A Palavra



A Palavra

O que é uma palavra? Um conjunto de letras ou sons, um símbolo, algo que descreve, que faz lembrar, síntese, tentativa. O que é palavra? Se escrita pode ser um registro, uma ideia, uma tese ou uma vida inteira, se ouvida é ameaça, amor, confiança, trato, respeito, um pouco do outro que entra em mim, já se dita, pode ser bem dita, mal dita, refletida, construída ou até não dita, pois pode ser dita, falada, gritada, resmungada, denunciada, choramingada. O que a palavra é? O jeito de se conseguir compreensão mútua, como diria Montaigne, ou serão fronteiras do meu mundo, como irremediavelmente concluiria Wittgenstein? Ou quem sabe, mudando de pergunta, o que não é palavra?
Palavra é o mundo, um mundo, do mundo e de mundo. É o mundo porque ele se dá em palavras, tudo que é tem um potencial para ser dito, e se não é o não já se encarregou de me dizer que não posso, mas "não" não é palavra? Palavra é um mundo de símbolos, metáforas, lógica, pacifismo, declarações, enfim, um mundo vasto ou um vasto mundo de combinações, eis a questão, palavra é combinação. Combinações que saem do mundo, o mundo dá sentido para as palavras, existiria palavras sem mundo? De mundo, do meu mundo, do seu mundo, de encaixe, palavra é encaixe, ou encaixa ou não encaixa.
Mas, não seria a linguagem a grande mãe? Sem dúvida que sim. Mas reflitamos acerca da palavra, sua filha mais cobiçada. Voltemos para a questão ainda não solucionada de algumas linhas antes: o que não é palavra? Mas bebês não usam de palavras, elas entram depois em nossas vidas. Tanto isto é relevante para os pais que o grande primeiro rito de passagem para os humanos é quando o seu bebê fala a primeira palavra, tornando-se criança, criando laços maiores, mais bilaterais com sua família e assim colocando-se no mundo, não que antes seus choros e risadas não conquistassem espaço, mas com as palavras, ou tentativas delas, não tem como não ouvirem-no, pois agora ele é algo além de um projeto, pense no robô, se ele é genial é porque algo de humano ele tem, seja em expressões faciais ou pode até chorar perfeitinho, mas se ele fala todos ficam com medo de que robôs estejam morando ao lado. Mas por que tanto fascínio e medo? Eles falam!
Agora penso que entramos no buraco da fechadura das palavras: que sentimentos elas trazem? Seria possível os seres humanos sentirem e não utilizarem palavras? Ora, claro que sim. Mas, qual a angústia de sentir-se mal, bem, apaixonado, fragilizado, ou seja qual for o mal ou o bem que lhe aflija e não poder colocar para fora. Sentir, emocionar-se, e enfim por palavras poder dizer ou mal dizer. Deixo claro que falo de palavras ditas, lidas, escritas, ouvidas. As palavras doem mais do que uma surra, quem nunca sentiu isso? Ou disse/escreveu e surrou ou/e ouviu/leu e ficou roxo para, quem sabe, sempre. As palavras tem poder, exemplo disso é dado por médicos, professores, advogados, publicitários, escritores, e uma infinidade de profissionais que todo dia nos revelam o que temos ou não, o que somos ou não, o que podemos ou não fazer, entre outros decretos.
Sei que se você chegou até este ponto deve já ter se perguntado: eu sei um exemplo do uso das palavras, a Psicanálise, ou se você for mais religioso poderá ter chegado no Padre, no Rabino, no Pastor, Monge ou algum outro religioso que use das palavras para lhe dar conforto, puxão de orelha ou até mesmo apenas lhe fazer pensar quando tudo está bem. Correto de sua parte, as palavras salvam. Salvam nós de nós mesmos. Palavrear é arte. E pode ser arte de curar. Escrever é uma terapia. Deite no divã e fale o que lhe trouxe até aqui. Entre no confessionário e fale seus pecados mais indizíveis. Sempre sob o véu de estar "sozinho", se és um leitor atento pode perceber que falamos, reclamamos, confessamos, resolvemos nossas angústias da alma fingindo estarmos sós, mas falando para que se ouça e que a palavra faça o circuito: eu,ideia, boca, mundo, ouvido, eu. A alma, só chegamos a ela pelas palavras. Temos que recorrer ao mito, ao livro sagrado ou ao que a mãe disse que não lhe caiu muito bem para começarmos com a tentativa de explicação. Todos queremos explicações, e queremos explicar. Palavras para serem duramente postas para fora, como que se um grande aperto no peito lhe comprimisse para expelir o que lhe faz doer. Eu falei e fiquei mais leve. Pensamentos apenas não bastam. Queremos mais, somos famintos por palavras. Não basta amar, tem que falar, senão que trágico amor eu tenho por ti. Eu preciso reclamar senão ficarei "entalada", e você sabe que não é metáfora. Falar para ver se faz sentido ou se sou apenas ridículo. Isso mesmo. Se for ridículo a cura está feita, mas se faz sentido, que dor me cabe. O sentido me leva para a compreensão. Nesta ordem mesmo. Só se há sentido é que posso compreender, se quiser. E compreender é medido pela palavra. Os professores não dão até nota para nossas respostas? Pois é. E se não entendemos o conteúdo não passamos de ano. Se não conseguimos expressar em palavras o que sentimos o outro jamais saberá, porque nós mesmos não sabemos, só compreendendo é que o sentido se faz presente frente a mim, pelas palavras, lidas ou escutadas. É o famoso exemplo de se repetir: eu consegui! quando realizamos um sonho, é o famoso beliscar.
Se não ouvimos não entendemos, se não falamos não deixamos o outro, ou nós mesmos, a par do que somos. A palavra nos faz mais ser. Torna-nos parte de algo, ou incorpora algo em nós. Mas afinal, o que não é palavra? O que não é palavra é o que nos tira o sono, o que nos faz chorar, nos deixa na cama por dias, é a angústia pela demora de algo que eu não sei mas que a qualquer momento vai se tornar sólido: palavra. Palavra é solidez. A palavra dita não retorna, a escrita também não, mesmo com as borrachas. Mas, tudo que é sólido é consumido pelo ar. Por isso a palavra é um vendaval de emoções.
Autor: Larissa Couto Rogoski


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