de culpa pelo da irritação, devido o nosso país infelizmente não ter conhecido um estado de bem estar social, como existem nos países de primeiro mundo e com isto os governantes se eximem de assumir de fato uma política pública capaz de reduzir o abismo das desigualdades sociais, levando-os a miséria total.
Os exemplos citados nos levam a refletir sobre nossa verdadeira realidade, pois pelo menos a maioria são vítimas de uma organização social iníqua e de uma crise econômica que possuem precedentes, porém só o segundo exemplo é considerado delito e usurpação de espaço e bem público.
Assim falando rigorosamente, nunca haveria, no sentido no sentido próprio da palavra uma "disfunção", porque, na eventualidade de uma ocorrência desse tipo de situação, ela seria reapropriada pelo sistema e se revelaria, no final das contas, compatível com sua reprodução, pois os mesmos são vistos pela sociedade como "o avesso da civilização".
1 - Projetos: Sementes do Amanhã / Reviver Experiência Concreta de Mudança e Transformação.
Os projetos Sementes do Amanhã e Reviver são ações intersetoriais do governo que envolvem as políticas de educação, saúde, assistência social, moradia, saneamento e cultura, visando prevenir a exploração do trabalho de crianças e adolescentes na faixa etária de 07 (sete) a 18 (dezoito) anos incompletos, que vivem da catação de resíduos sólidos no Aterro Sanitário do Aurá e dos residentes drogatitos (moradores de rua) que vivem e sobrevivem de pequenos roubos e da caridade humana, através do atendimento integral à família, às crianças e adolescentes socialmente vulneráveis, contribuindo para seu desenvolvimento humano e social.
Os indivíduos que fazem parte desses projetos e das ações desenvolvidas, possibilitam o acesso na reivindicação de seus direitos sociais, à inclusão nas políticas sociais como sujeitos de direitos e na busca e construção consciente e crítica de outras formas de trabalho e renda através da qualificação profissional obtendo perspectivas de inserção da criança no convívio familiar quer seja na família biológica, substituta ou até mesmo no convívio comunitário, buscando assim um novo projeto de vida. A partir do cadastramento realizado pela Secretaria Municipal de Saneamento (SESAN), das famílias catadoras, foi possível levantar um demonstrativo da situação sócio-econômica desses trabalhadores; a maioria das famílias moravam em casas construídas em lotes irregulares, com estruturas físicas precárias e sem instalações sanitárias adequadas e saneamento básico.
A média de dependentes por família era de 05 (cinco) por domicílio, e a mulher aparecia, na maioria dos casos, como sendo a única mantenedora. A maior parte dos responsáveis encontrava-se desempregados, sobrevivendo basicamente da catação, e na busca de sua sobrevivência, cada família procurava coletar o máximo possível, inserindo a família para o trabalho, motivo pelo qual crianças e adolescentes estarem fora da escola e expostos a uma série de violências incluindo seu pleno desenvolvimento biopsicosocial.
O projeto Sementes do Amanhã foi desenvolvido como alternativa para a reversão deste quadro social, através de ações gerenciadas pela Fundação Papa João XXIII (FUNPAPA), órgão este considerado gestor e executor da Política Municipal de Assistência Social, e o mesmo é executado em conjunto com a Fundação Cultural de Belém (FUMBEL), Fundação de Parques e Áreas Verdes (FUNVERDE), e pelas Secretarias de Saúde, Educação, Saneamento e Economia. Além de Órgãos Municipais envolvidos, o projeto estimula um espaço de participação e controle social através de parcerias como: Sociedade Civil Organizada e Comunidade Local, Comunidade esta que encontra-se dividida entre Associações e Cooperativas vinculadas à prevenção do trabalho infantil e ao desenvolvimento humano da comunidade afetada.
Com relação ao projeto Reviver, que é especializado no atendimento de crianças e adolescentes socialmente vulneráveis e se estende as famílias, para que possam ser assegurados os direitos da criança e do adolescente e situação de risco social e poder levar a esses cidadãos dos direitos e resgate de valores até então perdidos. O projeto Reviver procura promover a reintegração social e familiar de crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social, perpassando principalmente pelo aspecto de seu tratamento psicológico, afim de que, através do exercício de cidadania alcancem um futuro melhor de respeito e dignidade.
A sustentabilidade do projeto se dá através de sua equipe de voluntários que abrange assistentes sociais, psicólogos, pedagogos, sociólogos, monitores voltados a área educacional desenvolvendo atividades técnicas e de operacionalização, visando o desenvolvimento integral de crianças, adolescentes e famílias em situação de exclusão social.
Os projetos citados têm a finalidade proporcionar aos indivíduos sua inclusão em todos os segmentos da sociedade para obtenção de seus direitos como cidadãos críticos, reflexivos, comprometidos com o bem estar e com tudo que os cercam.
2 A construção de um novo amanhã Inclusão, um fazer necessário.
Diante da degradante imagem de exclusão social, de fundo, pode-se perceber a concepção de cidade neoliberal pautada em uma profunda desigualdade social e em um processo contínuo de concentração de renda no poder de poucos. Dentre as estratégias de sobrevivência das grandes metrópoles, nesse processe de globalização, as cidades estabelecem ferrenhas guerras para captação de captais, enquanto que a grande massa de cidadãos é empurrada para os abismos que circulam as grandes cidades.
