RESENHA - RUSKIN, John. A Lâmpada da Memória. Cotia, Ateliê Editorial, 2008



RESENHA

RUSKIN, John. A Lâmpada da Memória. Cotia, Ateliê Editorial, 2008.

Fernanda Figueredo Alves

"Podemos viver sem a arquitetura de uma época, mas não podemos recordá-la sem a sua presença. Podemos saber mais da Grécia e de sua cultura pelos seus destroços do que pela poesia e pela história". Assim dizia o inglês John Ruskin sobre Arquitetura, a importância de preservá-la e seu significado histórico para a humanidade. Este foi um escritor de pensamento romântico, onde prevalecia a emoção sobre a razão. Apreciador da Arte Gótica Medieval, viveu no auge da Revolução Industrial e se dizia inimigo da industrialização por acreditar que esta era uma forma de escravidão. Sustentava a ideia da não intervenção nos monumentos, por considerar que quaisquer interferências produziam novo caráter à obra, tirando sua autenticidade. Desta forma, trataremos nas linhas seguintes a respeito da visão deste que foi um dos pioneiros das teorias de Conservação, através do seu livro "A lâmpada da Memória".
Inicialmente, o autor discorre sobre o valor da Arquitetura, e que esta faz parte da natureza em que está inserida. Contudo, esta é vítima do esquecimento e muitos não creditam a ela o seu real valor. Os monumentos de hoje, conforme Ruskin devem possuir um valor histórico e os de épocas passadas devem ser conservados como nossa maior herança.
Em seguida, John Ruskin aborda a Arquitetura Doméstica que segundo ele "dá origem a todas as outras". A casa, para ele teria um caráter quase de santidade, pois permeava dentro dela a essência, a vida e a história do homem que nela viveu. Considerava um mau presságio quando casas eram construídas para durarem apenas uma geração. O desprezo do homem a sua casa, conforme o autor é um fenômeno precursor de outros males de desgraças (p. 10).
Já nos prédios públicos, deveria sempre haver um propósito histórico em sua construção. Para o autor, essas edificações deveriam "expressar de modo simbólico ou literal, tudo quanto é digno de ser conhecido sobre os sentimentos e realizações de uma nação" (P. 13). Ele cita o Palácio de Ducal, que através de suas imagens interiores, conta uma história.
No momento seguinte, Ruskin reforça o conceito de herança, e que tudo que temos agora devemos deixar aos que ainda virão principalmente nossa história, e por isso não devemos destruí-la. O autor ainda declara que "quando construirmos, pensemos que estamos construindo para sempre. E não façamos para a nossa satisfação de hoje (...) Que nossa obra seja tal que os nossos descendentes nos agradeçam (...)", e que em algum momento, aquela edificação se tornará sagrada. Percebe-se nesse momento do texto que o autor valoriza veementemente o monumento histórico e que a sua história e condição atual devem ser maximamente respeitadas.
Para o autor, a ruína de uma edificação ao longo do tempo carrega em si uma beleza que não pode ser comparada a nenhuma outra. Deste modo, ele utiliza o termo "pitoresco" como uma maneira de classificar um monumento de grande valor histórico e cultural. A beleza atribuída pelo tempo confere às edificações uma característica especial, suas particularidades chamam a atenção do espectador e vão em direção oposta ao estilo clássico.
Então, o texto chega ao que o autor considera como o que poucos entendem seu real significado: o Restauro. Para John Ruskin:

"(...) significa a mais total destruição que um edifício possa sofrer: uma destruição no fim da qual não resta nem ao menos um resto autêntico a ser recolhido, uma destruição acompanhada da falsa descrição da coisa que destruímos." (p. 25)

Deste modo, o autor considerava impossível restabelecer um monumento que foi grandioso e carregado de beleza, pois sua alma jamais poderia ser devolvida. É sustentado que outra época daria à edificação outro espírito, transformando-a em outra obra. Ainda, o autor considera o restauro uma "necessidade destrutiva" e acreditava que se preservássemos nossos edifícios não seria necessário essa restauração. Esse processo resultaria em uma imitação da arquitetura passada carregando em si uma réplica e um falso histórico, já que essa nova faceta pertenceria a uma nova época o tudo isso afetava sua autenticidade, seus valores evocativos e poéticos.
Para Ruskin, algumas intervenções até eram permitidas, porém, apenas para conservar a edificação. O autor aceitava pequenas obras de consolidação ("muletas"). Quando as mesmas perdiam sua utilidade, ele conformava-se frente à morte certa e natural que toda edificação teria um dia. Assim, o autor defende então a "morte" dos monumentos.
Percebe-se em todo o decorrer do livro, que o autor mantém um dado aspecto nostálgico em seu pensamento, o que corrobora o seu lado romântico, induzido à poesia e subjetividade da preservação dos monumentos históricos, chegando a tomar em alguns momentos, atitudes radicais quando a restauração destes. Seu posicionamento é evidentemente contrário a intervenções, porém essa atitude acaba por perdermos o que ele mesmo defende que é o valor memorial da arquitetura.
É notória a importância de se preservar nossas edificações e construí-las para durarem séculos contando a nossa história, apesar de que nos dias atuais, como já notou John Ruskin no século XIX, estamos cada vez mais construindo apenas para nossa geração, esquecendo do valor histórico que podemos deixar para os que virão.


Autor: Fernanda Figueredo Alves


Artigos Relacionados


Restauração De Patrimônio Histórico Em Porto Seguro

A Eficiência Energética Na Arquitetura

Baudelaire E A Arte Na Emergência Do Capitalismo

Ouro Preto Recebe Ajuda Para Preservação De Patrimônio Histórico E Cultural Da Humanidade

Desmemoriando

Cidade De Vila Nova De Poiares

Questões Homéricas