Para desafiar a superação de um modelo societário excludente, a Gestão do Governo do Povo (2000) imprimiu maneiras de governar, que favorecessem o desejo de radicalização da democracia, através de princípios, inversão de prioridades e participação popular. A inversão de prioridades compreende em projetos sociais voltados para o desenvolvimento humano cujo principal desafio está voltado às questões sociais, rompendo com histórias praticas que privilegiam os grupos dominantes locais, uma promíscua prática assistencialista, burocrática, fisiológica e autocrática.
Esse processo de inversão se materializa através da compreensão de justiça tributária, através do IPTU (Imposto Predial Territorial Urbano) progressivo, para que só assim seja feita uma divisão compartilhada dos bens públicos, bem como, investimentos nas políticas públicas para que caminhem em busca de sua sustentabilidade social, econômica, ambiental, cultural e principalmente ética dos seus indivíduos.
O fator estratégico para que possa ocorrer esse processo de inversão, se dá através da participação integral dos indivíduos, em um movimento onde o poder local institui um modelo direto com a sociedade civil, proporcionando assim um processo de apropriação da cidade por seus habitantes. Para que essa forma de governo se tornasse realidade, foi necessário construir um leque de instrumentais democráticos que englobassem o indivíduo.
O marco político e metodológico para que esse processo fosse posto em prática se deu através do conjunto de instâncias de participação popular que imprimiu uma outra cultura política de governar. Este novo processo de governar trouxe a baila uma parceria que tornou-se fundamental: À garantia dos Direitos Humanos enquanto condição de desenvolvimento humano, isto porque, fazem parte de um mesmo contexto, a medida que buscam o mesmo propósito, que é o de assegurar a liberdade, dignidade e bem estar de todas as pessoas através da construção de canais voltados para a viabilização de suas potencialidades individuais e coletivas.
3 Reviver através das sementes de um novo amanhã.
Os resultados obtidos pelos projetos fazem-nos acreditar que através deles pode-se obter a reintegração parcial na sociedade, pois são medidas paliativas de obtenção de respeito e cidadania das crianças e a partir deste conceito a exclusão da qual estamos falando (Exclusão Social) poderia através de situações como essas, concretas, mudar alguma coisa, mas, é preciso ações efetivas, para solucionar o problema.
A mensuração da participação popular resulta em uma ordem qualitativa e quantitativa de experiências voltadas para o bem estar social dos indivíduos, visando que acertar não condiz melhoria de vida e que o erro pode ser tomado como um processo de superação.
O olhar que analisa tais pensares nos remete ao aprofundamento de concepções teóricas e metodológicas aliadas a alterações de relações sociais no fazer das políticas públicas.
A análise sobre essas conquistas direcionadas a esses Projetos ora elucidados, expressa-se no fazer coletivo e emancipador que buscam resultados positivos em favor desta comunidade carente nos seguintes princípios norteadores para efeito de resultados: Atenção às crianças e adolescentes com garantia dos Direitos Humanos, encaminhamentos de indivíduos aos seus direitos e ao resgate de seus valores ora perdidos. As ações intituladas pelos projetos buscam a redução do trabalho infantil e o acesso a projetos educacionais que valorizem o contexto histórico de cada criança e adolescente comprometidos com a vida e com tudo que os cercam, motivado-os a assimilação de valores indispensáveis a sua formação.
Considerações Finais
A Inclusão Social não pode ser vista como uma utopia, como um modismo pois é um processo social maior que engloba todos os indivíduos independente de raça, gênero, credo, condição social etc.
Através desses Projetos pode-se perceber que essa missão não é fácil, e o muito que foi feito é enobrecedor, entretanto somente as suas continuidades e extensões nos planos Estadual e Federal, poderão consistir em uma etapa superior em termos de enfrentamento do processo de exclusão social. A partir daí, talvez, o Brasil possa se orgulhar de deixar de ser uma nação excludente.
As mudanças nesse contexto são lentas e exigem lutas, pois assim como na história da humanidade e em todos os tempos e épocas, alguém é favorecido em contrapartida de outros; sabendo disso, é interessante observar que se passarmos a refletir sobre a realidade a qual a humanidade vem construindo a vida humana começaremos a nos desconstruir, pois coloca-se os fatores estruturais, raciais, gênero, cultural de nossa sociedade como requisitos padrões. Contudo, seria muito oportuno salientar que todas as intenções, atenções, esforços e investimentos fossem de forma igualitária e convergissem para colocar em prática a integridade e identidade de cada indivíduo e assim legitimar os Direitos Humanos para que todos tenham o direito de ser tratados e viver com toda a dignidade que lhe couber.
Referências
·Mapa do Fim da Fome: Metas Sociais Contra a Miséria nos Municípios Paraenses. Fundação Getúlio Vargas: Instituto Brasileiro de Economia, 2001.
·POCHMANN, Marcio. O desafio da Inclusão Social no Brasil. SP: Publisher Brasil, 2004;
·Projeto Reviver;
·Projeto Sementes do Amanhã Fundação Papa João XXIII, 2001
·Próximo Passo: Qualidade de Vida por uma Belém Criança: Diretrizes Pragmática da Frente Belém
Popular, 2001 / 2004.
[1] Pedagoga, especializanda em Educação Especial e Inclusiva e Auxiliar Pedagógica da Faculdade da Amazônia FAAM / Pa.
Autor: Ana Rebelo
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